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Kraftwerk – “O Admirável Mundo Novo” (artigo de fundo | dossier | blitz)

BLITZ 3 ABRIL 1990


KRAFTWERK

O ADMIRÁVEL MUNDO NOVO


«I Sing the Body Electric»
Ray Bradbury

Bip Bip Bip. Boing Boom Tschak. A beleza da música dos alemães Kraftwerk é a beleza da eletricidade em estado puro. A harmonia da informação circulando livremente através dos chips de circuitos integrados. O classicismo digitalizado. A herança elegante de uma Europa crepuscular rendida à imagem requintada da despersonalização e da indiferença. Ralf Hutter, Florian Schneider, Wolfgang Flur e Klaus Roeder são as quatro máscaras humanas para um rosto que deixou de o ser. Manequins de gesto suspenso sobre a imobilidade gelada do Tempo aprisionado. Save. Enter. Return.

É costume considerar os Kraftwerk como os precursores de quase todas as principais inovações relativas às técnicas de estúdio. O «Disco Sound» ou o «Rap» proclamam-se devedores das manipulações sonoras levadas a cabo pelos quatro homens de Dusseldorf. Estes não confirmam nem desmentem, limitando-se a gravar discos, sem fazer grandes ondas e alargando com cada um deles as fronteiras do que se convencionou na generalidade designar por «música eletrónica».



Hutter e Schneider, os fundadores da banda, encontraram-se em 1970 no Conservatório de Música de Dusseldorf, uma das cidades mais industrializadas da Alemanha, e formaram os Organisation. Sob esta designação foi editado o álbum «Tone Float», gravado e produzido por Conny Plank numa refinaria de petróleo da cidade. No mesmo ano nascem os Kraftwerk que gravam no ano seguinte o álbum estreia «High Rail», com o selo Philips. No ano seguinte a Vertigo reúne estes dois discos num duplo intitulado simplesmente «Kraftwerk», infelizmente há já alguns anos fora do mercado. Na sua fase inicial a música do grupo conciliava as explosões de metal, o minimalismo e a música concreta com um lirismo exacerbado tão caro ao Romantismo alemão. Grupos como os Einstuerzende Neubauten, Test Dept, ou os primeiros SPK decerto que ouviram e aprenderam muito com este disco seminal.
O álbum seguinte, «Ralf and Florian», de 83, prossegue a mesma via, com temas fabulosos como «Eletrisches Roulette», à beira da esquizofrenia, a dança metálica de «Tanzmusik» e os catorze minutos planantes, cristalinos e tropicais de «Ananas Symphonie».
Em 74 os Kraftwerk passam a quarteto, com a inclusão de Klaus Roeder e Wolfgang Flur, respetivamente no violino e guitarra e nas percussões eletrónicas. É com esta formação que gravam, no mesmo ano, a obra-prima «Autobahn», um dos melhores discos de sempre de música eletrónica. O primeiro lado é ocupado na totalidade pela faixa do mesmo nome, uma «trip» psicadélica-automobilística, só ao alcance das auto-estradas e das cabeças teutónicas. Sem despistes e com as mudanças engatadas sempre na altura exata. Nunca os sintetizadores, «Vocoders» e «sequencers» tinham andado a tanta velocidade. O Futuro tinha começado. Do outro lado do disco o fogo-de-artifício sonoro em duas deslumbrantes versões de «Kometenmelodie». Surpreendentemente as rádios americanas e inglesa tocam uma versão mais curta de «Autobahn». O single e o álbum alcançam todos os Tops abrindo caminho para a vaga do «Eurodisco», com Giorgio Moroder à frente. «I Feel Love» é a voz de Donna Summer sobre um plágio grotestco dos ritmos robóticos dos alemães. Curiosamente este tema tem sido «samplado» pelas novas bandas até à exaustão. O Tempo é cada vez mais uma ilusão.
Em outubro de 75 Karl Bartos (percussão eletrónica) substitui Roeder, ficando assim constituída a formação que até à data se mantém inalterável. No mesmo mês, os Kraftwerk abandonam a Philips/Vertigo e formam a sua própria editora a Kling Klang, distribuída pela EMI. Ainda em 75 é publicado o LP «Radio Aktivitaet», versão original alemã de «Radio Activity» que sai em Inglaterra no ano seguinte. «Radio Activity» é o álbum mais fraco da banda, versão turístico-infantil da estética futurista. A simplicidade de meios, propositada ou não, e letras pueris à beira do imbecil tornam a audição do disco apenas divertida. Destaque mesmo assim para o título-tema «Radio Activity» e «Airwaves», dançáveis e irremediavelmente coláveis aos ouvidos.
1977 é o ano de «Trans Europe Express», dos manequins-réplicas em palco e do retorno à boa forma. «Trans Europe Express», «Metal on Metal» ou «Franz Schubert», metálicos, gelados e repetitivos são paradigmáticos e proféticos da «Cold Wave» que se avizinhava. Mais uma vez os Kraftwerk ditavam as leis, escrupulosamente seguidas pelas gerações futuras.
«The Man Machine» aparece no ano seguinte levando às últimas consequências todas as anteriores premissas estéticas e ideológicas do grupo. O fator humano cede definitivamente ao fator máquina. O álbum abre com «The Robots» e fecha com «The Man Machine». «Spacelab», «Metropolis», e «Neon Lights» são imagens de um filme fantasmático sobre cidades percorridas por sonâmbulos, ecos de «slogans» cibernéticos e neons deslumbrantes. O filme para. A realidade é elétrica. A luz torna-se branca. E fria.
«Computer World», de 81, é mais humano ou talvez não consoante a perspetiva. Em «Pocket Calculator» os Kraftwerk utilizam o som de uma calculadora eletrónica de bolso. «Numbers» é a Torre de Babel do Novo Mundo reduzido a ações de compra e venda, números e mais números soletrados em diversas línguas sobre um ritmo implacável de máquinas em sintonia. A realidade é matemática, rigorosa, previsível e programável. «Computer Love», bits em forma de coração, «I-L-O-V-E-Y-O-U» repete a voz sintetizada enquanto a mensagem vai piscando no monitor. «Home Computer», «It’s More Fun to Compute» e as máquinas continuam a dançar.
«Tour de France», como o nome indica, é dedicado à célebre prova velocipédica e aparece no filme «Breakdance» (!).
Finalmente, em 86, a EMI edita «Electric Cafe». Os Kraftwerk atingem com este disco o ponto de plenitude em que a superficialidade e o desprendimento se confundem com o sublime. O humor surge radioso no fim e do alto da tragédia há sempre um sorriso irónico e distante. «Techno Pop» é o estado atual da música Pop massificada, reduzida a sons empacotados e prontos a vender em supermercados. «The Telephone Call», a conversa telefónica unilateral com uma gravação que insiste em dizer que aquele número foi definitivamente desligado. «Sex Object», de novo os bonecos-fétiche de carne e osso. Palavras vazias, repetidas, destroçadas. Séc. XX ou XXI, já nada faz sentido ou tudo faz simultaneamente todos os sentidos. Todas as coisas, todos os sons, Eletricidade, «Electric Cafe», sintético, sonoro, nuclear, infinito, finito, circular, sintético, sonoro, «Musique Non Stop» – «Techno Pop».

