Arquivo de etiquetas: Van Morrison

Van Morrison – “Van Morrison Actuou Em Lisboa E No Porto – Ouvir Para Crer”

cultura >> domingo, 21.02.1993


Van Morrison Actuou Em Lisboa E No Porto
Ouvir Para Crer


É baixo, embora nos discos a sua música se eleve às alturas. Mas para muitos que pagaram para ver ao vivo Van Morrison, um dos monstros sagrados sobreviventes da década de 60, o bilhete apenas deu direito a ouvir as canções. A música, que valeu pela vitalidade demonstrada pelo mestre, não desmereceu das “Glorias” do passado.



O Parque Eduardo VII foi até há bem pouco tempo um local aprazível onde, aos domingos, as famílias iam piquenicar e as crianças se espraiavam em chilreios e brincadeiras pelos relvados em inclinação suave em direcção às torres, ao fundo e ao alto, dominando a cidade até ao Tejo. De um dos lados do jardim, altaneiro, erguia-se o então chamado Pavilhão dos Desportos, posteriormente baptizado Pavilhão Carlos Lopes, em homenagem ao campeão português. Eram coisas e locais palpáveis, que se podiam ver e sentir.
O mesmo não se pode dizer de Van Morrison que, sexta-feira à noite nesse mesmo pavilhão, foi para muitos, jornalista incluído, o homem invisível. Para arranjar um lugar, já não digo confortável, nem sequer sentado, mas pelo menos que permitisse ver alguma coisa do que se passava em palco, era preciso ter chegado ao recinto no mínimo com dois dias de antecedência. Daqui se compreende que estava cheio como um ovo. Óptimo. O que já não se compreende muito bem é que a organização, a R & B Produções, tenha despachado os jornalistas para a Geral, quer dizer, para a molhada. Para a próxima mandem-nos para o telhado, para a cave, sei lá, onde for mais desconfortável e que ofereça piores condições de trabalho.
Quanto ao concerto, a julgar apenas pela música, foi o que seria de esperar numa sala que não reúne quaisquer condições acústicas, quanto menos ambiente. Mas Van Morrison, apesar de todas as contrariedades, safou-se bem. E não foram poucas, as contrariedades. O som, como seria de esperar, falhou. Quando a voz parava de cantar, o volume sonoro dos restantes instrumentos baixava misteriosamente, quase até à inaubilidade. Assim, os diversos solos que pontuaram as canções do autor do lendário “Astral Weeks” perderam-se numa nuvem de murmúrios que não permitiram aferir da qualidade dos executantes. Mesmo assim deu para perceber que não são muito bons. Van Morrison, esse, continua em forma.

Acordar Do Transe

A primeira parte do concerto foi um bocado a atirar para o bocejo. Nela o cantor privilegiou a sua costela mística, em cerca de uma hora de “Soul gospel” à base de canções que mal se distinguiam umas das outras mas que invariavelmente falavam de uma “peaceful soul”. Seriam “Hymns to the Silence” se o barulho em redor não fosse tanto. Durante este período, digamos que de recolhimento, Van Morrison apenas saiu do transe religioso para acordar ao som de “In the Midnight Hour”, um clássico de Wilson Pickett. Intervalo para tentar encontrar um local com melhor visão para o artista. Em vão. Ainda por cima, baixote como é, com o seu ar de gnomo anafado, só dava mesmo para vê-lo nas notas mais altas.
Segunda parte. Início promissor com “Cyprus Avenue” em toada de “blues” cheio de sentimento, com passagem para um tema “jazzy” que deu direito a um solo, curto, débil, de vibrafone. Houve solos (pareciam sê-lo, pelo menos) para cada um dos seis músicos acompanhantes, apresentação dos mesmos (não se percebeu nada) e um final em beleza com o homem todo empertigado a cantar “No guru, no method, no teacher”.
A terceira e última parte foi, de longe, a melhor. Van Morrison atacou em força outro clássico, desta feita “What’d I say”, de Ray Charles, prosseguiu com o hino “Gloria”, cantado em coro pela assistência em peso, seguido de “It’s all over now”, popularizado pelos Rolling Stones mas escrito por Shirley e Bob Womack, para finalmente terminar num “slow”, “Have I told you lately”, da sua autoria. O velhote, afinal, ainda continua cheio de genica.
Para os admiradores incondicionais do cantor, o concerto terá correspondido às expectativas. Para os mais indiferentes, não chegou para aquecer. Para muitos, repete-se, nem sequer para ver. Ouvir para crer já não foi mau. O espectáculo foi reeditado ontem no Coliseu do Porto.

