Vários – “The Voices of the Dead” (conj.)

20.12.2002

Konstatin Raudive – O gravador de Mortos

Vários
The Voices of the Dead
Sub Rosa, distri. Ananana
6/10

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Vários
Klangmaschine
Mille Plateaux, distri. Ananana
7/10

Vários
A New Guide to Sound Sculpture and Invented Instruments
FMR, distri. Sonoridades
8/10
Está por comprovar a veracidade científica do registo de vozes de mortos captadas em fita magnética pelo Dr. Konstantin Raudive (1909-1974, na foto), natural da Letónia, editadas em 1971 em forma de livro e disco (“Breaktrough: An Amazing Experiment in Electronic Communication with the Dead”). William Burrougs serviu-se deste material, no qual encontrou paralelismos com as suas técnicas de “cut-up”, o mesmo fazendo os Smiths com a inclusão de um excerto destas vozes no final de “Rubber ring”: “You do not want to believe: You are sleeping”.
“Voices of the Dead” vai mais fundo, numa espécie de seesão de espiritismo ou de ficheiros secretos manipulados por Scanner, Lee Ranaldo, David Toop, DJ Spooky, Random Inc. e Ensemble, que transformaram sonicamente as fitas originais compiladas e catalogadas, consoante a sua maior ou menor perceptibilidade auditiva, em “A”, “B” e “C”. Nos interins é possível escutar as vozes à deriva dos defuntos, a par de explicações técnicas. O resultado também tem a ver com o mundo das sombras, em registos que vão da electrónica infernal a frequências soltas e puro ruído residual. As excepções são DJ Spooky, que ensaia um groove saído da tumba, em “Cadavre magnétique”, e Brett Dean, em viola de arco solo. Nos 11 minutos finais preenchidos por algumas das experiências, comentadas pelo Dr. Raudive, pode-se ouvir os mortos a pronunciar frases como “Yet, at night God’s air is free” e “Good evening, I’d like to drink your wine with you”. Música “soul” levada a este extremo é de morte. Além das questões éticas que levanta em matéria de direitos de autor.
“Klangmaschine”, ou “máquina de som”, é mais “vivo”, ainda que o tema seja ainda a morte. Parte de uma análise musical e sociológica de Marcus S. Kleiner e Marvin Chlada para chegar à tese de que a pop, na melhor das hipóteses, é um “zombie”. As teorias de McLuhan confundem-se com magia, teorias sobre som e comunicação, citações de Rosa Luxemburgo, Valerie Solana e “2001” de Kubrick, e a música industrial (pau para toda a obra ao negro), ambient, dub, tecno, deep house, em “metamachines”, “liebemachines”, “reproduktionmaschines” e toda a espécie de temas-“maschines” postos a funcionar por Terre Thaemlitz, Tim Hecker, Taylor Dupree, Snd e Frank Brestschneider. Cordell Clier lembra na sua “Schreibmaschine” até que ponto os Kraftwerk foram os primeiros andróides electrónicos e John Harding leva-nos através de uma “world music” digital, enquanto Alva Noto se resguarda na “house” abismal dos Pan Sonic.
Em “Sound Sculptures” o som organiza-se como matéria lúdica, em mais uma série de experiências, prolongando procedimentos ideológicos da música concreta e acusmática. A noção de “autor” esbate-se em detrimento de um sincretismo sonoro universal em que a música nasce menos da escrita matemática do que da manipulação directa, do toque e da textura. Entre as presenças de Hugh Davies e Max Eastley, uma cintilante “Piezo’s tower” interpretada em esculturas/gongo de metal, “6 stations” electroacústicas e tribais de Derek Shiel e uma “Suite” de François & Bernard Baschet que decalca Moondog, chama-se a atenção para o tema final, “Dark Brother”, “statement” em bruto com a assinatura de Harry Partch, nome lendário das “novas músicas” não eruditas – intuitivas, “imperfeitas” e possuídas por uma raiva interior.

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