Arquivo da Categoria: Festivais

Vários (Nuno Canavarro + Carlos Maria Trindade + Plopoplot Pot + Nuno Rebelo + A Máquina Do Almoço Dá Pancadas + …) – “Festivais De Lisboa – Os Sons Da Diferença” (festivais | antecipação)

Secção Cultura Quinta-Feira, 12.12.1991


Festivais De Lisboa
Os Sons Da Diferença


Os espectáculos de hoje e amanhã à noite, no S. Luiz em Lisboa, integrados nos “Encontros de Música” dos Festivais de Lisboa, prometem ser diferentes. Joaquim D’ Azurém e a dupla Nuno Canavarro / Carlos Maria Trindade actuam hoje, às 21h30. O primeiro toca guitarra de água, de cristal. “Transparências”, álbum de estreia editado há dois anos, inventa novas cores e filigranas para a guitarra portuguesa e é uma incursão serena no território das músicas ambientais. Fado astral?
Nas áreas do ambientalismo, com porta aberta para mundos paralelos, movem-se Carlos Canavarro e Carlos Maria Trindade, o primeiro ex-Street Kids, o segundo ex-Heróis do Mar. “Mr. Woologallu”, álbum acabado de editar, conta histórias de mil sons enredos, nascidos dos sonhos do computador. Imagens, sinais que se cruzam. Realidades virtuais que no cosmos de um instante se fazem e desfazem, contemplados de um “tapete voador zen, silencioso mas não sem turbulências”.
No dia seguinte a música acelera, torna-se rude, entrelaça-se em estruturas milimétricas, quase fractais. O silêncio dá lugar ao grito, a contemplação à improvisação. Da selva urbana, mensagens tecnojazz via Plopoplot Pot, de Nuno Rebelo, Luís Areias, Rodrigo Amado, Paulo Curado e Bruno Pedroso, e Máquina do Almoço Dá Panacadas, de João Pires de Campos, Rodrigo Amado, Gui, Luís Filipe Valentim, Lívio e Alberto Garcia. As duas bandas cruzam-se no CD colectânea “Em Tempo Real” onde provam que há uma ordem no delírio e prazer nesse delírio. O cérebro não necessita das pernas para dançar.
Em ambos os grupos os sopros de metal sustentam um edifício de paranoia, de vertigem. Desestruturar para estruturar mais à frente e encontrar o outro lado das formas, novos equilíbrios e maneiras de coabitar o pesadelo. “Catástrofes de todo o mundo desaguando nas planícies do silêncio?” O cataclismo supõe uma estratégia, a exigência de mudança, passagem, revolução. Nada é definitivo. Do silêncio depois do caos os sons renascem. Sempre pela primeira vez.

Vários – “Começa Hoje A Semana De Cultura Irlandesa – O Paraíso Celta Revela-se Em Lisboa” (festivais | céltica)

Secção Cultura Segunda-Feira, 02.12.1991

Começa Hoje A Semana De Cultura Irlandesa
O Paraíso Celta Revela-se Em Lisboa

Entre hoje e 7 de Dezembro realiza-se em Lisboa uma “Semana de Cultura Irlandesa”, organizada pelo Instituto de Cultura Inglesa e a Faculdade de Letras de Lisboa. A iniciativa visa “a articulação entre a cultura irlandesa e a portuguesa” e promete animação. Ou o acesso a Tir Nan Aog, o paraíso celta.



A semana irlandesa inclui, entre outras actividades, um concerto de música tradicional de raiz celta, na Aula Magna, com os irlandeses Comhaltas Ceoltóiri Éireann e os portugueses Jig, outro de música de câmara, conferências, debates, exposições, teatro, sessões de vídeo, cinema e até um jantar típico irlandês. E a presença do poeta e romancista John Montague que, logo a seguir à abertura oficial, lerá poemas da sua autoria. No Anfiteatro 1 da Faculdade de Letras, às 18h30.
“Fools of Fortune”, o novo filme de Pat O’ Connor, será apresentado em ante-estreia absoluta, na Cinemateca, dia 2 às 21h30. Ainda no capítulo do cinema, e no mesmo local, serão exibidos no dia 3, “Gente de Dublin”, de John Huston, às 18h30, e “My Left Foot” (“O Meu Pé Esquerdo”), de Jim Sheridan, às 21h30. E no dia seguinte os clássicos de John Ford, “The Quiet Man” (“O Homem Tranquilo”), 18h30, e “The Informer” (“O Denunciante”), 21h30, que decerto vão atrair à Cinemateca os apreciadores de bom cinema.
O teatro também estará presente. No Teatro da Comuna, dia 7, às 16h00. Com “The Dracula Meditations”, uma “série de reflexões sobre o mito de Drácula que agora é vítima da violência de uma sociedade recalcada” numa peça que “explora um submundo erótico e estético ameaçado pelo ‘status quo’ puritano e agressivo”, adaptada do original de Bram Stoker, escrita, dirigida e interpretada por Paul O’ Hanrahn e pelos Balloonatics, companhia de teatro independente sediada em Dublin. Todos os dias, das 10 às 18h00, estará patente na Sala das Exposições uma retrospectiva do “Teatro português sobre textos de irlandeses”.
Prevista está também a realização de debates: O “Teatro Irlandês em Portugal” (dia 3), “A Irlanda no cinema” (dia 4), “Música popular irlandesa” (dia 5). Todos às 14h, na Sala das Exposições. Com a presença de convidados ligados aos diversos temas abordados. O dia 6 está reservado para uma conferência sobre a cultura e literatura irlandesas.
Canções irlandesas e ciganas, e obras de Hoffmeister e Mozart, interpretadas por Stephanie Duarte, viola de arco, e William Raposo, violino (Duarte & Raposo Co.?) farão as delícias dos apreciadores de música de câmara. Dia 5, às 19h30.

