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Snakefinger – “Chewing Hides the Sound” + Snakefinger – “Greener Postures” + Richard Pinhas – “Iceland” + Strawbs – “Grave New World” + Gracious – “Gracious!” + Gracious – “This Is… Gracious!”

Sons

12 de Novembro 1999
REEDIÇÕES


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Snakefinger (na foto) podia gabar-se de ser um dos poucos eleitos que conhecia os nomes dos Residents. Colaborador em vários álbuns da banda responsável por “The Third Reich ‘n’ Roll”, o guitarrista, entretanto falecido, gravou a solo uma série de álbuns dos quais a Euro Ralph voltou a reeditar “Chewing Hides the Sound” (1979) e “Greener Postures” (1980), agora em digipak duplo com versões remasterizadas. Inseparável dos Residents, com os quais muitos dos temas foram compostos em parceria, a obra de Snakefinger cultivou o lado mais pop e “naif” do grupo em canções suturadas com a agulha da excentricidade.
“Chewing Hides the Sound” contém uma versão bubblegum/Residents de “The Model”, dos Kraftwerk, “Magic & Ecstasy”, de Ennio Morricone, e “cartoons” que não destoariam como complemento de filmes de David Lynch, como “Jesus was a leprechaun”, “The vivian girls” e “Who is the culprit and who is the victim?”. Steven Brown dos Tuxedomoon, participa como convidado.
Outro músico dos Tuxedomoon, Blaine L. Reininger, colabora também como convidado em “Greener Postures”, um álbum mais equilibrado, mas onde era já notória a cristalização de um estilo que o guitarrista ainda manteria na órbita de uma esquizofrenia iluminada no álbum seguinte, “Manual of Errors”, mas que finalmente se esvaziaria no derradeiro “Night of desirable Objects”, com os Vestal Virgins. (Euro Ralph, import. Ananana, 8 e 7).

Dos nomes mais antigos e ainda em actividade (gravou já este ano “Fossil Culture”, em duo com o alemão Peter Frohmader, para a editora Cuneiform), oriundo da cena electrónica alternativa francesa dos anos 70, Richard Pinhas é também um dos menos conhecidos. Fundador dos Schizo, dos Ose e dos Heldon – cuja música era o equivalente electrónico do totalitarismo nietzschiano dos Magma –, com quem gravou o apavorante “Un Rêve Sans Conséquence Spéciale”, Pinhas é outro dos pilares cuja influência e recorrência na vertente mais electrónica do pós-rock se fará decerto sentir com redobrada intensidade nos próximos tempos (depois dos Cluster, Neu! e Pyrolator e antes, acreditamos nós, dos australianos Severed Heads).
Em “Iceland” estão patentes todos os principais tópicos musicais de Pinhas: ritmos electrónicos paquidérmicos atafulhados com o som cheio dos sintetizadores e sequenciadores analógicos, o embate de placas de música concreta, um minimalismo corrosivo e o inconfundível “soloing” na guitarra eléctrica que fés de Pinhas o mais importante discípulo de Robert Fripp, influência que, de resto, o músico francês nunca escondeu. Imagine-se uma argamassa, batida numa misturadora de betão, dos Magma, Tangerine Dream, Terry Riley e King Crimson filtrada por uma trituradora electrónica e colada às patas de Godzilla (Spalax, import. FNAC, 8).

Mais uma reedição remasterizada da primeira fase dos Strawbs, “Grave New World” constitui o ponto mais alto a que a obra do grupo do vocalista Dave Cousins se alcandorou, sendo um álbum de referência do folk progressivo britânico dos anos 70, a par de “Cruel Sister” dos Pentangle, “Babbacombe Lee” dos Fairport Convention ou “Below the Salt” dos Steeleye Span e uma das obras-chave do género. Harmonias vocais saídas das gargantas dos anjos, melodias onde é possível detectar traços dos Genesis, electricidade rock, baladas bucólico-surreais (ainda numa linha genesiana de temas como “For absent friends” ou “Harlequin”, ou com sabor a Roy Harper, como em “Heavy disguise”), prestidigitação de estúdio (“loops”, inversões de fita, distorções, acumulação de efeitos electrónicos), laivos de psicadelismo “a la” Incredible String Band, combinados com um sentido épico que poucos grupos folk se atreveram a usar, fazem de “Grave New World” um objecto de fascínio e descoberta, tão deslocado nos dias de hoje como imbuído da magia de uma época que jamais se repetirá (A&M, import. Lojas Valentim de Carvalho, 9).

