Arquivo mensal: Março 2024

Whippersnapper – “Folk-Rock No S. João Do Porto”

cultura >> quinta-feira, 10.06.1993


Folk-Rock No S. João Do Porto

OS WHIPPERSNAPPER, trio constituído por Chris Leslie, Martin Jenkins e Kevin Dempsey, actuam amanhã e na sexta-feira na Ribeira do Porto, em espectáculos integrados nas festas de S. João, iniciativa do pelouro de animação da cidade, com produção e organização da MC – Mundo da Canção. É o regresso do humor e do virtuosismo que a banda já dera a conhecer nas suas duas anteriores visitas a Portugal: em 1991, nos Encontros Musicais da Tradição Europeia, e, no ano seguinte, a solo, nos “Circuitos” que complementavam esse festival.
De então para cá a música do grupo ganhou consistência e reconhecimento público, passando do estatuto de banda de culto – para o qual muito contribuiu a presença, na formação inicial, do mestre do violino, ex-Fairport Convention, David Swarbrick – para nome de cartaz no carrossel de festivais Folk internacionais.
Chris Leslie assume hoje o papel de violinista principal numa proposta que se mantém intacta desde o início, na qual os instrumentos de corda são os principais protagonistas: além do violino, o bandolim, a mandola, o mandocelo e a guitarra. Ultimamente, o sucesso e consequente alargamento de audiências levaram a que a electrização do som se fizesse sentir comm maior intensidade, através da inclusão, na paleta instrumental, do sintetizador e de um violino eléctrico.
Nas suas anteriores passagens por Portugal, os Whippersnapper deixaram a imagem de um grupo de “virtuoses” sem pretensões, que intercalava um “tour de force” das cordas ou a repescagem de tesouros antigos desenterrados dos tempos em que Jenkins e Dempsey ajudaram a implantar o Folk Rock em Inglaterra, nos Dando Shaft, com uma anedota ou um comentário bem humorado sobre cada canção.
Hoje como ontem, os Whippersnapper prosseguem viagem pelas margens da música tradicional inglesa, sem grandes preocupações em deixar marcas de reconhecimento. A revista americana da especialidade “Frets” definiu-os uma vez nos seguintes termos: “Just your typical everyday original new acoustic traditional british ethnic multi-instrumentalboedown rock folk band.” O que, traduzido por miúdos, significa bons momentos de música e de gozo em perspectiva.

Vários – “Vozes e Ritmos do Oriente”

pop rock >> quarta-feira, 09.06.1993
WORLD


ALMANAQUE ASIÁTICO

Vários
Vozes e Ritmos do Oriente
CD Tradisom, distri. Livraria Portuguesa de Macau



As compilações, de música tradicional ou de qualquer outro género, são divergentes nas suas propostas e propósitos. De catálogo sonoro de uma eyiqueta ou do embrulho de “êxitos” com fins meramente comerciais à explanação de uma tendência ou conceito estéticos comuns vai uma enorme distância. “Vozes e Ritmos do Oriente”, primeiro de uma série de três volumes, além de uma montra sedutora para os sons provenientes de várias regiões da Ásia, vale pelo aspecto didáctico, para os que agora se vão iniciando na exploração dos sons étnicos que se fazem ouvir dos quatro cantos do mundo.
Atento a este aspecto, o organizador do projecto, José Mouras, fez acompanhar os exemplos musicais de um livrete explicativo, escrito em português (parece redundância referir tal facto mas procurem outros discos desta área escritos nesta língua…), onde são fornecidas indicações preciosas, embora forçosamente incompletas, sobre as respectivas culturas, dos aspectos históricos aos instrumentos utilizados. Não faltam sequer explicações sobre os “chapéus coloridos de quatro bicos” da China, um festival das pastagens da Mongólia ou a “sublimação espiritual” no Paquistão. José Mouras, antigo músico dos Almanaque e antigo realizador do programa radiofónico “Arca do Velho”, transmitido na Rádio Macau, dedicado à divulgação de música tradicional, sabe obviamente do que fala e expõe os diversos assuntos de forma clara e acessível.
Das várias músicas abrangidas constam as tradições do Arzebaijão, China, Índia (Rajastão e Indostão), Japão, Mongólia, Paquistão e Tuva (na Sibéria, célebre pela técnica vocal que permite a um único músico emitir simultaneamente dois sons diferentes, já conhecida de alguns através de um álbum dos Tuva Ensemble, na editora Pan, com edição portuguesa).
Pondo de parte a literatura e o peso da História, os sons mais apelativos e próximos de uma sensibilidade europeia encontram-se na sequência final: nos dez minutos de festa vocal pelo conhecido Nusrat Fateh Ali Khan e no singelamente intitulado “Tying shrtukthlerining iri” dos cantores e instrumentistas de Tuva, em logaritmos rítmicos que os Penguin Café Orchestra deceto se terão entretido a decifrar. Uma edição que é, ou começou por ser, limitada, com hipótese de distribuição próxima por parte da BMG, a merecer todo o aplauso. (8)

