Arquivo mensal: Janeiro 2017

Bill Frisell – “Nashville”

Pop Rock

14 Maio 1997
poprock

Bill Frisell
Nashville
NONESUCH, DISTRI. WARNER MUSIC


bf

Por mais que tentemos detectar sinais de vida na música de Bill Frisell, não conseguimos. “Nashville” constituía, à partida, um pretexto excelente para o guitarrista mostrar que não é um animal de sangue frio. Debalde. Nesta aproximação à música country, gravada “in loco”, num dos seus locais sagrados, Nashville, nem a participação de Ron Block (dos excepcionais Union Station que acompanham Alison Krauss – atenção, que não morremos de amores pela country music) nem a inclusão de um tema de Neil Young, “One of these days”, conseguem tirar Frisell do seu laboratório de notas absolutamente limpas e exactas. A audição deste álbum servirá, porventura, para comprovar as palavras do crítico da revista “Jazz Times” quando se refere “à inabilidade inata de tocar uma nota supérflua” de Frisell, ou, segundo o “Minneapolis Star-Tribune”, a sua sonoridade “evocativa de uma ‘steel guitar’ solitária”, aqui, um pouco como nalguma música de Ry Cooder. Tudo aspectos formais, numa obra que conta ainda com os irritantes tiques vocais de Robin Holcomb e à qual continua a faltar a centelha de paixão. (6)



Depeche Mode – “Ultra”

Pop Rock

4 Abril 1997

DEPECHE MODE
Ultra (7)
Mute, distri. BMG


dm

Da onda “electropop” que assolou as Ilhas Britânicas nos anos 80, composta por grupos como os Human League, Tubeway Army, Berlin Blondes, Yazoo, Blancmange, Soft Cell, Depeche Mode e Orchestral Manoeuvres in the Dark, sobreviveram apenas os dois últimos, à custa de uma sucessão de reciclagens inteligentes, ainda que, nalguns casos, oportunistas.
Na prática, tanto os OMD como os Depeche Mode andaram, quase sempre, a reboque das diversas tendências da música de dança que foram emergindo ao longo da última década. Curiosamente, porém, assiste-se hoje a um revisionismo do “electropop”, revalorizando-se uma estética que, na primeira encruzilhada com que se deparou, na sua geração original, derivou para dois extremos que não poderiam ser mais divergentes: a pop sintética e plastificada para consumo adolescente e a música industrial, que por sua vez se desmultiplicou em vários movimentos.
Esta valorização está na base do retorno a algumas das premissas estéticas originais do movimento, por parte dos OMD e dos Depeche. Os primeiros recuperaram o seu lado mais espacial e psicadélico no álbum do ano passado, “Universal”, os Depeche Mode, neste seu novo trabalho, incorporando de forma perfeitamente coerente as melodias pop que sempre os caracterizaram, num formato heterogéneo que desloca subtilmente a rítmica do “trip hop” para os domínios mais adocicados do grupo.
No capítulo dos efeitos especiais, “Ultra” está saturado de pequenos e grandes achados, nomeadamente nas introduções dos 11 temas, onde David Gahan, Andrew Fletcher e Martin Gore ensaiam, com gozo óbvio, novas combinações da tecnologia computorizada com a estrutura da canção pop. Afirmado este gosto experimentalista – assumido sem rodeios no belíssimo e sombrio instrumental “Jazz thieves” –, que, de resto, nunca abandonou os Depeche Mode e, ainda hoje, mantém toda a sua premência em álbuns como “Construction Time Again” e “Black Celebration”, sínteses do “electropop” com o industrial, o trio desfaz-se em vacalizações de uma simplicidade desarmante.
Próximos da claustrofobia Trickyana no tema de abertura, “Barrel of a gun”, próximos do pós-rock em “The Bottom Line” (com a participação do baterista dos Can, Jaki Liebezeit) ou na descompressão, talvez excessiva, do último, “Insight”, um aceno aos Tears for Fears de “Shout”, os Depeche Mode alargam a sua mensagem de estetas divertidos que pretendem fazer drama, trocando o seu papel de bebés Kraftwerk pelo de adultos armados de ironia, adeptos do “glamour” eléctrico do final do século.



Yello – “Pocket Universe”

Pop Rock

26 Março 1997

YELLO
Pocket Universe (6)
Mercury, distri. Polygram


yello

Funciona a pescadinha de rabo na boca. Os Yello desbravaram, na aurora dos anos 80, o caminho à tecno e ao jungle. E, 1987 apanharam a última carruagem e vão a reboque do movimento que ajudaram a criar. Desde 1980, data de estreia do seu primeiro trabalho na Ralph (editora a que pertenciam, na mesma época, os Residents e os Tuxedomoon), “Solid Pleasure”, a evolução do duo suíço constituído pelo “crooner” Dieter Meier e o teclista Boris Blank processou-se no sentido do experimentalismo de comédia para a música de dança desalinhada. A partir de “Claro que Si” e “You Gotta Say yes to another Excess”, para nós os dois melhores álbuns da dupla, as cadências de dança e uma crescente aceitação na cena internacional tomaram conta dos Yello, numa progressão direita ao comercialismo, que começou na colecção de remisturas “Yello 1980.1985, The New Mix in one Go” e atingiu a completa esterilidade em “Zebra”, de 1994. “Pocket Universe” é uma fuga para a frente e a queda no buraco negro da música sintética. Uma visão iluminada pelos “pulsares” do drum’n’bass, da house e do jungle, onde a voz de barítono de Dieter Meier enche, em comentários de circunstância, as “catedrais de som” elaboradas pelo seu companheiro. Resulta simultaneamente maquinal e etérea (tão etérea como a voz de Stina Nordestam, convidada especial no tema “To the sea” – já agora, o “videoclip” é espantoso) a auto-estrada de humor cósmico encenada pelos Yello com um desprendimento próprio de reis. Trazem para o universo de bolso dos clubes de dança uma experiência acumulada e uma imensa gargalhada de desprezo a piscar no visor: “O futuro fomos nós!”