Boides – “Asturies: Camín de Compostela” + Felpeyu – “Felpeyu” + Llan De Cubel – “L’ Otru Llau de la Mar” + Llan De Cubel – “IV”

Pop Rock

19 de Junho de 1996
world

Peregrinos do Paraíso

BOIDES
Asturies: Camín de Compostela (10)
FELPEYU
Felpeyu (8)
LLAN DE CUBEL
L’ Otru Llau de la Mar (9)
IV (9)
Todos Fono Astur, distri. MC-Mundo da Canção


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Pés bem assentes na Galiza? Então preparem-se, porque chegou o momento de dar um passo à direita, para as Astúrias. Prontos para a viagem? Ergam o bordão e a “estela” de peregrino e abandonem as vaidades deste mundo. Vão com os Boides para o paraíso. Este quinteto propõe “uma geografia musical do Caminho de Santiago nas Astúrias, realizada sobre temas tradicionais ou composições originais, seguindo as duas rotas principais dos antigos peregrinos”. Um caminho pelo interior. Um caminho pela costa. Dois caminhos num.
A combinação arrepiante das vozes, masculinas e femininas, com a sanfona em “Dances: Molinera – Danza del Carmen” vale como uma verdadeira iniciação. As gaitas (há qualquer coisa de mágico na gaita-de-foles asturiana, não é detectável na sua irmã galega, um intimismo misterioso, será da afinação, em Si bemol, ou um segredo da terra?…) elevam-se nas notas do sagrado em “San Salvador” e quando nos metamorfoseamos num sonho de vozes, sanfona, acordeão e sinos de cristal, em “La virxen romera”, compreendemos que estamos perante um daqueles discos que não se explicam, tendo como única finalidade fazer-nos felizes.
A “morris dancing” inglesa cruza-se com a “muiñeira” no irresistível balanço e melodia de “A Herminio da fonfria”. Sintam, tão fundo quanto puderem, a cadência dos coros religiosos e da gaita-de-foles de “Oubona”. Marchas e cânticos nocturnos de monges à luz das candeias. Cisternas, grutas, bosques e catedrais. Lugares de encontro e de descoberta. Adeus, a Deus, o Céu de São Tiago espera-vos. Uma obra-prima como já não escutávamos desde “Acrobates et Musiciens”, dos Lo Jai (a vibração é semelhante…) e um clássico de sempre da música céltica.
Outro quinteto, os Felpeyu não vão tão longe. A sua proposta diverge para uma abordagem mais clássica do reportório asturiano, através da recuperação de algumas das danças de região como o fandango, a muiñeira e a polca, terminando num “horo” búlgaro. Encontramos aqui de novo a gaita asturiana nas mãos de executantes de alto gabarito, como Ruma Barbero e Xuan Nel Expósito. Se os Boides se confundem com a vertente sacra da música antiga, os Felpeyu, pelo contrário, seguem a via mais jocosa e lúdica dos bailes e folguedos, celebrando os rituais de união com a Natureza.
Os Llan de Cubel, ainda um quinteto, já tocaram em Portugal numa das edições do Festival Intercéltico do Porto. A sua evolução tem-se processado desde então de forma imparável. “L’ Otru Llau de la Mar” contagia com um “drive” tipicamente irlandês, com outros dois gaiteiros a “fazerem miséria”, Fonsu Mielgo e Flavio Rodrigues. Elías García revela-se de igual modo “irlandês” no bouzouki, em “El xarreru”, enquanto “San Roque” pertence a uma estirpe “Fairportiana”, mas a música soa no geral inequivocamente asturiana, competindo do outro lado da “fronteira” com vizinhos da dimensão dos Milladoiro e Luar na Lubre. Estão mesmo à altura dos Boides, no título tema, uma balada de amor vocalizada por Marco Llope e antecedida por um tocante dueto de harpa e gaita-de-foles.
O novo álbum, “IV”, inflecte em ritmos mais facilmente reconhecíveis como asturianos e assinala a promoção, de convidado em “L’ Otru llau” a membro oficial do grupo, do gaiteiro Flavio Rodrigues, passando Fonsu Mielgo para as novas funções de percussionista, tocador de “tin whistle” e vocalista secundário (!). Quem se destaca neste quarto volume do “javali gaiteiro” é o violinista Guzmán Marques, cuja sensibilidade e destreza técnica são postos à prova em temas como “Darme menu”, “Alborada d’ Amadi”, “Pasucáis d’ Uvieu” e “Adios la mio vaca pinta”, um dos mais belos e comoventes do disco. Uma última palavra para Lisardo Lombardía, produtor destes quatro álbuns, mentor da ideia original dos Boides e figura de proa do panorama actual da música tradicional das Astúrias – um paraíso aqui mesmo junto de nós.



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