Arquivo mensal: Novembro 2022

Vários – “Música Das Terras Altas” (mundo da canção)

Pop-Rock / Quarta-Feira, 01.05.1991


MÚSICA DAS TERRAS ALTAS



“O Porto é um mundo” – dizem os que lá vivem. É bem verdade. E dentro desse mundo há a Mundo da Canção, importadora e distribuidora portuense vocacionada para as músicas menos imediatistas, nomeadamente o jazz, a contemporânea e a tradicional. Sobretudo neste último campo, tem sido exemplar o trabalho empreendido pela Mundo da Canção, representante entre nós de catálogos importantes que abrangem grande parte do périplo celta, como é o caso das editoras Temple (escocesa), Hannibal (inglesa), Claddagh (irlandesa) ou, mais recentemente, a Edigal (galega). Portugal, é óbvio, tem estado presente nos projectos da casa. Refira-se, como exemplo, que “Terreiro das Bruxas”, segundo e excelente álbum dos Vai de Roda, editado pela UPAV, muito deve, em termos de apoio e divulgação, aos esforços empenhados dos responsáveis da Mundo da Canção. De raiz mais étnica são os álbuns “Terra do Marão”, pela tuna O Toque de Carvalhais, e o volume seis da série Música Tradicional, “Terra de Miranda”, ambos editados no selo madrileno Saga e distribuídos pela Mundo da Canção. “Terra do Marão”, com produção, coordenação e investigação a cargo de Salustiano Lopes e António Tentúgal (mentor dos Vai de Roda), recolhe temas tradicionais de Carvalhais, freguesia de Louredo, concelho de Santa Maria de Penaguião, distrito de Vila Real, na fronteira das províncias de Trás-Os-Montes e Ato Douro, em plena serra do Marão, interpretados pela tuna da aldeia. As tunas são conjuntos instrumentais populares de cordas e sopros, ao “serviço da música de feição meramente profana”, cujos elementos “lutam contra os ‘altifalantes’ que lhes abafam completamente os instrumentos e as mentes”. A de O Toque de Carvalhais toca a música da serra e da aldeia que “jaz aos pés do monstro, situada num dos seus fossos mais profundos”. De Carvalhais, onde “ao crepúsculo de um dia de sol melhor se vê a silhueta da mulher deitada na serra”. “Terra de Miranda” recupera o dialecto mirandês, os instrumentos artesanais e as vozes rudes de homens e mulheres cujos corpos e almas se confundem com a própria matéria de que o mundo é feito. Nos lugares de Póvoa, Duas Igrejas, Constantim e Paradela. Escutar as melopeias e cadências ancestrais transmontanas é sentir a vida a fluir, pulsando ao ritmo das gaitas e dos bombos. É sentir o sabor do sangue.

Fernando Magalhães no “Fórum Sons” – Intervenção #118 – “Pós-punk Lista (FM)”

#118 – “Pós-punk Lista (FM)”

Fernando Magalhães
24.06.2002 160406
Pós-Punk e…

Os discos que a seguir se apresentam são, essencialmente, derivações ou reacções à atitude e/ou estética punk. Entre o rock industrial e a coldwave, o art-rock e a electropop. Alguma desta música nasce historicamente do punk. Outra já vem de trás mas relaciona-se historicamente com ele. Em comum têm a recusa do primarismo e a vontade de propor novos caminhos, sejam eles tão niilistas como a “industrial music” ou apostados no resurgimento da complexidade e onirismo do Progressivo. Até mesmo na ressurreição da pop clássica dos anos 60 (caso dos Monochrome Set) ou do rock (Anthony Moore) Depois, entre 1978 e 1980, a electrónica e as máquinas ganharam espaço de manobra, a temperatura baixou. Mais cérebro e menos coração…Coisas terríveis surgiram, outras simplesmente coincidentes com o espírito da época. Outras ainda namorando descaradamente o desconhecido que ainda hoje não tem nome.