A Voz E O Estômago

“And last, but not least”, a música tradicional da Irlanda, das jigas e dos “reels”, dos violinos, “tin whistles” e “uillean pipes”. Pelos Jig (muita atenção à voz de Isabel Leal), do Porto, que foram revelação no Festival Inter-céltico de Abril deste ano, e os Comhaltas Ceoltóiri Éireann (com boa vontade até se pronuncia), associação fundada em 1951 com o objectivo de “preservar e divulgar a música, a dança e a língua irlandesas e, de uma maneira geral, promover a identidade cultural das comunidades irlandesas espalhadas pelo mundo”. Da actual formação dos Comhaltas, etc, fazem parte Jim Egan (concertina, flauta e “tin whistle”), Noel Carberry (“uillean pipes”, “tin whistle”, bodhran, ossos e dança), Karena Dowling (violino, flauta, “tin whistle” e bodhran), Paula Dowling (flauta e “tin whistle”) e Doreen Norris (dança).
Depois de sonhar com os mitos e lendas da velha Irlanda, resta a consolação do estômago. Possível dia 7, às 19h30, no Bar Novo da Faculdade, com as iguarias típicas da ilha.
Os bilhetes, a preços mais do que acessíveis, encontram-se à venda na livraria da Faculdade de Letras (música), Teatro da Comuna (teatro) e Cinemateca (cinema). A inscrição, por 5 mil escudos, na livraria, garante o acesso a todas as iniciativas desta semana de cultura da Irlanda. Terra mágica onde os homens se habituaram a convivar com os deuses.

“Britânicos Trazem A Portugal Música E Danças Tradicionais – Ventos De Northumbria”

Secção Cultura Segunda-Feira, 28.10.1991


Britânicos Trazem A Portugal Música E Danças Tradicionais
Ventos De Northumbria


Das cinzas de Babel renasce uma nova Europa ancorada nas músicas do tempo. Tempo de preparar novos antigos caminhos. Fruto da associação da “Folkworks”, projecto inglês de divulgação da cultura tradicional, com a Cooperativa Cultural Etnia, anuncia-se uma série de concertos com músicos da região de Northumbria, a realizar no Porto, Guimarães, Coimbra e Guarda, com início no final deste mês.



Agendadas para o nosso país estão já as actuações do grupo Folk Syncopace, da violinista / cantora Nancy Carry, do tocador de harmónica Will Atkinson e da dançarina Jane Vipond, nas seguintes datas: 30 de Outubro, no Porto, no Teatro Rivoli, 5 de Novembro em Guimarães, no Paço dos Duques, 6 em Coimbra, no Teatro Gil Vicente, e 7 na Guarda, no Cine-Estúdio Oppidana. Falta a confirmação de um espectáculo na capital. Todos os concertos têm início às 21h30.
Criada em 1988 no Norte de Inglaterra com o intuito de promover a música e dança tradicionais, a “Folkworks” estende hoje as suas actividades pelo resto da Europa, nomeadamente através da cooperação com organismos culturais de outras regiões.
Em Portugal, o projecto “’Folkworks’ na Europa” associou-se à Etnia, Cooperativa cultural do Norte do país, responsável, entre outras iniciativas meritórias, pelos Encontros da Tradição Europeia, que em Julho passado tiveram a sua 2ª edição.
Reforçando a união entre o que, por tradição e afinidade cultural, já nasceu unido, e prosseguindo numa saudável política de colaboração inter-regional, a Etnia estabeleceu por seu lado um acordo luso-galego com a sua congénere Federacion de Associacions Culturais Galegas, tendo por objectivo a criação de um circuito regular de actividades ligadas a este género de música. Portugal / Galiza / Inglaterra irmanados num triângulo concêntrico e dourado, centro irradiante da cultura e do raio celtas no mundo.

Música E Danças Do Nordeste Inglês

A Northumbria, localiza-se no Nordeste de Inglaterra, entre a Escócia e a zona carbonífera de Durham, é ciosa dos seus segredos. Ouvidos atentos e uma intuição desperta que permita ler as vibrações do ar, encontrarão decerto as chaves, nas melodias dos pastores das colinas de Cheviot ou nos lamentos das “Northumbrian pipes”, um modelo de gaita-de-foles característicos da região.
Alistair Anderson (um dos dinamizadores do projecto “Folkworks”) é o gaiteiro e tocador de concertina dos Syncopace, praticantes de uma música instrumental que alia as melodias de gaita-de-foles da Northumbria do séc. XVII a tradicionais finlandeses ou a uma eventual valsa texana. Alistair, para além dos Syncopace, tem gravados os álbuns “The Grand Chain” e “Steel Skies”, tendo além disso colaborado em discos de Kate Bush, John Williams e Nigel Kennedy. Completam a formação dos Syncopace a violoncelista Penny Callow, o flautista Martin Dunn e o violinista / bandolinista Chuck Flemming (ex-Fine Hane Reel, uma das propostas mais interessantes do revivalismo Folk britânico dos anos 70).
Will Atkinson (tocador de harmónica de 83 anos de idade, especialista na música dos pastores de Northumbria), Nancy Kerr (violinista / cantora das tradições irlandesa e de Northumbria) e a dançarina Jane Vipond (campeã de dança dos condados do Norte inglês) completam o programa. Paralelamente aos concertos, está prevista, em cada dia, a realização de “workshops”, no próprio local dos espectáculos.