Van Morrison – “Van Morrison Em Portugal, Com Datas A Confirmar – Sem Guru, Sem Método, Sem Mestre”

cultura >> sábado, 16.01.1993


Van Morrison Em Portugal, Com Datas A Confirmar
Sem Guru, Sem Método, Sem Mestre


Desta vez é a sério. Van Morrison, cantor irlandês de voz como a dos negros – diz-se sempre isto quando se ecreve sobre ele -, tem concertos agendados para Lisboa e Porto, respectivamente a 19 e 20 de Fevereiro, datas prováveis em salas a designar. Noites de “Gloria” anunciada.



Muitos chamam “génio” a este cantor-autor veterano a quem se deve a invenção da “celtic soul” – música de raiz celta interpretada com a mesma paixão com que os negros se entregam a todas as notas que nascem dos “blues”. É oq eu se poderá verificar nos concertos portugueses que a R & B organiza, gorados que foram os espectáculos do cantor anunciados há dois anos na capital.
Comparam Van Morrison a Dylan, pela importância que sempre concedeu às palavras, pelo peso de uma obra marcada por um cunho pessoalíssimo iniciada nos primórdios dos anos 60 com os Them. Dylan escreveu “Blowin’ in the wind”, em 63, Morrison assinou “Blowin’ your mind”, quatro anos mais tarde. É uma diferença importante, que se expressa nestas duas maneiras de soprar. Enquanto o americano se fez porta-voz dos ideais de toda uma geração (o que não deixa de ser curioso em alguém cuja voz tendia e tende a desafinar…), o irlandês preferiu o caminho da introspecção, da luta e da descoberta interior, como formas de dizer aos outros a utopia. Um anarquista.
Nos Them, o grupo que projectou o seu nome na cena pop internacional, Van Morrison foi responsável por um dos hinos psicadélicos dos anos 60, “Gloria”, que viria a ser recuperado ao longo das décadas seguintes em várias versões, das quais se destaca a de Patti Smith incluída no álbum estreia de 1976, “Horses”. A insatisfação com a editora, a par da necessidade de controlo absoluto sobre o seu trabalho, levaram-no a pôr fim a este projecto, em 1966, para se dedicar a uma carreira a solo.

Entre Dois Mundos

Só consigo mesmo desenvolveu um estilo, no qual procurou juntar tradições distintas – os “blues”, que aprendeu a sentir com Leadbelly, e a música irlandesa. Equilíbrio difícil de manter, entre a negritude que lhe escorria pela voz e o verde esmeraldino da ilha encantada. Entre estes dois mundos nasceram as canções. Entre a urgência de pregar ao mundo a mensagem evangélica (sim, Van Morrison desde cedo evidenciou uma costela religiosa, patente na maior parte dos seus álbuns) e o recolhimento.
“Astral Weeks”, de 1968, é considerada a sua primeira obra-prima. Semanas de viagem pelo plano astral que demoraram em estúdio somente dois dias a gravar. Álbum de assombramentos místicos, de enigmas e contradições que o tempo tem vindo a desvelar.
Depois, já no plano material, seguiram-se os passos, que não os do calvário, que o conduziram à fama. Quer dizer, À colaboração com Georgie Fame, outro cantor negro por dentro e branco por fora. Entre os pecados deste irlandês natural de Belfast (convém aqui notar o facto de os irlandeses conseguirem conciliar o cristianismo com um lado mais belicoso, chamemos-lhe assim. Em que outro país, senão na Irlanda, TODA a Irlanda, se pode ser ao mesmo tempo anarquista e cristão, e ver padres de metralhadora em punho?) contam-se um duo com Cliff Richard (em “Whenever God shines his light”) e ter deixado Tom Jones ruminar quatro canções suas num disco em que também este canastrão deixou vir ao de cima a transcendência.

O Diálogo Com Deus

Os álbuns imensos, resgataram-no. Uns mais do que outros, é verdade. Sobretudo “Moondance”, “St. Dominic’s Preview”, onde bebe na mesma fonte de “Astral Weeks” e se aproxima ainda mais do céu, “Beautiful Vision”, “No Guru, No Method, No Teacher” e “Irish Heartbeat” – este último na companhia dos Chieftains, banda emblemática da música tradicional da Irlanda – aqueles em que explorou mais fundo o filão celta.
Consumada a consagração pública na actuação ao vivo, no estádio de Wembley, em 1984, ao lado de Dylan, Van Morrison passou a preocupar-se quase em exclusivo com o diálogo com Deus. Não espanta, deste modo, a sua inflexão nas sonoridades “gospel” que ocupam lugar privilegiado no álbum de 91, “Hymns to the Silence”. Van Morrison decidiu subir. “Sem guru, nem método, nem professores”, como ele próprio disse. Quem quiser e puder que o acompanhe.

