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Ambitious Lovers – “Lust”

Pop-Rock 27.02.1991 – LP’S


O Pecado Genial

AMBITIOUS LOVERS
Lust
LP, MC e CD, Elektra, distri. Warner port.



Depois da avareza (“greed”) e da inveja “envy”), os Ambitious Lovers voltam a pecar, desta feita incorrendo na falta da luxúria (“lust”). Por esta nova amostra, apetece dizer: pequem muito, pequem sempre. Os pecadores são Arto Lindsay e Peter Scherer. Há pouco gravaram um disco repleto de ambientalismos experimentais para a série de luxo belga Made to Measure. O disco chama-se “Pretty Ugly” e é excelente. Agora regressaram aos prazeres mais imediatos da canção e da dança. E de que maneira! “Lust” é fabuloso da primeira à última espira. Provoca emoções e empurra o pé para a dança. Excita o corpo e seduz a inteligência. Junta com todo o à-vontade os tropicalismos brasileiros, caros a Lindsay, à imaginação tecnodelirante de Scherer. Arto (guitarrista dos originais Lounge Lizards) é a palavra, inglesa e portuguesa, a alma calorosa aprendida no sertão. Peter compõe a música, arranja-a e mostra como o “sampler” e a electrónica, quando manejados, como é o seu caso, por mãos e cabeça que sabem, não têm realmente limites. Desde a bossa nova melancólica, que dá título e início ao disco, até à belíssima balada final para voz e piano, que o encerra (“É preciso perdoar”), o álbum faz desfilar uma sucessão de maravilhas diante do ouvinte extasiado. Há pormenores engraçados: Em “It’s Gonna Rain” e “Monster”, as entoações vocais de Lindsay lembram Annette Peacock (repare-se, por exemplo, na maneira como, em “Monster”, Arto canta os versos “Have you got the stamna / This is worse than non-fiction…”); os arranjos e produção de “Ponta de Lança Africano – umbabarauma” e o mesmo “Monster” recordam idênticas e luxuriantes operações levadas a cabo por Brian Eno em “Remain In Light” dos Talking Heads. Depois, não vale a pena fazer mais comparações nem buscar outras referências – o disco “agarra-nos” e submete-nos à ditadura do desejo e do prazer, fazendo jus ao título e à capacidades dos músicos. “Tuck it in” e, de novo “Monster”, já para não falar dos dois temas que contam com a participação de Nile Rodgers, são brilhantes exercícios de música de dança, excitante e inteligente. “Half out of it” é “technohousefunkyacidbody” experimental – Peter Scherer desmonta e volta a montar os esquemas rítmicos, fornece pistas, cada uma suficiente para compor nova canção, avança e recua ou as duas coisas ao mesmo tempo, enfim, o único adjectivo que se lhe pode e deve aplicar é, sem sombra de dúvida (ou de pecado), “genial”. Escute-se o “scratch” simulado em “Ponta de Lança” (composto por Jorge Bem), o “delay” cintilante do piano eléctrico em “More Light”, a maneira como enriquece cada tema com pormenores brilhantes de concisão e imaginação. Escute-se e pasme-se. Arto Lindsay escreve os textos e canta-os cada vez mais como se tivesse nascido brasileiro. Selva de estrelas. Selva de desejos. “Lust” exibe profusamente as marcas inconfundíveis que definem as obras ditas “primas”.
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Peter Scherer & Arto Lindsay – “Pretty Ugly”

PÚBLICO QUARTA-FEIRA, 16 MAIO 1990 >> Videodiscos >> Pop


PETER SCHERER & ARTO LINDSAY
Pretty Ugly
LP e CD Made to Measure, distri. Contraverso