Por falar em progressivo, os Gracious foram, em 1970, uma das bandas portadoras daquilo que, na altura, se poderia definir como a mística do movimento. Da capa de abrir, com um enorme ponto de exclamação em efeito óptico sobre fundo branco, ao próprio nome do grupo, desprendia-se dos Gracious algo de especial que a música se encarregaria de confirmar. O álbum de estreia, “Gracious!” – acoplado nesta edição remasterizada de dois em um a “This is… Gracious!” – é um daqueles discos onde todos os clichés do progressivo se confundiam com uma genuína criatividade, nas vagas de mellotron, nos solos de órgão, de cravo (numa impensável “Fugue in ‘D’ minor”…) ou de guitarra, mas sobretudo na originalidade de composições que, ao contrário de muitas outras bandas da altura, escapavam a qualquer forma de copismo.
À saída da pop psicadélica, anunciando a era dourada do progressivo, “Gracious!” leva-nos por uma viagem que começa no paraíso e acaba no inferno, em “Hell”, sequência vertiginosa de mudanças de registo, da electrónica enfeitiçada ao can-can, que chega a lembrar a obra-prima “An Electric Storm” dos White House. O longo e último tema, “The Dream”, faz justiça ao título, uma alucinação nocturna em technicolor na linha dos melhores Gentle Giant para ouvir de noite num quarto secreto.
Infelizmente o álbum seguinte, derradeiro do grupo, “This Is… Gracious!”, é uma caricatura do primeiro, o ponto de exclamação da capa com o feitio de um vitral colorido, sobre fundo negro, e os 21 minutos de “Supernova” a serem alvo de interesse apenas para os aficionados do som do mellotron. (BGO, import. Megamúsica, média 7).



Strawbs – Ghosts

22.01.1999
Reedições
Obrigado, Cristo Pela Bomba
Os “blues” e a paranóia, o rock sinfónico e a poesia de um bardo celta – três apontamentos nas margens dos anos 70.

Os Groundhogs nasceram no final dos anos 60, isnpirados pelos “blues” de John Lee Hooker e pela pop dos Beatles e dos Kinks. Mas é no início da década seguinte que o grupo do guitarrista Tony McPhee atinge a maturidade e a popularidade. “Thank Christ For the Bomb”, de 1970 (reedição remasterizada), terceiro álbum da banda, reflecte a nota de estranheza que sempre caracterizou a música do grupo. A temática antibelicista, perspectivada com uma ironia e uma crueza pouco habituais na época, funciona como suporte de uma música assombrada por melodias aveludadas (John Peel tocou até mÀ exaustão o tema “Soldier”, cujas mudanças de tom e “nuances” vocais deixam adivinhar a presença fantasmagórica de Paul McCartney e Ray Davies…) e uma leitura dos “blues” pautada pela suavidade. Uma sonoridade estranha, fora do tempo e das regras de um estilo, “os blues”, que tony McPhee condensa no formato guitarra/baixo/bateria de forma inigualável.
Esta estranheza acentua-se em “Split”, de 1971, com reedição também remasterizada. “Split” disseca a paranóia e a dissociação de personalidade sofridas por McPhee, na consequência de um “flipanço” (seis meses de “bad trip”, incluindo a ressaca…) provocado pela ingestão involuntária (?) de LSD. A guitarra explode literalmente, nas quatro secções que compõem o título-tema, em solos de uma violência, intensidade e experimentação sónica que tocam o génio de Jimi Hendrix. O público britânico vibrou com o sofrimento e fez de “Split” um dos álbuns mais vendidos de toda a carreira dos Groundhogs – chegando ao 5º lugar do top.
“Hogwash”, de 1972, já com Clive Brooks, ex-Egg, no baixo, em substituição de Pete Cruickshank (que nunca chegou a recuperar a sanidade mental, também ele exagerando na dose de LSD…), introduz pela primeira vez a electrónica na música dos Groundhogs, acentuando ainda mais a dicotomia entre a força e a simplicidade emocional aprendidas com os mestres dos “blues” e um lado mais conceptualista e abstracto que McPhee constrói com o “mellotron” e uma panóplia de sintetizadores. Entre os “blues” psicadélicos e uma mutação aberrante da música cósmico-progressiva, “Hogwash” infecta como uma bactéria demoníaca. (BGO, Distri. Megamúsica, 8, 8, e 8)