Vários – “Um Guia Seleccionado Para A Música De Quatro Décadas Que Se Reeditou Em 90 – Raros, Inéditos e Reeditados”

Pop-Rock 09.01.1991


Um Guia Seleccionado Para A Música De Quatro Décadas Que Se Reeditou Em 90
RAROS, INÉDITOS e REEDITADOS


Fernando Magalhães e Luís Maio
Depois das glórias dos anos 50 e 60, foi a vez de o sumo da década de 70 e da primeira metade da de 80 alimentar em 90 a indústria dos fundos de catálogo. Essa orientação de mercado parece, contudo, não corresponder a alguma nostalgia instantânea pelo que acabou ou ainda está a passar – e muitas das compilações em causa integram e foram lançadas em simultâneo com novos singles. Houve sim uma espécie de adaptação ao mercado da música do sistema de montagem em série com variações mínimas de pormenor, corrente por exemplo no ramo automóvel. Prova disso, outra tendência dominante foi voltar a reeditar tudo o que ainda há pouco se reeditara, mas em diferentes embrulhos sob o lema das retrospectivas definitivas, em luxuosas caixas de CD, com aliciantes suplementares de títulos inéditos, gravações raras e “takes” alternativos. Importa também notar que, se o fluxo de reedições no resto da Europa foi em 90 tão grande, ou nalguns meses superior ao das edições de originais, as companhias portuguesas não parecem ter compreendido as potencialidades desse mercado (em contraste com algumas lojas de importação). Isso mesmo se poderá constatar neste guia pela ausência maioritária de representantes locais para tais reedições.

A divisão do guia por décadas é estritamente operatória

ANOS 50

THE EVERLY BROTHERS
Perfect Harmony (Knight Evy)

Todos os hits dos famosos manos, desde a estreia nos tops em 57 com “Bye Bye Love”, até à ligação com os Beach Boys para “Don´t Worry Baby”. Parce que sem eles os Simon & Garfunkel nunca teriam passado de meninos de coro.
GENE VINCENT
Boxed Set (Capitol)


Uma das grandes lendas mortas do rock ‘n’ rol, o preferido dos inadaptados, o eleito dos clã motorizados. “Be Bop A Lula” e tudo o resto reempacotado em CD para velhos adolescentes de alma rebelde sob o uniforme de executivos.
JOHNNIE RAY
Cry (Bear Family)

Celebrado como o primeiro “crooner” do rock ‘n’ rol, professor de Elvis nessa matéria, Ray parece não ter tido tanta felicidade na escolha do seu reportório de coberturas de negros, ou pelo menos não lhes comunicou tanto carisma em estúdio.
LITTLE RICHARDS
His Greatest Recordings (Ace)


Duas dúzias de pérolas do negro que assustou toda uma geração de pais americanos e, antes de se converter ao divino, inventou o vocábulo mais significativo da língua inglesa do pós-guerra, “Awopbopaloobopalopbambooom”.
THE SHIRELLES
The Collection (Castle)

Vinte e quatro lembranças queridas, ou tantos hits do tempo em que as Shirelles introduziram um modelo de singela “coqueterie” (para sempre?) no vocabulário do rock ‘n’ rol.
SCREAMIN’ JAY HAWKINS
Voodoo Jive (Rhino)

Aproveitando a reabilitação como gerente de hotel no “Comboio Mistério” de Jim Jarmusch, o pioneiro do rock ‘n’ rol foi recuperado nesta compilação das peças essenciais do seu show surrealista. Mesmo hoje, parece impossível que alguém pudesse cantar em semelhante grau de desarranjo.

