Tejedor + Lenga-Lenga + Dervish – “Irmãos Tejedor Levam Sendim À Loucura” (concertos / festivais)

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segunda-feira, 4 Agosto 2003

Irmãos Tejedor levam Sendim à loucura

LENGA-LENGA, LEILIA, TEJEDOR

Sendim, recinto principal
Sexta, dia 1, às 22h
Cerca de 2000 pessoas



Os irlandeses Dervish (em cima) e os Lenga-Lenga


Inacreditável. I-n-a-c-r-e-d-i-t-á-v-e-l! É o mínimo que se pode dizer do virtuosismo de José Manuel Tejedor, gaiteiro dos Tejedor, grupo asturiano que na tórrida noite de sexta-feira fechou o primeiro dia do festival Intercéltico de Sendim, que terminou ontem com a celebração, na igreja paroquial, de uma Missa Intercéltica.
Há muitos anos que não assistíamos a uma demonstração deste nível. Nas danças tradicionais mas, sobretudo, em duas peças solistas que recordaremos por muitos anos, José Manuel Tejedor foi simplesmente assombroso, num desempenho na gaita asturiana que deixou o público, positivamente, de rastos.
Vencedor quatro anos do troféu Macallan, no Festival de Lorient, na Bretanha, José Manuel Tejedor alia uma técnica irrepreensível a um estilo que tira o máximo partido da típica digitação fechada da gaita-de-foles das Astúrias. Não será por acaso que lhe chamam o “Induráin da gaita”, tal a velocidade e a força da sua execução. Mas toda a atuação do grupo foi de altíssimo nível, dos outros dois irmãos Tejedor – Javier (acordeão diatónico, percussões, gaita) e Eva (voz e percussões) – aos convidados (incluindo Igor Médio, dos Felpeyu, no bouzouki), pondo a assistência a dançar, a fazer rodas e a gritar de entusiasmo.
Isto é, de resto, outra das coisas inacreditáveis deste Intercéltico de Sendim. Há um ambiente que não se descreve mas se vive a cada momento. No recinto do concerto (que no sábado rebentou pelas costuras para assistir aos irlandeses Dervish), mas também nas ruas, nos cafés, em todo o lado, sente-se o “celtismo” da região, exacerbado pelo festival. Em cada canto respira-se música e ouve-se o som de gaitas-de-foles tocadas por músicos amadores.
No pequeno largo em frente ao restaurante Gabriela, onde se come uma divinal posta sendinesa (atenção, nunca chamar, aqui, mirandês ou mirandesa ao que quer que seja, pois a rivalidade entre Sendim e Miranda do Douro é feroz…), grupos de forasteiros misturam-se com a população local, convivendo ao som da música céltica. Os sendineses amam a sua terra e fazem questão de o mostrar.
À noite é igual. Tio Ângelo Arribas, construtor e tocador de gaita, entra no terreiro à frente do grupo dos melhores alunos do curso de gaita mirandesa que lecionou durante o ano no Centro de Música Tradicional Sons da Terra. Os miúdos tocam, orgulhosos, cinco temas tradicionais. E afinados – vai-se fazendo escola na arte de construir e tocar a gaita de Miranda.
Henrique Fernandes, gaiteiro da terra, apresentou, a abrir o festival, um programa especial que, além do trio habitual de gaita, bombo e caixa, incluiu um grupo de pauliteiros e cantoras convidadas. A “Alvorada” com que abriu, a solo, as hostilidades, foi a melhor que alguma vez lhe ouvimos tocar. As Leilia vieram a seguir da Galiza dizer que ficou para trás o tempo em que eram “apenas” o mais conceituado grupo de cantoras e pandeireteiras da sua região. Agora a sua música tem a acompanhá-la um grupo instrumental o que, se não melhora substancialmente a qualidade, tem a virtude de tornar o som ritmicamente mais cheio e acessível.
Mas Sendim é Sendim e tudo o que é da casa tem o gosto e a cor das coisas amadas. Numa das tendas instaladas no recinto, tio Ângelo Arribas não perde uma oportunidade de tocar para os curiosos e de mostrar a qualidade de fabrico dos seus instrumentos (gaitas mas também ponteiras e flautas – “fraitas” – pastoris). Mais embevecido fica quando duas belíssimas louras vindas da região “inimiga” de Miranda do Douro, se colocam ao pé de si, uma de cada lado, para se deixarem fotografar os três. Chamam-se Marta e Inês e, apesar de terem adorado o concerto dos Tejedor, torcem o nariz ao “show” de virtuosismo do seu gaiteiro: “Estamos habituadas e gostamos é de ouvir o som das gaitas da nossa região.” Mas reconhecem que tocar da maneira como o faz José Manuel Tejedor, “tem que se lhe diga”. Consumado o programa oficial do primeiro dia, seguiu-se a folia, na Taberna dos Celtas que fica mesmo ao lado.
Houve loucura etílica e musical completa, potenciada pelo calor. Gaiteiros saltam para cima das mesas (entre os quais Henrique Fernandes) e percussionistas, profissionais e improvisados, por todo o lado, criando uma atmosfera guerreira e tribal. Canta-se e bate-se nas mesas, dança-se e grita-se, a música mal se ouve, por vezes, no meio da confusão. No exterior, a mesma coisa, mais gaiteiros, vindos não se sabe de onde. O nascer do sol aproxima-se mas ninguém parece dar-se conta. Sendim está febril. O Intercéltico fez da terra uma rainha transmontana.

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