Arquivo da Categoria: New Wave

Everything But The Girl – “Amplified Heart”

pop rock >> quarta-feira >> 15.06.1994


Everything But The Girl
Amplified Heart
Blanco Y Negro, distri. Warner Music



Tracey Thorn e Ben Watt estão cada vez mais feios, mas isso até nem é muito importante, pois a música continua a ser bonita, embora com tendência crescente para ser bonitinha. Passados os tempos em que os ventos sopravam de feição para Sade Adu, Working Week, Marine Girls, Anna Domino e Weekend, e os próprios Everything nos deleitavam com as carícias de “Eden” e “Baby, The Stars Shine Bright”, resta agora uma brisa ligeira de Verão e um suave aroma de maresia. “Amplified Heart” é um oceano sem ondas, melhor, um lago de águas calmas, ideal como palco sonoro para namoros de veraneio, sem futuro nem compromisso. A onda dos Everything but the Girl, aliás, é outra. Feita de melodias que entram por um ouvido e saem pelo outro. Deixando na passagem uma rasto de paixões tão ardentes como o pico gasoso de um refrigerante e tão duradoiras como a espuma de uma cerveja. As canções deslizam de “skate”, quase todas na voz da menina com ar de patinho feio. Os calores tropicais foram substituídos pelo ar condicionado e já não é possível fazer “surf” sobre as emoções. Os murmúrios de um “Mini Moog” anacrónico, posto a cantar por Bem Watt no tema de abertura, “Rollercoaster”, o súbito acordar da guitarra, pelo convidado Richard Thompson, em “25th December”, e as sacudidelas dos saxofones a fechar, em “Disenchanted” proporcionam os único sobressaltos num disco que se compraz na serenidade de quem se observa no espelho das águas do Mar Morto. Danny Thompson, Dave Mattacks e Kate Saint John, presentes neste coração a precisar de um amplificador mais potente, aproveitaram para meter a velocidade de cruzeiro. Uma das delícias do Verão é poder-se saborear discos como este, que duram o tempo de uma maré. (5)

GNR – “GNR Apresentam Novo Guitarrista E Rui Reininho Mostra Nova Vocação – A Revelação De Um Guarda-Redes”

cultura >> sábado >> 11.06.1994

GNR Apresentam Novo Guitarrista E Rui Reininho Mostra Nova Vocação
A Revelação De Um Guarda-Redes

A juntar ao disco novo, “Sob Escuta”, os GNR têm também um novo guitarrista. Cantanhede foi o lugar escolhido para estrear a nova formação – que esteve para não se realizar – revelou uns GNR em forma, com o recém-chegado a dar cartas e Rui Reininho a somar aos seus dotes vocais os de guarda-redes.