ANOS 60

BEACH BOYS
“Pet Sounds”, “Surfin’ Safari” / “Surfin’ USA”, “Surfer Girl” / “Shut Down, Vol. 2”, “Little Deuce Coupe” / All Summer Long”, “Todo” / “Summer Days (and Summer Nights)”, “Summer Dreams” (Capitol, distri. EMI-VC)


Até “Pet Sounds”, os Beach Boys foram os meninos de ouro, queridos na Costa Oeste e, mais tarde, no resto dos Estados Unidos. Meninos da praia, reis do “surf” e das intricadas harmonias vocais, das raparigas de sardas e rabo-de-cavalo e dos descapotáveis eram a coqueluche das “garage band” da época. Brian Wilson, o génio da família, queria mais. “Rubber Soul”, dos Beatles, espicaçou-lhe o orgulho e a veia criativa. Decidiu que tinha de fazer melhor e há quem diga que o conseguiu. Com “Pet Sounds”, por muitos considerado um dos melhores álbuns de sempre da música popular. Um naipe de fabulosas canções e uma revolucionária utilização das técnicas de estúdio, tornam o disco incontornável. Depois foram os próprios Beatles a querer ainda mais além – “Sergeant Peppers” seria o disco e a lenda.
Cada uma das actuais reedições inclui quatro ou cinco faixas extra – as habituais versões alternativas ou simples experiências de estúdio. Nos textos das capas, Brian Wilson conta parte da história e explica como foi. “Summer Dreams” é uma colectânea que inclui a maior parte dos temas famosos da banda. “Good Vibrations”. Para sempre.
BEE GEES
The Very Best (Polydor)

Por aqui se vê que eram melhores imitadores dos Beatles que divas da “febre” disco dance.
THE BYRDS
The Byrds (CBS)


Caixa de quatro CD, contendo a maioria dos temas que cobriram de glória a banda americana percursora do “psychedelic rock” de tendências rurais. Guitarras cristalinas que fizeram escola (frequentada entre muitos, pelos R.E.M.) e vozes que serviam excelentes melodias funcionam como máquinas do tempo que nos leva direitinhos à época das grandes explorações de estúdio e ideologias a condizer. A caixa contém novas misturas e versões alternativas de temas antigas, interpretações ao vivo de “Mr. Tambourine Man” e “Turn! Turn! Turn!”, bem como quatro temas extraídos de um concerto recente em que de novo se juntaram Roger McGuinn, David Crosby e Chris Hillman, “Younger Than Yesterday”, “The Notorious Byrd Brothers”, “Sweethearts Of The Rodeo”, momentos mágicos de uma era (aparentemente) dourada. Canções, pois claro, a “Eight Miles High”, vibrando para sempre no éter estelar.
DONOVAN
The Collection, Donovan Rising (See For Miles)


Parece mentira, mas é verdade: O homem da voz doce e tremelicante ressuscitou das profundezas de “Atlantis”, mais gordo, mas cósmico e florido como nunca. Para além da colectânez e do álbum ao vivo, lançou ainda este ano o novo “One Night In Time”. Os psicadélicos devem-lhe alguma coisa, talvez as flores. Gravou uma obra-prima que poucos conhecem – o duplo “HMS Donovan”, tão belo e absurdo como Alice no país das maravilhas. Chegou a ser rival de Dylan. Hoje os Butthole Surfers homenageiam-no com a sua interpretação de “Hurdy Gurdy Man”. Homenageiam-no é uma forma de dizer…
ERIC CLAPTON
Clapton Conversation (London Wavelenght)

Depois desta caixa de três discos com Eric Clapton a botar discurso na rádio, porque não meia dúzia de CD da celebridade a cantarolar no duche?
HERMAN’S HERMITS
The EP Collection (See For Miles)

Odiados nos anos 60 pelas elites como campeões da patetice, os Hermits são agora reabilitados a título de porta-vozes de eleição da inocência dos anos 60, numa compilação que alterna os hits imediatos com títulos que, apesar de não terem conhecido os favores da altura, por isso mesmo resistiram melhor ao tempo.
JIMI HENDRIX
Cornerstones, 1967-1970 (Polydor)

Quatro temas por ano. A ordem e simetria são muito bonitas. Greenaway procederia assim. O guitarrista era menos ordenado, o génio explodia-lhe da alma até à guitarra, em chamas. Hendrix não se compadece com cronologias. Pertence à eternidade. “Hey Joe, Are You experienced?” Ao pé dele somos todos meninos.
THE KINKS
“Kinks”, “Kinda Kinks”, “The Kink Controversy”, “Face To Face”, “Something Else By The Kinks”, “Live At The Kelvin Hall”, “Are The Village Green Presrvation Society”, “Arthur Or The Decline And Fall Of The British Empire”, “Lola Versus The Power Man And The Moneyground, pt. One”, banda sonora de “Percy”. (Castle)

