pop rock >> quarta-feira >> 01.02.1995
A LUA SOBRE OS MONTES
NÉ LADEIRAS
C. C. Belém – Lisboa – Quinta – 23 – 22h

“traz os Montes” vem até Belém. O novo disco de Né Ladeiras tem a sua apresentação ao vivo marcada para o Centro Cultural de Belém (CCB), no Grande Auditório, a 23 de Fevereiro, numa co-produção da Fundação das Descobertas / CCB e Encore. O espectáculo terá cerca de hora e meia de duração e contará, como convidados, com o músico transmontano Amadeu Magalhães, membro dos Realejo, e um grupo de pauliteiros da Associação Académica de Coimbra, que “tem feito recolha em termos de dança em Trás-os-Montes”. “Vão dançar llaços [dança típica transmontana] e trazer adereços típicos da região, como os caretos ou os gigantones, utilizados nas festas populares”, explica a cantora. Está ainda planeada uma coreografia, pelos pauliteiros, de “Pingacho”, um tema de “Traz os Montes”, o único dançado por homens e mulheres, já que “normalmente os llaços são só dançados por oito ou 16 homens”.
Além da totalidade dos temas de “Traz os Montes”, Né Ladeiras incluirá outros que não constam do disco, como “Morgadinha dos canibais” e “Ai se a Luzia”, ambos da Banda do Casaco, de que fez parte, e “Marião”, da Brigada Victor Jara, grupo de música portuguesa de raiz tradicional com o qual a cantora gravou, em 1976, o primeiro álbum da banda, “Eito Fora”. Os arranjos vão diferir pouco dos do disco, estando os acompanhamentos vocais – alguns em mirandês -, de cariz tradicional, entregues a um coro formado por Isabel Bernardo e Genoveva Faísca. “Cantar os temas sozinha, não iria ter piada nenhuma.” As diferenças mais significativas terão lugar, por exemplo, em temas como “Argila de luz”, com um arranjo “totalmente diferente, mais moderno do que aquele que foi gravado em 1976”, e “Ai se a Luzia”, “mais próximo da cor musical que os músicos do concerto representam”. Os acompanhantes de Né Ladeiras no CCB serão, além dos já citados, Manuel Rocha (Brigada Victor Jara e Realejo), no violino, Victor Milhanas, baixo, André Sousa Machado, bateria, Joaquim Teles (Quiné), percussões, Ricardo Dias, piano, outros teclados e voz, e António Pinto, guitarra. A direcção musical e os arranjos estão a cargo de Ricardo Dias e Galandum.
Considerado unanimemente pela crítica um dos melhores álbuns de música portuguesa editados no anos passado, “Traz os Montes” não está, estranhamente, a obter em termos de vendas, resultados correspondentes. Exceptuando a primeira edição, lançada em Novembro, “que esgotou logo”, depois do Natal, diz a cantora, “deixou de haver [discos à venda]”. “É uma coisa que me está a espantar imenso, porque não consigo encontrar discos em lado nenhum. No Norte, já me dei ao cuidado de verificar que o álbum não está a ser bem distribuído. A partir daqui, estamos a começar a ter problemas. Já me vieram perguntar na rua o que é que se passa. Perguntam-me onde é que podem comprar o disco e fico sem resposta.” Para a cantora, o problema não está nas discotecas, “que têm feito pedidos ininterruptamente para os CD serem recolocados”, mas na distribuição, uma vez que tais pedidos “têm demorado muito a ser atendidos ou então simplesmente não são respondidos”. Luís Pedro Fonseca, da Alma Lusa, responsável pela supervisão artística do próximo concerto no CCB, já teve uma reunião com responsáveis da distribuidora, a EMI – Valentim de Carvalho, e a própria cantora tenciona fazer o mesmo, no sentido de “ser esclarecida” do que se passa.
Enquanto o disco não regressa aos escaparates, vale a pena encontrar ao vivo os caminhos da Tradição, à luz da voz e da música mágicas de Né Ladeiras. Depois do concerto do CCB, nada será como dantes. Para a navegante lunar das montanhas enfeitiçadas do Norte, a intenção é “não ficar por aqui e continuar”, embora “Traz os Montes”, como diz, “tenha acabado de nascer”: “É um bebé que temos de alimentar e fazer crescer.” Um bebé que, inclusive, poderá crescer no estrangeiro, uma vez que existem já “vários contactos feitos pela produtora, a Encore, com festivais de música tradicional”, além de que foram enviadas, pela Alma Lusa, para diversas editoras europeias, amostras do disco que têm sido “muito bem recebidas”. “Estão a ficar muito entusiasmados com este som português.” Né Ladeiras planeia ainda, num futuro próximo, ver editada num compacto duplo a sua discografia anterior a “Traz os Montes”: “Sonho Azul”, “Alhur”, “Corsária” e “Ana e as suas irmãs”.





