Pop Rock
2 Abril 1997
reedições
E os pássaros caíram do espaço
THE BYRDS
The Notorious Byrd Brothers (8)
Sweethearts of the Rodeo (5)
Dr. Byrds and Mr. Hyde (6)
Ballad of Easy Rider (6)
Columbia, distri. Sony Music
Roger McGuinn quis ser astronauta, mas não o deixaram. Quando Neil Innes, palhaço sábio da “troupe” Bonzo Dog Doo Dah Band, cantava, ainda nos anos 60, “I’m the urban spaceman” (canção posteriormente recuperada no antológico espectáculo ao vivo dos Monty Python no Hollywood Bowl), estava longe de imaginar que o tema se tornaria numa espécie de hino para McGuinn, líder pouco poderoso dos Byrds. Uma fantasia que voara pelo céu nos clássicos “Eight miles high”, “Mr. Spaceman” e “CTA – 102”, mas que ao longo de toda a obra dos Byrds posterior à obra-prima “Younger than yesterday” apenas teria direito a aparições fugazes, ou relegada para tapa-buracos, nos temas extra.
É uma história triste a que se conta a partir de 1967 e da edição dos quatro primeiros e seminais álbuns da banda americana. Remasterizados, polidos e embrulhados de acordo com a reputação dos seus autores, o novo pacote dos Byrds faz a história da decadência e o registo dos inúmeros equívocos que destroçaram por completo a identidade original do grupo.
Em 1968, McGuinn entrara para uma seita religiosa oriental, David Crosby afundava-se na droga e desafinava de propósito nas canções de que não era autor. Conta-se que era frequente, durante os concertos, olhar constantemente para o relógio e, passados mais ou menos 45 minutos, ala que se faz tarde, abandonar o palco. Crosby acabou por sair de vez, regressando, para o seu lugar, um dos elementos originais do grupo, Gene Clark, conhecido por um medo atávico de andar de avião. Infelizmente, a esta fobia juntara-se, entretanto, também o medo do palco e a claustrofobia. Depois de três espectáculos em que a sua prestação foi tão má que os outros se viram na obrigação de desligar subrepticiamente a amplificação da guitarra e o microfone, e de um ataque de pânico num elevador encravado, Gene não teve outro remédio senão ir de novo à vida.
Apesar de tantas contrariedades, “The Notorious Byrd Brothers” mantém a magia dos quatro primeiros discos, tirando partido da produção sofisticada de Gary Usher (antigo colaborador de Brian Wilson). É um disco que alia o interesse crescente de McGuinn pelas sonoridades electrónicas e pelo sintetizador Moog em particular (com a ajuda do mago Paul Beaver, parceiro de Bernard Krause nos seminais “Gandharva”, “In a Wild Sanctuary”), em temas como “Space odyssey” ou o extra “Moog raga”, com a apoplexia barroca dos emblemáticos “Sgt. Peppers”, dos Beatles, e o abortado “Smile”, dos Beach Boys. Naipes de cordas, em “Artificial energy” (sobre “speed”), vozes saturadas de “phasing” e pérolas pop como “Goin’ back” (de Carole King) e “Natural history” fazem de “The Notorious Byrd Brothers” o álbum mais estranho do grupo. De fora ficara “Triad”, um tema sobre amor a três, que acabou por estrear na fantástica versão dos Jefferson Airplane, em “Crown of Creation”, mas que agora foi recuperado na colecção dos extras.
A partir daqui tudo se complicou, com a entrada do novo elemento, Gram Parsons, para o grupo. McGuinn pensava então ter chegado a altura de pôr em prática a sua obra, há muito projectada, de “space music”, contando para tal com os talentos de teclista do novo elemento. Pura ilusão. Parsons tomou conta dos Byrds e, com o apoio de outro elemento restante da formação original, Chris Hillman, convenceu o próprio McGuinn de que o futuro não estava no espaço, mas no campo. Os Byrds tornavam-se num grupo de música “country” e “Sweethearts of the Rodeo” acabaria, estranhamente, por ser, de entre toda a discografia do grupo, o álbum que lançaria sementes, formando gerações de novos músicos, que aí viram o pretexto para pegar nas raízes da música branca norte-americana.
Esta dicotomia entre tensões contrárias, o gosto pela ruralidade, por um lado, o apelo da tecnologia e da inovação, por outro (esta última, como é óbvio, instigada por um homem só, Roger McGuinn), ficaria ainda por resolver no álbum seguinte, “Dr. Byrds and Mr. Hyde”, título só por si revelador da personalidade esquizofrénica que os Byrds desenvolveram na proporção directa da sua desagregação, de resto, fielmente retratada na fotografia da contracapa, onde um “cowboy” e um astronauta seguram no disco, com a legenda “Cowboys and spacemen: A short saga”. É um álbum que hesita entre a insistência na canção “country” (afinal, a própria crítica especializada desvalorizara o esforço anterior…) e os restos de um psicadelismo perdido, em temas em que os Byrds, se ainda voavam, voavam baixinho, como em “Child of the universe”, ou choramingando na nostalgia por Bob Dylan, que repescam em “This wheel’s on fire”.
O naufrágio consumar-se-ia em “Ballad of Easy Rider”, um álbum e uma nova formação erráticos (com John York, Gene Parsons e Clarence White), que procuraram, num último esforço, a salvação do “gospel” (“Jesus is just alright”, um “hit”, pelos Doobie Brothers), nos cânticos tradicionais dos marinheiros ingleses, em Woody Guthrie e, ainda e sempre, em Dylan, através de “It’s all over now, baby blue”, título profético. Do sonho espacial de Roger McGuinn ficariam, a fechar o disco, “Armstrong, Aldrin and Collins”, a celebrar a conquista da Lua pelos americanos e, nos extras, a derradeira aberração de “Fiddler a dram”, um instrumental “folk” tocado no sintetizador Moog.