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Tom Jobim – “‘Samba De Uma Nota Só’, Na Morte De Tom Jobim ‘É Impossível Ser Feliz Sozinho'” (obituário)

cultura >> sexta-feira >> 09.12.2022


“Samba De Uma Nota Só”, Na Morte De Tom Jobim
“É Impossível Ser Feliz Sozinho”


Morreu António Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, Tom Jobim, um dos pais da bossa-nova. Tinha 67 anos e a morte veio ao seu encontro ontem num hospital em Nova-Iorque, onde se preparava para ser submetido a uma angioplastia, a mesma operação á qual se submetera um mês antes. Ficou vazia a pauta do “Samba para uma nota só”.



Consideravam-no um dos melhores compositores brasileiros de sempre. Autor de mais de 400 composições escritas ao longo de 40 anos de carreira, muitas delas escritas de parceria com o seu amigo e poeta Vinicius de Moraes e outras com o pianista Newton Mendonça, Tom Jobim, como era conhecido, assinou êxitos que entraram para o domínio público como “Garota de Ipanema” e “Samba de uma nota só”, verdadeiros hinos da bossa-nova, essa música que pode ser comparada a um samba descarnado, banhada pelo sol das praias cariocas, mas onde habita uma tristeza sem nome, a contrastar com a sensualidade orgiástica e tribal e o entusiasmo dionisíaco do samba-carnaval.
Influenciado por Villa-Lobos, Tom Jobim estabeleceu as regras da música que viria a ser denominada bossa-nova nos finais dos anos 50, mais precisamente em 1958, ano da sua associação com João Gilberto, outro dos patriarcas do género, depois de em 1955 ter escrito a sua “Sinfonia do Rio de Janeiro”. Em 1954 compôs o seu primeiro samba, “Faz uma semana”, seguido pouco tempo depois por “Desafinando”. Com Vinicius de Moraes compôs o clássico “A felicidade”, incluído na banda-sonora de “Orfeu Negro”, um filme de François Marcel Camus, vencedor do Festival de Cannes de 1957.
“Chega de saudade”, de 1959, projectou a bossa-nova além fronteiras, em particular nos Estados-Unidos, onde foi adoptado pelo saxofonista de jazz Stan Getz. Data dessa época o encontro e a colaboração com nomes como Frank Sinatra, Ella Fitz gerald e o próprio Stan Getz. Três anos mais tarde, em 1962, abrir-se-ia uma última porta, numa inesquecível “grande noite da bossa-nova” realizada no Carnegie Hall em Nova-Iorque. “Garota de Ipanema” teve aí a sua rampa de lançamento, tornando-se em pouco tempo num dos temas mais famosos da música popular brasileira. Tem uma história. Uma história de amor como são todas as boas histórias. Vaga e um pouco triste. De algum modo coincidente com o ambiente de erotismo platónico que caracteriza a bossa-nova. A canção nasceu à mesa de um café onde Vinicius de Moraes se apaixonou por uma rapariga da qual nunca chegou sequer a conhecer o nome. Assim como ficou, ligada para sempre à beleza de uma mulher misteriosa, sem contornos fixos e por isso sujeita a todos os sonhos de possessão, “Garota de Ipanema” acabou por tornar-se num dos símbolos da mulher carioca, embora hoje a imagem que se tem dela seja mais do tipo carnudo, separado ameio por um fio dental. Seja como for a rádio pegou nela (na canção) e o próprio Frank Sinatra encarregou-se de cantar em 1967 a versão em inglês, “The girl of Ipanema”. Ipanema entrava desse modo para a lista dos lugares míticos do Brasil.
Nascido em 1927 no bairro de Tijuca, no Rio de Janeiro, Tom Jobim acabou por se instalar em Ipanema, nessa época um lugar desértico com uma praia cheia de ar puro e de silêncio. A mesma pureza e o mesmo silêncio que se podem escutar na música deste compositor.
Depois, a selva de cimento avançou contra a praia, invadindo a marginal de Ipanema com os seus edifícios-montra para onde foi morar uma nova burguesia ansiosa por se exibir. Tom Jobim fugiu, refugiando-se num lugar perto da floresta de Tijuca. Recentemente compôs o álbum “António Brasileiro”, o seu último de originais, dedicado à natureza e à ecologia, “talvez dê para salvar um pouquinho, talvez sobrem algumas árvores”, ironizava.
“Corcovado”, “Fotografia”, “Águas de Março”, “Retrato em preto e branco” (com Chico Buarque) são alguns dos outros títulos conhecidos de António Carlos Jobim que nos últimos meses gravou um tema para álbum “Duets II”, de Frank Sinatra – repetindo deste modo uma colaboração encetada nos anos 60 com “Fly me to the moon” – e em Setembro de 1992 actuou em Portugal, no claustro do Mosteiro dos Jerónimos, acompanhado por membros da sua família e da dos Caymmi, de Dorival Caymmi, “a água da fonte”, como lhe chamava.
Ontem, Tom Jobim despareceu. Amava a liberdade e recusava as etiquetas. Desprezava o fato e gravata e sentia “repulsa pelos horários rígidos e pelos engarrafamentos”. “A música falava mais forte”, dizia. E o amor. “Com a idade, primeiro vão-se as moças, depois os rapazes, até que a gente fica sozinho. O fundamental é mesmo o amor, é impossível ser feliz sozinho.”
É como se a praia de Ipanema ficasse de novo sem ninguém.