Alexandre Manaia é o novo guitarrista dos GNR, entrando para o lugar de Zezé Garcia. Por este motivo, era aguardada com uma certa expectativa a estreia ao vivo do grupo com o novo recruta. Ela aconteceu na quinta-feira e a honra coube a Cantanhede e ao Clube de Futebol “Os Marialvas”, entidade promotora do concerto.
Quinta-feira (ou talvez seja mais correcto dizer, sexta), por volta da meia-noite, hora a que se iniciou a actuação do grupo, poucos seriam, dos cerca de três mil jovens presentes no campo de terra batida de “Os Marialvas”, aqueles que sabiam como se chamava o novo guitarrista. Num passatempo realizado de tarde por uma rádio local de Cantanhede, ninguém acertou o nome.
Com bilhetes a 1750 escudos, o espectáculo esteve quase para não acontecer. “Problemas técnicos”, segundo explicou um elemento da organização, motivaram o atraso. “Problemas de alimentação eléctrica”: um gerador que não funciona, lá se conseguiu arranjar um em bom estado, mas que também não funcionava porque não tinha gasóleo. E toda a gente sabe que um gerador sem gasóleo não gera. A coisa estava para demorar. Os músicos? Ainda iam jantar. Mais problemas de alimentação.
Cerca da meia-noite, com a chegada do gasóleo, tudo se resolveu e os GNR, pese embora a noite amena, foram recebidos com pouco entusiasmo por uma assistência constituída quase exclusivamente por adolescentes. Arranque em força com “Las Vagas”, logo seguido de “Dominó”, ambos os temas do novo álbum “Sob Escuta” que o grupo apresentou em Cantanhede, aos quais se viriam a juntar “Ciclones”, “+ vale nunca”, “Música de Ligeia”, “O costume” e “Costa Atlântica inevitável”, alternando com êxitos como “Efectivamente”, “Morte ao Sol” e “Pronúncia do Norte”.
Ficou a confirmação de que os GNR estão cada vez mais Pop “mastiga e deita fora” e profissionais. Por vezes, a música aproxima-se dos Supertramp (nas ocasiões em que é dominada pelo piano eléctrico de Telmo Marques), noutras sobressai o lado “kitsch” e melodramático, com Reininho a vestir a pele do “crooner” espremendo-se em romantismo, noutras ainda joga-se com a fonética do gozo e das letras, como aconteceu em “Homem mau”, a adaptação dos GNR de “All right now”, um tema dos anos 70 dos Free. Quanto a Alexandre Manaia, teve tempo e motivos de sobra para se divertir e executar sem constrangimentos solos na guitarra. O som actual dos GNR passa em grande parte por ele.
Rui Reininho assumiu-se em definitivo como um “entertainer”. Entre Bryan Ferry e Tony Silva (“obrigados, obrigados!”, repetiu por várias vezes no final das canções). Em Cantanhede, embora não estivesse propriamente esfuziante, mostrou o humor do costume, do subtil ao espalhafatoso. Durante “Música de Ligeia”, uma canção “triste”, como anunciou, sugeriu que se formassem pares de dança de meninos com meninas, ou outros, a partir de “desvios freudianos”. Apresentou Jorge Romão no “cabisbaixo eléctrico” e o teclista convidado, Telmo Marques, como eu “guru espiritual”. A dada altura, numa antecipação improvisada do próximo “Mundial” de futebol, lançou-se para o chão em espectaculares defesas a balões lançados para o palco pela assistência.
Outro momento interessante ocorreu durante a interpretação de “Vídeo-Maria” (com “Valsa dos detectives” e “Dunas”, um dos três “encores” da noite). Na parte em que Reininho cantava “atirem-me água fria”, o público respondeu à letra, esguichando sobre o vocalista garrafas de água mineral. Finalmente, a despedida com um “hare-krishna” cheio de devoção.
Passavam 20 minutos da uma da manhã quando os GNR puseram uma pedra sobre o assunto. Pouco mais de uma hora de concerto que, se não encheu as expectativas de ninguém – é preciso não esquecer que se tratava do início de rodagem – também não as defraudou. Quem pairava nas estrelas, findo o concerto, eram a Inês, 18 anos: “Adoro os GNR, adoro, adoro, adoro! Era capaz de ficar aqui dias.” E a Iolanda, 19: “Já vou há muitos anos a concertos do grupo, a vários sítios.” Ambas estudantes, esperaram mais de meia hora à porta dos camarins pelos autógrafos dos seus ídolos.
Já de madrugada, as atenções voltaram-se para um segundo palco instalado no recinto onde actuaram a Fan-farra Académica de Coimbra e os Omega, de Mourelos, Vil de Matos, estes ansiosos por estrearem o seu novo sistema de iluminação e tocarem as suas versões de canções de Fausto, Quim Barreiros e Soul Asylum.