Curiosamente, em paralelo com estas três reedições, foi lançado no ano passado um novo álbum dos Groundhogs, “Hogs in Wolf’s Clothing”, que assinala o regresso de Tony McPhee às origens, com uma colecção de versões de temas de outro dos seus heróis, Howlin’ Wolf, “bluesman” do Inferno, do abandono e do desespero absolutos. Uma viagem através da noite e da solidão, com a guitarra eléctrica de McPhee galgando até aos limites da desolação. (HTD, Distri. Megamúsica, 7)


strawbs

No extremo oposto do espectro da música dos anos 70, estão os Strawbs. “Hero and Heroine” e “Ghosts”, ambos editados em 1974, regressam remasterizados, como exemplo de uma música que nessa altura já deixara para trás a herança folk dos primeiros álbuns e superara o trauma provocado pela saída de Rick Wakeman. Nasciam os grandes instrumentais e as profundas tiradas poéticas típicas do rock sinfónico, na sombra dos Genesis e da herança dos Beatles, para onde Dave Cousins, vocalista de inquestionável carisma, empurrara o grupo. Sem atingir o brilho e a originalidade dos anteriores “From the Witchwood” e “Grave New World”, os Strawbs aproximavam-se aqui do fim de uma carreira, que se foi esvaindo num rasto de teatralidade e elegância. (A&M, import. Lojas Valentim de Carvalho, 6 / 6)

Ao contrário de Dave Cousins, Robin Williamson é um verdadeiro bardo. O cantor e multi-instrumentista dos Incredible String Band, extinta a sua parceria, nesta banda, com Mike Heron, pegou na harpa, viajou para a sua Escócia natal e perdeu-se nas névoas da mitologia e música célticas. Não é bem o caso de “Dream Journals 1966-76”, fragmentos instrumentais e peças declamatórias (exploradas por Williamson nos Merry Band), que o músico recuperou e alterou para criar um novo painel de sonhos onde o surrealismo se cruza com a magia das histórias e lendas que o ex-Incredible String Band narra de forma quase radiofónica. “Dream Journals” devolve-nos o prazer da escuta dapalavra. Da sua música, dos seus desenhos, das suas entoações mágicas. (Pigs Whisker, import. Virgin, 7)

Strawbs – Hero and Heroine (conj.)

22.01.1999
Reedições
Obrigado, Cristo Pela Bomba
Os “blues” e a paranóia, o rock sinfónico e a poesia de um bardo celta – três apontamentos nas margens dos anos 70.

