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Matto Congrio, Maddy Prior Band, Bailia Das Frores, Llan De Cubel, Bleizi Ruz, De Danann “Terceira Edição Do Intercéltico Começa Hoje No Porto – Pelo Caminho Das Estrelas”

Cultura >> Quinta-Feira, 02.04.1992

Terceira Edição Do Intercéltico Começa Hoje No Porto
Pelo Caminho Das Estrelas

Durante três dias, a música folk vai trazer de volta a animação à cidade do Porto, com gaitas-de-foles, violinos e bombardas. É o Festival Intercéltico, na sua terceira edição, tornado “ex-libris” cultural da capital nortenha. “Estes celtas são loucos”, já dizia Obélix. Ao Porto vai-se pelas estrelas.



Ao contrário das duas anteriores edições, em que a programação incidiu em regiões específicas do mundo celta, casos da Galiza em 1990, e da Bretanha, em 1991, este ano o Intercéltico estende-se à Irlanda, Inglaterra, Bretanha, Astúrias, Galiza e Portugal, de maneira a, pela primeira vez, fazer jus à designação que ostenta. De Danann, Maddy Prior Band, Bleizi Ruz, Llan de Cubel, Matto Congrio e uma “bailia das frores” encenada por António Tentúgal são os nomes agendados.
Também o leque das chamadas actividades paralelas se alargou. A organização – da Mundo da Canção, numa iniciativa do pelouro da Cultura da Câmara Municipal do Porto – voltou a apostar numa política de enquadramento cultural do certame, que visa fomentar, de facto, e não ao sabor de oportunismos a reboque da moda, o gosto do público pela música tradicional.
Assim, desde segunda-feira e até sexta, funciona no teatro Rivoli, no Porto, um Curso de Aproximação à gaita galega, em regime de seminário aberto ao público, com a participação do gaiteiro D. Jesus Olimpio Giraldez Rio. Tempo dos jovens portugueses ganharem pulmão e soprarem com força nas gaitas. Nas gaitas alheias porque infelizmente as nossas desafinam.
Mas há outras coisas para aprender e entreter neste Intercéltico que dispensam a utilização da caixa toráxica. Por exemplo: uma exposição de instrumentos musicais (no CRAT – Centro Regional de Artes Tradicionais) e outra sobre o barco Rabelo (embarcação que figura no logotipo, criado pela primeira vez para o festival, por Tentúgal). Ou videoramas e diaporamas sobre as nações célticas, com música e paisagens a condizer. Para quem quiser comprar os discos e livros da praxe haverá uma banca bem recheada logo à entrada do Rivoli. E porque não adquirir um artefacto de inspiração céltica, construído por um artesão galego, digamos, o caldeirão de Panoramix, um saquinho com restos de Stonehenge ou uma miniatura da catedral de Santiago de Compostela.
Festa é festa e por isso não faltará a gastronomia. Fala-se à boca pequena numas queimadas galegas a realizar em local incerto. Os verdadeiros degustadores celtas poderão sempre seguir a pista pelo olfacto. “O que está em cima é como o que está em baixo.” Os caminhos do céu correspondem aos da terra. E aos do estômago.

caixa
GRUPOS INTERVENIENTES
Quinta-Feira, 2 de Abril
MATTO CONGRIO (Galiza)
A Galiza tradicional dá as mãos à pop, ao rock e á “salsa”. Os Matto Congrio não têm preconceitos. Carlos Nunez, líder e gaiteiro da banda, tem uma folha de serviços de se lhe tirar o chapéu: trabalhous com o grupo de gaitas “Xarabal” com o qual gravou a caixa (4 LPs) “Instrumentos Populares Galegos”, participou no duplo CD “Cornemuses en Europe” (gravação ao vivo com os melhores gaiteiros solistas da Europa, no festival da Cornualha, disponível por altura do Intercéltico), e gravou com os Chieftains a banda sonora de “A Ilha do Tesouro”. Os restantes Matto Congrio são Anxo Lois Pintos (gaita-de-foles, violino), Santiago Cribeiro (acordeão, teclados), Diego Bouzón (guitarras), Pancho Alvarez (baixo, bandolim) e Isaac Palacin (bateria, percussões).

