Pop Rock
17 de Maio de 1995
álbuns poprock
Jorge Reyes
Mexican Music Prehispanic (10)
Mexican Music Prehispanic: Music for the Forgotten Spirits (9)
Mexican Music Prehispanic: Mystic Rites (10)
PARAMUSICA, DISTRI. SYMBIOSE
Durante anos, os apreciadores da música deste mexicano procuraram em vão o compacto “Mexican Music Prehispanic”. Quem teve a sorte de escutar um exemplar de amostra que por aí circulou há tempos, desde logo considerou este um dos melhores trabalhos de sempre do músico. Agora, não só o disco está finalmente disponível, como a ele se vieram juntar os volumes dois e três deste projecto “sui generis”. Jorge Reyes – que actuará ao vivo em Portugal no próximo mês de Junho – pode ser considerado como que um Jon Hassell terceiro-mundista. Só que, enquanto o trompetista americano partiu do naturalismo ambiental das “Possible musics” do quarto mundo para se aproximar progressivamente de uma urbanidade revista à luz de novas ficções, em álbuns como “City: Works of Fiction” ou “Dressing for Pleasure”, o mexicano seguiu o caminho inverso. A música progressiva exótica dos primeiros álbuns derivou rapidamente para um lado mais acústico que privilegiava a utilização de instrumentos das antigas civilizações mexicanas, maias e “nahuatl”, ou de elementos da Natureza, quando não o próprio corpo, numa síntese subtil com a tecnologia electrónica. “Mexican Music Prehispanic” representa o primeiro momento desta inflexão numa vertente ritualista, ao qual se viriam mais tarde juntar obras importantes como “Cronica de Castas” (com o guitarrista espanhol Suso Saiz, seu companheiro nos Suspended Memories), “Bajo el Sol Jaguar”, “El Costumbre” e os desperdícios de ouro de “The Flayed God”.
Música única, feita com sons únicos, de conchas, pedras de fósseis, troncos de árvore ou água, juntamente com flautas e tambores rituais, “Mexican Music Prehispanic” invoca as antigas divindades pagãs e os seus poderes mágicos – “um simples pedaço de madeira pode constituir um elo de ligação com os deuses”, diz Jorge Reyes, a propósito do tema “Wood Music” – viajando nas asas de uma ave pelo mundo dos sonhos e das cerimónias de iniciação. Toda a obra de Reyes, e de forma superlativa neste disco, pode ser encarada por uma dupla perspectiva. Se por um lado pode agir como música funcional, psicadélica, na medida em que propicia condições para a passagem de estados normais de percepção para outros, em planos paralelos de realidade, por outro é inegável o seu fascínio e enorme riqueza sonoros, independentemente dos usos que se lhe quiser dar.
O segundo volume, “Music for the Forgotten Sprits”, recua ainda mais, até “ao tempo anterior ao tempo, aos deuses e à existência da consciência humana”. Leitura virtual dos estratos mais profundos do inconsciente humano onde habitam as entidades a eu chamamos deuses e demónios, e do limbo intemporal onde vivem os espíritos que, na tradição asteca, presidiram à criação do universo, como Ometeotl, a “essência suprema”. O álbum é produzido por Steve Roach, terceiro elemento dos Suspended Memories, cujo primeiro álbum, “Forgotten Gods”, aborda idêntica temática. À semelhança dos Suspended Memories, neste segundo volume de “Mexican Prehispanic” a música ganha peso, centrando-se no ritmo hipnótico das percussões, enquanto as melodias dervíshicas das flautas e dos cânticos servem para despertar os órgãos ocultos de percepção. De notar que se encontra também disponível outra edição deste registo, com capa diferente e o título “Tonami”, no selo espanhol No-CD.
“Mystic Rites”, terceiro volume da trilogia, é um caso especial, já que se trata de uma colectânea de temas considerados mais “místicos” e “rituais” da discografia do músico anterior à fase “pré-colombiana”, ou “pré-hispânica”. Voltado desta vez para o lado solar e luminoso, a ênfase é posta no amor e no misticismo, como forma superior de transcendência. Em consonância com este estado de espírito, o tema de abertura, “Invocacion”, combinação de “ritmos do corpo” com “atmosferas” e uma voz feminina, inspira-se na liturgia católica de uma ordem monástica. “Mexican Music Prehispanic”, na sua geografia secreta, desperta para a descoberta de novas formas de ouvir música. Ou, como diz o título de um dos temas, para “Ver cosas nunca oidas”.