Marisa Monte – “Marisa Monte Seduz Público Do Porto – Nos Braços De Uma Sereia” (concerto | reportagem)

cultura >> segunda-feira >> 07.11.1994


Marisa Monte Seduz Público Do Porto
Nos Braços De Uma Sereia



SE ELBA Ramalho é uma tentação com pernas, Marisa Monte é uma tentação com braços. O Coliseu do Porto viu as duas e pôde comprová-lo. Marisa, para além dos braços e de um corpo enleante, tem uma voz e uma presença em palco espantosas. Nada que se compare ao fracasso que constituiu a sua primeira apresentação em Portugal, em 1991, em que desafinou por todos os lados. Hoje ela é o que se chama uma profissionalona. Sabe o que faz e o que canta, domina como quer o ritmo e as tensões de um espectáculo, em suma, tão nova e é já uma das maiores vozes femininas da MPB.
Dá para perceber que o seu espectáculo de sábado à noite no Coliseu do Porto foi um êxito. A assistência, numerosa, viu-se a braços para conter os arrepios causados pela actuação de Marisa Monte, um monte de talento e sensualidade. O mesmo deve ter acontecido ontem em Lisboa, no Centro Cultural de Belém. Hoje, no Coliseu dos Recreios lisboeta, a cantora irá de novo decerto fazer faísca.
Marisa Monte, acompanhada por uma banda de sete elementos (um acordeonista, dois percussionistas, dois guitarristas, um baixista e um baterista), surgiu em palco envergando um longo vestido negro que deixava nus apenas os braços. Não foi preciso mostrar mais, como costumam fazer por exemplo as suas colegas Joanna, Fáfá ou a Elba das pernas de boa memória. Braços expressivos que cantaram tanto como a voz. Braços que acariciaram o cabelo, o rosto, o ventre e se acariciaram mutuamente. E as canções? Umas boas, outras óptimas, algumas fracotas, a atirar para o estilo telenovela. Mas em todas elas a voz da cantora brasileira conseguiu arrancar lampejos de emoção, como se fossem em qualquer dos casos declarações de amor tórridas ou pueris, não importa, mas sempre sinceras. Ao todo, incluindo os “encores”, Marisa Monte cantou vinte e uma. De início numa cadência lenta, com a sensualidade da voz e dos gestos a insinuar-se sem que a razão desse conta. Depois, sem avisar, a cantora de “Mais” ferveu no baião, no frevo e no samba. O corpo libertou-se das últimas amarras e o público rendeu-se, sem hipóteses nem vontade de resistir. No final, a plateia em peso do Coliseu dançava ao ritmo de “Balança a perna”, uma das canções do novo álbum “Verde Anil Amarelo Côr de Rosa e Carvão”. Uma bandeira brasileira agitava-se no meio da multidão.
Porque mais subtis, preferimos os temas de “Mais”, o álbum anterior da cantora: “Eu não sou da sua rua”, “De noite na cama”, “Diariamente”. “Ensaboa” foi diferente, com os braços, os tais braços, a fingir que ensaboavam o ventre e as pernas. Temperatura a subir no Coliseu. “Maria de verdade”, o tema que abriu o concerto. “Pale blue eyes”, “Dança da solidão”, “Segue o seco” e “Na estrada” saíram por sua vez do álbum das cores. “Preciso me encontrar2 rondou a obsessão, com uma batida tribal e o corpo ondulante da cantora a sugerir crimes do coração. A partir de certa altura a combinação das luzes, da voz e do corpo com o ritmo incansável e letras como “ai ai” e “eu só quero chocolate”, passou ainda a fazer mais sentido.
Já no “encore”, com a sala em delírio, os músicos da banda, responsáveis ao longo de todo o concerto pela criação de uma selva de seduções, mostraram em pequenos solos o muito que valem. Brilharam com intensidade Waldonys, no acordeão, e Marco Lobo, que conseguiu pôr uma cuíca (instrumento tradicional brasileiro) a cantar como uma “prima donna”. Em final apoteótico, para não dizer orgiástico, Cezinho explodiu num solo de bateria, acompanhado pelas “vari-lites” que disparavam relâmpagos e mudavam de cor de forma desenfreada. “Lenda das sereias” colocou um ponto final na loucura. A sereia tinha um nome: Marisa Monte. Para ela aquele braço, perdão, aquele abraço!

