pop rock >> quarta-feira, 17.11.1993
Ry Cooder
Trespass
Sire, import. Contraverso
Os caminhos de Walter Hill, cineasta especialista em filmes de acção, e Ry Cooder, o papa da “bottleneck guitar”, voltam a cruzar-se depois de anteriores colaborações em “The Long Riders”, “Southern Comfort”, “Streets of Fire” e “Crossroads”. Ao contrário das sonoridades lânguidas da guitarra que nos últimos anos fizeram a sua imagem demarca junto do grande público, muito por culpa da banda sonora que assinou para Wim Wenders em “Paris – Texas”, “Trespass” é uma deflagração de violência e de metais em colisão que remete mais para grupos como os Test. Dept. e Einstürzende Neubauten do que para as refracções vítreas da guitarra que ilustram parte da sua discografia. “Jazz”, é claro, é obra-prima à parte. No fundo é como se Ry Cooder estivesse aqui a sacudir uma imagem “clean” que apenas em ínfima medida é a sua, lembrando, a quem já o tinha esquecido, a sua colaboração no passado com um dos primeiros profetas da dissonância, Don Van Vliet, mais conhecido por Captain Beefheart. Dos quadros ambientais e corrosivos de “Orgill bros.”, “Totally boxed in” e “We’re rich” (semelhança com a música de Peter Principle) e das percussões industriais de “Trespass” (main title)”, “Goose and lucky”, “Give’em cops” e “Lucky in the trunk” às duas canções que fecham o disco, “King of the street” e “Party lights” (dedicatória nocturna à “country music”, com Van Dyke Parks, nome mítico da moderna música americana e seu amigo de longa data). “Trespass”, com o trompete de Jon Hassell sempre discreto mas determinante na criação da trama ambiental, funciona como um martelo-pilão que esmaga por completo qualquer preconceito que pudesse subsistir sobre a música de Ry Cooder. Longe ficaram desta vez a respiração dos grandes espaços e a limpidez de uma guitarra de cristal. (7)