“Comprar A Qualquer Preço” : Guerra Entre Distribuidoras Nacional E Espanhola – Artigo de Opinião

POP ROCK

26 Fevereiro 1997

Guerra entre distribuidoras nacional e espanhola

COMPRAR A QUALQUER PREÇO

Os espanhóis estão a fazer ocupação hostil do mercado discográfico português, ao venderem diretamente às lojas editoras sobre as quais não detêm direitos de distribuição. É a acusação lançada pela Música Alternativa à distribuidora espanhola Mastertrax. Estes negam. Será que “exclusividade” é mesmo um conceito subjetivo?

Com as facilidades de intercâmbio facultadas pela adesão de Portugal ao mercado comum, baralharam-se as regras de distribuição. Para os retalhistas e lojistas, a questão resume-se a comprar onde sai mais barato. Ou não será bem assim?
Os protestos mais recentes chegam da editora independente Música Alternativa, que se queixa de algumas das editoras que afirma representar chegarem às lojas por via da venda direta dos armazéns e distribuidoras espanholas. É o caso da Roadrunner – cujo lançamento mais próximo será o álbum dos Machine Head, “The more Things Change…” – Music for Nations e Earache, as quais, segundo os seus responsáveis, são distribuídas pela Música Alternativa, depois de o terem sido pela Sony Music. Mas um anúncio publicado no jornal “Blitz” da semana passada anunciava a Mastertrax como “representante exclusiva para a Península Ibérica” destes e doutros catálogos.
Para Samuel Carlos, diretor da Música Alternativa, contactado telefonicamente pelo PÚBLICO, trata-se de um problema que “já vem de longe”. Desde logo, acusa os espanhóis de “fazerem exportação indevida, sem direitos para isso, para Portugal, através de pessoas que têm negócios menos lícitos”. Embora reconhecendo que, a nível da Constituição, tais operações sejam legais, Samuel Carlos critica-as de um ponto de vista ético. “Era a mesma coisa que nós exportarmos para Espanha coisas sobre as quais não temos direitos. Eles têm os mesmos direitos para o país deles, mas é um facto que quebram esses direitos”.
Confrontado com a possibilidade de os discos obtidos por compra direta poderem sair mais baratos ao lojista, Samuel Carlos refuta-a. “Sinceramente, a nível de preços, não percebo… Se eles comprar exatamente ao mesmo preço, ou até, no nosso caso, ligeiramente mais barato, não percebo como é que poderão comprar mais barato aos espanhóis!…” Qual é o interesse dos lojistas? “Uma boa pergunta! Talvez tenham vários interesses… um deles, por exemplo até pode ser o de comprar discos sem faturas…”. Samuel Carlos reconhece a existência de lojas que se mantêm “fiéis” à sua distribuição, enquanto que noutras, diz, é a “selvajaria”, onde cada qual compra sem olhar a quem.
Em relação à Mastertrax, Samuel Carlos dirige um ataque mais violento ao seu representante em Portugal, a quem acusa de “querer lixar” a Música Alternativa. “Só pode ser uma doença. Analisando o percurso dessa pessoa no passado, verifica-se que passou a vida a fazer o mesmo a outras pessoas. Tem que ter sempre alguém para chatear. E nós, em vez de andarmos a fazer o que devíamos, promover artistas, criar editoras, perdemos tempo com estas chachadas, com cromos destes que aparecem a tentar desestabilizar. E até conseguem. Enquanto neste país se viver na ignorância, sem saber como as coisas realmente funcionam. Depois, os portugueses vivem de costas uns para os outros. Ao contrário do que acontece em Espanha”. O responsável máximo pela Música Alternativa adianta ainda um dado curioso sobre a nacionalidade do diretor da Mastertrax: “É indonésio!”.
António Seara, da Bojarda, representante da Mastertrax em Portugal, põe a questão em termos simples: “A Roadrunner deixou de ser distribuída pela Música Alternativa desde Janeiro deste ano. Temos um fax da Roadrunner a prová-lo”. Embora, a seguir, adiante que “a exclusividade é uma coisa um bocado subjetiva”: “Apesar de sermos exclusivos para Portugal da Roadrunner, a Música Alternativa pode continuar a vender, basta ir comprar a um armazém qualquer da Inglaterra, da Holanda ou da Alemanha. Se telefonarem para a Música Alternativa a perguntar se têm a Roadrunner, eles vão dizer que sim… Mas a distribuição oficial, para a Península Ibérica, pertence à Mastertrax. Em relação à Music for Nations e Earache, a Mastertrax apenas tem a distribuição para Espanha, independentemente de as podermos vender, se quisermos, como há mais pessoas a fazê-lo. Mas nós não o fazemos, atenção!”. Porque, no fundo, a exclusividade “o que é que dá?”. Para António Seara, a única coisa que pode dar é “melhores preços, melhores serviços e melhor publicidade”. Acontece que “as discotecas em Portugal vão muito aos armazéns, como se fossem a um supermercado, escolher dois discos destes, três daqueles. E os armazéns podem fazer importação direta…”.

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