Tarwater – Mergulhadores das Profundezas

16.03.2001
Tarwater
Mergulhadores das Profundezas

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Música alemã nos anos 70 foi sinónimo de krautrock. Cluster, Kraftwerk, Tangerine Dream, Faust, Klaus Schulze, Neu!, Amon Düül II e muitos outros grupos apostados em dotar a Europa de um rosto novo e electrónico, a partir da combinação LSD, anarquia, Stockhausen, psicadelismo e mais o que se estende para além do infinito.
A revolução prosseguiu na década de 80 com os industriais D.A.F. e Einsturzende Neubauten, o samplerista louco Holger Hiller e o electropopper Pyrolator. A este passado tão ilustre quanto distante da pop anglosaxónica mainstream, responderam, nos anos 90, os herdeiros de uma nova geração de música electrónica personificada por grupos e projectos como Mouse on Mars, To Rococo Rot, Kreidler, Pluramon, Schneider TM, Oval, Microstoria e… Tarwater, a banda que agora nos visita, formada por Robert Lippok (também elemento dos To Rococo Rot) e Bernd Jestram.
Ao invés dos sistemas de escritório musical dos Oval/Microstoria e do “kindergarten” dos To Rococo Rot e Kreidler, os Tarwater estão mais próximos da cena de dança underground de Berlim e Dusseldorf do que dos laboratórios e das fábricas, assistindo-se ao longo da sua discografia a uma evolução interessante, do abstraccionismo fragmentário da trilogia de estreia, “Solar Money System” composta por “John Donne – Death’s Duel”, “11/6 12/10” e “Rabbit Moon”, para a fantástica colagem onírica de “Silur”, e a neopop electrónico-psicadélica do novo “Animals, Suns & Atoms”.
Dos desequilíbrios causadores de desasjustamentos auditivos (sintomas potenciados por sequências vocais como “analytic paget saw na inn waste-gap city, Lana. A new order began, a more roman age bred Rowena”) das primeiras obras, em que estavam presentes o obscurantismo dos Residents e infiltrações trip-hop de genealogia Tricky, os Tarwater aproximaram-se em “Rabbit Moon”, álbum de remisturas em circuito fechado, do sinfonismo industrial para samplers totalitários dos Neubauten, Holger Hiller e Laibach, sem descurarem a preparação subliminar das suas futuras incursões na pop.
“Silur” avançou recuando cerca de 400 milhões de anos até ao período silúrico, caracterizado por intensa actividade vulcânica e pela transição das formas de vida oceânicas para o habitat terrestre. Os Tarwater, ao invés, mergulharam na água, fazendo jus à sua designação. A propósito deste álbum, Bernd Jestram comentou: “A água faz-nos sentir uma atmosfera diferente, como se estivéssemos imersos num outro mundo dentro da nossa realidade”.
Alfred Jarry, poeta dada/surrealista para quem Paris era um oceano, é citado em “Silur”, juntamente com remetências para a visão mecanicista dos Kraftwerk e do inglês Thomas Leer e incursões na electro-acústica minimalista e nas estratégias de Djing. De tal forma é multifacetado o universo sonoro de “Silur” que houve quem nele visse ainda, além das referências óbvias a Tricky e DJ Shadow, paralelismos com a cena hip hop da East Coast, os Coil de “Horse Rotorvator”, os Crooklyn Dub Consortium, o djing minimalista de Kazi Lenka e Taschensound e a esquizofrenia pop de… Carl Wilson.
“Animals, Suns & Atoms” é, finalmente, um título apropriado para a estranha arte combinatória dos Tarwater. Três mundos em cruzamento: o microcosmos atómico, a Natureza e o macrocosmos estelar. Por aí, em constante deambulação, circulam grooves surreais, fragmentos fonéticos organizados em beats e bits, a electrónica aquática (“The watersample”), uma remistura com a assinatura dos To Rococo Rot e uma estranha obsessão por Paris, em “All the ants left Paris”. Confusos? Curiosos? Ainda vão ficar mais, quando os Tarwater justificarem ao vivo a sua fama de mergulhadores das profundezas.

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