The Crazy World of Arthur Brown – The Crazy World of Arthur Brown (conj.)

03.03.2000
Reedições
Gargalhadas de Gorila no Verão do Amor
Para os arqueólogos da pop mais empenhados na descoberta de pérolas esquecidas, eis alguns exemplares interessantes desenterrados dos anos 60.

Vivian Stanshall (já falecido, foi, com o outro grande Bonzo, Neil Innes, ocasional colaborador musical em “sketches” dos Monthy Phyton, onde, entre outros temas, interpretaram o clássico “I’m the urban spaceman”) era o “compère” inspirado dos Bonzo Dog Doo Dah Band, uma das genuínas bandas humorísticas dos anos 60, juntamente com os Liverpool Scene (mais politizados) e os próprios Monthy Phyton. Começaram por chamar-se Bonzo Dog Dada Band, mas viram-se forçados a mudar o nome devido ao tempo que perdiam a explicar às pessoas o significado de “dada” e podem ser vistos no filme “Magical Mystery Tour” dos Beatles. No álbum de estreia do grupo (1967), “Gorilla”, dedicado a Kink Kong, Viv gasta a totalidade de “The intro and the outro” numa apresentação exaustiva e hilariante dos nove elementos da banda. Seria convidado por Mike Oldfield para repetir a graça, na célebre sequência de apresentação dos instrumentos de “Tubular Bells”. Sátira, por vezes desbragada, a vários estilos de música, da pop psicadélica ao jazz (“Jazz”, delicious hot, disgusting cold”, assim mesmo, sem advérbios), “Gorilla” termina com uma versão demencial de “Sound of music”, em golpes de desafinação e boçalidade capazes de fazerem Julie Andrews fugir pelos Alpes abaixo. Edição remasterizada (BGO, distri. Megamúsica, 8/10).

Pouco conhecidos, os Clouds eram um trio escocês que nos dois únicos álbuns que gravaram, “Scrapbook”, de 1969, e “Watercolour Days”, de 1971, conciliaram, com resultados entre o delicioso (algumas canções do primeiro e o fastidioso (os solos instrumentais pouco imaginativos do segundo), a pop orquestral, reminiscências do “rhythm ‘n’ blues” progressivo, uma curiosa patine de velhas canções da Broadway e elementos do rock progressivo. O que faltava em unidade de estilo aos Clouds era compensado por fulgurantes instantes de inspiração, em canções pouco menos que perfeitas, como “The colours have run”, “Ladies and gentlemen” e a bizarra e orquestral “Waiter, there’s something in my soup”, suite teatral/psicadélica na linha dos Nirvana de “The Story of Simon Simopath”. Edição “dois álbuns num CD” remasterizada (BGO, distri. Megamúsica, 7/10).

thecrazyworldofarthurbrown_same

LINK

Arthur Brown, o cantor que ficou célebre por actuar ao vivo com uma coroa de chamas na cabeça, entrou para os arquivos da pop através da demoníaca interpretação de “Fire” (um “hit” em Inglaterra, em 1968). The Crazy World of Arthur Brown foi, em 1967, o primeiro veículo para a sua excentricidade, num álbum homónimo que incutia ambiências demoníacas no rhythm ‘n’ blues e num jazz de tendências progressivas que viria a atingir a plenitude do grupo que Brown formaria a seguir, os Kingdom Come (réplica em registo de “bad trip” ao planar de haxixe dos Gong). Arthur Brown era um Zappa alucinado, um louco na acepção mais libertina do termo e um “showman” capaz dos maiores excessos. “The Crazy World of Arthur Brown” provoca alguma confusão, nas constantes mudanças de humor e de registo musical. Para além de “Fire” (aqui incluído), “Time/Confusion” (do “crooning” terno às profundezas do inferno) e “Prelude/Nightmare” são dois bons exemplos de como é possível tirar partido da própria paranóia. (Polydor, import. Lojas Valentim de Carvalho, 7/10).

Elevado ao estatuto de banda de culto, os The Creation, formados na sequência dos The Mark Four, representavam, ainda em 1967 (mas houve alguma coisa que não se fizesse neste ano?), o melhor do que restara do movimento “mod”, mas já inevitavelmente mesclado com as fantasias do psicadelismo. “Making Time”, destinado aos apreciadores dos primeiros Kinks (dos quais o baixista dos Mark Four, John Dalton, chegou a fazer parte) ou dos Small Faces, junta, em versões mono e estéreo, temas do único álbum de originais da banda, “We Are Paintermen”, com alguns dos singles editados pelo grupo entre 1966 e 1968, entre os quais “Making Time”, que chegou a figurar nos tops ingleses. O som dos The Creation destacava-se pelas vocalizações poderosas de Kenny Pickett e pela guitarra saturada de fuzz e distorção de Eddie Phillips. Antes de se extinguirem, os The Creation ainda tiveram como guitarrista um tal Ronnie Wood… (Retroactive, import. FNAC, 7/10).

Violentos, bastante violentos, eram os High Tide, um quarteto liderado pela guitarra abrasiva de Tony Hill e pelo violino electrificado de Simon House, músico que mais tarde se destacaria nos Hawkwind, como acompanhante de David Bowie e nos Third Ear Band (na banda sonora de “MacBeth”, de Roman Polanski). “Sea Shanties” (1969), álbum de estreia do grupo, é um magma massacrante de hard rock ou uma viagem de ácido marado, consoante a predisposição do ouvinte. Para os fanáticos da guitarra eléctrica em estado de combustão permanente é um opíparo convite à surdez. Uma canção, “Pushed, but not forgotten”, destaca-se pelo tipo de vocalização “fora do lugar” dos Egg. Pena o som não ser o melhor (Repertorie, distri. Megamúsica, 6/10).

“S. F. Sorrow” (1968), dos Pretty Things, é considerado um dos primeiros álbuns conceptuais da pop inglesa que, inclusive, terá servido como modelo de inspiração a Pete Townshend, dos The Who, para escrever a ópera-rock “Tommy”. Provenientes da cena do rhythm ‘n’ blues britânico 8cadinho do qual nasceram inúmeras bandas progressivas, com destaque para os Jethro Tull), os Pretty Things evoluíram neste seu quarto álbum para uma pop requintada construída a partir de canções com arranjos complexos e sofisticados efeitos de estúdio que tanto evocam os Beatles, de “Revolver” (“She Says Good Morning” passaria perfeitamente, para os mais desatentos, por uma composição de Lennon-McCartney, até as vozes são iguais…), como antecipam em mais de dez anos a sonoplastia dramática dos Pink Floyd, em “The Wall”. E se “Private Sorrow”, por seu lado, recorda os Jethro Tull, o conjunto total das canções é suficientemente variado e inspirado para justificar a inclusão de “S. F. Sorrow” no grupo dos álbuns injustamente menosprezados dos anos 60. Versão remasterizada (Snapper Music, import. Lojas Valentim de Carvalho, 8/10).

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.