Tarwater – “Silur”

23.10.1998

Tarwater
Silur (8)
Kitty-Yo, import. Ananana

@320kbps
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Na genealogia do planeta Terra o período silúrico, entre 439 e 409 milhões de anos atrás, caracterizado por intensa actividade vulcânica que reorganizou toda a superfície do globo, assistiu à transição das formas de vida oceânica para o habitat terrestre. Os germânicos Tarwater adaptaram neste seu terceiro trabalho, depois de “11/6 12/10” e “Rabbit Moon”, o termo germânico “Silur” no sentido inverso, de regresso ao elemento líquido. “A água faz-nos sentir uma atmosfera diferente, como se estivéssemos imersos num outro mundo dentro da nossa realidade” diz Bernd Jestram, um dos elementos do duo que, juntamente com os To Rococo Rot (aos quais também pertence o segundo elemento, Robert Lippok), Kreidler, Mouse on Mars, Kante, The Notwist, The Tied and Ticked, Pluramon, Schneider TM ou Village of Savoonga, entre outras bandas, ressuscitaram o termo “krautrock”. Alfred Jarry é citado como referência (o poeta via Paris como um oceano) desta música, que junta colagens de “samples” e frequências electrónicas num universo, também ele, surrealista, de camadas sonoras em constante mutação que tanto se aproximam da pop industrial de Thomas Leer (“No more extra time”), como da visão acústico-minimalista de Jim O’Rourke (“Otomo”), ou da frieza mecanicista dos Kraftwerk (“Ford”), entre outras disjunções submarinas visíveis apenas através de um batiscafo.

The Third Eye Foundation – “Ghost”

19.09.1997

The Third Eye Foundation
Ghost (7)
Domino, distri. Música Alternativa

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“Corpses as bedmates”, “Cadáveres como companheiros de cama”, é um dos títulos deste álbum de fantasmas. Os Third Eye Foundation têm um sentido de humor muito particular. “Ghost”, que tem provocado algum furor lá fora (destaque na revista “Magnet”), surgiu rotulado como “pós-rock”, embora não haja muitos grupos conotados com o movimento parecidos com os TEF. É visível que o principal objectivo deles é fazer-nos sofrer. O som desfaz-se, numa tortura de “samples” que tanto podem esganar vozes étnicas como sinfonizar os ruídos industriais mais insuportáveis. Em termos rítmicos, a confusão de “breakbeats” tem como finalidade a ordenação possível do caos de distorção e deformidade harmónica. Mas, se no “pós-rock” apenas os Rome – ou, num registo de cruel exposição ao vazio, os Stars of the Lid – poderão rivalizar com os TEF no jeito para o massacre, já na década anterior encontramos outros ilustres torcionistas do som. É o caso dos This Heat, de Charles Hayward, referência óbvia em temas como “Corpses as bedmates”, “The star’s gone out” ou “Ghosts…” (em versão “drum ‘n’ bass” no castelo dos horrores), numa idêntica combinação de bateria industrial, ruído rosa e metal “hurlant”. E dos Throbbing Gristle, em “The out sound from way in”, no mesmo gosto sádico com que fazem da elaboração de relatórios do pesadelo urbano deste final de século e do cinismo uma arma de vingança (o som de harpa, neste tema, é um esgar de gosto tenebroso). “I’ve seen the light and it’s dark”, avisam os TEF. Nós ouvimos a música e é ainda mais escura.

Tone Rec – “Thugny – Trugny”

20.06.1997

Tone Rec
Thugny – Trugny (7)
Sub Rosa, import. Ananana

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O pós-rock avança para regiões inóspitas. Os Tone Rec são franceses, dois homens e duas mulheres, que empurram o movimento para a vertigem da experimentação pura. “Thugny – Trugny” explora o ruído segundo uma estética minimalista de massacre, pela repetição implacável de logaritmos electrónicos onde os acontecimentos são estipulados ao pormenor. No meio do movimento das máquinas, a aparição de segmentos de guitarra e bateria, em “Tetra and day” e “The discret charm of diplomacy”, embora evidenciando a mesma precisão de um metrónomo psicótico, funciona quase como um alívio. “Handwriting letters” tem a crueza doente de uma fotocopiadora canibal em agonia. Em “Technics cimetery”, o tema que dá a estocada final, um coração sado-masoquista é castigado por choques eléctricos, sugerindo igualmente a imagem de um computador com as entranhas a serem devoradas por um vírus. Doze minutos de tortura tornados ainda mais aterradores pelo carácter implacavelmente matemático do seu programa. Sai-se da experiência com o cérebro esburacado.