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Oyster Band E Pierre Bensusan – “Oyster Band E Pierre Bensusan Actuam No Rivoli Do Porto – Danças De Copo Na Mão” (concertos / rivoli)

Cultura >> Sábado, 26.09.1992


Oyster Band E Pierre Bensusan Actuam No Rivoli Do Porto
Danças De Copo Na Mão


Música tradicional e rock ‘n’ rol nem sempre forma um casal feliz. Os Oyster Band celebram a aliança à mesa de um “pub”, dentro ou fora de portas. Para a banda inglesa é importante pôr toda a gente a dançar. E, passada a euforia do baile, fazer reflectir sobre o tom amargo das palavras.



A cidade do Porto volta a ser a capital da música Tradicional e não só. Oyster Band e Pierre Bensusan actuam hoje, às 21h30, no Teatro Municipal Rivoli, em mais uma iniciativa conjunta do Pelouro de Animação da Câmara Municipal do Porto com a MC – Mundo da Canção. Uma boa maneira de não perder o ritmo, enquanto crescem as expectativas sobre o Intercéltico do próximo ano, com a presença dos Chieftains já confirmada e uma série de outros nomes importantes em agenda.
Danças típicas inglesas, canções de intervenção e uma dose bem servida de entusiasmo constituem os ingredientes principais da música dos Oyster Band, banda que ao lado dos Pogues e dos The Men They Couldn’t Hang, dotou a música tradicional do Reino Unido, nos finais dos anos 70, com a energia do rock ‘n’ rol ou – melhor dizendo e de acordo com as correntes e os alfinetes da época – do punk. Se em relação às duas primeiras características os Oyster Band não fizeram mais que prolongar uma já longa tradição de bandas britânica de folk rock, já o item “entusiasmo” é inseparável do costume tipicamente “british” que preconiza a ingestão maciça de whisky e cerveja como forma de pôr o mundo e, sobretudo, a cabeça, a girar sobre rodas. Convém não esquecer que o “habitat” natural do britânico (seja ele inglês, irlandês ou escocês) é o “pub”. Os Oyster Band, como os Pogues ou os The Men They Couldn’t Hang, limitaram-se a trazer o “pub” para o palco. Num grupo restrito de amigos ou entre a agitação das multidões, o efeito não varia muito: euforia e dança.

Um Dilema Resolvido

Nos primórdios, a banda chamava-se The Oyster Ceilidh Band, o que lhe dava um certo ar de respeitabilidade entre os círculos folk eruditos. Com o advento do punk, resolveram que não queriam ser sérios. Pelo menos dessa maneira. Era preciso levar a loucura da dança e a embriaguez do álcool ao maior número possível de pessoas. As pessoas escusado será diz~e-lo, aderiram. As pessoas aderem sempre desde que se lhes ponha um copo na mão.
Não se infira daqui que os Oyster Band são um grupo de bêbedos. São é mais extrovertidos do que o habitual. E tão abstémios como Shane Mac Gowan, dos Pogues. “Step Outside”, de 1986, gravado na editora própria Pukka Records e posteriormente reeditado pela Cooking Vinyl, foi o primeiro brinde a um público ávido de dar ao pé ao ritmo de uma música genuinamente popular e com raízes nos problemas do quotidiano.
A entrada no grupo do violoncelista Chopper permitiu aos Oyster Band, segundo o violinista e teclista Ian Telfer, “estabelecer e criar condições mais profundas de familiaridade com uma grande variedade de estilos de música dedicada à dança”. Compromisso entre a tradição, a intervenção e a desbunda que os portugueses tiveram oportunidade de presenciar ao vivo na actuação dos Oyster Band há dois anos na Festa do “Avante!”, quando, na companhia da grande dama da folk que é June Tabor, se entregaram a uma versão “sui generis” de “All tomorrow’s parties”, dos Velvet Underground.

O Beijo Da Morte

Os anos 90 têm correspondido a esta fase de “um pé na folk, outro no rock”: versões de “Love vigilants”, dos New Order, e “New York Girls” e os álbuns “Freedom and Rain” (com June Tabor) e “Deserters”, do ano passado, deixam bem patente o gosto dos Oyster Band pelo rock ‘n’ rol que sabe respeitar os seus antepassados. Importa talvez, no final do baile, reter as palavras de Ian Telfer: “Ser-se inglês, em termos musicais, pode significar uma espécie de beijo da morte. Tem de se recorrer a tantas coisas para se ser radical e construir uma alternativa diferente e genuína! Uma cultura minoritária ou uma cultura que sente que tem algo a defender está sempre numa posição mais forte, tem um entendimento mais profundo e vigorosos da sua própria identidade.
A primeira parte do concerto do Porto será preenchida pelo guitarrista argelino, radicado em França, Pierre Bensusan, considerado um dos mestres actuais do “fingerpicking” e de outras técnicas de corda dedilhada. Ao vivo, Bensusan costuma submeter a sonoridade próxima da harpa, que caracteriza o seu estilo, a diversas transformações electrónicas, na criação de paisagens sonoras bizarras próximas do universo da “world music”.