Syd Barrett – “A Crazy Diamond” (3xCD box)

pop rock >> quarta-feira, 09.06.1993
REEDIÇÕES


COMO DESTRUIR UM MITO

SYD BARRETT
A Crazy Diamond
3xCD Harvest, distri. EMI-VC



Mais uma caixa, desta feita contendo a discografia completa a solo do lunático que iluminou a fase inicial dos Pink Floyd com a lâmpada do psicadelismo: os dois álbuns oficiais de originais, “The Madcap Laughs” e “Barrett”, mais a adenda “Opel”, os três acompanhados por um livrete que narra passoa a passo a carreira do músico desde os tempos de “Arnold layne” ao afogamento na loucura.
Se Barrett é hoje um mito, tal deve-se mais à aura de estranheza e de diferença que sempre rodearam o seu nome do que às suas virtudes como músico. Imagem que até os seus antigos companheiros nos Pink Floyd não se dispensaram de reforçar quenado lhe fizeram a dedicatória na faixa “Shine on you crazy Diamond” de “Wish you were here”. Se a presente colectânea tinha como objectivo preservar essa imagem do “génio” incompreendido, mártir da sua arte, a táctica escolhida resultou no inverso, esfarrapando a lenda ao mostrar, em toda a nudez, um mau cantor e guitarrista, em pleno processo de desagregação mental. E isto porque se foram desenterrar todas as “takes possíveis e imaginárias de temas que encontraram a sua forma definida e mais ou menos estável (?) nos tais dois primeiros álbuns, esvaziando-os, sem que desse processo se obtivessem quaisquer contrapartidas. Os “bonus tracks” que foram acrescentados a cada um dos álbuns de originais não passam de esboços inacabados, hesitações, gravações de estúdio que exibem com despudor um Barrett totalmente incapaz de cantar afinado, em sucessivas tentaivas para conseguir acabar um tema do princípio ao fim, entre tossidelas, paragens, frases soltas e as instruções dadas tores do lado de fora da cabina.
Deste modo, “The Madcap Laughs”, um álbum que vale essencialmente pelo “nonsense” dos textos, mais do que pela inspiração melódica, e “Barrett”, este sim, já mais próximo de uma obra acabada, muito por culpa da produção de David Gilmour, perdem com os enxertos. Qual o interesse de dar a ouvir um (mau) ensaio da repetição inconsequente de temas como “Dominoes” ou “Love you”? O valor musical é nulo. Há, evidentemente, o interesse documental, mas mesmo aí o livrete incluso acaba por desempenhar melhor a tarefa. “Opel”, nesta medida, é mesmo perfeitamente dispensável, passando da manta de retalhos que já era ao puro desperdício, um pouco o disco pirata de um artista de terceira ordem.
No mei de tanta inutilidade e até de um certo mau gosto, visível na leitura parola da estética psicadélica utilizada nas novas capas (como as originais aparecem, apesar de tudo, no inverso, é sempre possível, para quem ainda não tiver os originais, dobrá-los do avesso), sai maltratado Syd Barrettt, reduzido à figura do demente cuja inspiração se desvanecia passado o efeito do LSD e de quem preferiremos guardar para sempre os sonhos floydianos de “The Piper at the Gates of Dawn”. O que se segue? As gravações integrais das festas de aniversário do filho mais velho de Roger Waters? (4)