Freddie Mercury – “Homenagem A Mercury, Ontem, No Estádio De Wembley – Nas Garras De Freddie”

Cultura >> Terça-Feira, 21.04.1992


Homenagem A Mercury, Ontem, No Estádio De Wembley
Nas Garras De Freddie


Freddie Mercury foi um “homem-espectáculo” em toda a acepção da palavra. Enquanto viveu, entreteve e chocou como lhe competia. O mundo do espectáculo fez-lhe a homenagem póstuma e aproveitou para lembrar o perigo dos excessos. Não se sabe se a “rainha” teria gostado.



Estádio de Wembley, 72 mil pessoas na relva mais 500 milhões em frente à televisão ou de ouvidos colados à rádio, para assistir ao “Mercury Tribute” – uma homenagem do universo rock ao ex-vocalista dos Queen, vitimado pela sida em Novembro do ano passado, aos 45 anos de idade – a que aderiram nomes como David Bowie, Paul Young, Lisa Stansfield, Elton John, George Michael e Annie Lennox, entre outros. O PÚBLICO seguiu o acontecimento via satélite. A aldeia global voltou a sintonizar em onda única. Com os lucros a reverterem a favor dos doentes da sida.
Antes do início do espectáculo, já uma locutora da Correio da Manhã Rádio, visivelmente nervosa, se esmerava num chorrilho de disparates em directo, chamando Estádio Nacional a Wembley e Luís a Nuno Bettencourt. Um simples teledisco dos Queen, projectado no ecrã gigante, foi suficiente para lhe provocar “uma das maiores emoções” da sua “vida”. Mais tarde, outro locutor chamaria Def Deppard aos Def Leppard só faltando chamar Merdy Fercury a Freddie Mercury. À mesma hora a RTP, de outro modo, também provocava. Com a passagem de uma selecção de “clips” da banda, mostrando como se sabe estar em cima do acontecimento. A transmissão em diferido ficava marcada para quinta-feira próxima.
No exterior do estádio, as já habituais manifestações de protesto. Desta vez com os rapazes “gay” da “Outrage”, especialistas na denúncia pública dos seus companheiros de armas não assumidos a insurgirem-se contra a presença no programa dos Guns ‘n’ Roses. Um dos membros da organização chamou “hipócrita” ao vocalista Axl Rose e acusou a banda de “racista”, citando a propósito um verso de uma das canções: “niggers get out of my way”. Nada preocupados com questões ideológicas, os jovens formavam bicha (em singela homenagem a Freddie Mercury) para entrar no recinto.

Música Preservativa

Os Metallica, banda de “heavy metal”, homenagearam da única maneira que conhecem, ou seja, a ferro e fogo, com uma salva de artilharia pesada que deve ter feito Freddie Mercury dar cambalhotas no túmulo. Os Extreme vieram a seguir. Tocaram um “medley” de canções dos Queen que atingiu o auge em “Radio ga-ga”, com a multidão a cantar o refrão em uníssono e Nuno Bettencourt a dar “show” na guitarra eléctrica. Depois foi a vez dos Lef Deppard – quer dizer, dos Def Leppard, a tal banda do baterista que só tem o braço esquerdo e toca melhor com o direito – fazerem mais uns minutos de barulho com “Animal” e “Let’s get rocked” e aquecerem os ânimos com “Now I’m Here”, ajudados por Brian May, um dos sobreviventes dos Queen.
Roger Taylor, outro dos Queen vivos, apresentou Bob Geldof, símbolo vivo de todos os “aids”. Geldof chegou vestido de flores, acompanhado por um acordeonista e dois guitarristas. Despachou-se cedo, com um “Too late God” composto especialmente para a ocasião. Foi interrompido pelos Spinal Tap, supostos parodiantes do “heavy metal”. O único tema que tocaram não pareceu uma paródia.
Um dos momentos mais belos do espectáculo foi proporcionado pela Top-model Cindy Crawford que não precisaria sequer de apresentar os U2 para deslumbrar. Os irlandeses limitaram-se a enviar de Sacramento uma gravação de “Until the end of the world”.
Alheios à polémica provocada, os Guns ‘n’ Roses, com Axl Rose, o vocalista “hipócrita” e “racista”, de lenço na cabeça e outro à volta da cintura a fazer de saia, deram uma lição de profissionalismo que incluiu o capítulo de Dylan “Knocking on Heaven’s Door”. Os sons, os gestos e a presença de duas vocalistas de apoio agitaram a assistência de ponta a ponta – se assim se pode dizer -, fazendo de novo assomar o espectro da sida. Após alguns minutos de “afrojazz” pelos Mango Groove, em directo de Joanesburgo, na África do Sul, Elizabeth Taylor veio dar o conveniente tom sério ao “Tributo a Freddie Mercury”. Dirigiu-se, emocionada, à multidão, forneceu números alarmantes e lançou o alerta da praxe: “hétero sex”, “gay sex” ou “bissexual sex”, mas sempre “safe sex”. “Use a condom.”

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