MADDY PRIOR BAND (Inglaterra)
Esteve no Folk Tejo do ano passado onde as condições acústicas não perdoaram. Para Maddy Prior, vocalista dos Steeleye Span, “irmã” de June Tabor das Silly Sisters e intérprete de música antiga na Carnival Band, o regresso a Portugal constitui uma espécie de vingança. A sua voz justifica por si só toda a atenção, sejam quais forem os músicos acompanhantes, neste caso: Nick Holland (teclados), Richard Lee (contrabaixo), Mick Dyche (percussões) e Steve Anftee (guitarra). Discografia seleccionada: “Please to see the King”, “Tem Man Mo por Mr. Reservoir Butler Rides Again”, “Below the Salt” e “Parcel of Rogues” (todos com os Steeleye Span), “Summer Solstice”, “Folk Songs of The Olde England”, vols. 1&2, (com Tim Hart), “No More to the dance” (Silly Sisters), “A Tapestry of Carols” (Carnival Band).

Sexta-Feira, dia 3
BAILIA DAS FRORES (Portugal / Galiza)
Projecto de António Tentúgal, que utilizará todo o espaço do teatro Rivoli para recriar o ambiente e os mitos da Ibéria medieval. Cerimónia que girará à volta dos quatro elementos que ligam Portugal e a Galiza: a terra, o mar, a saudade e a língua. Com músicos dos Vai de Roda e alguns convidados especiais: a cantora Uxia (ex-na Lua), um gaiteiro galego, Paulo Marinho (Sétima Legião), três sanfonineiros portugueses (que equivalem a 100% do total nacional), cantadeiras, pauliteiros, palhaços, bugios e o mais que se verá. Discografia: “Vai de Roda”, “Terreiro das Bruxas”.

LLAN DE CUBEL (Astúrias)
Utilizando uma instrumentação exclusivamente acústica, o reportório dos Llan de Cubel inclui, para além do folclore asturiano, tradicionais da Irlanda, Escócia, Bretanha e País de Gales. Tocaram ao lado de Alan Stivell, Oskorri, Chieftains, Tannahill Weavers, Milladoiro e Capercaillie, entre outros. Formação composta por Jose Manuel Cano (guitarra), Guzmán Maqués (violino, bouzouki, voz), Elias Garcia (bouzouki, voz), Marcos Llope (flauta, tin whistle, voz) e Fonsu Mielgo (acordeão, tambor e gaita-de-foles asturianos, tin whistle, voz). Discografia: “Deva”, “Na Llende”.

Sábado, dia 4
BLEIZI RUZ (Bretanha)
Os Bleizi Ruz (lobos vermelhos) há 18 anos que animam as tradicionais “Fest noz” (à letra: festas de noite) da Bretanha. Celebraram o aniversário com um disco ao vivo, “En Concert”. Aliás, para estes bretões (“ils sont fous ces bretons”, como diria Obélix) todas as ocasiões são boas para celebrar. Por isso a sua música assimilou ao longo dos anos as influências irlandesas, galegas, balcânicas ou a “cajun” do Louisiana. Para dançar sempre, seja qual for a origem do ritmo. A vertente séria pode ser encontrada nos “kan há’ diskan” (cantos de resposta) em que são peritos. Cantados em bretão porque “essa é uma forma de se ser bretão”. Os lobos são Eric Liorzou (guitarra, bandolim, sintetizador, voz), Bem Creach (baixo) e Bernard Quillien (bombardas, flauta, gaita-de-foles, voz). Discografia selecionada: “Coz Liorzou”, “Klask ar Plac ‘h”, “Pell há Kichen”.

De Danann (Irlanda)
Banda lendária, do “folk revival” irlandês dos anos 70, ao lado dos Planxty e dos Bothy Band. Sobreviveram da formação original o flautista (violinista Frankie Gavin e Alec Finn (guitarra, bouzouki). Pelos De Danann passaram, ao longo de várias formações, grandes vocalistas femininas como Dolores Keane, Mary Black ou Maureen O’Connor, presentes as três no álbum “Song for Ireland”. No Porto a responsabilidade cabe a Eleanor Shanley. Completam a formação que actuará no Intercéltico Arty McGlynn (outro grande guitarrista), Colin Murphy (bodhran) e Aidan Coffey (acordeão). Discografia selecionada: “De Danann”, “Selected Jigs, Reels & Songs”, “A Song for Ireland”, “Ballroom”, “Anthem”.

