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Varttina – “Aitara” + Garmarna – “Vittrad” + Henry Kaiser & David Lindley – “The Sweet Sunny North”

Pop Rock
18 de Outubro de 1995
Álbuns world

Vida para além dos Hedningarna

VÄRTTINA
Aitara (8)

Xenophile


varttina

GARMARNA
Vittrad (9)

Xxource


gar

HENRY KAISER & DAVID LINDLEY
The Sweet Sunny North (8)

Kosh International
Todos distri. MC-Mundo da Canção


hk

O sucesso estrondoso alcançado pelos suecos Hedningarna acarretou algumas vantagens mas também algumas desvantagens. A principal vantagem foi ter chamado a atenção para uma região, a Escandinávia, cuja música tradicional andou sempre afastada dos principais centros de decisão do mundo “folk”. A maior desvantagem está em que, rapidamente, um número razoável de grupos da mesma proveniência geográfica descobriu o filão e tratou de “imitar” os autores de “Kaksi!” e “Trä”, transformando numa fórmula o que na origem era uma música profunda e genuinamente original. O “perigo” da criação do que poderíamos chamar uma escola Hedningarna, por muito boa que seja a música de grupos como os Den Fule ou Hoven Droven (só para citar os mais aplicados), está na normalização, padronização, do que seria um “som escandinavo”. Algo que poderíamos situar no cruzamento da herança tradicional com uma prática estilística firmemente enraizada no jazz (cujos paradigmas recuam ao pioneirismo dos Sammla Mannas Mama e Arbete & Fritid), a par de uma certa “anarquização” (leia-se “selvajaria”) dos arranjos. No caso dos Garmarna, as semelhanças com os Hedningarna são até bastante ténues. É antes na música medieval ou no imaginário “folk” imposto pela vaga irlandesa dos anos 70 que a música de “Vittrad” se afirma.
Por muito que a terminação fonética seja a mesma, a verdade é que os Garmarna se dirigem a gostos educados num passado mais remoto, que assistiu já a várias “revoluções”. Depois, nem a sanfona explode nem a voz de Emma Härdelin pertence à tribo das feiticeiras, como fica amplamente demonstrado em temas de uma beleza interiorizada como “Inte sorja vi…”, “Liten kersti” , “Domschottis” e “Styvmodern”, bem mais chegados às litanias rosa-gelo de Agnes Buen Garnas, em “Rosensfole”, que ao furor “viking” dos diabos de “Trä”. Em poucas palavras: excepcional.
As Värttina são outra coisa, mais solar e, a julgar por este seu quarto álbum, divertida. Depois dos magistrais “Oi Dai” e “Seleniko”, o grupo vocal, de novo apoiado numa secção instrumental variada, regressa de cara lavada e decidido a investir num alargamento de mercado. Em “Aitara”, as Värttina aumentaram a voltagem e arredondaram as arestas rítmicas. São agora uma banda folk-rock (“Outona omilla mailla” e Kannunkaataja” a passarem na rádio, numa emissão rock?…). Sem vergonha. Com a bateria e o baixo a baterem com força. Forçam a dança, sem hipótese de resistência. Mas, ó maravilha, no camiho da euforia, o ritmo tropeça em momentos como “Maamo” (“mãe”) e silenciamo-nos e sabemos que a Finlândia ancestral continua a respirar na alma destas sacerdotisas. As Värttina estão, é certo, mais cosmopolitas e sofisticadas, o que retirou à sua música um pouco da sua coloração “étnica”, patente nos álbuns anteriores. Mas apostamos que “Aitara” trará para o grupo uma legião de novos admiradores.
Por fim, temos o “caso” Kaiser, Lindley e o seu “affaire” Noruega. Henry Kaiser e David Lindley são dois americanos com um pé nas “novas músicas” e outro na música tradicional. Como todos os americanos que se prezam, sentem-se bem no papel de turistas. Só que, para eles, não é só ver e fotografar. Metem as mãos no fogo, que é como quem diz, no melhor que a música tradicional das regiões que visitam tem para oferecer, e com ele fazem “cocktails” de originalidade e, diga-se de passagem, legitimidade garantidas. Como já acontecera na anterior aventura, em dois volumes, passada em Madagáscar (“A World out of a Time”), a dupla reuniu alguns dos melhores grupos e solistas vocais e instrumentais, desta feita da Noruega, nalguns casos não lhes tocando, noutros metendo a colher, isto é, guitarras de todo o tipo, para obter exóticos exemplares de “world music” de focagem incerta. Mais uma vez, levam na bagagem bastante que contar e uma obra que é, em simultâneo, um tratado de etnomusicologia e um divertimento.







Garmarna – Hildegard Von Bingen (conj.)

