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Les Rita Mitsouko – “Rita Mitsouko” + “The No Comprendo” + “Marc Et Robert”

pop rock >> quarta-feira >> 21.04.1993
REEDIÇÕES


A EDUCAÇÃO DE RITA

LES RITA MITSOUKO
Rita Mitsouko (6)
The No Comprendo (5)
Marc Et Robert (5)
CD Virgin France, distri. Edisom



O estilo é a perdição dos franceses. Perdem-se de desejos pela imagem, pela pose, pela sofisticação a todo o custo. Os Rita Mitsouko, duo formado pela ex-porno actriz Catherine Ringer e pelo ressacado dos anos 70 Fred Chichin (tem um fraco pelas fantasias “glamour”: David Bowie, Iggy Pop, Sparks), pelam-se por uma boa fotografia e por um “clip” bem tirado. A música dos Rita Mitsouko – Mitsouko é a marca de um perfume de Guerlain – segue pela coleira da imagem.
A reedição das três primeiras obras do grupo gaulês pauta-se por uma caldeirada de géneros musicais subjugados pelo imperativo de dar a conhecer ao mercado estrangeiro (grande parte das canções é cantada em inglês) um som e bonecos passíveis de mercantilização à escala internacional. As sonoridades e ritmos latinos confundem-se com a canção de cabaré, as lágrimas de Piaf com descarrilamentos Velvet Underground, “pastiches” do romantismo decadente dos anos 70 (Roxy, Bowie) são atropelados por fanfarras “funky” ao retardador e desatinos “ska”, a voz de Catherine percorre a auto-estrada que liga o grito gutural ao ronrom de cama. Engraçada a operação de mimetismo das inflexões vocais de Robert Wyatt levada a cabo em “Un soir, un chien”. Mas a musicalidade intrínseca da língua francesa, em alguns casos, não ajuda, cravando pregos no tímpano, sobretudo quando Catherine se deixa levar por arrebatamentos “new wave”. A instrumentação é predominantemente constituída por sintetizadores e caixas-de-ritmo, o que desde logo remete a estética do grupo para os salões sintéticos da pop electrónica. Não por acaso, o produtor do primeiro álbum é Conny Plank, anfitrião em Berlim de tudo o que desde os anos 70 vem sendo conotado com a electrónica, do “Kosmische rock” aos experimentalismos cibernéticos do ex-Cluster Dieter Moebius. Se quisermos procurar alguns parentes próximos dos Rita Mitsouko, poderemos encontra-los, obviamente, nos Sparks ou nos suiços Yello. Mas não é preciso sair de França, onde outros dois duos já antes tinham encetado estratégias semelhantes de pop sintetizada apontada aos ecrãs de cinema: Kas Product e Alésia Cosmos. O problema dos Rita Mitsouko é talvez o de não serem nem carne nem peixe. Ou seja, a multiplicidade de pistas e a pluralidade de sentidos que dispersam faixa a faixa nestes três álbuns não encontram uma contrapartida aglutinadora, dando a ideia de que a banda procurou apanhar um qualquer comboio em andamento, numa ânsia de diferença que acaba por se diluir no ambiente geral de confusão. Falta-lhes o humor e o distanciamento dos Yello, a acidez corrosiva dos Kas Product e o radicalismo dos Alésia Cosmos. Os Rita Mitsouko absorveram com avidez 40 anos de cultura pop e quiseram regurgitá-la toda de uma vez. A digestão ficou completa. Poderiam ter encontrado um caminho em pseudobaladas como “La fille venue du froid” e “Vol de nuit”, mas preferiram a sofisticação da produção barroca entregue a Tony Visconti em “The No Comprendo” e “Marc et Robert”. Ou ter-se-ão guardado para os filmes. O “videoclip” de “Marcia baila”, extraído do primeiro álbum, foi comprado pelo Museu de Arte Moderna de Nova Iorque. As sessões de gravação de “The No Comprendo” foram filmadas por Jean-Luc Godard. Bandas sonoras que fariam boa figura em desenhos animados.