Vários – “III Edição Do Festival Intercéltico Arranca Em Abril No Porto – Celtas Em Manobras” (festivais / intercéltico)

Cultura >> Quarta-Feira, 11.03.1992


III Edição Do Festival Intercéltico Arranca Em Abril No Porto
Celtas Em Manobras


Galiza, Astúrias, Bretanha, Inglaterra e Irlanda são as regiões contempladas pelo programa do terceiro Festival Intercéltico, a realizar entre 2 e 5 de Abril na cidade do Porto. De Danann e Maddy Prior são os nomes de cartaz. Portugueses e galegos juntam-se sob a batuta de Manuel Tentúgal numa “Bailia de Frores” que se prevê festiva. O Porto volta a erguer o ceptro celta.



A pouco menos de um mês do seu início, o “Intercéltico” caminha para a consagração. Uma programação criteriosa e o cuidado, da parte da organização, em enquadrar os concertos num contexto cultural mais lato, garantem à partida o êxito da iniciativa. Mário Correia, do “Mundo da Canção”, Júlio Moreira, do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal do Porto e o músico Manuel Tentúgal revelaram ao PÚBLICO, em primeira mão, pormenores do que vai acontecer.
P. – Chegada à 3ª edição, o Intercéltico está em vias de se institucionalizar. Que garantias e apoios há nesse sentido?
MÁRIO CORREIA – Já na edição do ano passado a Câmara do Porto manifestara a intenção de assegurar, por todos os meios que estivessem ao seu alcance, essa institucionalização. É evidente que a Câmara só por si não tem meios para o fazer. Para tal torna-se necessária a conjugação de esforços e de apoios de outras entidades.
JÚLIO MOREIRA – Para o ano continuaremos a ter o apoio do Instituto Francês que se comprometeu a trazer todos os anos um grupo da Bretanha indicado pela organização. O ano passado tivemos a colaboração da Junta da Galiza. Este ano coube a vez do Principado das Astúrias que colabora na deslocação dos Llan de Cubel. Há também um acordo com a Câmara e com uma empresa de Vigo, aos quais se deve a vinda dos Matt Congrio. O festival é, como se vê, um bocado feito em termos de apoios externos dos países e das regiões celtas.
P. – Não há então por enquanto autonomia absoluta em termos organizativos?
J.M. – O Festival não tem de facto ainda autonomia. Para já não nos podemos comparar, por exemplo, ao Fantasporto que é organizado por uma associação própria. Recorde-se que o primeiro Festival Intercéltico foi organizado pelo Instituto Francês, no âmbito das suas actividades. O ano passado tudo surgiu na sequência da Semana da Bretanha. Neste momento, a Câmara é o principal financiador do Festival Intercéltico, no quadro de um programa de animação cultural e turística da cidade. Sem esquecer a própria revitalização do teatro ‘Rivoli’ [local onde decorrerão todos os espectáculos]. Quanto ao futuro, a Câmara comprometeu-se já a apoiar o festival do próximo ano. Depois é a incógnita levantada pelo período de eleições…
P. – Podemos depreender que tudo se continua a dever ainda ao esforço de um grupo de vontades isoladas, não havendo qualquer protocolo oficial que garanta a tal institucionalização do Festival?
J.M. – Acho que a questão é mais profunda do que isso, prendendo-se com uma política e um plano de actividades estabelecido pelo pelouro da Cultura e Animação da cidade, que dá prioridade às actividades culturais. O Festival Intercéltico faz parte desse plano, está lá consignado. Inflexões políticas à parte, como é evidente…
P. – Será possível levar parte dos espectáculos do “Intercéltico” ao Sul, e à capital, como acontece, por exemplo, com o Fantasporto?
J.M. – Este ano foi feita uma proposta à Câmara de Lisboa nesse sentido. Isso acabou por não ir para a frente porque o pelouro da Cultura da Câmara de Lisboa não parece ter grande vocação neste momento para organizar directamente espectáculos. Seria uma questão de encontrarmos outros interlocutores…
P. – O êxito das anteriores edições do festival deve-se me grande parte às chamadas “actividades paralelas”. O que está programado a este nível?
M.C. – Destaco, por exemplo, um “workshop” – um curso de aproximação À gaita galega, com a duração de cinco dias, proposto pelo grupo de teatro “Arte e Imagem” e orientado por um professor galego, Jesus Olimpio Geraldes Ryo. Haverá um diaporama sobre vários aspectos das nações célticas, e um videorama com música e imagens dos artistas intervenientes no festival. Tudo no Rivoli. Estão também agendadas uma exposição de instrumentos musicais populares do Norte de Portugal e da Galiza, nas instalações do Centro Regional de Artes Tradicionais (CRAT), ligada ao curso atrás referido e que documentará as várias fases de construção da gaita-de-foles, e outra, cedida pelo Arquivo Histórico do Porto, sobre o barco rabelo. Não faltarão, claro, as tendas de discos e de artesanato celtas.
P. – Ao contrário do ano passado – em que a escolha recaiu em artistas consagrados que, na prática, desiludiram, casos de Alan Stivell e dos Gwendal -, o programa deste ano parece mais seguro nesse aspecto, apesar de alguns nomes serem praticamente desconhecidos…
M.C. – A Câmara do Porto fez um grande investimento e acabou por dispor de um orçamento considerável. Foi feita uma série de contactos que, em certos países, obrigaram a uma selecção, como aconteceu com a Irlanda em que depois das hipóteses Four Men & A Dog e Ron Kavana, acabou por se optar por trazer os De Danann. Em relação à Bretanha aconteceu a mesma coisa com os Bleizi Ruz, escolhidos de um lote de seis grupos.
P. – A escolha de Maddy Prior não implicará um risco, depois do fracasso da sua apresentação no “Folk Tejo”?
M.C. – É quase um acto de vingança. A Maddy Prior é uma das grandes vozes da folk britânica e é preciso vingar a ausência de público a que foi votada no “Folk Tejo”.
P. – Existe alguma ligação temática entre os vários espectáculos?
R. – Este ano, pela primeira vez, essa ligação existe, sendo dado o privilégio à gaita-de-foles. Na próxima edição poderá ser a vez da guitarra portuguesa e do “bouzouki”, em destaque quer ao nível de actos musicais quer a nível de cursos, “workshops”, palestras, etc. A ideia será pôr músicos portugueses a dialogar com músicos estrangeiros.