21.12.2001
Brass Monkey
Os Senhores Da Folk

Garmarna
Hildegard Von Bingen
MNW, distri. MC – Mundo da Canção
5/10

LINK

Kepa Junkera
Maren (7/10)
EMI, distri. EMI-VC
7/10
Brass Monkey
Going & Staying
Topic, distri. Megamúsica
8/10
Manuel Luna
Romper El Baile
Resistencia, distri. Sabotage
7/10
Kornog
Kornog
Keltia, distri. Megamúsica/import. Fnac
7/10
Decameron
Mammoth Special
Edsel, distri. Megamúsica/import. Fnac
6/10

Em dia de estreia de “O Senhor dos Anéis”, em plena época natalícia, nada melhor que ouvir uma boa pacotada de folk europeia, para prolongar o deslumbramento e animar ainda mais os espíritos. Ainda que nem tudo sejam rosas. Os Garmarna, por exemplo, gravaram um disco inteiro inspirado na música da nossa querida Hildegard Von Bingen, a abadessa medieval que fez um pouco de tudo menos aquilo em que vocês estão a pensar. Já tiveram um lugar de destaque no quadro de honra das grandes bandas suecas com o nome terminado em “arna”, como os Hedningarna, Hoven Drovenarna e Den Fularna, mas neste novo trabalho espalharam-se ao comprido. “Hildegard Von Bingen” é tecnofolk e new age a pensar nos tops de “world music”, com uma piscadela de olho ao público de Enya e outra aos “dance addicts” de costela étnica. Não é a opção em si, mas o oportunismo de uma fórmula estafada, que torna “Hildegard Von Bingen” redundante. Assim, as batidas moem mais do que encantam e, tecno por tecno, porque não experimentar a linha dura da tecnomedievalfolk personificada pelos QNTAL?
Também mais modernaço do que o costume, quçá impelido pelo êxito alcançado pelo anterior “Bilbao 00:00H”, Kepa Junkera aligeira a respiração da sua “trikitixa” em “Maren”. A lista de convidados inclui um grupo de vozes búlgaras, o gaiteiro MIDI, Hevia, o sanfonineiro Gilles Chabenat, o flamenquista Canizares, o percussionista fusionista Glen Velez, a diva da folk mediterrânica Maria del Mar Bonnet, o madagasquenho Justin Vali e o ex-Malicorne Hughes de Courson, entre outros. Tudo boa gente, se bem que o virtuosismo do basco sobressaia uma vez mais. Maculado pela comercialite de temas como “No hirahira”, redime-se nas mestiçagens balcânicas (de sabor medieval num maravilhoso “Oliene”) e no folclore basco ferrenho de “Peliqueiroak terranovan”, num álbum marcado ainda por uma forte componente africana e, no título-tema, pelas aragens occoitanas dos Verd e Blu.
Boa muito boa, é, como sempre, a superbanda inglesa Brass Monkey (na foto), onde despontam a figura mítica de Martin Carthy, na voz e na guitarra, e do não menos importante John Kirkpatrick, na concertina. Em “Going & Staying”, o legado ancestral das danças “morris” volta a servir de base a incursões épicas alargadas pela tradicional secção de metais, em contraponto com as vocalizações de Carthy, que uma vez mais roçam o sublime. Um álbum que prolonga a tradição de ouro dos melhores de Shirley Collins e dos Albion Country Band, pelos verdadeiros senhores da folk.
Manuel Luna também está de regresso, com o seu grupo La Cuadrilla Maquisera e o álbum “Romper el Baile”. Uma voz única, um estilo de interpretação especial, ao serviço de um reportório onde a música valenciana, sob influência do flamenco e da música árabe, adquire uma estranha sensualidade, própria do Sul, mas tornada quase hipnótica pelo canto de Luna e o violino de Enrique Valino.
Outro regresso é o dos Kornog, banda bretã que fez algum furor nos anos 80, com “On Seven Winds” (1985). Regresso de saudar, diga-se de passagem. “Kornog”, o novo álbum, não traz nada de novo, é um facto. Mas é preciso? Ouvir os extraordinários desempenhos vocais do escocês Jamie McMenemy, um dos fundadores do grupo, em 1981, é suficiente para nos comover e fazer recordar como a folk podia ser exaltante na década dos Planxty. Maturidade (fazem parte do grupo as raposas velhas da folk bretã, Jean-Michel Veillon, na flauta, e Nicolas Quemener, na guitarra), uma dedicatória ao rei deposto, Alan Stivell, e alguma água deitada na fervura nos instrumentais, justificam uma audição atenta.
Para quem aborda a folk pelo lado do rock progressivo, há uma proposta razoável: a reedição, aumentada com um tema extra, de “Mammoth Special”, álbum de 1974 dos Decameron. Como outras bandas da mesma época, imaginavam o folkrock como uma salganhada de imaginação, arranjos impensáveis e contrastes de várias cores e feitios. Se é verdade que um título como “Rock and roll woman” é de molde a afugentar qualquer purista, não deixa de fazer sentido arrumar “Mammoth Special” numa colecção exaustiva dos anos 70, ao lado dos Stawbs, Spirogyra, Lindisfarne, Gryphon (“Jan”, o tema a reter, cheira à Primavera des “Treason”) ou Horslips, todas elas da mesma família dos Decameron.