Inglaterra, nevoeiro, chá das cinco, bosques verdes, Londres, Big Bem, Picadilly Circus, Ray Davies, Dave Davies, os Kinks. Sobretudo Ray Davies, o “dandy” preocupado em cantar o declínio do império. As reedições em CD reproduzem as capas originais e abrangem toda a obra fundamental da banda londrina. “Arthur” não apanhou o comboio das óperas rock, arrastado pela velocidade de “Tommy”, dos rivais “Who”. Quase tudo são hits que fizeram uma época e que assobiaremos para sempre no coração. “You Really Got Me”, “Sunny Afternoon”, “Waterloo Sunset”, “Death Of A Clown”, “Victoria”, “Shangri-La”. Roupas e vozes muito coloridas. Londres parecia então um arco íris.
RIGHTEOUS BROTHERS
Unchained Melody (Verve)

Já não se façam canções românticas deste classicismo. Se se fizessem, por que razão haveria um filme tão chunga quanto “Ghost” de ressuscitar um tema com 25 anos para os primeiros postos de vendas dos tops mundiais?
ROLLING STONES
Hot Rocks, More Hot Rocks (London, distri. Polygram)

A pretexto dos Stones 1990, a reedição dos seus êxitos no catálogo London. Passa sem muita discussão que aqui se encontra tudo ou quase tudo o que interessa nos Stones, e teria sido menos cansativo e incomparavelmente mais elegante editarem só estas colectâneas no lugar de “Steel Wheels”.
STEVE MILLER BAND
Best Of 68-73 (Capitol)

Tem tudo a ver com a recuperação de “The Joker” no recente anúncio da Levi’s. Mais ou menos o mesmo que a prévia “Anthology” sob outra ordem.
SMALL FACES
The Ultimate Collection (castle), The Singles A’s & B’s (See For Miles)


Se, na altura da explosão mod inglesa, os Who foram os que mais fizeram negócio, os Small Faces devem ter sido os mais originais e dinâmicos, extrapolando com classe as coordenadas soul e r&b para um contexto branco. Estas colectâneas são provas indiscutíveis.
TIM BUCKLEY
“Dream Letter, Live In London 1968”

Duplo CD contendo temas inéditos do autor de “Goodbye and Hello”, “Starsailor” e “Look At The Fool”. 1968 foi o ano em que se apresentou pela primeira vez ao público londrino. Uma voz, guitarra acústica, baixo e vibrafone (absolutamente encantatória a introdução de “Hallucinations”) chegaram para criar uma atmosfera mágica, intimista e irrepetível. Tim Buckley nunca parava de cantar, mesmo no intervalo entre duas canções. Como se sabe, só a morte o impediu de continuar.
VAN MORRISON
The Best Of (Polydor, distri. Polygram)

É quase um crime reduzir a obra discográfica do irlandês a escassas duas dezenas de títulos. A boa desculpa desta compilação é serem os favoritos do próprio artista na altura da resenha.

ANOS 70

BUZZCOCKS
The Peel Sessions Album (Strange Fruit, distri. Anónima)

Oportunidade para recordar Pete Shelley, acreditado como o poeta oficial do punk e um dos ídolos de Morrissey, nas gravações para o programa de John Peel, em Setembro de 1977, no zénite da sua eloquência desesperada.
CHIC
Megachic (Atlantic)

Depois das remisturas que lançaram o revivalismo “Chic”, os originais, ou seja, aquilo por que os Chic hoje valem ainda a pena serem recordados.
DAVID BOWIE
Changes Bowie, Space Oddity, The Man Who Sold The World, Hunky Dory, Aladin Sane, Pin Ups, Diamond Dogs (Emi)

Primeiras peças do grande teatro Bowie, acrescidas em CD, de temas bónus – novas misturas, “takes” de estúdio, brincadeiras. Claro que se trata de álbuns todos eles fundamentais, como fundamental é a totalidade da sua obra até “Scary Monsters / Super Creeps”. Daí para a frente o “Thin White Duke” trocou o teatro pelo cinema e os resultados são um pouco para esquecer, não havendo “Tin Machine” que lhe valha. Antes era diferente. Era sempre diferente. De álbum para álbum. De máscara para máscara. De comum entre “Space Oddity” e “Diamond Dogs” existe apenas essa extraordinária capacidade de se metamorfosear e a facilidade com que produzia fabulosas experiências musicais, sempre à frente do seu tempo. Indispensável. Toca a trocar os discos por CD!
THE ENID
Touch Me, Six Pieces, The Spell, Final Noise!

