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Vicente Amigo, Paul McCartney – “Vencedores e Vencidos” (televisão)

local >> sexta-feira >> 16.04.1993
Rádio e Televisão
Destaque


Vencedores E Vencidos



CONFESSO. Começo a ficar farto. Na RTP, os intervenientes nos programas de música são sempre os mesmos. Na modalidade “agora escolha” do Últimas Notas, o derrotado de uma emissão é guardado na manga e apresentado como alternativa na emissão seguinte. O que significa que acabam por ser apresentados todos. Se não for á primeira, é à segunda ou à terceira. Até ver e até dar. Vicente Amigo – agora acrescentado de um “d” antes de Amigo, pois convém que haja pelo menos uma diferença – foi derrotado no confronto directo com Paco de Lucia. Hoje à noite, o adversário é Paul McCartney e, em princípio, D’Amigo deverá perder de novo. Não importa. Para a semana será um mano a mano com Quim Barreiros e então D’Amigo sairá vencedor. Pensando melhor, talvez não.
Segundo esta lógica do “que ganhe o melhor”, haverá vencedores e vencidos crónicos, até ao dia em que surgir a concurso o Frei Hermano da Cãmara, o António Albernaz, o João Marcelo, a Cidalina, a Ruteca, os Cabanelas Música ou os Kaganisso, tudo nomes que constam do guia actualizado dos artistas e espectáculos.
Poderia voltar a escrever sobre Don Vicente El Amigo, mas não o faço. As pessoas são maiores e vacinadas, com obrigação de conhecer este nobre espanhol tocador de flamenco. Poderia igualmente escrever sobre Paul McCartney (aqui, a RTP resolveu acrescentar um Mc a Paul Cartney) e revelar pormenores inéditos sobre a sua vida, por exemplo, que pertenceu aos Beatles, escreveu um par de canções de parceria com John Lennon e que a sua mulher afinal não é filha do fotógrafo Fuji. Mas também neste caso me recuso. Para não criar um precedente. Por este andar teria que escrever sobre Bob Geldof, Sting, Guns ‘n’ Roses e U2, artistas com passe vitalício nas televisões de todo o mundo. E sobretudo, Phil Collins, este, sim, o verdadeiro amigo dos povos, o fenómeno mediático do século, o irmão, marido e pai que gostaríamos de ter tido, o gajo fixe que recebe dinheiro directamente das mãos de Deus, enfim, o próprio deus da música pop.
Apenas concedo em informar o seguinte: sua senhoria Don Juan Vicente D’el Amico concorre com um espectáculo gravado no Teatro Municipal de S. Luiz. Sir Paul McCartney ganhará decerto com larga vantagem com o seu “Up Close”, gravado no Ed Sullivan Theater, em Manhattan. Pobre, pobre Amigo, o telespectador não está contigo.
TV 2, às 00h50

Paul McCartney – “Paul Is Live”

pop rock >> quarta-feira, 01.12.1993


Paul McCartney
Paul Is Live
Parlophone
Distri. EMI-VC



Uma brincadeira que não deixa de ser divertida esta do regresso, depois de “Off the Ground”, de Paul McCartney, num registo ao vivo de uma digressão realizada no princípio deste Verão pelos “States”. O gozo começa logo pela capa, na qual Paul se deixou fotografar a atravessar a mesma passadeira de peões de “Abbey Road”, desta feita acompanhado apenas por um cão. Depois, o folheto refere a digressão como tendo sido realizada “in the new world”, recorrendo ao velho chavão que serviu para designar a América do Norte, dando a entender tratar-se da primeira vez que Paul aí actuou. Mas o gozo maior vem sobretudo da música. “Paul Is Live” é o álbum mais “beatleano” de toda a carreira a solo ce “Macca”. Ao lado de êxitos pessoais como “Here, there and everywhere”, “My love”, “Live and let die” ou o recente “Hope of deliverance” surgem velhos temas dos Beatles interpretados – e isto é que é espantoso – com arranjos e vocalizações bastante fiéis aos originais: “All my loving”, “We can work it out”, “Michelle”, “Magical mystery tour”, “Lady nna”, “Paperback writer” e “Penny Lane”. Como se Paul fosse de súbito acometido por um desejo incontrolável de voltar a aninhar-se no útero materno. Um jogo de gato e rato com a memória. Para a graça ser total, o ex-Beatle atira-nos no final com 45 segundos de zumbido de um ensaio de som, seguido de três ensaios de canções. O homem, diga-se o que disser, não perdeu o sentido de humor. (6)