Vários – “XV Festa Do “Avante!” Começa Hoje Na Amora – Músicas Autónomas Proclamam Independência”

Secção Cultura Sexta-Feira, 06.09.1991


XV Festa Do “Avante!” Começa Hoje Na Amora
Músicas Autónomas Proclamam Independência

Todos os anos, por esta altura, os comunistas portugueses dão espectáculo. Sobre um fundo vermelho cada vez mais esbatido, na Amora, Seixal, voltam a erguer-se os palcos onde se fará a festa. Os camaradas estão resignados: a república da música há muito que se tornou independente.



Ideologia à parte, não faltam motivos de interesse em mais uma edição, a XV, da feta do “Avante!”, que durante três dias vai animar o cinzento poluído da margem Sul do Tejo. Em termos exclusivamente musicais, se ainda não é desta que vêm os Pink Floyd, resta a consolação de poder apreciar ao vivo o rock de Gianna Naninni, uma “latin lover” italiana que já trabalhou com Bertolucci, Antonioni e cantou o hino do último campeonato do Mundo de Futebol, capaz de incendiar corações de todas as cores com o som agressivo do seu mais recente álbum “Scandalo” – no domingo, às 22 h, no palco 25 de Abril.
Mas o programa da Festa não engana: 1991 é o ano da consagração da música tradicional. Não deixa de ser engraçado verificar como o vocábulo “tradição” se sobrepôs aos de “Revolução” no léxico das festividades comunistas. O que vem provar que os comunistas, quando querem, sabem ser homens “às direitas”…
June Tabor com os Oyster Band, Boys of the Lough e Savourna Stevenson constituem cartaz aliciante num campo musical que, finalmente, parece ter-se implantado nos gostos (mais que não seja consumistas) do auditor português.
June Tabor é apenas uma das vozes superlativas do canto feminino de raiz celta. Recentemente, no Coliseu, conseguiu fazer esquecer o equívoco chamado “Folk Tejo”. Pela sua voz, se com ela formos capazes de vibrar em consonância, chega-se ao céu. Em termos de materialismo dialéctico é difícil de compreender. Na Amora será talvez um pouco diferente, já que cantará acompanhada por um grupo de rapazes irlandeses dados à bebida (há algum irlandês que não o seja?) e que por isso mesmo fazem música de cair para o lado – os Oyster Band.
Da Irlanda brumosa de alma acastelada e pátria provisória do “senhor da ira”, os Boys of the Lough transportam consigo as texturas e odores da madeira e do musgo, do vento e da pedra. Trazem a alegria e a tristeza do exílio irlandês. Na flauta e no violino virtuosísticos de Cathal McConnell e Aly Bain. E na gaita-de-foles, como não podia deixar de ser. Sábado às 19 h, no “25 de Abril”, para dançar até à exaustão. O comité central do partido em princípio nãose deve opor…
Duas horas depois, às 21h, no Auditório 1º de Maio, é a vez da harpa de Savourna Stevenson serenar os ânimos, em dueto com o violinista dos “Boys”, Aly Bain. Savourna é um dos expoentes da nova linhagem de harpistas celtas, que com Maire Ni Chathasaigh, Alison Kinnaird, Billy Jackson ou as Sileas, recupera os códigos estilísticos e a mística do lendário Carolan, o bardo, para os devolver de forma intimista num contexto contemporâneo. Outros estrangeiros merecem uma chamada de atenção: os Bogus Brothers e o guitarrista da flamenco Rafael Riqueni (ambos com actuações agendadas para sábado, respectivamente no “25 de Abril” às 22h30 e “1º de Maio” às 22h). Havia o trio de Cedar Walton, mas foi cancelado.
Imensa, a legião portuguesa, representativa de diversos quadrantes, promete momentos de boa música. Sexta-feira convém não perder as actuações dos Plopoplot Pot de Nuno Rebelo, dos Pop Dell’Arte de João Peste e de Jorge Peixinho.
Sábado, sempre no palco principal, uma sequência interessante: Romanças, Issabary, Brigada Vítor Jara, Júlio Pereira, António Pinho Vargas. No 1º de Maio: Trio de Carlos Bica, Idéfix e Zé-di-Zastre – o jazz em português.
Finalmente, no domingo: Tina e os Top Tem, Delfins e José Eduardo Unit. Para o fim uma referência muito especial para a actuação (sexta, 22h30, no “1º de Maio”) dos Telectu de Jorge Lima Barreto e Vítor Rua que se farão acompanhar pelo percussionista, anarquista e referência mítica da cena vanguardista mundial (Henry Cow, Art Bears, Skeleton Crew, David Thomas, Fred Frith, a constelação da “Recommended”…), Chris Cutler.
Depois há os ranchos folclóricos ou os grupos rock da última divisão, espalhados um pouco por todo o lado, a acompanhar a merenda no chão, de frango, poeira e garrafão. Enquanto se espera que o camarada Cunhal venha dizer que tudo está como era dantes…