Les Rita Mitsouko – “Rita Mitsouko” – “The No Comprendo” + “Marc Et Robert”

pop rock >> quarta-feira >> 21.04.1993
REEDIÇÕES


A EDUCAÇÃO DE RITA

LES RITA MITSOUKO
Rita Mitsouko (6)
The No Comprendo (5)
Marc Et Robert (5)
CD Virgin France, distri. Edisom



O estilo é a perdição dos franceses. Perdem-se de desejos pela imagem, pela pose, pela sofisticação a todo o custo. Os Rita Mitsouko, duo formado pela ex-porno actriz Catherine Ringer e pelo ressacado dos anos 70 Fred Chichin (tem um fraco pelas fantasias “glamour”: David Bowie, Iggy Pop, Sparks), pelam-se por uma boa fotografia e por um “clip” bem tirado. A música dos Rita Mitsouko – Mitsouko é a marca de um perfume de Guerlain – segue pela coleira da imagem.
A reedição das três primeiras obras do grupo gaulês pauta-se por uma caldeirada de géneros musicais subjugados pelo imperativo de dar a conhecer ao mercado estrangeiro (grande parte das canções é cantada em inglês) um som e bonecos passíveis de mercantilização à escala internacional. As sonoridades e ritmos latinos confundem-se com a canção de cabaré, as lágrimas de Piaf com descarrilamentos Velvet Underground, “pastiches” do romantismo decadente dos anos 70 (Roxy, Bowie) são atropelados por fanfarras “funky” ao retardador e desatinos “ska”, a voz de Catherine percorre a auto-estrada que liga o grito gutural ao ronrom de cama. Engraçada a operação de mimetismo das inflexões vocais de Robert Wyatt levada a cabo em “Un soir, un chien”. Mas a musicalidade intrínseca da língua francesa, em alguns casos, não ajuda, cravando pregos no tímpano, sobretudo quando Catherine se deixa levar por arrebatamentos “new wave”. A instrumentação é predominantemente constituída por sintetizadores e caixas-de-ritmo, o que desde logo remete a estética do grupo para os salões sintéticos da pop electrónica. Não por acaso, o produtor do primeiro álbum é Conny Plank, anfitrião em Berlim de tudo o que desde os anos 70 vem sendo conotado com a electrónica, do “Kosmische rock” aos experimentalismos cibernéticos do ex-Cluster Dieter Moebius. Se quisermos procurar alguns parentes próximos dos Rita Mitsouko, poderemos encontra-los, obviamente, nos Sparks ou nos suiços Yello. Mas não é preciso sair de França, onde outros dois duos já antes tinham encetado estratégias semelhantes de pop sintetizada apontada aos ecrãs de cinema: Kas Product e Alésia Cosmos. O problema dos Rita Mitsouko é talvez o de não serem nem carne nem peixe. Ou seja, a multiplicidade de pistas e a pluralidade de sentidos que dispersam faixa a faixa nestes três álbuns não encontram uma contrapartida aglutinadora, dando a ideia de que a banda procurou apanhar um qualquer comboio em andamento, numa ânsia de diferença que acaba por se diluir no ambiente geral de confusão. Falta-lhes o humor e o distanciamento dos Yello, a acidez corrosiva dos Kas Product e o radicalismo dos Alésia Cosmos. Os Rita Mitsouko absorveram com avidez 40 anos de cultura pop e quiseram regurgitá-la toda de uma vez. A digestão ficou completa. Poderiam ter encontrado um caminho em pseudobaladas como “La fille venue du froid” e “Vol de nuit”, mas preferiram a sofisticação da produção barroca entregue a Tony Visconti em “The No Comprendo” e “Marc et Robert”. Ou ter-se-ão guardado para os filmes. O “videoclip” de “Marcia baila”, extraído do primeiro álbum, foi comprado pelo Museu de Arte Moderna de Nova Iorque. As sessões de gravação de “The No Comprendo” foram filmadas por Jean-Luc Godard. Bandas sonoras que fariam boa figura em desenhos animados.

Vários – “Festa Da Música Em Bourges, Entre 30 De Abril E 5 De Maio – Sagração Da Primavera” (artigo / antevisão / concertos / festivais)

Secção Cultura Domingo, 31.03.1991


Festa Da Música Em Bourges, Entre 30 De Abril E 5 De Maio
Sagração Da Primavera

Festa da música em Bourges, pequena cidade medieval francesa. É o “Printemps de Bourges”, ponto de encontro e convívio da França com o resto do mundo, na descoberta e partilha de um espaço cultural europeu comum.

