António Manuel Ribeiro – “Pálidos Olhos Azuis – P.O.A.”

Pop Rock >> Quarta-Feira, 02.12.1992

OS OLHOS DO TÉDIO


ANTÓNIO MANUEL RIBEIRO
Pálidos Olhos Azuis – P.O.A.
LP / MC / CD, Edição BMG



“Há uma parede mágica que rodeia a canção (…) não sabemos se alguém a vai descortinar à primeira escuta / essa magia que vive do outro lado da escuridade.” Escreve-se isto a propósito de “Velhos tamborins”, primeira canção a ser editada no formato de “single”, retirada do álbum de estreia “P.O.A” de A.M.R., vocalista dos UHF. Deve haver, de facto, uma parede a rodear cada canção de “P.O.A.”. Nem à primeira, nem à segunda, nem à vigésima sétima audição se consegue descortinar nelas qualquer tipo de magia, muito menos um bocadinho de música original – um mínimo de interesse que seja. Só escuridade. Só banalidade em cada melodia estafada, disco após disco, dos UHF.
António Manuel Ribeiro tinha que fazer um disco a solo, para dar a conhecer às multidões o enorme artista que é. Era preciso mostrar uma visão autónoma, um talento liberto das imposições do colectivo, a grande arte do génio solitário, abandonado à magna angústica da criação. Então A. M. R. pegou na guitarra, abriu a boca e a obra fex-se. Não devia. “P.O.A.” aproveita o pior dos UHF. Vai buscar o típico ambiente das noites de Benfica e passa-o a ferro em linhas melódicas sem ponta de inspiração, e textos que repisam velhos chavões e paranoias: a estrada, sempre madrasta, mas a que não se pode fugir; a marginalidade dos subúrbios; a violência juvenil como forma de fuga ao tédio; e agora, em estreia mundial, os “olhos das miúdas”, das “groupies”, aquelas mosquinhas que cirandam à volta do artista a pedir migalhas. Um espectáculo que visivelmente comove António Manuel Ribeiro. São pálidos olhos azuis, faróis na escuridão, essas tretas.
Tudo estaria bem e tudo seria perdoado, se não fosse a música. Com “P.O.A.” A.M.R. esqueceu uma década de evolução, regressando à pré-história do “rock português”, dos primeiros UHF, GNR e CTT. Não falta sequer um “puro sangue”, na melhor tradição dos “cavalos de corrida” e um coro de impensável parolice, no “épico” “A noite inteira”. Escapa à mediocridade total um “Aqui na arena” cantado de raiva, entre o ódio e a introspecção, contra o “portuga”, o “show business” e, por tabela, a humanidade em geral – o melhor A.M.R. na pele de D. Quixote em luta com os moinhos e consigo próprio. O CD inclui o tema-extra “Hi John”, dedicado a John Lennon, e a versão longa de “Velhos tamborins”. A António Manuel Ribeiro deseja-se rápidas melhoras e votos de um bom descanso. (3)

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