Déanta – “Ready For The Storm”

pop rock >> quarta-feira >> 23.11.1994
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Vencer Os Fantasmas

Déanta
Ready For The Storm (9)
Green Linnet, distri. MC – Mundo da Canção



Na corrida imparável para os lugares da frente na grande maratona da música tradicional da Irlanda, os Déanta aceleraram a fundo. Em competição directa com os Dervish na categoria de “principiantes” (noção algo relativa, tendo em conta a tenra idade com que na ilha se começa a pôr em prática o amor pela música), a primeira etapa foi vencida por estes últimos com “Harmony Hill”, contra a estreia dos Déanta.
“Ready for the Storm” responde à letra e ultrapassa sem apelo nem agravo “Harmony Hill”. Um passo de gigante dado por este grupo de cinco raparigas e um rapaz que alcançaram já a maturidade e um nível médio de execução instrumental que lhes permitirá, a breve prazo, entrar em competição directa (se é que não o fazem já) com as “trutas” da primeira linha (Altan, Skylark, Patrick Street, Open House, La Lugh, De Danann… Quanto aos Chieftains, insistimos em “arrumá-los” num local à parte…).
“Ready for the Storm” não sofre dos tremeliques nervosos que de algum modo tolhiam os movimentos dos músicos no álbum anterior. Melhorou a escrita e a capacidade inventiva dos arranjos, evidente desde logo no tema de abertura, “The mighty clansmen”, de uma riqueza harmónica extraordinária, bem como aquela energia mágica que parece possuir as melhores bandas irlandesas e as faz ultrapassarem-se a si próprias (os Dervish, por exemplo, que o digam, a propósito da sua actuação no último Intercéltico), liberta de forma exemplar no medley “Rocky reels”.
Deirdre Havlin está a tornar-se um caso sério na flauta. Basta escutá-la no citado tema de abertura ou nos diálogos com o “”bodhran” de Clódagh Warnock, em “Hammy Hamilton’s Jigs”, e com o violino de Kate O’Brien, em “The Landsdowne lass”. Mary Dillon, por seu lado, perdeu a timidez e projecta com outra convicção e naturalidade a sua voz. Eficaz, no clássico crioulo “The lakes of Pontchartrain”, ágil e profunda como um oceano de emoções, em “Culloden’s Harvest” (escrita pelo escocês Alastair McDonald sobre uma antiga canção gaélica do mar), simplesmente emocionante, em “Ready for the Storm”, um “standard” em potência.
Se “Déanta”, sem dúvida um bom álbum, não conseguia manter o mesmo nível elevado do princípio ao fim, sofrendo de uma ocasional “anemia” e de uma excessiva contenção (resultante dos tais receios – infundados – de falhar), em “Ready fot the Storm” é difícil detectar pontos a seu desfavor, dada a maneira como o grupo conseguiu, como já dissemos, libertar-se dos fantasmas do passado. Os Déanta estão agora preparadas para enfrentar, não só qualquer tempestade, como a responsabilidade de receber e transmitir o testemunho musical de uma tradição imorredoira.

Tannahill Weavers – “Capernaun”

pop rock >> quarta-feira >> 23.11.1994
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Tannahill Weavers
Capernaun
Green Linnet, distri. MC – Mundo da Canção



Com uma atitude oposta à dos House Band, os Tannahill Weavers são um valor seguro da música escocesa, com o qual se pode contar para não se ter ilusões. Essa é talvez a maior virtude da banda mas também a sua principal limitação. Tal significa que o grupo cumpre os mínimos, que ocasionalmente uma escolha mais feliz do reportório os faz subir uns furos acima, mas mais do que isto não lhes peçam. “Capernaun” (bela harmonização de vozes no título-tema) é música tradicional da Escócia – cortada pelo picante de um “na dro”, com o aval dos amigos da Bretanha, Bleizi Ruz – tocada com a competência, a convicção e a naturalidade de esperar numa das bandas que há mais anos circula na cena folk da Escócia. Os Tannahill Weavers jamais farão um álbum fraco mas é difícil acreditar que alguma vez consigam atingir o brilhantismo. Mas, claro, continua a ser um prazer ouvir Kenny Forsyth fazer cantar as “Highland pipes”. (7)

Open House – “Second Story”

pop rock >> quarta-feira >> 23.11.1994
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Open House
Second Story
Green Linnet, distri. MC – Mundo da Canção



A primeira história chamava-se precisamente “Open House” e vinha creditada como um álbum a solo de Kevin Burke – título que agora serviu para designar o colectivo, algo que já acontecera, por exemplo, com os Altan e os La Lugh. Kevin Burke foi, como já devem saber, violinista dos míticos Bothy Band. Gravou a solo ou em parcerias alguns álbuns dedicados a este instrumento, para encontrar, por fim, o seu segundo, e grande, grupo nos Estados Unidos – onde reside há alguns anos – nestes mesmos Open House. O “swing” é medonho, a facilidade e velocidade de execução arrepiantes. Mas, quando é preciso, os Open House fazem uma pausa e mostram que são capazes de, a qualquer momento, nos fazer dar de caras com o inesperado. Já nem sequer falamos da originalidade de ter um tocador de harmónica, Mark Graham, que faz com este instrumento, num “jig” ou num “reel”, o mesmo que um violino ou uma senhora, Sandy Silva, que faz as percussões do grupo com os pés, entre o “toc-toc” do picapau e o estrondo do martelo-pilão. A surpresa chega com “Jackson and Jane”, uma vocalização “a capella” por Mark Graham ou com a pop zoológica – que até ficaria bem num “single” -, um pouco à maneira dos Four Men and a Dog, de Monkey with a typewriter”. Um “Merengue” bem batido pelos pés e pelas palmas é um autêntico Sandy “show” e a previsível incursão pela Bretanha, com o clarinete de Graham fazendo as vezes da bombarda, em “Bourrées de Berry”, quebram, pelo desvio de perspectiva, a rotina da vertente tradicional irlandesa. Ouça-se, em último lugar, “Flowers of the forest”, em ritmo de valsa, relembrando os “dias da rádio” (e, para quem os conhece, os Late Night Band, que não há meio de serem reeditados em compacto!), enquanto se sonha com o regresso da Primavera. (8)