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Maria Kalaniemi – Entrevista: Maria Kalaniemi reinventa a folk finlandesa – “A vida fora da academia”

Sons

12 de Junho 1998


Maria Kalaniemi reinventa a folk finlandesa

A vida fora da academia


mk

Niekku, Aldargaz, Zetaboo, The Accordion Tribe são alguns dos projectos em que a acordeonista finlandesa Maria Kalaniemi esteve ou está envolvida. Impulsionadora da “new finnish music”, “virtuose” do acordeão, destaca a importância da criatividade e gosta que a sua música conte uma história.

Maria Kalaniemi, que há 15 dias actuou em Portugal, no festival Cantigas do Maio, defende a sua posição de “marginal”, o que lhe permite repartir a sua actividade por múltiplos projectos. Numa entrevista ao PÚBLICO fez o resumo da sua já recheada carreira.
PÚBLICO – Parece estar sempre em vários projectos ao mesmo tempo. Sente necessidade em se dispersar desse modo, em vez de se concentrar numa coisa só?
MARIA KALANIEMI – É muito difícil dizer não. Acontece que há cinco, seis anos atrás, era impossível viver de uma única actividade, sob pena de se ganhar pouco dinheiro. Fui, de certa forma, obrigada a fazer muitas coisas ao mesmo tempo. Mas também é verdade que gosto de trabalhar assim, com diferentes grupos e pessoas. É saudável. Mas o meu projecto principal é, neste momento, os Aldargaz, embora esteja também a tocar com outras bandas.
P. – O seu último disco, “Iho”, já saiu há três anos. Tem planos para editar um novo trabalho?
R. – Sim, vamos gravar um álbum novo no Outono. E, se tiver tempo, gostaria também de editar um álbum a solo, só com música de acordeão.
P. – Começou por tocar música clássica, antes de entrar para a Academia Sibelius – como faz, aliás, a maior parte dos músicos finlandeses – e se dedicar à folk. A frequência desta academia é uma forma dos músicos enfrentarem a concorrência?
R. – No início tocava formas muito antigas de música de dança finlandesa. Depois entrei para a academia e comecei a tocar música clássica. Não diria que é uma forma de lidar com a concorrência, até porque há uma quantidade de músicos que não frequentaram essa escola. Para mim foi importante porque, por volta de 1983, quando comecei, tratava-se realmente de uma coisa nova que me fez pensar de uma maneira diferente sobre a música folk. O professor que tive, Heikki Laitinen, pretendia que fizéssemos uma música que nunca tivesse sido ouvida antes. Algo que acontece hoje em dia, a toda a hora, na Finlândia, com grupos novos a aparecerem constantemente, a fazer música completamente original. É muito importante para qualquer músico folk ter o seu próprio estilo. De resto, é impossível copiar os velhos executantes, ainda que seja necessário conservar a ligação às raízes.
P. – Como definiria o seu estilo?
R. – É uma mistura de muitas coisas. Como intérprete folk, ou apenas como intérprete, num sentido mais lato, ouço música de todo o lado, o que, evidentemente, determina o resultado final. Acima de tudo prezo a liberdade. É verdade que “Iho” já saiu há três anos, mas é bom poder gravar apenas quando quero, quando há material que o justifique. É o lado positivo de se ser um músico “marginal”.
P. – Tem alguma explicação para o facto de, comparando com o que acontece na Suécia, com grupos como os Hedningarna, a música finlandesa gozar de uma projecção menor no Ocidente?
R. – Penso que essa situação está a mudar aos poucos, embora não tão depressa como na Suécia. Na Suécia aquilo que poderíamos designar por uma “new wave” já existe há mais tempo. A Finlândia ficou um bocado à parte. Talvez porque estamos próximos da Rússia, enquanto a Suécia tem uma localização mais central.
P. – Também dá a ideia de que os novos grupos finlandeses fazem uma música mais delicada do que os suecos. Basta comparar o som dos Hedningarna ou dos Garmarna com as Värttina ou as Niekku. Concorda?
R. – É verdade. Gosto que exista essa diferença. É a velha questão de ter, ou não, uma atitude rock. Não há necessidade que todos os grupos tenham bateria.
P. – As Niekku, das quais fez parte, foram dos primeiros grupos a fazer o que vulgarmente se chama “new finnish folk”?
R. – Sim, absolutamente. Fomos o primeiro grupo a sair do departamento de música folk da Academia Sibelius. De certa forma fomos nós que demos início a todo o movimento.
P. – Arto Jarvella era o único homem do grupo. Não encontraram nenhuma violinista à altura que fosse mulher?
R. – Não se trata disso. Os Niekku eram um grupo de estudantes; não era, de forma alguma, um grupo profissional. Nunca sabíamos quem é que vinha estudar para o nosso departamento. Era quase por acidente que nos encontrávamos uns aos outros.
P. – Uma das características técnicas que distingue o seu estilo é a utilização que faz do teclado esquerdo do acordeão.
R. – Em geral, na maioria da música folk, os acordeonistas usam esse lado esquerdo apenas como acompanhamento da mão direita. Mas, se usarmos o acordeão com “baixos soltos”, podemos tocar também melodias no teclado esquerdo. Duas melodias diferentes ao mesmo tempo, uma em cada teclado. Tocar apenas acordes com a mão esquerda limita a música.
P. – Costuma ouvir outros acordeonistas, como John Kirkpatrick ou Kepa Junkera?
R. – Claro, e gostaria de tocar com alguns deles, se tivesse tempo. O meu favorito é Dino Saluzzi.
P. – O que distingue os Aldargaz de outro grupo em que também toca, os Zetaboo?
R. – Nos Aldargaz todos os músicos vieram de géneros musicais diferentes. Têm na cabeça as suas próprias especificidades, embora todos tenham ligações com a folk em várias das suas formas – como o “bluegrass”, ou a música irlandesa, no caso de Petri Hakala, por exemplo. Nos Zetaboo os músicos vêm todos da cena jazz.
P. – Também acompanhou a cantora Anna-Kaisa Liedes. Sente-se confortável no papel de acompanhante?
R. – Sim. Neste momento estou a tocar com outra cantora, esta muito mais tradicional, Vesa-Matti Loiri, que também é flautista e actriz. O prazer que me dá acompanhar cantores tem a ver com a necessidade de não me ouvir apenas a mim, de fazer coisas em conjunto com outras pessoas. Gosto de ouvir e compreender as palavras que são cantadas. Eu própria, embora não use as palavras, tento que a minha música conte uma história.
P. – Nos The Accordion Tribe interpreta música contemporânea com outros quatro acordeonistas, entre os quais Guy Klucevsek e Lars Hollmer, que muito admiramos…
R. – Gravámos um disco de um dos nossos concertos onde cada um de nós tem o seu solo e as suas composições próprias, além de tocarmos as músicas uns dos outros.
P. – Ainda continua a dar aulas na Academia Sibelius? Qual é a mensagem principal que passa aos seus alunos?
R. – Desde a Primavera passada que estou de licença. Não tenho tempo para ensinar. Mas adorei, enquanto o fiz. O que lhes dizia era para criarem o seu próprio estilo, para descobrirem o que de mais forte neles existe. Não queria que eles fossem cópias de mim. É uma das razões por que não quis dar aulas durante muito tempo.



