Arquivo de etiquetas: Labradford

Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #166 – “Labradford, Ikeda, Ocsid”

#166 – “Labradford, Ikeda, Ocsid”

Labradford, Ikeda, Ocsid
Fernando Magalhães
Tue Feb 13 14:30:40 2001

Comecei hoje de manhã a ouvir o novo “Fixed::Context”. Apenas a primeira (longa) faixa. Continuam ambientais qb, a insistirem numa mesma linha de guitarra David Gilmouriana de “Wish you Were Here” (Pink Floyd) e a criarem espaços de contemplação únicos no panorama do pós-rock. Digamos que, pelo menos a julgar pelo ex. desta 1ª faixa, conseguem num ápice criar o tipo de ambientes que os Sigur Rós, na minha opinião, por mais que se esforcem (lamento, mas n/consigo gostar do disco…), apenas conseguem aflorar. Em comparação “Fixed::Context” os islandeses soam a uma banda de heavy-metal, passe o exagero.
Deu ainda para reparar que as duas faixas seguintes começam com guitarras de cristal e que a última será, por ventura, a mais electrónica. Hoje, audição completa.

Por falar em electrónica, estive a ouvir ontem, à noite uma disco interessantíssimo de uns tais OCSID (“Opening Sweep”, na Ash International), trio do qual faz parte o Graham Lewis, dos Wire e He Said. É um longo tema de 75 minutos que recupera parte dos ambientes da discografia a solo de outro ex-Wire, o Bruce Gilbert, espécie de drone sombra, atravessada por grooves longínquos, samples de vozes distantes e súbitas explosões de electronica abstracta. “Leisure Zones”, do Burnt Friedmann, andará lá perto, mas este CD dos OCSID é mais amplo, variado e perturbador.

Ainda ouvi por alto o “Matrix” (ed. Touch), do japonês RYOJI IKEDA, 3ª parte de uma trilogia. O exemplar que recebi é duplo, apenas ouvi o 2º CD, mais curto. Música próxima do novo dos Pan Sonic, ainda mais fria e minimalista. Mas estive a ler as notas relativas ao 1º CD e nelas se refere que o músico criou uma espécie de arquitectura sónica 3D que muda, consoante a posição do auditor na sala/local de escuta, dando a revelar de cada vez facetas inesperadas das composições. Promete.

Saudações

FM

PS-Sexta, à chegada a casa, n/houve, felizmente, retaliações… 🙂

Fridge – “Eph” + Labradford – “E Luxo So”

Sons

22 de Outubro 1999
POP ROCK


Atom Darth Vader

Fridge
Eph (9)
Go Beat, import. Lojas Valentim de Carvalho
Labradford
E Luxo So (8)
Blast First, import. Lojas Valentim de Carvalho


