Arquivo mensal: Agosto 2017

Dave’s True Story – “Sex Without Bodies”

Sons

16 de Julho 1999
DISCOS – POP ROCK


Dave’s True Story
Sex without Bodies (8)
Chesky, distri. Ajasom


dts

O compositor David Cantor e a cantora Kelly Flint formam o duo Dave’s True Story cuja génese remonta a uma noite regada a álcool num bar da parte baixa de Manhattan em Nova-Iorque. No início de 1994 a dupla gravou o seu álbum de estreia, “Dave’s True Story”, conquistando nesse mesmo ano o prémio Kerrville New Music, depois de, nos anos anteriores, este galardão ter sido atribuído a Lyle Lovett, Suzanne Vega e Michelle Shocked. Dave e Kelly definem a sua música como “beat-lounge” e a crítica nova-iorquina enfiou-os naquilo a que chama cultura “neo-cocktail”, definindo a voz de Kelly como uma combinação de pêssegos e licor Cointreau. “Sex without Bodies” mistura num copo alto Astrud Gilberto, Julie London, Peggy Lee e Chet Baker, com muito sal do mar, chantilly jaz e uma cereja pop no topo. “Baby talk”, “Spasm”, “Once had a woman”, “Repentant” e “Nirvana” lançam-nos para o meio de um “drive-in”, para uma piscina de vibrafones, para o fogo de um trompete trôpego. Em “Rue de Lappe”, o cenário muda no fole de um acordeão para um baile musette de Paris do princípio do século. Depois, a voz de mil especiarias e respiração de nuvens, de Kelly Flint mostra-nos a existência de uma sensualidade sem carne, no título-tema, “sexo sem corpos”, uma bossa-nova de swing absolutamente transparente: “sexo sem corpo, sexo sem ódio, de uma paixão impossível de descrever por palavras”. Mesmo a versão de “Walk on the wild side”, de Lou Reed, mergulha na mesma névoa inebriante. O disco perfeito para este Verão.



The Lothars – “Meet the Lothars”

Sons

10 de Setembro 1999
POP ROCK


The Lothars
Meet the Lothars (6)
Camera Obscura, distri. Matéria Prima/Ananana


lot

Os Lothars representam o lado mais artesanal e, por vezes, fascinante, do pós-rock. Armados os três de “theremins” (aparelho electrónico anterior aos sintetizadores, popularizado por “Good vibrations”, dos Beach Boys, e actualmente de novo em voga), Kris Thompson, Jon Bernhardt e Brendan Quinn, juntamente com a guitarra de Ramona Herboldsheimer, desenham um “space-rock” “kitsch”, algures entre os Laika e a mecânica sem rodas dentadas dos Stars of the Lid. A fórmula repete-se de faixa para faixa: uma guitarra eléctrica dormente e sem grandes pretensões melódicas arrasta-se sobre a massa de efeitos criados pelo conjunto de “theremins”, sem dúvida, as estrelas da companhia que, na maior parte do tempo, se entretém a fazer o tipo de glissandos cósmicos que os Hawkwind produziam com os seus osciladores, há quase 30 anos, em álbuns como “In Search of Space”. Mas há um lado apelativo nesta música instrumental que parece derreter-se no próprio instante em que nasce, sugada pelo buraco negro da obsessão pelo arcaísmo dos “theremins”: uma estranheza que, num tema como “The cat & the mean old man”, lembra as disformidades pop dos Pere Ubu, para em “Trem, as well” se perder definitivamente nas trevas do espaço exterior, enquanto o violino de Brendan Quinn empresta a “The coronation of king Lothar” um tom velvetiano. Mas faltam astros à galáxia inóspita dos Lothars. Mesmo assim, os interessados podem encomendar, via Internet, “t-shirts” e miniaturas em barro de “theremins” confeccionados pelo grupo.



Scanner – “Lauwarm Instrumentals” + Slab – “Ripsnorter” + Novisad – “Novisad”

Sons

24 de Setembro 1999
POP ROCK


Scanner
Lauwarm Instrumentals (7)
Drag City, distri. Ananana

Slab
Ripsnorter (6)
Hydrogen Jukebox, distri. MVM

Novisad
Novisad (7)
.Tom, distri. Matéria Prima/Ananana

scanner

slab

novisadScanner, Novisad, Slab

Entre a proliferação crescente de bandas na área da chamada “electrónica” torna-se cada vez mais problemática a distinção de estéticas autónomas e de projectos capazes de emancipar-se da rápida cristalização enquanto demonstrativos de determinada corrente ou movimento. “Drum ‘n’ bass”, tecno, pós-rock e outras catalogações afins tornaram-se fórmulas limitativas, sobretudo ao nível rítmico, às quais é difícil escapar. Entretanto, um ou outro artista lá vai conseguindo evidenciar margens maiores de criatividade, para além da constante renovação tecnológica que esconde muita coisa. Scanner, Slab e Novisad são três projectos de electrónica que tentam escapar com êxito relativo a estas malhas.
Os Scanner, ou seja, Robin Rimbaud, (ligações anteriores aos Nonplace Urban Field, David Toop, Coil, Laurie Anderson, Terre Thaemlitz, DJ Spooky e Combustible Edison) começam por trabalhar um pedaço da memória de “The Faust Tapes”, dos Faust, para chegarem a um “dark industrial ambient” que remete para Peter Frohmader, Asmus Tietchens ou os Coil, em versão jungle.
Na mesma escuridão dos Scanner, movimentam-se os Slab, Lol Hammond e Nina Walsh, com a diferença de que, neste caso, não conseguem disfarçar a dependência das batidas de dança, nomeadamente o hip e o trip-hop, que misturam com elementos de música de filmes dos anos 60, funk ou tecnopop. Interessante mas dispensável.
Por fim, os Novisad, aliás Kristian Peters, são ainda mais sombrios, inserindo-se num industrial obscuro que tanto evoca a vertente telúrica de Jeff Greinke como as construções em aço de Konrad Kraft ou (em “Membran”) a rigorosa – e saborosa – metalurgia dos Esplendor Geometrico.