23.01.2004
Vários
On Paper
2xCD Crónica, distri. Matéria Prima
8/10
O suicídio esclarecido de Sócrates, encarado como prova da imortalidade da alma, faz sentido em termos ontológicos. Acontece que, quando calha a nós, como diria Woody Allen, faz sentido, sim, mas “no papel”. Esta discrepância entre a Fé e a desconfiança da razão encontra eco no trabalho de “colagem/descolagem” empreendida por artistas sónicos portugueses como Vítor Joaquim, @C, Paulo Raposo, Longina e Pedro Tudela, a partir de um tema deste último, “Rasgão.aif”, e do papel, simultaneamente superfície rasa e suporte de informação. “Aceitar que se trata de uma matéria que acumula informação por camadas e conjugações” como ponto de partida, determina as múltiplas manipulações/funções de “On Paper” em que o som do papel (rasgado, dobrado, batido à máquina…) é processado electronicamente. Ao contrário da máxima de Allen, porém, resulta desta operação não a dúvida ou o medo, mas uma paleta diversificada de músicas inseridas no “industrial”, na música concreta, no ambientalismo digital sujo ou em abstracções órfãs de paternidade estética. Soa incómodo, no papel. Aos ouvidos, felizmente, ainda mais.