Vários – “Eleitos Do Ano 1993 – Nova Fórmula” (internacionais)

pop rock >> quarta-feira, 29.12.1993


ELEITOS DO ANO 1993 – NOVA FÓRMULA

De facto, a eleição dos melhores álbuns do ano 1993 segundo o Piop Rock é a mais científica de sempre. Escolhemos oito áreas: pop-rock português, pop-rock anglo-saxónico, reedições pop-rock, bandas sonoras, vídeos, world music, reggae e blues. Depois, fomos a todos os suplementos que editámos este ano e destacámos os discos com melhores classificações, distribuindo-os por tops segundo as referidas áreas. Uns tops são maiores do que outros, porque as áreas também não têm todas o mesmo valor.
Há conclusões interessantes a tirar, como, por exemplo, de que, enquanto se chegou facilmente a um “top” da “world” só com discos com o máximo de pontuação e não foi preciso descer a menos do que aos nove pontos na área pop-rock internacional, já na música portuguesa se teve de repescar discos com sete pontos, para se reunir uma dezena. Claro que, a seguir, fizemos uma certa batota, porque, se dez discos portugueses com oito pontos não havia, em contrapartida os que tiveram sete pontos seram mais de dez. Excluímos primeiro as compilações, depois os idoscos ao vivo, por fim, usámos critérios menos transparentes. Completas as listagens, concentrámo-nos na votação do disco do ano em cada uma das oito áreas. Após acesas discussões, algumas birras e muitas cedências mútuas – do tipo, eu voto no teu discoportuguês se tu votares no meu de “world” -, elegemos os melhores de 1993. E, por fim, já cansados, recomeçámos a escrever.
Mas era rigor laboratorial a mais, veleidades epistemológicas excessivas, estávamos À beira do colapso. Foi quando surgiram duas ideias para fugir ao trauma da cientificidade e restituir a este suplemento a sua verdadeira alma rock ‘n’ rol. Uma dessas ideias foi votar os artistas do ano, partindo do princípio que nesta área musical não são as boas acções, nem tão pouco os factos, que conferem prestígio, antes a escandaleira e os boatos. O que lerem aqui é assim uma mistura de realidade e fantasia, de genuína admiração e muita má língua. A outra odeia foi recapitular os melhores momentos dos concertos que houve em Portugal em 1993 e, a partir daí, elaborar um questionário, partindo também do princípio de que um espectácuklo rock ‘n’ rol fica na história não tanto pelo virtuosismo dos desempenhos, mas sobretudo pelos acidentes extra musicais.
Bom Ano Novo!
LUÍS MAIO, FERNANDO MAGALHÃES E JORGE DIAS