(caixa)
“Parece O Sporting, O Benfica E O João Pinto”

ALEXANDRE MANAIA, é ponto assente, trocou de funções com Zezé Garcia, como guitarrista dos GNR. Até aqui nada de novo. Só que Manaia deixou a banda de Rui Veloso em vésperas de uma digressão deste músico. António Pinho, empresário de Veloso, já ameaçou com um processo, que não nos foi confirmado, dado que, por enquanto, prefere “não tecer mais comentários”. Por seu lado, Manaia, contactado pelo PÚBLICO no final da actuação dos GNR em Cantanhede, declarou que “obviamente tinha um compromisso com o Rui “, mas que, também “obviamente”, se pretendeu “desvincular dele”, embora “sempre cumprindo até à data todas as coisas”. “Sinto-me comprometido é com Rui Veloso e não com António Pinho”, disse o guitarrista, que garantiu ter tentado “fazer as coisas de maneira a que o Rui tivesse um mês ou mais para tentar arranjar outro músico”.
Certo é que Manaia se integrou perfeitamente nos GNR, tendo para tal ensaiado com os outros músicos “todos os dias durante duas semanas”. O músico até já faz comparações entre as suas novas funções e as que desempenhava com Rui Veloso: “Gosto de tocar guitarra como gostava de tocar piano com o Rui. Tenho imenso prazer em tocar o que quer que seja. Lembro-me de, com o Rui, numa digressão há três ou quatro anos, ter tocado chocalho nalgumas músicas. O prazer era o mesmo. O espectáculo actual dos GNR tem um ritmo mais acelerado, enquanto o Rui tem neste momento um concerto mais íntimo, menos volumoso em termos de som, com timbres mais acústicos, tudo mais “jazzy”. São prazeres diferentes.”
Também para Rui Reininho, igualmente contactado pelo PÚBLICO, a mudança de guitarristas foi “uma coisa espontânea, sem razões de fundo”: “Achámos que precisávamos de mudar.” Não por motivos ligados ao visual, ou à falta dele, do antigo guitarrista, hipótese que fora avançada anteriormente, mas por “uma questão de som”. “Hoje divertimo-nos como já não nos divertíamos há muito tempo.”
Sobre os eventuais procedimentos legais contra Manaia, Reininho é claro: “São problemas que nos ultrapassam. Acho muito chato ameaçar um puto que quer tocar e não o deixar fazer o que quer. Se foi ou não a altura ideal, não sei. Já parece o Sporting, o Benfica e o João Pinto.”
E, numa alusão à sua actuação como guarda-redes: “Foram duas boas defesas. Para canto.”

Yosure Yamashita & Bill Laswell – “Asian Games”

pop rock >> quarta-feira >> 08.06.1994


Yosure Yamashita & Bill Laswell
Asian Games
Verve XXX, distri. Polygram



Gravado em 1988, “Asian Games” acabou por ser editado apenas no ano passado mas nem por isso perdeu uma parcela do seu interesse. O projecto resultou de uma sessão de estúdio de Yamashita, pianista de jazz, com Ryuichi Sakamoto, na altura ocupado com a banda sonora de “The Last Emperor”. Avesso à utilização de samplers e sintetizadores, Yamashita cedeu, por fim, a manipular toda a tecnologia digital posta à sua disposição pelo ex-Yellow Magic Orchestra com a ajuda de Bill Laswell, cuja marca em “Asian Games” é determinante. O cruzamento da techno japonesa dos YMO com o etno-funk dos Material serve de base às divagações jazzísticas do pianista, em trabalho improvisacional e exploratório, como acontece em “Napping on the bamboo” ou, simplesmente, como em “Melting pot”, fazendo ornamentações enquanto a enxurrada de ritmo o empurra para as pistas de dança do quarto mundo. No horizonte, avista-se a metrópole híbrida dos The President, de Bobby Previte e Wayne Horvitz. “Asian Games” é notoriamente um álbum feito, antes de mais, pelo prazer do diálogo e do risco partilhado. Receptáculo de cumplicidades a que se juntaram outros dois nomes da “downtown” nova-iorquina e companheiros de luta de Laswell, Nicky Skopelitis e Alyb Dieng. Jogos asiáticos, lúdicos não tanto por constituírem um manancial de descobertas mas, acima de tudo, como lugar de encontro de sensibilidades que souberam ultrapassar as divergências. (7)