Arquivo mensal: Abril 2020

Elba Ramalho – “Elba ‘Brasa’ Ramalho Regressa A Portugal”

Cultura >> Sexta-Feira, 24.01.1992


Elba “Brasa” Ramalho Regressa A Portugal

ELBA RAMALHO regressa a Portugal para uma digressão a realizar entre os dias 8 e 22 de Fevereiro por várias localidades do país. Assim, o novo espectáculo da cantora brasileira nordestina – “Felicidade Urgente” – tem já marcadas as seguintes datas: dia 8, apresentação de gala no novo casino de Vilamoura; dia 14 – Guimarães, no Pavilhão Francisco de Holanda; dia 15 – Pavilhão de Sobral de Monte Agraço; dia 16 – Amadora, no Pavilhão da Académica; dia 20 – Aveiro, no Pavilhão da Feira; dia 21 – Coimbra, Pavilhão da OAF; dia 22 – Amiais de Baixo.
Em espectáculos que se anunciam com “espectaculares coreografias”, “8000 watts de som” e “120000 de luz, apoiados por diversos efeitos”, Elba Ramalho faz-se acompanhar por uma banda de sete músicos formada por Elber Bedaque, bateria, Marcos Farias, piano e maestro, Manassés de Souza, guitarra, Fernando Moura, teclas, Jamil Joanes, baixo, Reppolho, percussão, e Jussara Silva, coros, e pelo bailarino Carlinhos Jesus, o “Duque”, na telenovela “Kananga do Japão”.
A produção dos espectáculos está a cargo da PROPALCO para quem esta primeira iniciativa “é o primeiro passo de um projecto que visa levar, com o apoio das autarquias e de outras entidades culturais locais, nomes grandes da música e do teatro a cidades e vilas normalmente deixadas fora do circuito de espectáculos – que continuam a ser pensados para os Coliseus ou as grandes salas de Lisboa e Porto”.
De facto, não é todos os dias que Amiais de Baixo tem a sorte de assistir à sedução, vocal e corporal, da “cantriz”, que é como os brasileiros chamam a uma das maiores “brasas” da MPB. A felicidade é sempre urgente. Com a voz e o resto de Elba Ramalho é meio caminho andado.

Erik Wollo, Green Isac, Robert Rich – “Renovação Da ‘New Age’ – Música Em Estado De Graça”

Cultura >> Sábado, 18.01.1992


Renovação Da “New Age”
Música Em Estado De Graça


Erik Wollo, Green Isac e Robert Rich são novos músicos apostados em dotar a “new age” com um espírito voltado para o futuro. Aventuras discográficas à volta da Tradição, da floresta da Amazónia ou da arquitectura da Gaudi encontram-se a partir de agora disponíveis em Portugal.



Origo e Hearts of Space, duas editoras especializadas na área de música electrónica “new age”, a primeira norueguesa, a segunda norte-americana, partilham uma concepção de “nova idade” diferente da visão cósmico-lamechas das congéneres Windham Hill, Coda ou Innovative Communications. Em vez de ter a sílaba sagrada “aum” na ponta da língua e à venda nos supermercados, na Origo e nos “corações do espaço”, privilegia-se a aventura, a síntese de culturas e diferentes linguagens musicais, a exploração de ideias e paisagens sonoras inusitadas, a criação de novos hábitos de escuta. Alquimia do Verbo manifestado no mundo novo que se pressente e anuncia.
“Images of Light”, sexto álbum de originais de Erik Wollo, culmina a fase de pacificação deste compositor norueguês de 31 anos de idade, iniciada com “Traces” e “Silver Beach”. Música expressionista, de tonalidades irreais, entre o minimalismo de cristal, a luz azul turquesa dos fiordes da Noruega e o silêncio, aprendido com John Cage e depois com Brian Eno. Gravado no estúdio próprio “Wintergarden”, com auxílio do oboé, saxofones e sampler de Jan Wiese, “Images of Light” ergue-se sobre o horizonte da música electrónica com o brilho de uma lua cheia – música de espaços silenciosos, de reverberações nocturnas, de ecos de culturas ancestrais à deriva no oceano do tempo. Imagens de luz, de enigmas, de figuras primitivas traçadas a dourado sobre o céu.