Paul McCartney – “McCartney” + Paul & Linda McCartney – “Ram” + Wings – “Wings Wild Life” + Wings – “Red Rose Speedway” + Wings – “Venus And Mars” + Wings – “Wings At The Speed Of Sound” + Wings – “London Town”

pop rock >> quarta-feira, 07.07.1993
REEDIÇÕES


PAUL McCARTNEY
McCartney (6)
PAUL & LINDA McCARTNEY
Ram (8)
WINGS
Wings Wild Life (7)
Red Rose Speedway (6)
Venus And Mars (7)
Wings At The Speed Of Sound (4)
London Town (6)
CD Parlophone, distri. EMI – Valentim de Carvalho

COM ASAS PARA CANTAR



Assim, sim! Discos separados, capas originais, temas extra, sim senhor, mas separados dos originais por um intervalo longo de silêncio, como meros apêndices que são. A presente reedição contempla os oito primeiros álbuns de McCartney a solo e com os Wings, gravados entre 1970 e 1978. Pretexto excelente para a reaudição de canções, algumas que foram êxito, e a descoberta de outras, por vezes bem mais valiosas, que terão passado despercebidas. É conhecido o génio melódico de Paul McCartney. Os oito álbuns em questão provam-no e de que maneira. À distância, porém, descobrem-se-lhe fraquezas e alguns defeitos, o que significa que nem sempre esta sua capacidade resultou em cheio. O ex-Beatle afinal é humano e por vezes espalhou-se ao comprido. Facto que, paradoxalmente, tem na maior parte dos casos que ver com a sua tendência para experimentar ao nível dos arranjos e com a procura de diferentes formatos para as suas canções e menos com falhas de inspiração. De disco para disco, Paul Mc Cartney ousou a mudança, sugerindo pistas que outros grupos, alguns importantes, depois aproveitaram e desenvolveram (Supertramp, Queen, XTC, por exemplo). “Macca”, como ficou conhecido, experimentou géneros e estilos, sons e ideias. Ficando a unidade formal de cada disco bem firmada no esteio melódico que nos Beatles, e em parceria com John Lennon, foi responsável pela criação da lenda. “McCartney” deu início À viagem a solo. Um disco feliz, de amor pela sua mulher Linda. “Lovely Linda”, arroubo juvenil de veneração à musa e mulher amada, dá o mote do modo como Linda teve e continua a ter importância na carreira e na música de Paul. Os cinco instrumentais incluídos no álbum mostram o seu desejo de se distanciar dos Beatles, mas são traídos pelos arranjos, que não escondem as limitações de Paul McCartney como executante, que neste caso tomou a seu cargo todos os instrumentos. Entre a aproximação aos “blues” de “Oh you”, um punhado de temas que afinal acabam por soar bastante aos “fabulous four” e o experimentalismo ofegante de “Kreen-Akrore”, destaca-se uma gema, “Teddy boy”, na qual se torna visível o tipo de arranjo que melhor serve o seu talento de melodista – nas canções acústicas, mais intimistas, feitas de pequenas sinuosidades vocais e alterações subtis.
“Ram” é o melhor de todos. Nele, Paul McCartney libertou-se das preocupações em ser diferente e da responsabilidade de fazer tudo sozinho, assinando o disco mais próximo dos Beatles de toda a sua discografia. Sem temas fracos e na companhia de Linda e de mais três músicos, Denny Seiwell, David Spinoza e High McCracken, “Ram” reúne uma colecção de canções da melhor cepa: “Too many people”, “3 legs”, “Ramo n”, “Dear boy”, a lição de como ultrapassar o refrão que é “Uncle Albert / Admiral halsey”, o belíssimo “Heart of the country”. Um disco ainda e sempre de amor feliz, sob a influência de Linda, em contraste com a obra de John Lennon, marcada pela paixão torturada (e desequilibrada) por Yoko Ono. “Cherchez la femme”!…
