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Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #110 – “Terry Riley na Gulbenkian (dubturn)”

#110 – “Terry Riley na Gulbenkian (dubturn)”

Fernando Magalhães
29.05.2002 150302
Fui ontem, para o concerto de piano solo, compostos por peças escritas pelo próprio. Não assisti ao concerto em duo da véspera, inserido num contexto diferente.

Terry Riley é um dos papas do minimalismo. Certo. Mas…

1) Houve momentos do concerto confrangedores (sobretudo na 1ª parte), perto da new age mais obsoleta. Ou quando cantou (!), muito perto da desafinação, uma canção pop eivada de misticismo e de lugares-comuns…

2) Em termos técnicos, TR é um pianista apenas sofrível, o que até nem será muito relevante, embora a sua mão esquerda desenrole com notável segurança os típicos ciclos de notas que fizeram a sua imagem de marca. A direita, enfim…notas falhadas, quebras rítmicas fora do programa…

3) TR é o anti-académico por excelência e o “amador” no sentido mais nobre do termo, de alguém que ama verdadeiramente aquilo que faz. Notou-se isso. Estava na Gulbenkian como se estivesse a tocar num clube para um círculo de amigos.

4) Mas…há sempre um mas… a certa altura (último tema da 1ª parte toda a segunda), a música levantou voo. TR voltou a cantar (segundo as técnicas tradicionais indianas conotadas como o “raga”) e era esse canto que “puxava” a inspiração. Como na música indiana, há um momento (ideal e procurado) em que já não é o músico que toca a música mas a música que toca o música.

5) Nessa altura aconteceu o “clic”. A maior utilização dos pedias tornou a música mais espacial. A mão direita como que se tornou mais leve, bailando verdadeiramente sobre o teclado. Música plena de dádiva e ternura, música que aquece a alma.

6) Em termos formais, TR improvisou sobre os temas. Na 1ª parte raramente ultrapassando os clichés da música minimal repetitiva, que alternou com passagens românticas a la Wim Mertens/Michael Nyman de “O Piano”/Richard Clayderman e instantes mais jazzísticos, quando não de inspiração no teatro da Broadway. Também “caiu” frequentemente no ragtime (um dos temas, assumidamente neste andamento, foi dedicado ao seu professor de piano, músico de ragtime).

7) Na segunda parte, porém, a música como que se libertou de todos os espartilhos e TR soou como uma espécie de Keith Jarrett espiritualista, fazendo a música passar da simplicidade mais desarmante para construções mais complexas.

Foi, em suma, um concerto desequilibrado. Houve alturas em que me senti verdadeiramente desiludido (mesmo irritado!) mas finalmente acabei rendido a uma espécie de magia benigna que se desprende da música, da atitude e da figura de Terry Riley.

FM

John Cale & Terry Riley – “Church Of Anthrax”

Pop Rock

16 FEVEREIRO 1994
REEDIÇÕES

John Cale & Terry Riley
Church of Anthrax

Columbia, distri. Sony Music


jc

Um disco mítico. Gravação de 1971, na qual o então violista dos Velvet Underground juntou forças com um dos papas do minimalismo americano. Resultou interessante, mas deixa um certo sabor a frustração. Cale martela como pode o piano em “Church of Anthrax”, “The hall of mirrors in the palace at Versailles”, que o sax soprano do americano sobrevoa como uma área real, e no longo e penúltimo tema “Ides of March”, acompanhando como pode a cadência milimétrica imposta por Riley, mestre da circularidade e sobreposição de ritmos. É notório que é Riley a ter de descer ao nível de Cale. Vê-se que o compositor de “in C” e do fenomenal “Rainbow in Curved Air” tem a preocupação de não descolar em demasia dos esforços do companheiro, na maneira contida como toca o órgão electrónico. Depois, a bateria, tocada por alguém nunca identificado em qualquer edição desta obra, não ajuda nada, de tão quadrada e pesadona. O melhor tema acaba por ser a única canção do disco, “The soul of Patrick Lee”, uma das típicas baladas fantasmagóricas de Cale, cantada por este de forma preciosa. Mas a sensação de ineditismo da parceria e alguns pormenores mais conseguidos, por entre o emaranhado rítmico dos temas “minimais repetitivos”, acaba por tornar “Church of Anthrax” uma curiosidade digna de interesse. Mesmo que a quilómetros de distância do melhor, tanto dos Velvets como do patriarca da repetição. (7)

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