Destaque:
Noite Galaico-Portuguesa Com “Bailia De Frores”
“Bailia De Frores”, espectáculo marcado para dia 3 de Abril no teatro Rivoli, é mais um projecto de Manuel Tentúgal, mentor do grupo Vai de Roda, que desta feita vai mais longe, compondo uma encenação musical que junta as heranças tradicionais galega e portuguesa. “Bailia de Frores”, assim mesmo, em galaico-português, seguirá um guião cuja temática gira, segundo Manuel Tentúgal, “à volta dos quatro elementos que relacionam Portugal com a Galiza: a terra, o mar, a saudade e a língua”.
Em palco vão estar músicos ligados ou não à música tradicional. “O objectivo é tentar contrariar a ausência de colaboração entre os músicos”, explica Tentúgal para quem é importante “despoletar esse confronto, por exemplo, entre violoncelistas e violinistas clássicos e um gaiteiro e coros tradicionais”.
Nos corredores e “foyers” do Rivoli, recriar-se-á o ambiente de uma feira medieval: “haverá máscaras, a participação dos “Bugios”, palhaços, cantadeiras, pauliteiros”. Depois, “tudo passará para o palco”, para um final em conjunto de todos os músicos envolvidos: a cantora galega Uxia, dois gaiteiros, um do Centro Cultural da Galiza e Paulo Marinho, dos Sétima Legião, as cantadeiras do Neiva, os pauliteiros do Orfeão Universidade do Porto, quatro sanfonineiros (Carlos Guerreiro, Fernando Meireles, Amadeu e o próprio Tentúgal) e membros dos Vai de Roda. Para o autor de “Terreiro das Bruxas”, “daqui poderá sair o germe de futuros supergrupos de música tradicional.

Programa
Dia 2:
Matt Congrio (Galiza)
Maddy Prior Band (Inglaterra)
Dia 3:
Llan de Cubel (Astúrias)
“Bailia de Frores” (Portugal)
Dia 4:
Bleizi Ruz (Bretanha)
De Danann (Irlanda)
Todos os espectáculos no Teatro Rivoli, no Porto