Arquivo mensal: Maio 2022

UHF – “Este Filme / Amélia Recruta”

PÚBLICO QUARTA-FEIRA, 4 JULHO 1990 >> Videodiscos >> Pop

CONTRA OS CANHÕES


UHF
ESTE FILME/AMÉLIA RECRUTA
Maxi, Ed. Edisom



Este disco prova-o. Os UHF assumem-se definitivamente como o principal grupo português de rock. Do verdadeiro, direto, descomplexado, mandando às urtigas quem neles insiste em ver D. Sebastião ou então, frustradas as tontas expetativas, uma corja de vendidos. Não são nem uma coisa nem outra. Nem se preocupam muito com isso. O novo disco é o melhor da banda, dos últimos tempos. A vários níveis. A começar pela capa, uma fotografia simulando um anúncio de filme, retratando a preto e branco uma cena de guerra. “Este Filme” e a legenda aposta – “Intenso e verdadeiro, humor… A história de um soldado”. Por baixo a respetiva ficha técnica. O cartaz, sobrepondo-se à impressão de uma entrevista a António Manuel Ribeiro. Na contracapa, um plano ampliado da mesma fotografia, nas cores da bandeira nacional.
Quatro temas. Do lado A o já citado “Este Filme” e “Portugal dos Pequeninos”. O primeiro um tema lento e balanceado em que AMR mostra até que ponto tem evoluído como vocalista. Seguro, cantando como se tudo dependesse das palavras. Cantando-se a si próprio, como quase sempre, e ao país que a seguir retrata como o “dos pequeninos”. Este último o mais facilmente encostado ao som habitual da banda. O outro lado é excelente. “Amélia Recruta” é a canção mais forte do disco. Um “hit” inevitável, disparando rock ‘n’ roll sobre a instituição militar, com uma convicção eufórica e uma melodia irresistível. O “Rock de Cá” é uma crítica irónica e não muito feroz ao meio musical lusitano. Que, bem feitas as contas, não existe como tal.
É também ao nível dos arranjos que a banda de Almada faz questão de afirmar a diferença. O modo como o saxofone de Renato Júnior é projetado para a boca de palco, liberto em contorções furiosas, as intervenções guitarrísticas de Rui Rodrigues e Renato Gomes, este como convidado especial em “O Rock de Cá”, os teclados, imitando marimbas neste último tema, são alguns exemplos sintomáticos de que a banda de Almada não está disposta a dormir sobre os louros alcançados. Liberta de fantasmas, o povo é finalmente o único destinatário das canções e palavras do seu líder carismático, o mesmo que reconhece frontalmente serem os UHF o seu projeto a solo. Palavras e melodias para serem cantadas e assobiadas na rua pela grande massa anónima, a mesma que os levou ao lugar ímpar que ocupam, por direito próprio, no panorama musical luso. Quanto às polémicas e acusações que regularmente se levantam à sua volta, “os lobos uivam, a caravana passa”. Quer queiramos quer não, há que continuar a contar com os UHF e desde já como estes novos “argumentos e bandas sonoras” assinados por António Manuel Ribeiro e interpretados pelo “cast” UHF.

Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #7 – “Muito Grave!”

#7 – “Muito Grave!”

Fernando Magalhães
11.09.2001 180629
Para além da tragédia factual de tudo o que está a acontecer nos EUA, o meu receio prende-se com algumas das possíveis consequências deste(s) atentados que classifico como verdadeiramente apocalípticos.

A pior de todas elas será se Israel decidir pôr em prática aquilo que há muito anunciam: “Podemos acabar com o terrorismo internacional em cinco dias!”. Implica tal operação ataques generalizados a todo o mundo árabe. Destruição maciça.

Mas se este cenário já é aterrador, pior se tornará com as hipotéticas (?) retaliações da Rússia, se tal acontecer.

Aí sim, não é de prever nada de bom…

Rezemos para que o ser humano, sobretudo aqueles que detém o poder, tenham ainda um resto de inteligência e, sobretudo, ainda, um coração, que impeça o Fim. Que será, não tenho dúvidas, da Humanidade tal como a conhecemos.

Do que não restam dúvidas é que, sejam quais forem as consequências a curto prazo do que está a acontecer, nada será igual daqui para a frente na história do mundo.

É difícil, nesta altura, interiorizar isto, tal a dimensão do que está a acontecer.

saudações de desilusão e tristeza mas também de alguma esperança que alguém possa ACORDAR, com tudo isto

Fernando Magalhães

Shawn Colvin – “Steady On”

PÚBLICO QUARTA-FEIRA, 4 JULHO 1990 >> Videodiscos >> Pop


SHAWN COLVIN
Steady On
LP e CD, CBS, distri. CBS portuguesa


O mundo vai, progressivamente, tornando-se feminino. As mulheres fingem que não reparam e vão avançando com suavidade, mas em força. À sua maneira. O lado masculino tem consciência da ameaça, mas não parece importar-se muito. Deve pensar que já cumpriu a sua parte e agora merece descansar. Na música o fenómeno é evidente e ninguém se deve queixar. Enquanto as novas divas souberem encantar, não há razões para tal. É o caso de mais uma novata (nisto dos discos, que não na carreira, já longa e, nalguns meios, de certa notoriedade), Shawn Colvin. Depois de dar nas vistas em clubes e ter integrado bandas de “hard rock”, “country” e “bluegrass”, graças a uma voz lindíssima, de entoações suaves e “folky”, chegou por fim ao mundo da indústria, dos números e do vinilo. Em “Steady On” são notórias duas influências, qualquer delas não constituindo motivo de vergonha, antes pelos contrário: Joni Mitchell e, sobretudo, Suzanne Vega, para quem Shawn contribuiu com apoios vocais, em “Solitude Standing” e que agora retribui, cumprindo a mesma função, num dos temas de “Steady On”. Mas, como se sabe, ter boa voz, se é meio caminho andado para o sucesso, não é, porém, o caminho todo. A voz fez-se para cantar. As boas vozes, para cantar boas canções. Há-as excelentes neste disco. Quase todas prendem a atenção. E, mais importante, ao prazer físico proporcionado pelas carícias da voz, junta-se o agrado espiritual, só possível quando acontece verdadeira música. Oiça-se “Shotgun Down In The Avalanche”, talvez o expoente máximo, neste disco, do encanto e tente-se evitar o arrepio…
A produção, ótima, é de John Leventhal e Steve Addabo (que já trabalharam com Vega) e as misturas, de Kevin Killen (U2, Costello, Gabriel, K. Bush). A combinação do estúdio com a frescura e o timbre suave e incisivo da voz de Colvin resultou numa sedutora estreia a escutar atentamente. As mulheres continuam a ganhar.