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Tarwater – Silur

23.10.1998
Tarwater
Silur (8)
Kitty-Yo, import. Ananana

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Na geneologia do planeta Terra o período silúrico, entre 439 e 409 milhões de anos atrás, caracteriza-se por intensa actividade vulcânica que reorganizou toda a superfície do globo, assistiu à transição das formas de vida oceânica para o habitat terrestre. Os germânicos Tarwater adaptaram neste seu terceiro trabalho, depois de “11/6 12/10” e “Rabbit Moon”, o termo germânico “Silur” no sentido inverso, de regresso ao elemento líquido. “A água faz-nos sentir uma atmosfera diferente, como se estivéssemos imersos num outro mundo dentro da nossa realidade” diz Bernd Jestram, um dos elementos do duo que, juntamente com os To Rococo Rot (aos quais também pertence o segundo elemento, Robert Lippok), Kreidler, Mouse on Mars, Kante, The Notwsit, The Tied and Ticked, Pluramon, Schneider TM ou Village of Savoonga, entre outras bandas, ressuscitaram o termo “krautrock”. Alfred Jarry é citado como referência (o poeta via Paris como um oceano) desta música, que junta colagens de “samples” e frequências electrónicas num universo, também ele, surrealista, de camadas sonoras em constante mutação que tanto se aproximam da pop industrial de Thomas Leer (“No More Extra Time”), como da visão acústico-minimalista de Jim O’Rourke (“Otomo”), ou da frieza mecanicista dos Kraftwerk (“Ford”), entre outras disjunções submarinas visíveis apenas através de um batiscafo.

Tarwater – Mergulhadores das Profundezas

16.03.2001
Tarwater
Mergulhadores das Profundezas

tarwater

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pwd: majorbonobo

Música alemã nos anos 70 foi sinónimo de krautrock. Cluster, Kraftwerk, Tangerine Dream, Faust, Klaus Schulze, Neu!, Amon Düül II e muitos outros grupos apostados em dotar a Europa de um rosto novo e electrónico, a partir da combinação LSD, anarquia, Stockhausen, psicadelismo e mais o que se estende para além do infinito.
A revolução prosseguiu na década de 80 com os industriais D.A.F. e Einsturzende Neubauten, o samplerista louco Holger Hiller e o electropopper Pyrolator. A este passado tão ilustre quanto distante da pop anglosaxónica mainstream, responderam, nos anos 90, os herdeiros de uma nova geração de música electrónica personificada por grupos e projectos como Mouse on Mars, To Rococo Rot, Kreidler, Pluramon, Schneider TM, Oval, Microstoria e… Tarwater, a banda que agora nos visita, formada por Robert Lippok (também elemento dos To Rococo Rot) e Bernd Jestram.
Ao invés dos sistemas de escritório musical dos Oval/Microstoria e do “kindergarten” dos To Rococo Rot e Kreidler, os Tarwater estão mais próximos da cena de dança underground de Berlim e Dusseldorf do que dos laboratórios e das fábricas, assistindo-se ao longo da sua discografia a uma evolução interessante, do abstraccionismo fragmentário da trilogia de estreia, “Solar Money System” composta por “John Donne – Death’s Duel”, “11/6 12/10” e “Rabbit Moon”, para a fantástica colagem onírica de “Silur”, e a neopop electrónico-psicadélica do novo “Animals, Suns & Atoms”.
Dos desequilíbrios causadores de desasjustamentos auditivos (sintomas potenciados por sequências vocais como “analytic paget saw na inn waste-gap city, Lana. A new order began, a more roman age bred Rowena”) das primeiras obras, em que estavam presentes o obscurantismo dos Residents e infiltrações trip-hop de genealogia Tricky, os Tarwater aproximaram-se em “Rabbit Moon”, álbum de remisturas em circuito fechado, do sinfonismo industrial para samplers totalitários dos Neubauten, Holger Hiller e Laibach, sem descurarem a preparação subliminar das suas futuras incursões na pop.
“Silur” avançou recuando cerca de 400 milhões de anos até ao período silúrico, caracterizado por intensa actividade vulcânica e pela transição das formas de vida oceânicas para o habitat terrestre. Os Tarwater, ao invés, mergulharam na água, fazendo jus à sua designação. A propósito deste álbum, Bernd Jestram comentou: “A água faz-nos sentir uma atmosfera diferente, como se estivéssemos imersos num outro mundo dentro da nossa realidade”.
Alfred Jarry, poeta dada/surrealista para quem Paris era um oceano, é citado em “Silur”, juntamente com remetências para a visão mecanicista dos Kraftwerk e do inglês Thomas Leer e incursões na electro-acústica minimalista e nas estratégias de Djing. De tal forma é multifacetado o universo sonoro de “Silur” que houve quem nele visse ainda, além das referências óbvias a Tricky e DJ Shadow, paralelismos com a cena hip hop da East Coast, os Coil de “Horse Rotorvator”, os Crooklyn Dub Consortium, o djing minimalista de Kazi Lenka e Taschensound e a esquizofrenia pop de… Carl Wilson.
“Animals, Suns & Atoms” é, finalmente, um título apropriado para a estranha arte combinatória dos Tarwater. Três mundos em cruzamento: o microcosmos atómico, a Natureza e o macrocosmos estelar. Por aí, em constante deambulação, circulam grooves surreais, fragmentos fonéticos organizados em beats e bits, a electrónica aquática (“The watersample”), uma remistura com a assinatura dos To Rococo Rot e uma estranha obsessão por Paris, em “All the ants left Paris”. Confusos? Curiosos? Ainda vão ficar mais, quando os Tarwater justificarem ao vivo a sua fama de mergulhadores das profundezas.

Tarwater – Animals, Suns & Atoms

12.05.2000
Tarwater
Animals, Suns & Atoms (7/10)
Kitty-Yo, distri. Symbiose


tar

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Seduzidos por uma nostalgia que apenas se pode fazer sentir vinda da Europa (encontra-se em doses diluvianas, na sua vertente mais intelectualizada e “cinematográfica”, nos discos gravados para a editora Made to Measure, por exemplo), os Tarwater mostram-se de igual modo receptivos a um outro tipo de melancolia que se desenrolou em volta do eixo de Manchester, em bandas como os Durutti Column ou os New Order, mas também ao pendor gótico das legiões da 4AD (This Mortal Coil, Dif Juz, Cocteau Twins, Dead Can Dance) e à electrónica suburbana dos Tubeway Army. A diferença está num subtil desvio de perspectiva que de forma imperceptível, vai revelando novas e inesperadas facetas da música do grupo, como a hipnótica progressão de “Noon” que começa por se parecer com um transe-pop dos Biosphere, passa pelos This Mortal Coil e termina num “raga” fora de fase. As vozes, femininas e masculinas, monocórdicas na essência, sofrem metamorfoses, alongam-se ou são desfeitas por cordas e sopros digitais. A música que sai de uma coluna suspensa num tronco carunchoso confunde-se com o som da chuva, outras vezes um filtro molda a voz ao registo de fantoche diabólico manipulado pelos homens de negro dos Stranglers, em “The Gospel According to the Meninblack” (“Early Rises”) enquanto “Song of the Moth” evoca os primeiros Tortoise. Mentes retorcidas, as dos Tarwater…