Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #107 – “Excepcionais discos prog por aí à venda em saldos__ (FM)”

#107 – “Excepcionais discos prog por aí à venda em saldos__ (FM)”

Fernando Magalhães
14.05.2002 180641
Muita atenção aos CDs de Progressivo/Krautrock/experimental que vão aparecendo na Neon Records (ou loja do Chico Punk, no C.C. Portugália).

Andam por lá neste momento discos que recomendo vivamente, tais como:

5 UU’s: Bel Marduk & Tiamat/Elements – Os dois primeiros álbuns reunidos num CD desta banda contemporânea herdeira da pop vanguardista dos Gentle Giant.

DEDALUS: Dedalus – banda italiana dos anos 70. Disco inteiramente instrumental de um jazz cerebral que evoca, de forma ainda mais experimental, a música dos Soft Machine dos álbuns “Fourth” e “5”.

FAIRFIELD PARLOUR: From Home to Home – Um clássico dos anos 70 na vertente psicadelismo soft com tonalidades folk. Imaginem um cruzamento dos Beatles com Syd Barrett e os Incredible String Band…

Mais THE RED KRAYOLA, SNAKEFINGER (o guitarrista e ex-colaborador dos Residents – já morreu – em dois álbuns num CD, em versão digipak de luxo), RESIDENTS (“The Third Reich ‘n’ Roll”), MYTHOS (“Mythos” – krautrock)…

FM

dubturn
14.05.2002 190710
Fernando,

Conheci recentemente os Red Krayola (através do tema ‘Hurricane Fighter Plane’)… fiquei cheio de vontade de conhecer mais.

Dub

Fernando Magalhães
14.05.2002 180641
São uma boa banda.
Começaram por ser no final dos anos 70 uma espécie de “irmão pobre” dos PERE UBU, no álbum “Soldier-talk” (psycho-garage em versão militarista) até se tornarem no que são hoje – dignos representantes do pós-rock, nos recentes “Hazel” e “Fingerpainting”, onde figuram alguns dos nomes mais importantes da escola de Chicago (leia-se os papas Jim O’Rourke e John McEntire…).

FM

Vários (KGA, Plastic People, Istvan Martha, Der Expander Des Fortschritts, Boris Kovak) – “A Leste Tudo De Novo”

BLITZ 6 MARÇO 1990 >> Valores Selados


A LESTE TUDO DE NOVO

Não há dúvida que novos ventos sopram do Leste. De feição, no caso da música. Novos sons vão invadindo o Ocidente, suscetíveis de injetar sangue novo no panorama das músicas alternativas independentes europeias. Os apaixonados pelos sons originais das «Outras esferas» já não tinham mãos e ouvidos a medir, perdidos no meio das dezenas e dezenas de bons discos produzidos um pouco por todo o lado à margem das estratégias comerciais. Se o ritmo já era difícil de acompanhar, agora é preciso contar também com a brigada (ex)vermellha.

No princípio eram os novos totalitaristas como os Laibach ou os Last Few Days, operários, radicais, provocadores, subversivos e estimulantemente violentos. Os primeiros, depois de alguns desvios que deram mau resultado, regressaram às trombetas e fanfarras militaristas iniciais, agora rotulados com o selo de qualidade de «Novos clássicos». Em todo o caso, o mais recente «MacBeth» não envergonha os seus autores quando comparado com o ponto máximo que foi o estreante «Nova Akropola».
Quanto aos Last Few Days substituíram as sirenes, megafones e «slogans» anarquistas pelos ritmos, pelo menos mais rentáveis, da dança. Mudam-se os tempos, mudam-se as subversões…
Dos Holy Toy, polacos mas liderados por um norueguês (Lars Pedersen), nada mais se soube, após uma série de bons álbuns e a obra-prima «diferente de tudo» assinada por Lars, «Death in the Blue Lake». E já que falamos de obras-primas convirá não esquecer essa outra que é «Insect Culture» dos soviéticos Popular Mechanics, de Sergei Kuriokhin.
Saliência ainda, na área do jazz, para a obra dos Ganelin Trio e para os projetos, conotados com a música concreta e eletroacústica, do grupo de percussão húngaro Amadinda, do checoslovaco Jaroslav Krcek («Raab») e deste músico juntamente com Georg Katzer (Alemanha Democrática) e Zygmunt Krause (Polónia) num mesmo álbum gravado para a Recommended («Aide Mémoire/Folk Music/Sonaty Slavickove»).
Recommended Records que se mantém, como habitualmente, atenta a todos os novos sons do Mundo e, neste caso particular, aos do leste europeu. Paralelamente à distribuição de uma revista de divulgação e apoio aos novos projetos e ideias oriundos daquelas regiões, associou-se à editora Points East, distribuindo para o Ocidente todos os seus discos. Os mais recentes valem todos a pena e estarão brevemente disponíveis na discoteca Contraverso que, por sinal, acabou de receber nova remessa de maravilhas com a chancela de qualidade «Recommended». Aqui vão entretanto algumas indicações sobre novos discos dos nossos amigos do Leste:

BORIS KOVAK: Ritual Nova 2
Segunda parte do dito ritual. Música tradicional jugoslava, eletrónica, sopros, sons ambientais, cântico gregoriano e sérvio, leituras do Corão (em fita ou sampladas). Ritual dividido em duas partes: «Dream of the Origine» e «Origine of the Dream», com várias secções de títulos místicos como «All under the Celestial Cap», «Sacred Millstone» ou «Mandala». Crescendos rítmicos e corais desembocando em episódios mais contemplativos, próximos dos de John Surman ou Stephan Micus. Delicioso.
Instrumentação: Sampler, Sax soprano, clarinete baixo, taragato (instr. Trad.), cítara (não confundir com a sitar indiana), percussão, violoncelo, fitas, vozes.
Referências: ECM (Micus, Surman), música étnica, Musci/Venosta, música religiosa medieval, Terry Riley, Laraaji.

