cultura >> quinta-feira >> 26.05.1994
Teresa Tarouca Comemora 33 Anos De Carreira, No Tivoli
Morte E Ressurreição Do Fado
TERESA TAROUCA celebra neste ano 33 anos de carreira. Este aniversário será comemorado com um espectáculo intitulado “33 Anos a Cantar Portugal”, que se realizará hoje no cinema Tivoli em Lisboa, com produção das Edições Ledo.
Acompanhada à guitarra por João Torre do Vale e Pedro Veiga, e à viola por D. Segismundo de Bragança e Jaime Santos, Teresa Tarouca contará ainda com a presença de dois convidados – Gonçalo da Câmara Pereira e o actor Tó Zé Martinho, que vão cantar dois ou três fados cada. Ao todo, a fadista interpretará 26 fados, entre os quais alguns inéditos, como uma versão de “Lágrima”, imortalizada por Amália, ou “À minha mãe”. Parte dos lucros deste espectáculo – que poderá ser repetido em Paris e noutras cidades portuguesas – reverte a favor do Instituto Português de Oncologia.
Não vai ser um espectáculo qualquer. Porque Teresa Tarouca tem pergaminhos na canção nacional, porque pertence a uma família ilustre de cantadores – é prima de Vicente da Câmara e foi D. Teresa de Noronha quem a iniciou nas lides fadistas – e, acima de tudo, porque canta o fado com a emoção que ele exige.
Vale a pena citar uma das suas declarações à revista “Olá! Semanário”, publicada em 24 de Julho do ano passado: “Estive a cantar em França, para um auditório de jovens universitários. Ao fim de umas horas senti as pernas dormentes, coisa que nunca me tinha acontecido. E das duas uma: ou tirava os sapatos ou caía. Tirei os sapatos e pedi-lhes desculpa por ter de cantar descalça, explicando o que estava a acontecer. Foi impressionante! Todos se levantaram e aplaudiram.”
Por aqui se vê a raça da artista que, curiosamente, canta um fado intitulado “Não sou fadista de raça”.
Além disso Teresa Tarouca é uma pessoa bastante religiosa. Diz que Deus a ajudou na sua carreira e faz mesmo notar que o número 33, correspondente ao seu aniversário como fadista, é igual ao da idade de Jesus Cristo quando morreu e, três dias depois, ressuscitou. Até porque, como avisadamente nos é explicado no folheto de promoção do espectáculo, “o acto de criação artística é simultaneamente um acto de morte e de ressurreição”.
Entra-se depois no território da filosofia (de inspiração cristã) e aqui as elipses são obscuras e de mais difícil decifração, como que a querer dar um sentido ao título de um dos fados mais célebres de Teresa Tarouca, “Saudade, silêncio e sombra”. “A Arte deve procurar estas correspondências em símbolos que transcendem a própria natureza humana.”
Teresa Tarouca, à sua maneira, com o sentimento e a voz que Deus lhe deu, foi isto que fez e continua a fazer ao longo de 33 anos de carreira. É verdade que o fado não é símbolo de nada e que não há nada menos simbólico do que a música, seja ela qual for. Quando muito, os portugueses é que são símbolo do fado.
Quem, no entanto, tiver dúvidas o melhor que tem a fazer é ouvir os discos de Teresa Tarouca – de preferência os de fado, uma vez que a artista também tem uma queda pelo folclore. “Portugal Triste” ou o recente “Teresa Tarouca canta Pedro Homem de Mello”. E dar hoje à noite no Tivoli toda a atenção a composições como “Não sou fadista de raça”, “O meu bergantim”, “Zé sapateiro”, “Povo que lavas no rio”, “Canção verde”, “Deixaste a vida de outrora” e o maior êxito da fadista, “Saudade, silêncio e sombra”.