O melhor e o pior alternam em “Wild Life”, álbum marcado pela estadia de Paul e Linda no campo, em Inglaterra, primeiro com a assinatura do colectivo Wongs (aqui o parzinho, com Denny Sewell e Denny Laine). Negativas são as inflexões “reggae”, género que sempre atraiu Paul McCartney, mas que este nunca soube incorporar da melhor maneira, em “Love is strange”, ou a faceta rock ‘n’ rol sem grandes rasgos de “Mumbo”. A recompensa faz esquecer o resto, numa sequência sem mácula: “Wild life”, talvez uma das canções com mais força de toda a carreira do músico, servida por uma melodia ao seu melhor nível, das que nunca mais noslargam a cabeça, “Some people never know”, “I am your singer”, “Tomorrow” e o melodramático, mas sem hipótese de resistência ao apelo melódico, “Dear friend”. Os extras incluem o politizado “Give Ireland back to the Irish” e o pueril “Mary had a little lamb”.
“Red Rose Speedway”, com a chancela na produção, entre outros, de Alan Parsons, assinala o regresso de Hugh McCracken aos Wings e dá espaço alargado às guitarras. Canções a reter: “Single pigeon”, das tais que fazem cócegas no cérebro, e, pela curiosidade, “Loup (1st indiano n the moon)”, ao melhor estilo dos Pink Floyd, de “Meddle”. O “medley” final deve ter servido de compêndio aos XTC. Ah, sim, é aqui que aparece “My love”, um dos temas de veia sentimentalona que durante os anos 70, nos convívios liceais e outras bailações, mais ajudou a constituir famílias.
Fraco, sem chama nem grandes canções é “Bando n the Run”. Saliência, mesmo assim, para “Bluebird”, o típico arranjo anos 60 de “Picasso’s last words (drink’s me)” e “Nineteen hundred and eighty five”, com David Bowie a espreitar no horizonte. Horrendas são “Mrs. Vandebilt”, digna de figurar no Top da Praça de Espanha ao lado de “Bamboleo”, e a imersão “gospel” com alma gémea de “Woman”, de John Lennon, “Let me rol it”. Disparando em múltiplas direcções e com a ajuda de convidados como Allen Toussaint, Tom Scott e Dave Mason, “Venus and Mars” acumula refer~encias e permite alguns encontros, reais ou imaginários – com os Genesis, em “Venus and Mars”, o “hard rock” e os Beatles do início, em “Rock show”, as danças de salão, em “You gave me the answer”, os Queen, em “Magneto and titanium man”, de novo os Pink Floyd (“Money”) em “Letting go”, o rhythm ‘n’ blues, em “Spiritual ancient Egypt” e “Medicine jar”, a mistura de música “soul” e Otis Redding com Ziggy Stardust, em “Call me back again”, os Supertramp, em “Listen to what the man said”, o “reggae” e os brinquedos de Pascal Comelade (!), no bónus “Lunch box/odd box”. Execráveis, os temas finais. Deslumbrante e de antologia, “Love in song”. Dos tais… “Wings at the Speed of Sound” perde-se na ausência de ideias e na falta de convicção. Paul experimenta por experimentar, numa acumulação de efeitos de estúdio sem qualquer significado. Um tema que ficou no ouvido, “Let ‘em in”, e uma mão cheia de vazio é tudo o que o disco tem para oferecer. Nenhuma boa canção à altura dos pergaminhos do autor. Multa por excesso de velocidade.
“London Town” emenda a mão e regressa com alguns bons momentos: “London Town”, “I’ve had enough”, “Famous groupies” (em registo de “jugband”), outra das preferências de Paul), “Don’t let it bring you down”. Infelizmente, a balança pende para o lado errado em coisas como “Cuff link”, um instrumental para encher, ou “Café on the left bank”, confortável à mesa do Rock FM para americano ouvir. Nos extras, está a gritaria que vendeu milhões “Mull of Kintyre”. Feito o balanço, sobram motivos para revisitações e consultas repetidas e atentas. Até porque nesta matéria Paul McCartney continua a dar lições.