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Art Zoyd – “Marathonnerre I & II”

pop rock >> quarta-feira >> 12.01.1994


Art Zoyd
Marathonnerre I & II
Atonal, import. Contraverso


Poucos grupos além dos Art Zoyd se poderão orgulhar de possuir uma discografia em que não se vislumbra qualquer ponto fraco. Com efeito, esta banda francesa ocupa hoje uma posição privilegiada na música deste século, naquele lugar onde se cruzam todas as épocas e as etiquetas “popular” e “erudita” deixam de fazer sentido. “Marathonnerre” é a nova obra de fôlego dos Art Zoyd, actualmente um trio formado por Thierry Zaboitzeff, Gérard Hourbette e Patricia Dallio, editada em dois compactos separados, composta para um espectáculo “multimédia” do mesmo nome, com 12 horas de duração, apresentado ininterruptamente entre o meio-dia e a meia-noite, segundo coreografia e realização de Serge Noyelle. À semelhança dos anteriores “Berlin” (uma das obras-chave, senão a maior, da música alternativa dos anos 80) e “Nosferatu”, sobre a obra do expressionista alemão Murnau, “Marathonnerre” é uma obra desmesurada com a dimensão mítica de Wagner, a alma presa à memória dos Magma e a disciplina férrea própria dos Laibach. A electrónica e a manipulação dos “samplers” ganham aqui importância crescente, com algumas sequências a recordarem as sínteses electro-étnicas da dupla Musci-Venosta. A música evolui por ciclos amplos, em alternância de tensões e clímaxes instrumentais. Música de câmara do século XXI por uma dupla francesa, Thierry Zaboitzeff e Gérard Hourbette, que é a digna sucessora da parelha, igualmente gaulesa, formada nos anos 70 por Christian Vander e Jannick Top, o núcleo de fogo dos Magma. Fundamental. (9)

Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #146 – “Univers Zero – p_FM (Karalinda)”

#146 – “Univers Zero – p_FM (Karalinda)”

Karalinda
31.01.2002 121229
Podes-me fazer uma critica rápida com classificação aos albuns dos Univers Zero?!?!?

que album aconselhas a investir a seguir?!?!?

será que o vendedor ainda tem algum?!?!

Fernando Magalhães
31.01.2002 150303
Se não estou em erro, levaste o “Uzed” e o “Heatwave”, não foi?
Bom, sugeriria agora um disco anterior, para mim a obra-prima dos UZ: “Ceux du Dehors”, um disco gótico, denso e fascinante. Edgar Allan Poe + HP Lovecraft em música!
A Ananana arranja.
Creio que o vendedor já não tem lá mais nenhum Cd do grupo.

FM

Karalinda
31.01.2002 121229
PS: sempre chegaste a ouvir o Ultimo de Art Zoyd?!?!? é que por acaso gostava de saber a tua opinião… Para mim é o pior album dos Zoyd… que falta faz o zaboitzeff… snif

Fernando Magalhães
31.01.2002 150336
Ouvi uns bocados na Ananana e não me impressionou mesmo nada. Soou-me a electrónica bem comportada, com laivos classizantes mas sem a energia que costumava ser timbre dos Art Zoyd.
Estou em querer que a Patricia Dallio está a moldar a sonoridade do grupo, adequando-o à música dos seus álbuns a solo (“Procession”, “Champ de Mars”, “La Ronque nést pas le Pire”, “D’où Vient l’Eau des Puces?”…)…

UNIVERS ZERO:

1313 – 7,5/10
Hérésie – 7,5/10
Ceux du Dehors – 9/10
Uzed – 8,5/10
Heatwave – 8,5/10
Certitudes – 8/10 – Fiz crítica no Y

FM

Fernando Magalhães
31.01.2002 150310
O “Hérésie” é um dos 1ºs álbuns de um grupo que nunca parou de evoluir (bom, pelo menos até ao último disco…). Nesse disco, como em “1313” a sonoridade está, como dizes, bastante próxima da música de câmara acústica.

“Ceux du Dehors” – um clássico – é o álbum de charneira (lê a mensagem para o Karalinda) para uma sonoridade que incorporaria a electrónica e uma dimensão mais vasta e aberta, na linha dos melhores Art Zoyd, nos álbuns seguintes: “Uzed” e “Heatwave” (os que o Karalinda tem, se não estou em erro).
O novo álbum, sobre o qual escrevi no Y, é bastante bom, embora não apresente grandes inovações. É uma combinação explosiva de rock de câmara, jazz de uma elegância e requinte extremos e electrónica. Não me lembro agora do título, mas é uma porta de entrada no universo dos Univers Zero.

FM

Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #139 – “Hammill – um manifesto (MárioZ)”

#139 – “Hammill – um manifesto (MárioZ)”

MárioZ
08.11.2002 160455
Deparei com um texto-manifesto do Peter Hammill algures na net e decidi postá-lo aqui. Acho que exprime com felicidade a essência do que é o seu trabalho. Originalmente o texto – manuscrito – foi publicado como introdução a uma compilação qualquer, creio que ainda nos anos 70.