O melhor de uma dessas bandas sinfónicas que o punk sepultou, agora ressuscitada em CD como pioneiros da “nova idade”.
ISAAC HAYES
Black Moses (Stax)

O épico de 1971 reeditado num CD duplo para consolo dos iluminados da época e educação dos actuais aprendizes do funk filosófico. Apoteose acabada de um dos maiores profetas da música negra deste século.
THE ISLEY BROTHERS
Forever Gold (Epic)

Ainda não foi a reedição integral destas glórias da fusão soul/rock dos anos 70, que hoje se estima mais estimulante que na altura, mas do melhor nos seus primeiros quatro álbuns no selo próprio T-Neck.
JOHN LENNON & YOKO ONO
The Interview, (BBC) The Ultimate Lennon Box Set (Parlophone)


Duas horas de conversa entre John e o jornalista Andy Peebles, gravada para a Radio One, com a japonesa a interromper de vez em quando. As ideias, a generosidade e ingenuidade de um visionário que acreditou até ao fim que o mundo podia ser melhor. Quanto à caixa são os discos pós Beatles que já toda a gente conhece nu embrulho luxuoso para revigorar o apetite.
JONATHAN RICHMAN AND THE MODERN LOVERS
Great Recordings (Essencial)

Jonathan Richman, o tipo de Boston que à saída da Factory de Andy Warhol tropeçou num buraco negro e foi dar às filmagens de um secreto re-make de “O Feiticeiro de Oz”, retratado nos seus momentos de mais brilhante alucinação.
KATE BUSH
This Woman’s Work (Emi)

O trabalho todo – nove álbuns que incluem os seis discos de originais até agora gravados em estúdio, mais 31 lados B de singles, uma faixa extra retirada da colectânea “the Whole Story” e dois temas em francês, “Ne T’En Fuis Pas” e “Un Baiser d’Enfant”, num total de noventa e oito canções. Chega e sobeja para nos arrepiar.
KEVIN AYERS, JOHN CALE, ENO, NICO
June 1, 1874 (Island)


Imemorial reunião de quatro das personalidades mais bizarras da pop. Hoje, Nico, “deusa da Lua”, brilha na escuridão do firmamento. Ayers deixou os copos, deixando também para trás a genialidade dos cinco primeiros álbuns, trocada pelo sol de Maiorca. Cale continua a ser aquilo que sempre foi: um bom compositor, com esporádicos lampejos de génio. Eno forçou a que se inventassem novos sistemas de referência – sozinho, vai redescobrindo o silêncio e inventando novos universos. Há 16 anos provavam que a loucura pode ser partilhada, inflamados no vulcão de “Baby’s On Fire”.
KEVIN AYERS
The Collection (See For Miles)

O menino prodígio dos Soft Machine, que renunciou à alta-roda dos tops para cantar os prazeres e as amáveis alucinações da vida ao sol mediterrânico, em mais uma recapitulação que evita os delírios surrealistas em favor das baladas acessíveis e suaves.
LED ZEPPELIN
Remasters, Led Zeppelin (Atlantic)

No primeiro caso trata-se de três discos, ou dois CD, preparados e tratados em estúdio por Jimmy Page, numa operação de cosmética destinada a valorizar o material passado para o “compacto”. No segundo, os números passam para o dobro: Seis discos, quatro CD. 54 temas que incluem os bónus “Travelling Riverside Blues” e “White Summer / Black Mountain Side”, gravados em 1969 numa sessão para a BBC, nova versão do clássico da percussão “Moby Dick” e “Hey, Hey What Can I Do”, originalmente o lado B de “Immigrant Song”.
MADNESS
One Step Beyond; Absolutely; The Rise & Fall (Virgin)

Melhor banda “new wave” com humor britânico, recordada numa edição limitada de três “Picture discs”, talvez demasiado composta para recheio tão achicalhado.
MARC BOLAN & T. REX
My People Were Fair And Had Sky In Their Hair… Prophets, Seers And Sages, Unicorn/Beard Of Stars, Electric Warrior”, Bolan Boogie, The Slider, Tanx, Zinc Alloy And The Hidden Riders Of Tomorrow, Bolan’s Zip Gun, Futuristic Dragon, “Dandy In The Underworld, The Collection. (Castle)