Todos aqueles cuja relação com Lindsay se reduz ao conhecimento dos exercícios funky perpetrados no seio dos Ambitious Lovers ou às brasileiradas espalhadas um pouco por todo o lado, incluindo a aventura a solo “Envy” ou a colaboração no fabuloso e heterodoxo “Homem no Elevador” (“Der Mann Im Fahrstuhl”), da dupla Heiner Goebbels-Heiner Muller, gravado para a ECM, ficam desde já informados que o disco agora em questão não tem rigorosamente nada em comum com as características citadas. Lindsay, juntamente com o produtor e músico Peter Scherer, este último responsável por alguns dos mais excitantes trabalhos na área das músicas de fusão nova-iorquinas (lembremos, por exemplo, os dois volumes de “Comme des Garçons”, com a assinatura de Seigen Ono), propuseram-se desta feita investir direta e descomplexadamente nos territórios frequentemente minados do experimentalismo. Com efeito, “Pretty Ugly”, título simultâneo do álbum e da faixa de 26 minutos que ocupa a totalidade do primeiro lado, é uma teia complexa de sonoridades eletrónicas, entre o ambiental e atonalidades próximas da música concreta, não dispensando os dois minutos cantados em português sub-repticiamente intercalados, por Lindsay, no meio da peça. A estrutura é suportada por alicerces rítmicos computorizados ou pelas percussões tradicionais do brasileiro Cyro Baptista. Naná Vasconcelos também é mencionado na ficha técnica, limitando-se a dar palmas e a assobiar. Jill Jaffe toca violino e viola de arco. O disco, como acontece na maioria das gravações da série Made To Measure, engloba-se na categoria das “músicas de circunstância”, neste caso tratando-se de uma composição comissionada para o ballet do mesmo nome coreografado por Amanda Miller. Brilhante, como a quase totalidade das obras deste catálogo.

Ambitious Lovers – “Lust”

Pop-Rock 27.02.1991 – LP’S


O Pecado Genial

AMBITIOUS LOVERS
Lust
LP, MC e CD, Elektra, distri. Warner port.



Depois da avareza (“greed”) e da inveja “envy”), os Ambitious Lovers voltam a pecar, desta feita incorrendo na falta da luxúria (“lust”). Por esta nova amostra, apetece dizer: pequem muito, pequem sempre. Os pecadores são Arto Lindsay e Peter Scherer. Há pouco gravaram um disco repleto de ambientalismos experimentais para a série de luxo belga Made to Measure. O disco chama-se “Pretty Ugly” e é excelente. Agora regressaram aos prazeres mais imediatos da canção e da dança. E de que maneira! “Lust” é fabuloso da primeira à última espira. Provoca emoções e empurra o pé para a dança. Excita o corpo e seduz a inteligência. Junta com todo o à-vontade os tropicalismos brasileiros, caros a Lindsay, à imaginação tecnodelirante de Scherer. Arto (guitarrista dos originais Lounge Lizards) é a palavra, inglesa e portuguesa, a alma calorosa aprendida no sertão. Peter compõe a música, arranja-a e mostra como o “sampler” e a electrónica, quando manejados, como é o seu caso, por mãos e cabeça que sabem, não têm realmente limites. Desde a bossa nova melancólica, que dá título e início ao disco, até à belíssima balada final para voz e piano, que o encerra (“É preciso perdoar”), o álbum faz desfilar uma sucessão de maravilhas diante do ouvinte extasiado. Há pormenores engraçados: Em “It’s Gonna Rain” e “Monster”, as entoações vocais de Lindsay lembram Annette Peacock (repare-se, por exemplo, na maneira como, em “Monster”, Arto canta os versos “Have you got the stamna / This is worse than non-fiction…”); os arranjos e produção de “Ponta de Lança Africano – umbabarauma” e o mesmo “Monster” recordam idênticas e luxuriantes operações levadas a cabo por Brian Eno em “Remain In Light” dos Talking Heads. Depois, não vale a pena fazer mais comparações nem buscar outras referências – o disco “agarra-nos” e submete-nos à ditadura do desejo e do prazer, fazendo jus ao título e à capacidades dos músicos. “Tuck it in” e, de novo “Monster”, já para não falar dos dois temas que contam com a participação de Nile Rodgers, são brilhantes exercícios de música de dança, excitante e inteligente. “Half out of it” é “technohousefunkyacidbody” experimental – Peter Scherer desmonta e volta a montar os esquemas rítmicos, fornece pistas, cada uma suficiente para compor nova canção, avança e recua ou as duas coisas ao mesmo tempo, enfim, o único adjectivo que se lhe pode e deve aplicar é, sem sombra de dúvida (ou de pecado), “genial”. Escute-se o “scratch” simulado em “Ponta de Lança” (composto por Jorge Bem), o “delay” cintilante do piano eléctrico em “More Light”, a maneira como enriquece cada tema com pormenores brilhantes de concisão e imaginação. Escute-se e pasme-se. Arto Lindsay escreve os textos e canta-os cada vez mais como se tivesse nascido brasileiro. Selva de estrelas. Selva de desejos. “Lust” exibe profusamente as marcas inconfundíveis que definem as obras ditas “primas”.
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