África Astral

Mais chegados à terra, os Green Isac reinventam no seu álbum de estreia, “Strings & Pottery”, os folclores do mundo, recriando no computador as sonoridades de instrumentos tradicionais transformados em títulos de canções: “Sarod”, “Musette”, pequenas peças de teatro sonoro coreografadas pela natureza e pela electricidade. A África torna-se um continente astral, de fauna e flora fantasmagóricas, em temas como “Congalonga” e “Waterflute”, Índia e China revelam-se lugares outros delineados no mapa da subjectividade, transfigurados pelo sonho. Novas geografias interiores cujo acesso passa pelas vias do Inconsciente. Os Green Isac são fazedores dos mitos do futuro.
Do futuro, observado sob outro ângulo, nos fala ainda o compositor norte-americano Robert Rich, em “Rainforest”, “Strata” (de parceria com Steve Roach, outro nome importante da música electrónica actual) e “Gaudi”, o mais recente do lote. Sons que viajam entre a religiosidade presente na época áurea de Klaus Schulze (“Timewind”, “Moondawn”, “Mirage”) e as pulsações obscuras de Brian Eno em “On Land”. Inventor de um novo sistema de afinação que designa por “Just Intonation” baseado nos conceitos de “harmonia natural” e “microtonalidades”, promotor e intérprete de concertos “all night” destinados a pôr em transe as audiências da “Bay Area” em São Francisco, Robert Rich aborda em “Rainforest” questões como a deflorestação da Amazónia e a procura pessoal do paraíso primordial, num disco de respiração ampla e paisagens electro-tribais tão luxuriantes quanto as do coração da selva.
“Strata” situa-se na mesma área de cruzamento da música electrónica com sonoridades étnicas, dos computadores com flautas de bambu. Robert Rich e Steve Roach estão empenhados em mergulhar nos abismos do “subconsciente, do surreal e das sombras”. Acreditam no “rio do acaso” e deixam-se levar pela intuição. Dilúvio de símbolos, de encontros improváveis, verdadeiro compêndio de onirismo, “Strata” sintetiza de forma genial as premissas enunciadas pelos mestres Hassell e Musci / Vennosta.
Por seu lado, “Gaudi”, inspirado nas concepções visionárias do arquitecto catalão Antoni Gaudi e em particular na catedral da Sagrada Família, em Barcelona, eleva-se me espiral, tão alto quanto formos capazes de nos libertar do lastro mental.
Na arquitectura de Gaudi encontrou Robert Rich uma “aspiração da beleza sagrada”. Encontramos na música do compositor idêntica preocupação com “a vibração, o espaço e o tempo, na expressão do espírito humano”. Se a arquitectura lida com a matéria e com o espaço, ambos, arquitectura e música, podem “evocar emoções se nome” e “atingir o sublime”. “Gaudi”, o disco, alcança o estado de graça.
Nota: discos encomendados por via postal à Ananana, Apartado 2167 – 1137 Lx códex

Pop Dell’Arte – “Edição De Máxi Antecipa Novo Álbum Dos Pop Dell’Arte – Assim Falava Peste, Com Música De Strauss”

Cultura >> Quinta-Feira, 16.01.1992


Edição De Máxi Antecipa Novo Álbum Dos Pop Dell’Arte
Assim Falava Peste, Com Música De Strauss



“2002” e “M C Holly” são os dois temas que integram o novo máxi dos Pop Dell’Arte antes do álbum “Ready-made”, com edição prevista para a primeira semana de Fevereiro na editora Variodisc. O disco é “mais dirigido às pistas de dança” que o álbum, nas palavras de João Peste, vocalista e anarco-ideólogo do grupo do qual fazem parte ainda Rafael Toral, Luís Sampayo, Pedro Alvim e João Paulo Feliciano.
“2002”, que o cantor considera um tema “carismático”, prolonga por alamedas sombrias o sonambulismo “house” vigente nas noites mais ácidas da Europa, em alucinações e parasitagens electrónicas, descarrilamentos “scratch” e as vocalizações de Peste que, como não podia deixar de ser, também saltam da linha. Não falta sequer a alusão kitsch à odisseia espacial de Stanley Kubrick, em “2001”, através da utilização de “Thus Spake Zarathustra” – “Assim falava Zaratustra”, de Richard Strauss – “a ideia partiu de uma colagem de uma versão ‘funky-jazz” do poema sinfónico deste autor, dedicada a Friedrich Nietzsche. Trabalhámos nela e o resultado acabou por soar um bocado irónico, uma brincadeira à volta dos slogans ‘power is life, power is love’, disse o cantor. “M C Holly” carrega com mais força no acelerador e é mais fiel aos cânones tradicionais da música de dança. Há menos ousadia sem que isso implique ausência de provocação. A maneira como, logo no início do tema, se dirige via cinismo samplado, aos jovens – “remember kids, I’m your friend”, como um “amigo” que só dá bons conselhos – ilustra bem a atitude de Peste como diletante da decadência “chic” por excelência entre o conformismo bem comportado da maior parte das bandas pop nacionais.
Confirmando o interesse crescente de João Peste pela música de dança, o cantor estará hoje à noite na discoteca “Zona Mais”, onde actuará desta feita na função de disc-jockey”: “É uma coisa que eu não costumo fazer regularmente mas que já aconteceu por várias vezes, sempre que para tal me convidam. Neste caso concreto, trata-se de pôr a tocar discos de ‘dosco-sound’, ideia que juguei engraçada. De resto já tinha colaborado antes, também como ‘disc-jockey, no mesmo local, durante uma ‘noite psicadélica’”, informou João Peste.
Interrogado quanto aos discos que irá passar esta noite, o cantor refugiou-se num lacónico “ainda não pensei nisso”.