fridge

lab

Com “Ceefax” e “Semaphore” os Fridge já tinham lançado o aviso de que são uma banda para seguir de perto, capaz dos mais altos voos. E se qualquer destes álbuns dava já indicações de estarmos perante um grupo que não se contenta em seguir os mandamentos do pós-rock, com as obrigatórias vénias ao krautrock ou ao Progressivo, o novo “Eph” explode como uma estrela em direcção a um sinfonismo electrónico tingido pelo jazz e por uma pop instrumental estratosférica. Sim, pop, leram bem, mas uma pop com a forma de vapores, perfumes e cintilações desconhecidos na Terra. “Ark” abre o disco com pulverizações de uma beleza asfixiante, aumentando progressivamente de densidade e deixando entrar elementos residuais, segundo o método Biota/Mnemonists, até ao sufoco final. “Meum” é ambiental, minimal, cristal, claustro, zen, new age para curar robôs neuróticos. O ritmo fragmenta-se e surgem vozes interceptadas do éter, em “Transience”, antes de uma lenta ascensão conduzir a lugares que seria melhor evitar. O psicadelismo entrou no pós-rock com este tema monumental. Em “Of” o espectro de um avião Concord revela uma paisagem bucólica/minimalista habitada pelos Biosphere. Refracções, feedback e delay obscurecem “Tuum” que, em “Sad ischl” deriva para uma incursão de saxofones jazzy à la Tuxedomoon (de “Desire”) sobre harpejos de sintetizador analógico e uma melodia celebratória do crepúsculo da Europa que traz ecos de “Desperate Straights”, da conjunção Henry Cow Slapp Happy. “Yttrium” consegue aquilo que os Stereolab andam há anos a tentar: a “easy listening” do futuro. O longo tema derradeiro, “Aphelion”, começa por instalar-se nos territórios do free rock abertos pelos Isotope 217º e Supersilent, uma música visceral com raízes na estética de jazz tribal cultivada pelo selo ESP nos anos 60, para finalmente entrar, e nunca mais sair, num mantra psicadélico de violinos que levantam o pano do teatro de música eterna de LaMonte Young. O que os Tortoise deixaram por fazer em “TNT” lograram os Fridge concluir de forma admirável com “Eph”, o pai do pós-rock sinfónico, o guerreiro-vilão, como Darth Vander, capaz de manejar o lado negro da força. A capa, curiosamente, lembra “Atom Heart Mother”, dos Pink Floyd, sem a vaca.
O novo dos Labradford dá sono. Mas calma, não se vão já embora! Acontece que “E Luxo So” é o álbum mais terapêutico que ouvi nos últimos tempos. O sono chega como uma bênção para nos mergulhar num estado de semi-realidade onde os sons são como nuvens que se formam e desfazem adquirindo as formas que a imaginação lhes quiser dar. Mais ainda do que no anterior “Mi Media Naranja” os Labradford deixam falar o silêncio através de guitarras reverberantes, pianos e cordas hipnóticos e electrónica soporífera. No tema nº 3 (sem título, como todos os outros), a música sugere uma junção de Roger Eno com “Alan’s psychedelic breakfast” um tema dos Pink Floyd, de novo do álbum “Atom Heart Mother, enquanto o nº 6 poderia ser uma vinheta de “Another Green World” de Brian Eno. Mas quando julgamos poder descansar neste estado de contemplação algo avisa de que uma realidade diferente pode estar escondida por detrás: zumbidos, frequências quase inaudíveis atravessam periodicamente “E Luxo So” como sinais provenientes de outra dimensão. Percebemos então que o que os Labradford fazem é empurrar-nos suavemente para o outro lado do espelho.



Labradford – “Labradford”

Pop Rock

19 Fevereiro 1997

Labradford
Labradford
BLAST FIRST, DISTRI. SYMBIOSE


lab

Os Labradford são uma das partes visíveis do gigantesco “iceberg” de bandas do “post-rock” que, lenta mas seguramente, vão emergindo na cena alternativa norte-americana. “Labradford” é o terceiro álbum da sua discografia, sucedendo a “A Stable Reference” e “Prazision”. À semelhança de outras formações da mesma área – Tortoise, Trans AM, Ui, Bowery Electric, Magnog, Jessamine, Rome, Gastr Del Sol, Fuxa, C Clamp – fica a sensação de estarmos perante uma música ainda em formação que se refugia na criação de ambientes enquanto não descobre arquitecturas de maior definição. Daí o fascínio, que exerce, de assistir à gestação de algo novo que tem a modéstia de dar ouvidos à tradição. Curiosamente, é possível estabelecer uma correspondência entre o que se passa actualmente com a música electrónica nos Estados Unidos da América – na oposição entre as bandas do “post-rock” e a escola californiana representada por nomes como Steve Roach, Robert Rich e Michael Stearns – e a cena alemã dos anos 70. Nesta medida, os Labradford e os Tortoise estao para Steve Roach e Robert Rich como os Faust e os Cluster estavam para Klaus Schulze e os Tangerine Dream. “Labradford” balança entre atmosferas instrumentais intoxicantes, reminiscentes dos This Heat (banda de Charles Hayward que é também referência obrigatória dos Tortoise, tendo feito, no final dos anos 70, de charneira entre o “krautrock” e a música industrial), guitarras carregadas com a depressão do eixo Joy Division-Durutti Column e canções sonambúlicas misturadas no ventre de uma baleia. Música fria, como as estruturas de metal da capa, “Labradford” anuncia a nova glaciação. (7)