Os Groundhogs nasceram no final dos anos 60, isnpirados pelos “blues” de John Lee Hooker e pela pop dos Beatles e dos Kinks. Mas é no início da década seguinte que o grupo do guitarrista Tony McPhee atinge a maturidade e a popularidade. “Thank Christ For the Bomb”, de 1970 (reedição remasterizada), terceiro álbum da banda, reflecte a nota de estranheza que sempre caracterizou a música do grupo. A temática antibelicista, perspectivada com uma ironia e uma crueza pouco habituais na época, funciona como suporte de uma música assombrada por melodias aveludadas (John Peel tocou até mÀ exaustão o tema “Soldier”, cujas mudanças de tom e “nuances” vocais deixam adivinhar a presença fantasmagórica de Paul McCartney e Ray Davies…) e uma leitura dos “blues” pautada pela suavidade. Uma sonoridade estranha, fora do tempo e das regras de um estilo, “os blues”, que tony McPhee condensa no formato guitarra/baixo/bateria de forma inigualável.
Esta estranheza acentua-se em “Split”, de 1971, com reedição também remasterizada. “Split” disseca a paranóia e a dissociação de personalidade sofridas por McPhee, na consequência de um “flipanço” (seis meses de “bad trip”, incluindo a ressaca…) provocado pela ingestão involuntária (?) de LSD. A guitarra explode literalmente, nas quatro secções que compõem o título-tema, em solos de uma violência, intensidade e experimentação sónica que tocam o génio de Jimi Hendrix. O público britânico vibrou com o sofrimento e fez de “Split” um dos álbuns mais vendidos de toda a carreira dos Groundhogs – chegando ao 5º lugar do top.
“Hogwash”, de 1972, já com Clive Brooks, ex-Egg, no baixo, em substituição de Pete Cruickshank (que nunca chegou a recuperar a sanidade mental, também ele exagerando na dose de LSD…), introduz pela primeira vez a electrónica na música dos Groundhogs, acentuando ainda mais a dicotomia entre a força e a simplicidade emocional aprendidas com os mestres dos “blues” e um lado mais conceptualista e abstracto que McPhee constrói com o “mellotron” e uma panóplia de sintetizadores. Entre os “blues” psicadélicos e uma mutação aberrante da música cósmico-progressiva, “Hogwash” infecta como uma bactéria demoníaca. (BGO, Distri. Megamúsica, 8, 8, e 8)

Curiosamente, em paralelo com estas três reedições, foi lançado no ano passado um novo álbum dos Groundhogs, “Hogs in Wolf’s Clothing”, que assinala o regresso de Tony McPhee às origens, com uma colecção de versões de temas de outro dos seus heróis, Howlin’ Wolf, “bluesman” do Inferno, do abandono e do desespero absolutos. Uma viagem através da noite e da solidão, com a guitarra eléctrica de McPhee galgando até aos limites da desolação. (HTD, Distri. Megamúsica, 7)


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No extremo oposto do espectro da música dos anos 70, estão os Strawbs. “Hero and Heroine” e “Ghosts”, ambos editados em 1974, regressam remasterizados, como exemplo de uma música que nessa altura já deixara para trás a herança folk dos primeiros álbuns e superara o trauma provocado pela saída de Rick Wakeman. Nasciam os grandes instrumentais e as profundas tiradas poéticas típicas do rock sinfónico, na sombra dos Genesis e da herança dos Beatles, para onde Dave Cousins, vocalista de inquestionável carisma, empurrara o grupo. Sem atingir o brilho e a originalidade dos anteriores “From the Witchwood” e “Grave New World”, os Strawbs aproximavam-se aqui do fim de uma carreira, que se foi esvaindo num rasto de teatralidade e elegância. (A&M, import. Lojas Valentim de Carvalho, 6 / 6)

Ao contrário de Dave Cousins, Robin Williamson é um verdadeiro bardo. O cantor e multi-instrumentista dos Incredible String Band, extinta a sua parceria, nesta banda, com Mike Heron, pegou na harpa, viajou para a sua Escócia natal e perdeu-se nas névoas da mitologia e música célticas. Não é bem o caso de “Dream Journals 1966-76”, fragmentos instrumentais e peças declamatórias (exploradas por Williamson nos Merry Band), que o músico recuperou e alterou para criar um novo painel de sonhos onde o surrealismo se cruza com a magia das histórias e lendas que o ex-Incredible String Band narra de forma quase radiofónica. “Dream Journals” devolve-nos o prazer da escuta dapalavra. Da sua música, dos seus desenhos, das suas entoações mágicas. (Pigs Whisker, import. Virgin, 7)