Maria Kalaniemi – “Iho”

POP ROCK

15 Janeiro 1997
world

Maria Kalaniemi
Iho
OLARIN MUSIIKKI OY, DISTRI. MC-MUNDO DA CANÇÃO


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Com a chancela da Academia Sibelius, “Iho” sucede a “Maria Kalaniemi” na discografia desta acordeonista, uma das mais reputadas executantes deste instrumento da atualidade. Álbum heterogéneo de referências e cruzamentos de estilo, conta com o apoio de uma superbanda de músicos finlandeses, entre os quais uma das eminências pardas da “finnish folk”, o violinista Arto Järvellä, dos Tallari, e Matti Mäkelä, dos JPP e Troka. A música, composta pela acordeonista ou por Timo Alakotila, também dos Troka (e igualmente presente no álbum das irmãs Kaasinen), não é fundamentalista, não se destinando ao gozo exclusivo de meia dúzia de iniciados. Tem, pelo contrário, um apelo universalista, apostando em simultâneo nos parentescos com a referência céltica e numa riqueza harmónica só possível em executantes de alto nível. Exemplo desta capacidade de tocar nos arquétipos do que poderíamos designar por “folclore universal” é um tema como “Green score”, onde o acordeão de Kalaniemi percorre diversas escalas e modos por uma vereda algures entre o “jazz” e um “folk rock” aveludado. Uma secção de metais usada com subtileza e um tango de Carlos Gardel contribuem para conferir a “Iho” a tal variedade de registos que torna a sua audição numa sucessão de pequenas e grandes surpresas. No título-tema, os metais juntam-se a uma guitarra elétrica aquática no que poderia ser a versão escandinava de uns Brass Monkey ou Home Service. “Trolipolska” possui o mesmo balanço sincopado de um “horo” dos Balcãs. Tudo somado, significa que Maria Kalaniemi, um dos poucos músicos naturais da Escandinávia ativos na cena folk europeia, soube aproveitar deste convívio o melhor que este tem para oferecer: o diálogo de culturas e de estilos, traduzido na afirmação daquilo a que já, por várias vezes, chamámos, “nova tradição”. (8)



Maria Kalaniemi – “Maria Kalaniemi”

Pop Rock

17 de Maio de 1995
álbuns world

Maria Kalaniemi
Maria Kalaniemi

GREEN LINNET, DISTRI. MC – MUNDO DA CANÇÃO


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Já vai sendo tempo de acabar com os preconceitos relativos ao acordeão. Nas mãos certas faz maravilhas como outro instrumento qualquer. John Kirkpatrick, Riccardo Tesi, Mairtin O’ Connor ou Rod Strading são não só notáveis tecnicistas como gravaram álbuns de grande qualidade. Acrescente-se a estes nomes o de Maria Kalaniemi, acordeonista sueca que faz parte dos Niekku, grupo que já abordámos nesta rubrica, a propósito do álbum “Niekku 3”, que vale a pena redescobrir. Kalaniemi é uma especialista do acordeão “5-row” (por ter cinco filas de botões) e na exploração de melodias de acompanhamento baixo. Grande improvisadora, estudou o estilo francês do baile “musette”, bem como o tango argentino, cujas técnicas de improvisação utilizou no tema “Olin sairas kun luokseni saavuit”. A maior parte do reportório, porém, é constituída por “polskas” suecas e finlandesas, nalguns casos recolhidas de um manuscrito do século XVII, de Samuel Rintaa-Nikkola. “Yxi kaunis papillinen polska” cruza-se com o imaginário africano, numa bizarra combinação do acordeão com uma “mbira” (ou “kalimba”, ou “thumb-piano”) da Tanzânia. A instrumentação, para alívio dos que receiam o confronto demasiado exclusivo com o acordeão, inclui ainda o piano, órgão de pedais, guitarra, rabeca, “nyckelharpa”, baixo eléctrico e o tamborim, pelo percussionista dos Hedningarna Björn Tollin. Um álbum não muito generalista, aconselhável aos incondicionais da música escandinava (atenção, quem está a pensar em ritmos rock deverá procurar noutras paragens…) e que poderá suscitar a curiosidade de auditores sintonizados noutras ondas. (7)