Luar Na Lubre – “Ara-Solis”

Pop Rock

19 de Julho de 1995
Álbuns world

“Dun tempo para sempre”

LUAR NA LUBRE
Ara-Solis (10)

Sons Galiza, distri. MC-Mundo da Canção


lnl

Nesta altura, os que já conhecem este grupo galego, e ainda mais os que tiveram oportunidade de assistir à sua actuação no Intercéltico de Abril passado, já deverão ter adquirido o disco e perguntado por que razão é que “o gajo do PÚBLICO” ainda não escreveu nada sobre ele. Têm toda a razão. As razões do atraso são as do costume: falta de espaço e excesso de oferta. Mas os outros, os que não fazem a mínima ideia de quem são os Luar na Lubre nem ouviram os anteriores “O Son do Ar” e “Beira-Atlântica”, merecem que recapitulemos este novo trabalho de uma das melhores bandas do actual circuito tradicional da Galiza.
Os Luar na Lubre vão pelo caminho que poderia ser hoje o dos Milladoiro, se estes não tivessem, a determinada altura, enveredado pela via do classicismo. Domínio perfeito da linguagem tradicional e um bom-gosto inexcedível nos arranjos, plenos de energia e subtilezas escondidas, conferem à música do grupo um grau de alta qualidade. Em termos individuais merece ser referido o fenomenal desempenho de Bieito Romero, na “gaita”. Na “Muiñera de Malpica” inicial consegue mesmo ser empolgante, o mesmo acontecendo em “Muiñeira de Poio”, com um balanço imparável, ou no tom “processional” (mais arrastado e apoiado no bordão) de “Marcha procesional de Mato”. No extremo posto da escala de timbres, a saliência vai para a harpa, clara e luminosa, de Cris Gandara, simplesmente em estado de encantamento na composição da sua autoria, “Nodaiga”. Com meios instrumentais riquíssimos à sua disposição (harpa, acordeão, bouzouki, violino, flauta, contrabaixo, gaita-de-foles galega e de Northumbrian…) e a capacidade para os aproveitar da melhor maneira, os Luar na Lubre têm o céu ao alcance da mão. E a poesia, que se desprende dos versos de “Dun tempo para sempre”, cantados por Ana Espinosa, sobre a cadência mágica de um “alalá”, ou “ailalelo” (cântico tradicional ancestral da Galiza): “Cando atoparemos/ druidas envoltos/ nos fumes das lubres/ nos bosques de emain? E o luar enfeitizado/ polas sombras que ainda emerxen/ da última noite/ noite de luar. Soños galopando/ xa rachan co silencio/ e o vento assubia/ acordes de alalás.” Um clássico.



Boys Of The Lough – “The Day Dawn”

Pop Rock

19 de Julho de 1995
Álbuns world

Boys of the Lough
The Day Dawn

LOUGH, DISTRI. MC-MUNDO DA CANÇÃO


bl

Já vem um bocadito atrasada esta crítica, mas, como diz o ditado, “mais vale tarde do que cedo”; por isso, e porque não queremos que falte ao leitor informação sobre os discos que consideramos importantes, aqui vai alguma prosa sobre o novo (bem, há uns meses era novo…) dos Boys, que já não o são tanto como isso. É o álbum da ruptura suave, do envelhecimento com classe. Desceram as rotações mas aumentou o grau de amizade por tradições afastadas do calor dos velhos “pubs” da Irlanda e da Escócia. O Inverno e os seus rituais, pagãos ou cristãos, do Natal e do Ano Novo, como são ou eram celebrados em diversas regiões do Norte da Europa, erguem-se espectrais sobre as litanias religiosas de “The Day Dawn”, maioritariamente centrado na tradição das ilhas Shetland, berço do violinista do grupo, Aly Bain. Uma aproximação temática nos antípodas da alucinação fusionista empreendida, sobre o mesmo tema, por Hector Zazou, no seu mais recente projecto, “Chansons des Mers Froids”. Os Boys of the Lough caminharam sobre as montanhas cobertas de neve, navegaram pelos mares gelados, tão longe quanto os levaram uma dança esquimó ou uma balada sueca, para finalmente virem aquecer-se no fogo de Natal de um “carol” (dos raros que se podem encontrar na tradição irlandesa) entoado em gaélico, “That night in Bethlehem”. Nota-se que o reumático já vai tolhendo alguns movimentos (ou nem por isso, se escutarmos a ligeireza de uma sequência de instrumentais dedicados à carriça, onde os velhotes como que ressuscitam, levados pelas asas do pássaro…) e que o tempo de vociferar a plenos pulmões já lá vai. Que importa, se em seu lugar se ergue a beleza sagrada de baladas como “The Christ Child’s lullaby” ou “The Wexford carol”? Ao contrário dos Chieftains, que optaram pela postura de uns Rolling Stones da folk, os Boys of the Lough partiram numa barca que leva ao que se esconde atrás do pôr do sol. (8)



Sharon Shannon – “Out The Gap”

Pop Rock

12 de Julho de 1995
Álbuns world

Acordeão preguiçoso

SHARON SHANNON
Out The Gap

Green Linnet, import. Etnia


ss

Não se faz uma coisa destas, Sharon! Então a senhora dá um concerto de arromba nos Encontros, grava um primeiro disco que é um pitéu e agora não consegue manter a pedalada? Eu explico-lhe as razões da minha reserva. Está bem que, desta vez, forçou um bocado demais na nota americana, pegando de passagem em temas da tradição do Quebeque – um deles, por sinal, que lhe foi ensinado pelos La Bottine Souriante (sabia que vêm cá tocar na próxima Festa do Avante!? Se puder, apareça.) – e numas “Butterflies” finlandesas. Também reconheço que continua a tocar como só você sabe (descontando o seu compatriota Mairtin O’Connor, mas esse já tem idade para ser seu pai…). Mas a base rítmica da sua nova banda, meu deus, nas mãos desse ex-Waterboys que você arranjou, no baixo, e nas de um guitarrista com a desagradável tendência para se deixar adormecer, não podia ter sido um bocadinho mais trabalhada?
É que parece música a metro e, por vezes, até somos levados a pensar que você, nos últimos tempos, não tem feito outra coisa senão ouvir “ceili bands”, contra as quais, de resto, nada tenho contra. Mas esse binários quadrados, tão martelados, que alguém mais desprevenido seria levado a tomar por uma caixa-de-ritmos!… Que coisa. E então o saxofone de feira nessa coisa medonha com o título “The mighty sparrow”, não tinha lá em casa nada melhor? Você que até mostra ter sorrisos e lágrimas no coração no tal tema da Finlândia, que, em “Thunderhead”, nos pega ao colo e leva à Irlanda profunda (mas aqui, se calhar, é por a guitarra estar entregue a um tal Gerry O’Beirne…) e, em “Reel Beatrice”, até pôs asas no acordeão. Sharon, é com algum pesar que lhe estou a escrever isto. Ainda guardo na memória o seu sorriso corado pela alegria de tocar e o prazer que senti em ouvi-la em Algés. Danço consigo a valsa, tão triste e arrastada, a que chamou “Maguire and Paterson” e depois vou-me embora. Espero encontrar-me em breve consigo com algo mais animador para lhe dizer. Entretanto, continue a tocar acordeão, que esse dom ninguém lhe tira. Do seu amigo que, infelizmente, não lhe pode atribuir mais que a nota (6)