Vision

The aspects of vision are many,
and in addition there are reflections, illusions and hallucinations.
If some can be shared that makes us less alone.
If the dark can be faced, that makes us less afraid.
If we accept sight, that makes us more visible.

I feel the city caging me like an animal;
I am crushed by the weight of the system,
but I can still raise a – human- shout against it.
I feel the tension of doubt surge in me,
the release of eye-on-eye love,
the loss of childhood idols and aspirations;

I clutch the transitory prizes of knowledge and unspoken faith.
I feel the torch in my hand,
The spark in my heart,
and I must carry both as long as I can.
We all have our torches;
but lone flame-bearers do not make a procession of humanity.

It has been, and remains, my hope that through songs
vision can be shared and enhanced.
As for me, disappearing like the Cheshire Cat
with hardly even my smile intact,
I can still look at you only through the camera.
There is more urgent vision than that.
Listen to yourself.

Saudações

Mário

__________________
If I gave you just a little song
would that be enough
to save your life
or is the knife already turning in my hand?

Fernando Magalhães
08.11.2002 170526
Caro Mário

Está aqui tudo, de facto, senão relativamente aos “conteúdos” (esses que o tempo e a experiência vão moldando e transformando), pelo menos em relação às intenções e orientação geral da obra de PH.

O texto é, nesse aspeto, luminoso.

O problema com que já te deves ter deparado (o mesmo com que eu me deparei e deparo, de resto…) tem a ver com um “problema” com que todos os fãs de Hammill se debatem: por um lado a vontade imensa de partilhar esta luz imensa que jorra da obra musical e poética do autor em questão, por outro, e isto pode ser frustrante, a noção de que é impossível conseguir esta partilha com quem ainda não INTERIORIZOU todo o universo hammilliano que, em última análise, sendo de uma UNIVERSALIDADE quase heroica, começa por ser uma EXPERIÊNCIA PESSOAL INTENSÍSSIMA, de COMUNICAÇÃO com as palavras e a música.

Como tu bem disseste aqui há dias, a música e os poemas de PH revelam-se no contacto direto (interior), na sensação de identificação que se estabelece entre ele, autor, e cada um de nós, recetor/ouvinte/leitor.

Só se gosta verdadeiramente da obra de PH e dos VDGG quando chegamos aquele ponto em que achamos que esta música e estas palavras nos pertencem, nos transmitem qualquer coisa de vital, como se fossem um espelho da nossa própria humanidade.

É impossível apreciá-los de FORA, como também decerto já te apercebeste. Podemos achar a música interessante, original, forte, etc etc etc, mas o clique apenas acontece quando tem lugar o tal sentimento de identificação.

Hammill atinge o inconsciente (Jung chamou-lhe o ULTRA-consciente…). O milagre está em que a sua voz, a sua poesia e o seu génio enquanto compositor (e, já agora, pianista, guitarrista…), constituem as ferramentas ideais para a transmissão dessa tal VISÃO enunciada no texto que transcreveste.

De resto, tudo o que acabei de escrever, está bem explícito nesse manifesto – o desejo de partilha, mas também a distância, a solidão e o isolamento…

Penso que, por esta altura, já compreendes os motivos que me levam a considerar o Peter Hammill o maior músico/compositor da música popular dos tempos atuais (numa edição da Mojo comparavam-no, em importância, ao F. Zappa e a…Picasso!!!).

Tudo o mais é segredo. Sagrado. Ou…

“the least we can do is wave to each other”

saudações hammillianas

FM

Fernando Magalhães
08.11.2002 170531
Faltou acrescentar que esta identificação/comunicação a que me refiro é de uma natureza algo diferente, e mais profunda, do que aquela que em geral se estabelece com a obra da maioria dos músicos (por melhores que sejam) pop.

Ela funciona ao nível do mito, dos arquétipos psíquicos do homem, daí a “pancada” que sentimos no embate (no bom sentido) com os sons e as palavras de Hammill.

“A Plague of lighthouse keepers” (e, numa outra perspetiva, a sequência “Gog/Magog”, de “In Camera”) leva-nos a subir até à mais alta das montanhas, à mais alta das solidões (“The tower”, repara…). Nietzsche, de resto, também esteve lá.

FM

Fernando Magalhães
08.11.2002 180626
Passando do PH para os MAGMA, estou curioso em saber a tua reação. O CHRISTIAN VANDER é outra figura (e esta assumidamente Nietzschiana…), mas no sentido da magia negra (pela qual, diga-se de passagem, o PH também se interessou nos primeiros anos de carreira, parece que os outros músicos dos VDGG andavam um bocado assustados, como já li algures…). A música dos MAGMA (que o PH ouvia e apreciava) é totalitária e assustadora, mas num sentido diferente da do PH. Imagina se Wagner fizesse parte de um grupo rock…

Depois há a língua inventada por ele, os concertos de oito horas, os solos arrasadores de bateria, a vertente Coltraniana…

Já ouviste alguma coisa?

FM