Era uma espécie de David Bowie a uma escala menor. Mestre do “glamour” e da poesia “naif”, Marc Bolan era o Merlin dos adolescentes, cobrindo de lantejoulas e melodias pop um universo de fábula. Tyranossaurus Rex, assim se chamava o duo inicial – guitarra acústica, bongós e uma voz de encantar. Depois foi a electricidade e o rock em hits como “Hot Love”, “Get It On” e “Telegram Sam”. Infelizmente as letras dos álbuns da época “mística”, não constam nos CD. Também “T. Rex”, álbum de transição para a fase eléctrica não teve direitos de reedição. Deste disco apenas quatro faixas aparecem nas colectâneas “Bolan’s Boogie” e “The Collection”. Já não há flores na cabeça das pessoas.
MONTY PYTON
Monty Pyton Sings (Virgin)

Mais que larachas cantadas, canções verdadeiras que fazem rir, a prova dos nove dos Monty Python no terreno do “vaudeville”.
NICK DRAKE
Five Leaves Left, Brayter Layter, Pink Moon, Heaven In A Wild Flower (Island)

Obra completa do poeta da melancolia. A música de Drake cai na alma como folhas no Outono. Trsitemente. À luz da lua. Morreu muito novo, depois de caminhar pela loucura em câmara lenta. Passou despercebido na altura em que todos queriam ser sinfónicos. Ele cantava, apenas, com voz frágil, a passagem do tempo e das ilusões. Joe Boyd, responsável e amigo do artista, autorizou a venda do catálogo Witchseason à Island, na condição de esta manter permanentemente em “stock” os discos do poeta. “Heaven In A Wild Floer”, título do romântico William Blake para a colectânea do mesmo nome, sintetiza a essência da visão que Nick Drake em vida cantou e, depois da morte, decerto alcançou.
PETER GABRIEL
Shaking The Tree – 16 Golden Hits 8Virgin, distri. Edisom)

Foi o próprio Gabriel quem escolheu, e agora o seu segundo álbum a solo não está entre os seus preferidos, mas sobretudo o mais recente “So”. Sendo assim, se calhar, não valia a pena fazer compilação nenhuma.
QUEEN
Queen At The Beed 1973 (Band Of Joy, distri. Anónima)

A curiosidade de descobrir que, nas secções de gravação prévias ao álbum de estreia, a estrela dos Queen era Brian May. Do mal teria sido o menos…
SOFT MACHINE
The Peel Sessions (Strange Fruit)


Duplo álbum gravado durante as célebres sessões de John Peel, num período compreendido entre 1969 e 1971. Na época, Hugh Hopper acabara de substyituir Kevin Ayers e a banda alcançava com o duplo “Thrid” a sua obra-prima absoluta, após os psicadelismos pop dos dois primeiros discos. Destaque para a participação nalguns temas da secção de metais constituída por Elton Dean, Lyn Dobson, Marc Charig e Nick Evans (que colaboraria também em “Third”) e de uma nova versão de “Moon in June”, a clássica e terna liturgia esquizofrénico-vocal de Robert Wyatt, aqui com letra alusiva ao locutor. Mike Ratledge e Elton Dean tornam a coisa mais complexa.
THE STRANGLERS
Greatest Hits 1977-1990 (CBS, distri. CBS port.)

Agora saiu Hugh Cornwell, amanhã, se calhar, Jean Jacques Burnell vira actor de cinema, ou qualquer coisa no género. Os hits dos Stranglers, esses, são sempre os mesmos. Pelos vistos, o que muda é o pretexto.
SUICIDE
1/2 Alive (Contempo)


Alan Veja e Martin Ver gravaram, durante uma carreira de vinte anos, três álbuns de estúdio. Neste disco aproveita-se tudo o que ficara até agora de fora: gravações caseiras e inéditos ao vivo, gravados entre 1974 e 1979. “Harlem II”, “Going to Las Vegas”, “Space Blue”, “Long Talk”, “Speed Queen”, “Love You”, “Cool as Ice” e “Dreams” são alguns dos originais incluídos no disco. O ritmo da sociedade industrializada à beira do caos tocado por Ver em serra elétrica e cantado por Veja, encarnando o espectro cavernoso e reverberado de Elvis Presley. Implacável.
TELEVISION
The Blow Up (Danceteria)

Peça essencial para enriquecer a magra discografia da mais carismática banda nova-iorquina de guitarras na fase “new wave”, onde as duas faixas de cerca de 14 minutos, gravadas ao vivo em 1978, chegam e sobram para demonstrar o virtuosismo explosivo da dupla Tom Verlaine / Richard Lloyd.

