O Cisne Negro
Gostaria de partilhar convosco um livro que ando a ler e que me tem agradado sobremaneira.
Trata-se de “O Cisne Negro” de Nassim Nicholas Taleb, nascido no Líbano, em Amioun (o que não é irrelevante, como veremos) sobrevivente da guerra civil.
A tese do autor é que sendo o futuro completamente imprevisível, todas as previsões com que somos bombardeados no nosso dia-a-dia não são mais do que charlatanices a querer armar ao pingarelho, para dizer o melhor.
Título: O Cisne Negro – O Impacto do Altamente Improvável
Título original: The Black Swan
Autores: Nassim Nicholas Taleb
Editora: Publicações Dom Quixote
Data: Maio de 2008
Data original: 2007
Tradução: Sónia Oliveira
Nº de Páginas: 455
ISBN: 978-972-20-3587-3
Embora esta afirmação pareça trivial, não é.
Basta pensar nas previsões que ouvimos todos os dias, do tipo:
O petróleo não vai para de subir
A inflação este ano vai ser de… (esta é muito usada vocês sabem bem por quem)
A vida humana vai ter uma duração média superior a 150 anos no século XXII
Enfim, estão a ver onde quero chegar. E não é difícil arranjarem mais umas dezenas em poucos minutos.
Esta incapacidade de prever é inata ao Homem, à vida como ela é, e à complexidade extrema do mundo em que vivemos.
Consequência nefasta da charlatanice é a aplicação de métodos científicos (da ciência dura como a física e matemática) à Economia, Filosofia, História, Pedagogia (esta foi metida por mim) e todas as “ciências” sociais em geral. Querem ser aquilo que não podem com métodos não aplicáveis, quando podiam seguir a via narrativa que durante muito tempo seguiram com resultados não “espectaculares” (para a sociedade mediática em que vivemos) mas bem mais razoáveis e verdadeiros.
Outro dado curioso é que são os especialistas que mais erram nas suas previsões. O autor prova que qualquer taxista consegue prever melhor o andamento do preço das acções do que um corretor depois de aplicar métodos matemáticos que deram direito a prémio Nobel, por exemplo.
O autor desmonta no seu livro a arrogância académica, a sabedoria dos especialistas e não o faz, como é óbvio, de forma leviana. Apresenta dados e estudos concretos e baseia a sua tese na própria vida pessoal uma vez que foi durante muitos anos consultor de instituições financeiras famosas, participante em “task-forces” governamentais norte-americanas, possuindo no seu currículo formação avançada em matemática, filosofia e economia e sendo (ou tendo sido), ele próprio académico nestas áreas.
Quer dizer, não fala de cátedra como certas pessoas que nós conhecemos que mandam nos professores e comentam o seu trabalho, sem nunca terem posto os pés numa sala de aula ou há muito tempo não o fazerem, por terem conseguido saltar a tempo daquela profissão em que “não se faz nada”, “tem-se montes de férias” e cujos profissionais são os verdadeiros culpados do “estado da nação”.
Cito um excerto do livro deveras significativo sobre o que relato:
“ … A ideia de Popper tem que ver com as limitações existentes ao nível da previsão de acontecimentos históricos e a necessidade de reduzir áreas «moles», como a história e a ciência social, a um nível ligeiramente acima da estética e do entretenimento, como se se tratasse de coleccionismo de borboletas ou de moedas. (Popper, tendo recebido uma educação clássica vienense, não chegou tão longe; eu, sim. Eu sou de Amioun.) Aquilo a que nos referimos aqui como ciências históricas moles são os estudos dependentes da narrativa.
O argumento central de Popper é que, para prever acontecimentos históricos, é necessário prever a inovação tecnológica, a qual é essencialmente imprevisível.
(…) Se eu esperar vir a esperar alguma coisa em algum momento no futuro, então já espero algo no presente.
(…) Se tivesse conseguido profetizar a invenção da roda, já saberá o seu aspecto, logo, já saberá construir uma roda, ou dito de outra maneira, para compreender o futuro ao ponto de conseguir prevê-lo, é necessário incorporar elementos do próprio futuro.
Antes da Internet, quem conseguiria prever o futuro? Tal as mudanças impostas por esta? (…)”
Uma das características que mais me agrada no autor é a forma desabrida com que apresenta os seus argumentos, sem o agrilhoamento do politicamente correcto (o facto de ser libanês não é despiciendo como podem comprovar ao ler o livro), chamando os “bois pelos nomes”, e fazendo-o com uma escrita escorreita, cativante, mas sem perder o rigor.
O autor inscreve-se na escola empírica céptica, por contraposição aos teorizadores de bancada que produzem e induzem os maiores disparates que vemos pulular pela comunicação social. Aliás esta é, segundo Nassim, tão reles, que deixou de ver televisão e ler jornais, uma vez que isso só contribui para a “desinformação”, o que casa com a sua tese de que quanto mais “informados” pelos media somos, menos conhecedores nos tornamos, apesar de isto contrariar o “senso comum”.
Mas o que mais me agradou foi a cena que Taleb relata quando, após anos de trabalho numa empresa financeira, presente perante o seu avaliador, lhe rasga a avaliação à frente, mesmo sem ver o resultado, pois tratava-se segundo o autor de uma farsa, de um coisa sem pés nem cabeça, visto que, no trabalho que exercia os resultados dependem, quase e só, do acaso, da sorte, e não de nenhuma capacidade demonstrável em especial, pelo menos dos parâmetros que eram usados para avaliar e, parece, para exercer as funções do dia-a-dia.
Parece que ele era o único maluco que havia por aqueles lados…
Isto faz-me lembrar qualquer coisa, e é evidente que tenho pena de não ter as condições financeiras, o à-vontade, enfim a coragem para fazer o mesmo. Mas pode ser que até lá fique também maluco.
É que a partir de Setembro também vou estar metido no meio de um vórtice de bizarria.
Abraços a todos.
PS: Leiam o livro porque esta resenha está bem longe de fazer a justiça merecida à sua grande qualidade.
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