Philip Glass – “Itaipu / The Canyon”

pop rock >> quarta-feira, 20.10.1993
NOVOS LANÇAMENTOS POP ROCK


Philip Glass
Itaipu / The Canyon
Sony Classical, distri. Sonty Music



Parte dois e três da série de música programática inspirada na Natureza (a primeira foi “The Light”) paralela a outra do mesmo autor, mais antiga, a das óperas inspiradas em personalidades, como “Einstein on the Beach”, “Satyagraha” e “Akhnaten”. “Itaipu” usa a orquestra sinfónica e o coro de Atlanta, segundo um formato gigante à altura do tema escolhido: o percurso do rio Paraná, desde a nascente em Mato Grosso até à foz no Atlântico, passando pelo imenso lago artificial criado por uma não menos imensa barragem hidroeléctrica construída a meio doleito entre 1974 e 1991. Tão grande, de facto, que ao visitar os seus monstruosos geradores (a orquestra sinfónica do Brasil inteira tocou uma vez no interior de um deles!) e condutas, o compositor terá concebido logo ali o formato sinfónico-coral da nova peça. O “libreto” é uma adaptação de um mito dos índios guarani que refere “Itapu” (“a pedra cantante”) como sendo a vibração musical de uma antiga rocha, provocada pelo contacto com os rápidos do rio.
Ao contrário de “Itapu”, “Canyon” não se baseia em nenhum local concreto – é um “canyon” idealizado por Glass que a esta obra fez corresponder um naipe instrumental mais reduzido.
O certo é que, seja no meio aquático, seja entre as pedras, a linguagem mil vezes reciclada de Glass já não consegue provocar uma centelha de surpresa ou de excitação. Aqui, o compositor que faz óperas como quem estrela um ovo, bateu na tecla das grandes massas sonoras e nos coros tonitruantes, sobretudo em “Itaipu”, querendo simbolizar a grandiosidade do tema abordado. Algo numa veia semelhante à de “The Forest”, de David Byrne. Mas fica a impressão, como tem vindo a acontecer na maioria das obras recentes de Glass, de se tratar de um mero exercício formal. De uma reciclagem cansada das obsessões de sempre. Com corpo mas sem coração. Umas férias eram capazes de vir mesmo a calhar. (5)

Michael Nyman – “The Piano”

pop rock >> quarta-feira, 20.10.1993
NOVOS LANÇAMENTOS POP ROCK


Michael Nyman
The Piano
Virgin, distri. EMI – VC



Banda sonora do filme de Jane Campion, actualmente em exibição nos cinemas portugueses. Para trás ficou, até ver, Greenway e os seus grandes frescos decadentes, que serviam às mil maravilhas o neoclassicismo minimalista, com a reconhecida vénia a Purcell, de Michael Nyman. Em 2The Piano”, porém, o compositor toca pianinho, em peças curtas que deixam esbatido o seu estilo peculiar, o que se por um lado tem a vantagem de tornar o disco menos previsível, por outro acaba por torna.lo um pouco aborrecido. É a velha história das bandas sonoras que aguentam e as que não aguentam a ausência das imagens. “The Piano” aguenta com esforço, como um carregador de pianos.
Para ponto de partida das orquestrações, Nyman utilizou um reportório específico para piano que idealizou como sendo o reportório pianístico de Ada, a personagem principal do filme, nas suas aulas de aprendizagem / iniciação amorosa deste instrumento. Ada é escocesa: por isso, foram incorporados na música elementos folk deste país. Nota-se, se prestarmos muita atenção. Da música de Ada – de Nyman, pois – diz outra personagem do filme: “É um estado de espírito que nos trespassa… um som que provoca arrepios.” Provavelmente. (5)

Liam O’Flynn – “Out To Na Other Side”

pop rock >> quarta-feira, 20.10.1993
WORLD


Liam O’Flynn
Out To Na Other Side
Tara, import. VGM



Lyam O’Flynn, para quem não saiba, era o tocador de “uillean pipes” dos Planxty. Mais recentemente tornou-se solista vitalício nos projectos orquestrais de Shaun Davey, que poderemos considerar o contrapeso ligeiro, “easy listening”, do patriarca Sean O’Riada ou de Michael ‘O Suilleabhan. As prestações de O’Flynn são, de resto, o mais interessante dos álbuns de Davey: “The Pilgrim”, “The Brendan Voyage” e “The Relief of Derry Symphony”, sem esquecer as vocalizações de Rita Connolly, em “Granuaile”.
“Out to na Other Side”, verso de um poema de Seamus Heany, “The pitchfork”, é um pouco o reverso das obras daquele compositor, que, por sinal, produz o álbum do gaiteiro: uma abordagem erudita da música irlandesa que pretende pôr em relevo a sonoridade das “uillean pipes” quando inserida num contexto de “ensemble” instrumental e não tanto uma obra declaradamente orquestral, como no caso de Shaun Davey.
Longe da espontaneidade que caracteriza a música tradicional instrumental irlandesa, mesmo se abordada em trabalhos de maior complexidade, “Out to na other side” não consegue libertar-se de um certo academismo, sensível no modo como O’Flynn e Davey exercem um controlo apertado sobre os mais ínfimos pormenores da composição, adaptação e produção. Contentemo-nos então em saborear esta música como se de uma peça clássica se tratasse, extirpada de arestas e rugosidades, pronta a agradar, na condição de não lhe exigirmos nada de mais fundo e escuro, o que ela não pode nem pretende dar. Além do mais, é sempre um prazer o reencontro com executantes de excepção como Arty McGlynn (tinha que ser!…), Séan Keane (dos Chieftains), Nollaig Casey, o trio vocal The Voice Squad (requisitado pelos Chieftains em “The Bells of Dublin”) ou os vocalistas convidados Liam O’Maonlai, dos Hothouse Flowers, e Rita Connolly, que em “The Dean’s pamphlet” rubrica o momento de maior emoção num álbum por vezes demasiadamente procupado com as aparências. (7)