Harold Budd & Hector Zazou – “Glyph”

Pop Rock

6 de Dezembro de 1995
Álbuns poprock

Tempos de seca

HAROLD BUDD & HECTOR ZAZOU
Glyph (6)

Made to Measure, distri. Megamúsica


hb

Harold Budd e Hector Zazou, muito juntinhos, aderiram à moda da “etno-seca”. Caso fossem outros, a coisa passava com uma piada. Mas, dado que são quem são, convirá fazer alguns esclarecimentos. A temível, anedótica ribombante batida “seca” (vamos chamar-lhe assim, para abreviar e dado que a contrapartida “etno” até nem está presente neste disco) é rigorosamente igual em todos os discos onde aparece. Não acreditamos que dezenas, centenas de músicos tenham ouvido na cabeça ou sentido no coração o mesmo ritmo. Trata-se então de um modelo de produção. Que soa a falso.
Veja-se: no contexto em que se insere – seja no étnico de fusão ou no ambiental ritmado -, a batida “seca” está a mais. O lado étnico dispensa-a porque já tem os seus ritmos próprios e naturais. O ambiental, por seu lado, não tem ritmo nenhum. Logo, qualquer acrescento “antinatura” soa como intruso. A batida “seca” é um compromisso. Uma tentativa de tornar acessíveis, logo, mais comercializáveis, dois campos musicais considerados “difíceis”. Não é carne nem peixe, mas uma excrescência monstruosa. E incómoda. Neste sentido, a “seca” equipara-se ao “disco-sound” dos anos 70. O que de início constituiu alguma inovação transformou-se em poluição.
Abstraindo-nos deste pequeno senão, “Glyph” evidencia algumas das traves-mestras sobre as quais repousam as obras passadas de Budd e Zazou. As aguarelas de orvalho do pianista, a relojoaria fractal do argelino naturalizado francês.
Os títulos, cuidadosamente escolhidos, são invenções do autor de “Plateaux of Mirror”, conhecido pelo seu gosto pela escultura fonética e poética das palavras. De Budd decorrem ainda as sequências declamadas, pontuando as diversas geometrias instrumentais, algo que o pianista introduziu na sua estética a partir de “By Dawn’s Early Light”, álbum de 1991. Zazou contribui com as notas discordantes, provocando alguma inquietação e ondas mais picadas nas águas quase sempre serenas de “Glyph”. Entre os poemas, a contemplação e a “seca” rítmica, ainda se arranjou espaço para uma canção sem sal na voz de Lian Amber. Na ficha técnica, além do habitual colaborador de Zazou, Renault Pion, encontramos os nomes de B.J. Cole, Barbara Gogan (não canta, apenas toca guitarra), Mark isham, Lone Kent e Brendan Perry.
Budd, Zazou e tantos outros que se deixaram adormecer à sombra de Brian Eno andam a precisas que se lhes espete um alfinete num sítio que eu cá sei. Para ver se arrebitam.



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