Aquivos por Autor: luisj

Apocalyptica – Inquisition Symphony

15.05.1998
Vilões Cellos
Apocalyptica
Inquisition Symphony (7)
Mercury, distri. Polygram

LINK
pwd: www.gudubet.com

Do experimentalismo “a sério” dos Kronos Quartet à insurreição populista dos Soldier String Quartet, passando por ocasionais intromissões dos Balanescu Quartet, o quarteto de cordas tem vindo a ganhar um lugar de proeminência na música popular desta década, mais ou menos próximo do academismo, mas sempre ostentando orgulhosamente um estatuto de superioridade em relação à pop plebeia.
Era confortavelmente assim até os Apocalyptica cuspirem na sopa e oferecerem os seus préstimos – que o mesmo é dizer os seus violoncelos – à selvajaria e ao peso mastodôntico dos décibeis do “heavy metal”, num álbum inteiro dedicado aos Metallica. Heresia da qual ficaram as sementes desta nova investida do quarteto finlandês. Não satisfeitos em agradecer aos Sepultura (cujos temas os Apocalyptica irão interpretar nos próximos concertos a realizar em Portugal – dia 18, no Paradise Garage, em Lisboa; dia 20, no Coliseu do Porto -, bem como os dos Faith No More e dos Pantera), o quarteto reincide em subverter as normas do violoncelo, insistindo no poder do “riff”, na aceleração e na saturação dos timbres.
Desta feita, o tema é a Inquisição, a perseguição e o castigo dos hereges, escolhido talvez como alusão aos que não perdoam aos Apocalyptica terem tirado o violoncelo do seu canto dourado. A capa, um violoncelo em forma de caveira, contém do lado de dentro o aviso: “Este disco contém ruído excessivo.”
E assim é: os Apocalyptica carregam com toda a força nos pedais do volume, tocando como se estivessem a esmagar baratas. Com efeito, nós, baratas, ficamos reduzidos a papa. Mas “Inquisition Symphony” não se esgota numa sinfonia de motores que Glenn Branca não desdenharia apadrinhar, uma vez que os Apocalyptica fizeram questão de mostrar a sua formação clássica e a sua sensibilidade, em temas de câmara como “Nothing else matters” e “Fade to black” (poderia ser um “hit” tão ou mais belo que “The piano”…), que prolongam o trabalho inacabado de dois ex-minimalistas, Michael Nyman e Mikel Rouse.
O tema final, “One”, além de conter um solo de pura pirotecnia, equivalente ao que nos anos 70 Darryl Way fez com o violino nos Curved Air, em “Vivaldi” e “Ultra Vivaldi”, sugere a todo o momento a entrada em cena da voz de David Coverdale, dos Deep Purple. Entre o exibicionismo e o totalitarismo, fica a certeza de que é difícil permanecer indiferente aos excessos dos Apocalyptica.

Fridge – Semaphore

08.05.1998
Fridge
Semaphore (7)
Output, import. Lojas Valentim de Carvalho

LINK

O pós-rock está a chegar à idade adulta, a julgar pelos mais recentes trabalhos dos Tortoise, Trans AM, Ui, Gastr Del Sol e Tone Rec. A esta elite não se juntam, por enquanto, os Fridge que, depois de “Ceefax”, um álbum que terá feito as delícias dos incondicionais dos Neu!, atingem, no entanto, neste seu terceiro álbum, a maturidade capaz de os libertar do peso excessivo das influências. “Semaphore”, embalado numa vertiginosa sequência de fotografias destituídas de mensagem (“Ceefaz” era todo branco, à maneira dos Faust), arranca com uma batida mecânica, fazendo gala de uma agressividade que a seguir se diluirá num gosto acentuado pelo ambientalismo. Consumada a marca do “krautrock” restava ao Fridge enveredarem por vias mais pessoais que passam aqui pela descoberta da melodia em desenvolvimento de guitarras que se deixam adormecer em “grooves” demetal. Por vezes a música recorda um grupo como os Dif Juz (uma das pérolas menosprezadas da 4AD dos anos 80), noutras são ainda os Neu!, no seu lado mais amplo e aquático, de “Neu!75”, a fazer sentir a sua presença. Na conjugação e alternância deste lado cinematográfico da sua música com temas com base em programações electrónicas (semelhantes, na forma, aos utilizados pelos Trans AM no recente “The Surveillance”) constroem os Fridge a sua auto-estrada sinalizada por semáforos de nevoeiro.

Ani Di Franco – Little Plastic Castle

01.05.1998
Ani Di Franco
Little Plastic Castle (8)
Cooking Vinyl, distri. Megamúsica

LINK

27 anos de idade, uma dúzia de álbuns gravados e um estatuto de excentricidade não chegam para definir o talento de Ani Di Franco como uma das “singer-songwriters” mais originais e versáteis da sua geração. “Little Plastic Castle” já recebeu críticas em publicações tão díspares como a “The Option”, especializada nos sons mais alternativos, e a “Folk Roots”, bíblia da “world music”, o que pode dar uma ideia da pluralidade de ângulos através dos quais pode ser abordada a música desta intérprete, que a última dauelas revistas define como a “papisa punk da folk avant-garde”. Dos 12 temas que compõem “Little Plastic Castle”, não há dois parecisdos. O “reggae”, a “country esquizóide”, metais “mariachi”, falsos mimetismos de Joni Mitchell ou Suzanne Vega, incursões electro-filosofantes no corpo andróide de Laurie Anderson, desenhos animados de pequenas crueldades sónicas no mesmo tom magoado de Victoria Williams, moldes de “road movies” sem princípio nem fim, acenos de gozo ao FM dos tops, “cowboy songs” de ampla respiração, tudo se cruza, sobrepõe e atropela sem causar estragos numa colecção que prima pela multiplicidade e, em termos temáticos, pela aliança da crítica social bem-humorada com o puro delírio. Os 14 minutos do tema final, “Pulse”, formam uma declamação épica à altura dos manifestos de Annette Peacock, embora mais “cool”, antes de o trompete de Jon Hassell transformar num jardim de surdinas o espelho deformante das palavras. A capa é uma delícia. Ao peixe chamado Wanda junta-se um peixe chamado Ani.