Troféus Imaginários, Mas Merecidos, Para Artistas De Sonho

AS FIGURAS INTERNACIONAIS DO ANO

Pinóquio 1993



Refutando perentoriamente toda a espécie de vis acusações que recaem sobre o autor de “Dangerous”, a Associação dos Amigos do Pinóquio (anónima, mas aparentemente subsidiada por uma multinacional, de um refrigerante concorrente da Pepsi) decidiu este ano atribuir por unanimidade o seu galardão maior a Michael Jackson. Trata-se, como é óbvio, de um acto simbólico, com que se pretende acentuar que a parte do corpo do artista que cresce quando está na companhia de menores não é a que ele costuma mais afagar durante os concertos (isto é verdade, alega ele). Tendo verificado que o mesmo sucedia com o focinho do Homem Elefante (daí ter licitado os despojos mortais da infeliz criatura) e o do seu chimpanzé (corre o boato, não confirmado, de se passar outro tanto com a sua amiga Liz Taylor), o mais famoso do clã Jackson teria então submetido o seu próprio órgão do olfacto a uma difícil operação de cirurgia estética e, a partir daí, ele passou a crescer ou a diminuir não por dizer verdades ou mentiras (ele pouco mais diz que “obrigado”), mas consoante as tenras companhias.

Batráquio 1993



Uma Liga de Amigos dos Animais, preocupada com a violência protagonizada por humanos praticantes de música eléctrica contra outros seres vivos – praga que cresce desde que o rock sinfónico caiu em desgraça -, acaba de criar o troféu Batráquio da Música. O prémio original destina-se a estimular a pacificação da cena musical pela metamorfoseação em sapos, encenada ou real, de estrelas de rock e amigos, numa inversão alegórica da fábula popular. Este ano, o galardão foi naturalmente arrecadado por Prince, que começou por rubricar uma digressão de Verão perguntando às suas plateias como é que se chamava (isto é verdade). O rumor que corre é de que o famoso génio minorca, depois de passar semanas a fio a imitar James Brown, George Clinton e Jimi Hendrix, acordou um dia sem saber quem era. Quando a sua corte de cinderelas lhe jurou que ele era Prince, não acreditou e pensou que o confundiam com um tal Victor, que também era imitador. Como as plateias não o convenceram do contrário, ele decidiu-se por esta ideia brilhante de publicar anúncios nos principais jornais do mundo à procura da mulher mais bonita do planeta. O raciocínio é o seguinte: quando ela o beijar pela primeira vez, e se ele for mesmo Prince, então ele transforma-se em batráquio.

Rainha GATT 1993




No contexto de uma nova estratégia dos serviços secretos dos Estados Unidos, delineada no tocante às negociações do GATT, superestrelas norte-americanas foram convidadas para executar certos trabalhinhos no estrangeiro. Os artistas mais insuspeitos foram recrutados, tendo Madonna, bem conhecida pela sua paixão pelo mundo latino – desde o hino hispânico “La Isla Bonita” à sedução do actor António Banderas -, sido indigitada para atacar na América do Sul. Muito descarada, mas não menos patriota, Louise Ciccone não se fez rogada e desferiu um rude golpe nas pretensões sul-americanas quando, em Outubro passado, actuou em San Juan, Porto Rico, e usou uma pequena bandeira desse país para, em palco, limpar o suor não apenas nos sovacos, mas também no peito e entre as pernas (isto é verdade). A proeza valeu-lhe instantaneamente o prémio de Rainha GATTT, nos Estados Unidos, mas toda a publicidade que daí resultou comprometeu novas missões similares. No Canadá, ainda conseguiu dizer “Fuck Toronto”, numa estação de rádio local (isto é verdade), mas já na Alemanha teve de anular um concerto, onde era seu propósito vexar os alemães protagonizando um número de lésbica vestida à Marlène Dietrich. Correm agora boatos insistentes de que os serviços secretos norte-americanos pretendem enviar Michael Jackson vestido de panda para rebaixar os chineses; e Garth Brooks disfarçado de Saddam para desmoralizar as tropas iraquianas.