ANOS 80

ABC
Absolutely (Phonogram, distri. Polygram)

O fim do contrato dos ABC com a Phonogram deu origem a esta compilação dos anos em que durou (81-89), com justo destaque para os títulos do LP de estreia “Lexicon Of Love”. O caso acabado dos tipos que são melhores a fingir mundos e fundos que a chorar as desgraçadas dos subúrbios.
CARMEL
Collected (London, distri. Polygram)


Jazz estilizado, gospel incendiário, pop distanta, conjugados numa fórmula harmónica que, ao longo de sete anos, nunca vingou nos tops, mas fez sempre as delícias das elites de bom gosto. Só os distraídos preferem a colectânea aos discos originais.
JOE JACKSON
Ntepping Out (A & M, distri. Polygram)

A colecção de mais de uma década de êxitos falhados, mas de muito prestígio, que acabaram por fazer a A & M meter Jackson no olho da rua.
THE FALL
458489 A-Sides, 458489 B-Sides (Beggars Banquet, distri. Anónima


Um disco para as faces A, outro para as B dos singles que os Fall editaram entre 84 e 89, os seus anos na Beggars Banquet. Mark Smith fica uma vez mais reiterado, é único companheiro de Morrisey na fé de que o público nunca se farta de lhe comprar discos por atacado.
THE GO-BETWEENS
1978-1990 (Beggars Banquet, distri. Anónima)

Os Go-Betweens acompanharam de perto as mais sinuosas elipses do coração apaixonado ao longo demais de uma década sem colherem grande contrapartida financeira. Esta compilação faz-lhes justiça alternando os seus clássicos com material que foi ficando pelo caminho.
MADONNA
The Immaculate Collection (Sire, distri. Wea)

Os hits da escaldante senhora e mais nada, dos inícios electrodisco nos primórdios da década de 80 até ao bailado “voguing” nos inícios dos anos 90. Como remate, a mesma história de sempre, quer dizer, mais um single para encher o olho no pequeno ecrã, onde pela milésima vez a loura avantajada justifica as suas fraquezas carnais.
MANTRONIX
The Best Of (1986-1988) (10 rec, distri. Virgin)

Pioneiros algo inglórios da actual febre de sincretismo dançante, os Mantronix viram o seu material antigo recuperado nesta compilação graças ao hit menor, mas recente “Got To Have Your Love”.
MOMUS
Monsters Of Love Singles (1985-90) (Creation, distri. Anónima)

Um tipo que se tornou francamente chato e afectado, cujas boas recordações estão todas aqui, porque o actual já ninguém tem paciência para aturar.
MORRISSEY
Bono Drag (His Master Voice, edi. EMI-VC)

Na sequência do ensaio frustrado para o segundo álbum a solo, Morrissey iludiu a crise editando primeiro um vídeo de concerto e em seguida esta compilação dos seus singles em nome próprio. A eloquência poética e a chama vocal não se apagaram, mas este material transpira a ausência de um cúmplice nos arranjos à altura de Johnny Marr.
NEW ORDER / JOY DIVISION
Peel Sessions (Strange Fruit, distri. Anónima)


Esboço de retrato da evolução do mais cinzento projecto britânico de finais dos anos 70 para a banda independente de dança mais brilhante dos 80, através das sessões gravadas pelas duas formações para o programa de John Peel. Sem surpresas, só pelo prazer de recapitular.
PUBLIC IMAGE LTD
Greatest Hits (Virgin, distri. Edisom)

O grande profanador de crina multicolor Johnny Lydon reciclado nos seus hits pós-Pistols, na liderança da “experiência” Public Image. Se isto não fosse uma compilação, mas um disco de originais, os PIL, seriam com certeza maiores que os Pistols.
THE TEARDROP EXPLODES
Everybody Wants To Shag The Teardrop Explodes (Fontana, distri. Polygram)

O terceiro álbum “perdido” dos Teardrop Explodes, com o título pretendido para o primeiro. Cinco faixas foram incluídas num EP que saiu em 83, duas retomadas depois a solo por Julian Cope, restando assim de facto cinco inéditos. Mais uma sequência de esboços que de canções acabadas, peça sobretudo dedicada aos colecionadores.
TALK TALK
Natural History (Parlophone, distri. EMI)

Estranhamente, depois de os Talk Talk terem assinado em “The Spirit Of Eden” um enorme salto qualitativo, percorrendo sinuosos caminhos algures entre a pop e a música ambiental, eis que a Parlophone os despediu. O êxito comercial da compilação cronológica sequente foi um verdadeiro certificado de incompetência para o seu sector de “artistas e reportório”.