Jon Balke & Oslo 13 – “Nonsentration” + Edward Vesala Sound & Fury – “Invisible Storm” + Tamia & Pierre Favre – “Solitudes”

Pop Rock >> Quarta-Feira, 10.06.1992


O SOPRO VITAL

JON BALKE & OSLO 13
Nonsentration (7)
EDWARD VESALA SOUND & FURY
Invisible Storm (9)
TAMIA & PIERRE FAVRE
Solitudes (9)
CD, ECM, distri. Dargil



Os três discos em análise são outros tantos exemplos de alguns dos caminhos percorridos pela música contemporânea ao mesmo tempo que constituem motivos de meditação para todos quantos se preocupam com “a questão do jazz”, essa “música difícil” que afinal encontra nos preconceitos o seu maior obstáculo. Dos três, o de Jon Balke é o que se insere, de forma inequívoca, na estrutura e na tradição do que se convencionou chamar “jazz”, aqui na sua vertente europeia e, em particular, na escola nórdica, tão do agrado do produtor Manfred Eischer.
Membro fundador dos Masqualero, Jon Balke, compositor e teclista norueguês, tocou entre outros com Archie Shepp, John Surman e Zbigniew Namyslowski (há quem o recorde de um dos primeiros festivais de jazz de Cascais). A banda Oslo 13 exercitou-se nas sendas da improvisação colectiva antes de se entregar à prática da concentração e contenção exigidas por Balke no contexto deste álbum, pese embora o prefixo do título. “Nonsentration” resolve-se nos jogos e na dialéctica tonal entre três secções – trompetes e trombone, saxofones e percussão – apoiadas, seccionadas (raramente em confronto directo) pelos teclados, que por vezes se libertam da carga rítmica para se entregar ao típico “yoga” de contemplação pianística que é, ou foi, imagem de marca da editora. A ideia é fazer a síntese entre as orquestras árabes, a música de câmara e as “big bands” de jazz, sendo as primeiras, à partida, as mais capazes de injectar no projecto o elemento desestabilizador.
Tal não acontece. A bateria e as percussões estão bastante mais próximas da África central (Balke já trabalhou com músicos da Gâmbia) ou do Brasil, e o resultado está longe de ser das arábias. Entre o afro-jazz e o icebergue de arranjos demasiado rígidos e tipificados, “Nonsentration” fica-se pela beleza apaziguadora e pelo apuro formal, sem arriscar demasiado nos territórios da música étnica ou nas liberdades concedidas por um formato instrumental que Carla Bley, por exemplo, tão bem soube explorar ou Keith Jarrett, nessa bizarria que é “In The Light”.
Problemas que Edward Vesala, finlandês, percussionista, autor de uma “Ode to the Death of Jazz” editada sob esta mesma etiqueta, resolveu de forma brilhante. Em “Invisible Storm”, o jazz é deixado para trás para ser apanhado mais à frente, revigorado e apto a avançar em novas direcções, aqui simbolizadas pela utilização de percussões de metal que, no entender de Vesala, substituem com vantagem as peles e madeira convencionais, em poder e ressonância.
Energia e tensão são o fogo e a massa aglutinadora desta “trovoada invisível” que, ao contrário de “Nonsentration”, explora todos os cantos, na combinação dos sopros, nas interpolações rítmicas de uma harpa, nas modulações electrónicas ou até no disparo ao rock do tema “Gordion’s flashes”, algures entre as pulsações da Jazz Composers Orchestra e o experimentalismo de um David Linton.
“Solitudes” é todo um universo diferente que se abre muito para além do jazz. É música religiosa no sentido em que é religiosa uma voz e um canto que ligam o humano a esferas mais elevadas. Depois de “De la Nuit… Le Jour”, Tamia e o percussionista suíço Pierre Favre, oriundo das hostes do “free jazz” europeu e membro desse colectivo de génios que foi a Michel Portal Unit, aprofundam aindamais o sentido do seu diálogo. Tamia é a voz do fundo e do final dos tempos, tão radical como Joan La Barbara, tão teatral como Meredith Monk e com a carga de misticismo de uma Enya a multiplicar por mil. Favre é o poeta dfas percussões. O criador de mundos elementais, de chuvas e areias, e de céus constelados de sinos, guizos, gongos e metais em vibração. Uma floresta de sons entre os quais a voz de Tamia ora dança ora se eleva. Música étnica de outra dimensão. Vozes que, no espaço centralo das grandes solidões falam a quem souber erguer-se acima da pequenez do mundo.

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