Justine 1993




O prémio Justine distingue fêmeas proeminentes nso “tops” internacionais que tenham dado o passo decisivo e público de se auto-reavaliar numa óptica libidinal, eventualmente operando a transfiguração de sacos de batatas para “pin-ups” radicais. O troféu que em edições precedentes foi conquistado por artistas como Sheena Easton e Kylei Minogue, vai este ano, não sem alguma surpresa, para a última sensação “indie” que responde pelo nome de Polly Harvey. Apesar dos seus dois discos deste ano não evidenciarem melhoras de vulto no plano da moléstic amusical, Polly tomou gosto pela experiência de aparecer ainda pudicamente com as costas nuas, na capa de um New Musical Express do ano passado, e desembaraçou-se do visual da cara deslavada e cabelo oleoso, roupas de mendigo e botas cardadas, para ressurgir toda pintada e de óculos escuros, com nada mais do que um “top” e um calçãozito a tapar-lhe o recheio, qual mulher fatal com alcova por cenário (isto é verdade). Enquanto se espera pelo dueto escaldante desta “Belle de Jour” da distorção com Prince, já se anuncia a transformação de virtuosas em bombas sexuais – de Enya, Elisabeth Frazer e Kate Bush.

Benfeitor 1993




Embora não fosse a escolha mais óbvia, o prémio pela acção benemérita de origem rock ‘n’ rol acabou por ir parar, com toda a justiça, às mãos de Axl Rose. Isto porque o sempre vulnerável e sensível cantor dos Guns N’ Roses processou a sua ex-noiva, a modelo Stephanie Seymour, argumentando que a “fera” o violentou, tanto no foro mental quanto num plano emocional. Trocada por miúdos, na sequência de várias cenas de peixeirada, a reputada donzela pôs a circular uma foto sua com um olho negro, afirmando que a dita mazela resultava de um murro que Axl lhe aplicara no dia de Natal do ano passado, quando, segundo diz o cantor, foi ela que lhe atirou com uma peça de mobília. Pior do que isso, Stephanie recusou-se a devolver-lhe o anel de noivado e toda uma série de pechisbeque que lhe oferecera, conjunto estimado em qualquer coisa como cem mil libras. Tudo isto é, no entanto, irrelevante e o que ressalta deste infeliz melodrama é que Axl quer recuperar a quinquilharia para a vender e doar para fundos que revertem para centros de assistência a crianças violentadas (isto é verdade). Como ele, se calhar, por matulonas demau génio.

Anti-Sexista 1993




Enquanto a crítica britânica de literatura prosseguia um animado debate sobre o significado exacto do refrão “por ti fazia tudo, mas isso é que não”, recorrente no novo álbum “Bat out of Hell II”, o seu autor, Meatloaf, abria um centro de recuperação para marginais. Na foto (isto é verdade, ou seja, não é uma montagem), o benemérito artista exemplifica o suave método de reabilitação para tirar da vida duas jovens caídas em tentação, permitindo que elas mantenham o seu antigo visual e uniformes de trabalho numa casa de passe gótica, mas substituindo as actividades viciosas pelo inofensivo passatempo de montar em duas rodas (há uma certa inversão de posições que também é terapêutica). As chamas ao fundo são, naturalmente, mais uma metáfora requintada para a saída dos infernos em versão motorizada e a sua exegese teológica foi já encetada por um núcleo de estudiosos destas coisas.

Saias 1993




Apesar de estarem fartos de ser “grunge” e de todos os rótulos anexos, tais como “Novos Campeões da Barbárie”, “Sexistas sem Pausa” e “Misógenos de Seattle”, os Nirvana voltaram em 1993, para reciclar as mesmas fórmulas de combinação de punk e heavy metal em “In Utero”. Não conseguiram mudar o som, mas, em compensação, operaram uma subtil reforma do visual, trocando as camisas de flanela aos quadrados e as calças de ganga, rotas nos joelhos, por lindos e vaporosos vestidos folridos. A luminosa iniciativa dos Nirvana produziu instantaneamente uma nova tendência da moda, contagiando bandas tais que Afghan Whigs, Stone Temple Pilots e Smashing Pumpkins, nos Estados Unidos, e James, Maniac Street Preachers e Take That, em Inglaterra (isterdade). Também se diz que a revista feminina “Vogue” vai passar a ser para homem e vice-versa; e a “Elle” só não passa a “Lui”, porque esse é já o nome de uma revista “soft porno”. Entretanto, os fãs, inicialmente apanhados desprevenidos, não demoraram a assaltar os guarda-roupas de mães e irmãs, mas estão agora perante um grande dilema: se os seus heróis vestiram saias compridas no Outono, será que devem já rapar as pernas para usar mini-saia na Primavera?