DER EXPANDER DES FORTSCHRITTS (Alemanha Democrática): Álbum estreia com o mesmo nome
Oriundos de Berlim e destinados a espantar muita gente. Músicos fabulosos combinam todos os seus talentos na construção de labirintos sonoros com múltiplas entradas/saídas. Síntese de esquisitas manipulações eletrónicas com a decadência do cabaré berlinense, o free-jazz, vozes parasitárias e canções à beira da demência. A heterogeneidade completamente assumida e assimilada resultando numa música excitante e verdadeiramente original. A letra de um dos temas é retirada de um texto do filósofo Friedrich Nietzsche.
Instrumentação: Vozes, fitas, percussão, piano, saxofones, flauta, teclas/eletrónica, baixo e guitarra.
Referências: Cassiber, Goebbels & Harth, Fred Frith, Cabaré, Dada.

ISTVAN MARTHA (Hungria): Támad Aszél
Obra de grande fôlego denominada «Diário de som eletrónico» pelo próprio compositor. Longa suite subdividida em várias partes, contando com a participação de Marta Sebestyén e dos «Amadinda», entre dezenas de outros músicos importantes da cena underground magiar. À semelhança de Boris Kovak, o ponto de partida é a música tradicional (neste caso a húngara), reinterpretada e inserida num contexto atual. Polifonias vocais complexas e grandiosas e um aproveitamento de todos os sons planetários disponíveis, contribuem para a construção de um monumental edifício sonoro onde, mais uma vez, imperam as sínteses de estilos e épocas diversificados.
Instrumentação: Saxofones, flauta, trompa, shawn (instr. medieval de sopro), vocoder, bateria, guitarra, sintetizadores, trombone, órgão, violoncelo, sanfona, gaita-de-foles e harpa, mais o quarteto de cordas «Mandel» e o grupo de percussão «Amadinda».
Referências: Toda a música, desde a Idade Média até à Idade Digital.

PLASTIC PEOPLE (Checoslováquia): Midnight Mouse
Também conhecidos pelo nome completo Plastic People of the Universe. Já existem e gravam discos há uns bons aninhos. Politicamente empenhados e praticantes de um «jazz» híbrido construído à base dos sopros e de um velhinho sintetizador analógico «Korg». Superam todas as limitações técnicas com a originalidade dos arranjos, algures entre Carla Bley e os Henry Cow.
Instrumentação: bateria, trombone, baixo, vozes, sintetizador «Korg», violino e viola-de-arco eletrificados, guitarra, clarinete, clarinete baixo, flauta.
Referências: Fanfarras, música de feira, Carla Bley, Henry Cow.

KGA (URSS): ZGA
O vocábulo «ZGA» só existe na língua russa na forma negativa. Num sentido mais lato pode significar «ver». Os ZGA são niilistas até dizer chega, impenetráveis e incómodos. O álbum foi gravado ao vivo num apartamento na cidade de Riga e consta basicamente de ruído mais ou menos controlado com incursões na música dita industrial. Improvisações corrosivas e tortuosas levam a experimentação eletroacústica aos limites do intolerável.
Instrumentação: Clarinete, Ring Modulator, teclas, objetos de metal, percussão, baixo, bateria, vozes.
Influências assumidas: Biota/Mnemonists, Cassiber, John Zorn, Nurse With Wound, Henry Kaiser, John Cage, Ned Rothenberg, Luciano Berio.
Glasnost, Perestroika, Gorbachev, Vodka, até para a semana com os Kraftwerk.

Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #106 – “White Noise An Electric Storm (FM)”

#106 – “White Noise An Electric Storm (FM)”

Fernando Magalhães
10.05.2002 170500
WHITE NOISE: An Electric Storm (1969)

Trata-se, nunca é demais repeti-lo, do disco pioneiro (embora absolutamente irrepetível e avesso a recuperações…), mais mórbido, divertido, perturbante e fantasmagórico de toda a pop eletrónica.

O tema “The visitation” é uma coise simultaneamente sublime, sensual e medonha (o fantasma de um namorado acabado de morrer por atropelamento que tenta desesperadamente contactar com a sua apaixonada: sons repetidos de um carro que derrapa, suspiros, gritos, ecos, uma voz do além-túmulo segredando promessas de amor eterno, ela à espera para sempre, tudo isto servido por uma melodia do outro mundo e efeitos eletrónicos de cortar a respiração!).

Há ainda uma “Missa negra no inferno” (orgia de percussões e eletrónica, com a presença do improvisador inglês Paul Lytton), pop eletrónica viciante (“Firebird” – “fly me, fly high…psicadelismo astral, único!), erotismo e orgasmos sintetizados e uma sequência/colagem hilariante (“Here come the fleas”).

Quem tem, que se acuse! 🙂

FM