ANTHONY MOORE: Flying doesn’t Help (1979)
ART BEARS: Hopes and Fears (1978)
Winter Songs (1979)
ART ZOYD: Musique pour l’Odyssée (1979)
BRIAN ENO: Before and After Science (1977)
CABARET VOLTAIRE: Mix-up (1979)
Voice of America (1980)
CHROME – Half Machine Lip Moves (1978)
Red Exposure (1980)
CLUSTER & ENO: Cluster & Eno (1977)
CONRAD SCHNITZLER: Blue Glow (1979)
CONVENTUM: A L’Affut d’un Complot (1977)
Le Bureau Central des Utopies (1979)
DAEVID ALLEN: Opium for the People (1978)
DAVID BOWIE: Low (1977)
Heroes (1978)
Lodger (1979)
DEVO: Q: Are we not Men? We are Devo! (1978)
Duty now for the Future (1979)
ENO, MOEBIUS, ROEDELIUS: After the Heat (1978)
ESKATON: 4 Visions (1979)
ETRON FOU LELOUBLAN: Batelages (1977)
FAD GADGET: Incontinent
Under the Flag
THE FLYING LIZARDS: The Flying Lizards (1980)
GLENN BRANCA – The Ascension (1981)
HELDON: Un Rêve sans Conséquence Spécial (1976)
Interface (1977)
Stand by (19799
HENRY COW: Western Culture (1979)
HUMAN LEAGUE (THE) – Reproduction (1979)
Travelogue (1980)
IGGY POP: The Idiot (1977)
KRAFTWERK: Trans Europe Express (1977)
The Man Machine (1978)
LEGENDARY PINK DOTS: Island of Jewels
L. VOAG: The Way out (1979)
MARTIN REV – Martin Rev (1980)
MOEBIUS & PLANK – Rastakraut Pasta (1980)
– Material (1981)
MONOCHROME SET (THE) – Strange Boutique (1980)
– Love Zombies (1980)
– Eligible Bachelors (1982)
NEGATIVLAND – Negativland (1980)
Points (1981)
NEW YORK GONG : About Time (1979)
PERE UBU – The Modern Dance (1978)
Dub Housing (1978)
New Picnic Time (1979)
The Art of Walking (1980)
PETER HAMMILL – The Future now (1978)
PH7 (1979)
A Black Box (1980)
THE RESIDENTS: Not Available (1978)
Fingerprince (1979)
Eskimo (1979)
RICHARD PINHAS – Rhizosphère (1977)
Chronolyse (1978)
Iceland (1979)
ROBERT FRIPP: Exposure (1979)
SNAKEFINGER – Greener Postures (1980)
SUICIDE: Suicide (1977)
Alan Vega – Martin Rev – Suicide (1980)
TALKING HEADS – More Songs about Buildings and Food (1978)
Fear of Music (1979)
TELEX: Neurovision
THIS HEAT – This Heat (1979)
Deceit (1981)
THOMAS LEER & ROBERT RENTAL: The Bridge (1979)
TUXEDOMOON – Half-Mute (1980)
– Desire (1981)
UNIVERS ZERO: Hérésie (1979)
Ceux du Dehors (1980)
URBAN SAX: Urban Sax (1977)
VAN DER GRAAF: The Quiet Zone/The Pleasure Dome (1977)
WALL OF VOODOO: Dark Continent
Call of the West
ZNR: Barricade 3 (1977)
Traite de Mécanique Populaire (1979)

FM

Paco de Lucia – “Zyryab”

Pop-Rock / Quarta-Feira, 17.04.1991


Paco de Lucia
Zyryab
LP / MC e CD, Philips, distri. Polygram



Ao lado de Manitas de Plata, Paco de Lucia faz papel de grande embaixador do flamenco no mundo. Ao contrário de Manitas ou do menos conhecido (mas não menos importante) Pepe Habichuela, conservadores na atitude e no estilo, Paco de Lucia investe em áreas que só indirectamente têm a ver com a música cigana, como o jazzou a canção de tons mais ligeiros (quem nunca trauteou “solo quiero caminhar”?). Com John McLaughlin (com quem partilha um estilo particular de fraseado) e Al Di Meola, gravou um álbum exclusivamente dedicado às possibilidades da guitarra. “Zyryab” revela-se ecléctico no modo como aborda as típicas bulerias, tarantas, rumbas ou fandangos ciganos, através de uma liberdade formal que não receia juntar o discurso ortodoxo do flamenco às divagações jazz-rock ou a incursões mais marcadamente arabizantes, como acontece no título-tema “Zyryab”, valorizado ainda mais pela participação pianística de Chick Corea. ****