Vários – “XV Festa Do ‘Avante’ Tradição Na Revolução” (festivais / concertos)

Secção Cultura Quinta-Feira, 25.07.1991


XV Festa Do “Avante”
Tradição Na Revolução



Por incrível que pareça os comunistas portugueses não têm só defeitos, também têm qualidades. Sobretudo a partir do momento em que desistiram de comer criancinhas, a sua popularidade aumentou enormemente. Tornaram-se mesmo quase simpáticos. Mas não só a mudança de hábitos alimentares é digna de elogios. Também a sua reconhecida capacidade de organização e mobilização das massas.
Assim voltará a ser, nos dias 6, 7 e 8 de Setembro, na Atalaia, Amora, Seixal, com a Festa do “Avante” a entrar na sua XV edição. Em matéria de música, o programa insiste, e bem, numa política de diversificação. Dos oito cabeças de cartaz, metade inclui-se na área da música folk, ou tradicional: June Tabor, Oyster Band (está prevista a actuação conjunta da voz abissal da primeira com a euforia etilizada dos segundos, repetindo a magia discográfica de “Freedom and Rain”), Boys of the Lough, irlandeses da estirpe de uns Chieftains, Altan ou Patrick Street, onde pontifica o violinista Aly Bain, e Savourna Stevenson, uma das grandes intérpretes da “clarsach”, ou harpa escocesa, da actualidade.
No capítulo do rock a escolha recaiu na italiana Gianna Naninni, que, espera-se, causará escândalo, com a energia e entrega evidenciadas no álbum “Scandalo”. O vídeo recente tem a assinatura de um louco, Dieter Meier, membro dos inclassificáveis Yello.
O trio do pianista Cedar Walton, o “acompanhador perfeito”, como lhe chamaram, tocou a o lado de lendas como Charlie Parker, Dizzy Gilespie ou John Coltrane), que virá acompanhado pela bateria de Billy Higgins e o baixo de David Williams, fará decerto as delícias dos amantes do jazz.
Os Bogus Brothers são o primeiro nome internacional na história da Festa do “Avante” a reincidir. O êxito do ano passado forçou o regresso em força da “soul” e dos “rhythm and blues”. O flamenco estará presente através da guitarra cigana de Rafael Riqueni, para alguns o digno dicípulo de Paco de Lucia. Estes os nomes sonantes. Para além deles, os portugueses vão mostrar que a festa também sabe ser aqué,-fronteiras: Delfins, Pop Dell’Arte (no rock), Júlio Pereira (Folk-rock) e os grupos de José Eduardo e António Pinho Vargas (jazz-música contemporânea) garantem à partida grandes momentos musicais.
Mas nem só de música se faz a Festa do “Avante”. Uma bienal de pintura, na sua sétima edição, ou o Avanteatro, são algumas das realizações com que o PCP se propõe agitar e dinamizar durante três dias, o nosso tradicionalmente “morno” meio cultural. No grandioso palco 25 de Abril (agora transformado em anfiteatro), no pavilhão 1º de Maio ou em qualquer recanto onde a festa possa acontecer.
O resto é o folclore e a ideologia do costume, nos inúmeros pavilhões espalhados pelo recinto ou no inevitável discurso do camarada Álvaro Cunhal (ainda por cima com legislativas à porta), em festa que, ninguém duvide, constitui um dos acontecimentos culturais mais importantes, a nível nacional. Pelo menos uma vez por ano, os comunistas portugueses estão de parabéns. Até porque neste o partido cumpre a bonita idade de 70 anos. Avante camaradas.