Este ano no “Printemps de Bourges”, entre 30 de Abril e 5 de Maio próximos, como de costume, o programa é aliciante e diversificado, num leque que vai do classicismo pós-moderno de Wim Mertens e a música antiga dos Hespérion XX, ao jazz de Manu Dibango (vertente “afro”) e Carla Bley com Steve Swallow, sem esquecer, obviamente, o rock representado pelos House of Love e Elliott Murphy, ou o universo múltiplo das músicas étnicas.
Com o apoio e patrocínio de entidades oficiais (o Ministério da Cultura e Comunicações, a Secretaria de Estado para a Juventude e Desportos ou a “Maison de la Culture de Bourges) e instituições particulares (MCM – Euromusique, L’ARCAM, Coca-Cola, Air France, etc.), o “Printemps de Bourges” conta entre os seus objectivos “encorajar os jovens artistas e possibilitar ao maior número de pessoas possível a descoberta de novos músicos e a audição das suas vedetas preferidas”.

Espectáculo Na Rua

À semelhança do que aconteceu no ano passado, o centro das operações localiza-se na parte antiga da cidade, num périplo que inclui as suas principais zonas históricas, impecavelmente servido em termos de infra-estruturas habitacionais e comerciais. Quando despertar ao som de músicas estranhas, invadida por milhares de forasteiros atraídos pela curiosidade, pela festa ou pela magia única doo acontecimento, a habitualmente pacata cidade de Bourges transfigurar-se-á, adquirindo a aura luminosa e o prestígio das grandes galas culturais.
O Palácio dos Congressos, o “Grand Théatre” e o Pavilhão, salas menores como as “Gilles Sandier”, “Duc Jean” e “Germinal”, e a própria catedral, preparam-se para abrir as portas à música, ao espectáculo e às inúmeras surpresas capazes de transformar o festival em qualquer coisa de inesquecível. Mas nem só nos recintos fechados haverá que ver e ouvir. Como é da praxe, também as ruas da cidade serão palco para o que der e vier, através dos designados “Hors Jeu” – actividades paralelas que este ano vão desde o “cosy disco centre d’art”, estranho acampamento completo, espécie de festival dentro do festival, que junta os conceitos de circo, dança e centro cultural alternativo, ao desfile dos chamados “trens eléctricos” brasileiros – orgia carnavalesca sobre rodas.

“Troupe” Surrealista

Despoletar e encantar a imaginação infantis é a tarefa a cargo da “troupe” surrealista “Maximomes”. Mas que ninguém se espante se deparar com um camião orquestra, uma agência noticiosa (“L’Agence Tartare ‘La Chaine’”), encarregada de confundir e difundir notícias e acontecimentos fantasiosos (!) ou com a possibilidade de aprender, “in loco”, a disparar um canhão napoleónico. Os “Generik Vapeur et la grande petarde nocturne motorisée” prometem tornar as ruas num pesadelo povoado de criaturas estranhas e cerimónias apocalípticas. Por vezes acontecerá tudo ao mesmo tempo.

Nomes Importantes

Para quem preferir o conforto dos recintos fechados, o mais difícil será escolher. Todos os dias, entre as duas da tarde (no “Germinal – découvertes” – à descoberta dos novos valores do rock) e as tantas da manhã, a música não para e a excitação muito menos. Entre os concertos agendados com nomes de cartaz, destaque para Eliott Murphy (rock americano urbano) e Manu Dibango (jazz + funky = cataclismo rítmico), dia 30; Bel Canto (pop norueguês da “nova idade”) e Carla Bley com Steve Swallow (duo piano/baixo por dois expoentes no jazz actual), dia 1; Guesh Patti (animal de palco em “music-hall” revisitado), Wim Mertens (minimalista, classicista, pianista, monárquico e doido genial) e os House of Love (guitarras e canções da nova geração Pop britânica), dia 3; Juliette Greco (grande dama da “chanson française”), dia 4; Jimmy Sommerville (ex-Communards, porta-voz das emoções “gay”), dia 5. Realce muito especial para a actuação do grupo de música antiga Hespérion XX, dirigido por Jordi Savall e onde pontifica a voz sublime de Monserrat Figueras, dia 1, na catedral.
A lista continua: UB 40 (“reggae” em corte inglês), Geoffrey Oriema (dos nomes mais importantes da actual música africana, Brian Eno e Peter Gabriel não lhe regateiam elogios), os franceses Les Rita Mitsouko e Les Negresses Vertes, New Model Army (os novos “Clash”, para o “Times”), Flying Pickets (vocalizações “a cappella”), Kanda Bongo Man (rumbas zairenses transvertidas em música de dança). Depois, partir à descoberta dos nomes novos e novas emoções: Elmer Food Beat, Victims Family, Sons Of The Desert, Noise Gate, Bat Attack, Patrick Bruel, Reynaldo Anselmi, Bratsch, Paris Musette… Em Bourges, a música faz a Primavera.