Arquivo mensal: Julho 2015

Ney Matogrosso – “As Aparências Enganam”

Pop Rock

21 JULHO 1993

Ney Matogrosso
As Aparências Enganam

CD Philips, distri. Polygram


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Em “As Aparências Enganam”, Ney Matogrosso assina um dos melhores álbuns de música brasileira deste ano. A voz do antigo elemento dos Secos e Molhados está melhor do que nunca. Os arranjos voam do tropicalismo para o intimismo, da dança para o solilóquio, com a agilidade da água. Com a firmeza de quem tem voz própria. Na companhia da banda Aquarela Carioca, Ney liberta-se na personagem de intérprete, de médium que veste as máscaras e as mil poses de autores alheios, no fundo o papel que melhor lhe assenta. E que autores: Milton Nascimento, Alçeu Valença, Caetano Veloso, João Ricardo, Chico Buarque e Jorge Bem, entre outros mestres da música popular brasileira.
Há grandes canções em “As Aparências Enganam”. Melhor dizendo, há apenas grandes canções. Fabulosas de fragilidade, de emoção, as interpretações de “O ciúme”, de Caetano, “Fruta boa”, de Milton, e “Pedra de rio”, de Luli e Lucinha. Como estrelas luzindo no firmamento povoado de frutas astrais de Cármen Miranda. “Notícias do Brasil”, também de Milton Nascimento, e “FM rebeldia”, de Alçeu Valença, são sol brasileiro, o morro e a favela. Onde “vive um povo que merece mais respeito, sabe? (…) tem gente boa espalhada por esse Brasil que ia fazer desse lugar um bom país”.
“Sangue latino”, repescado dos Secos e Molhados, é ponto de paragem do cantor em mares já explorados. O calor da dança tropical torra “Las muchachas de Copacabana”, de Chico Buarque, e “El Manisero”, nas ondas do reggae, cantado à maneira, em castelhano.
“Pavão misterioso” (”eles são muitos mas não podem voar”…) e “Cheiro de saudade”, segundo tema de Alçeu Valença incluído em “As Aparências Enganam”, são dois outros momentos em que a voz do cantor empresta acentuações inusitadas, seguidos de “Pedra do rio” (“meu barco voa sem vela, rio e navego sozinho”), esculpida nas graças da água e do amor, e “Vendedor de banana”, de Jorge Bem, colorido de amarelo-banana e dos pregões de mercado. Uma sequência irresistível de cirandas, com a voz de Ney caindo nos lugares exactos, desagua no título-tema que fecha o disco, onde as coisas se mostram afinal como são: “As aparências enganam aos que odeiam e aos que amam, aos que gelam e aos que inflamam, porque o amor e o ódio, o fogo e o elo se irmanam na fogueira das paixões.” Um disco apaixonado e apaixonante. (8)

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Tangerine Dream – “The Story Of Tangerine Dream”

Pop Rock

14 JULHO 1993
REEDIÇÕES

Tangerine Dream
The Story of Tangerine Dream

2xCD Jive, distri. BMG


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Contar em dois discos uma história que ronda os 30 capítulos, correspondentes a outros tantos álbuns, é tarefa ingrata. A solução seria seleccionar as melhores fases da banda, o que nem teria sido difícil, porque os Tangerine Dream “desapareceram” a partir do álbum “Stratosfear”. Em vez disso, a colectânea junta o impensável: discos da década de 80, como “Green Desert”, “Le Parc” e “Underwater Sunlight”, em que os Dream eram já uma sombra de si próprios, a um tema de “Atem”, “Wahn”, de 1973, e outro do álbum-estreia, “Electronic Meditation”, “Journey through a burning brain”, de 1969. Ou seja, meteu-se no mesmo saco o que não passava já de um pacote de “disco” espacial dos anos 70, um tema “Wahn”, em que o grupo alemão copiava as sonoridades de “Ummagumma”, dos Pink Floyd, e, do primeiro álbum, 18 minutos de experimentação com sons concretos que pouco tinham a ver com a estética futura seguida pelo grupo. De fora, como já vai sendo hábito, ficou o melhor: o duplo “Zeit” e os dois álbuns que arrancaram do ponto onde os Floyd tinham ficado: “Phaedra” e “Rubycon”. Uma história mal contada e outra que ficou por contar. (5)

CD1
CD2



Ryuichi Sakamoto – “Wild Palms”

Pop Rock

14 JULHO 1993
NOVOS LANÇAMENTOS POPROCK

Ryuichi Sakamoto
Wild Palms
CD Capitol, distri. EMI-VC


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É um problema, isto das bandas sonoras. Faltam as imagens e, pronto, quase sempre a música não funciona, ficando nua e desamparada, sem bonecos a que se agarrar. Há excepções, claro, mas não é o caso destas palmeiras musicadas pelo ex-Yellow Magic Orchestra, para a série do mesmo nome realizada por Oliver Stone para a cadeia americana ABC. São 13 temas à deriva no vazio, em busca de quem os guie, entre a new-age preguiçosa, o neoclassicismo, da escola Nyman, Mertens e quejandos, e a “techno” a metro, com uma perninha do inevitável “sample” de vozes étnicas a fingir de diferente. Uma receita mil vezes repetida a que Sakamoto não conseguiu dar a volta ao texto, isto é, às imagens. A desforra surge no final, com a repescagem de cinco velhos temas dos anos 60 e 70: “She’s not there”, dos Zombies, “I need your lovin’”, de Don Gardner e Dee Dee Ford, o clássico “Can’t take my eyes off you”, de Franki Valli, “Lightnin’ strikes”, de Lou Christie, e o instrumental clássico-“kitsch” “Classical gas”, de Mason Williams. Vitória do “velho” sobre o “novo”. (4)

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