Vários (Chieftains, Bakerswell, Panxty, Whitlebinkies, Alison Kinnaird, Battlefield Band, Gordon Mooney) – «O TEMP(L)O DOS CELTAS» (blitz | artigo de opinião | dossier)

BLITZ 13 FEVEREIRO 1990

O mercado discográfico nacional foi inundado recentemente por uma série de importações de obras relativas à música tradicional de raiz celta. No meio de tanta fartura muito terão ficado confundidos com a profusão de títulos e talvez pelo súbito interesse que este tipo de música volta a suscitar. Sobretudo para estes, que não sabem por onde começar, aqui vai como que um guia orientador das melhores opções de entre a oferta disponível


«O TEMP(L)O DOS CELTAS»

A música tradicional nunca esteve (ou esteve sempre, consoante a perspectiva) na moda. Uma ou outra vez sai um pouco mais da sombra, são referidos alguns nomes e discos (geralmente os piores e menos representativos) por parte de algum crítico entediado e a coisa rapidamente passa de novo à História. Assim, periodicamente, o fenómeno renasce por entre a confusão dos «media» que apressadamente atiram com o rótulo revivalista ao ar e já está.
Quanto à música celta propriamente dita, vai dispensando e desafiando a incompreensão, o desconhecimento e todas as manobras que se vão desenrolando à sua volta. É intemporal, tem quem verdadeiramente a ame e isso basta-lhe. Os discos que agora vão enchendo as prateleiras de algumas das nossas discotecas, chegam-nos do Porto e abrangem unicamente as músicas irlandesa e escocesa. Vejamos então o que sobressai de tanta quantidade que justifique a aquisição ou pelo menos uma audição atenta.
Da Irlanda, através dos selos Claddagh e Tara, eis uma parte do que vale a pena. Tomem nota:
BAKERSWELL – Na linha dos Chieftains, com a encantatória gaita-de-foles, violino e a harpa da senhora que costuma tocar com os Oisin. Verde e água. Irlanda até ao fim.
CHIEFTAINS – O emblema musical irlandês. À disposição dos interessados nada menos que 14 álbuns, desde o primeiro, de 1964, gravado em mono, até ao recente «Ballad of the Irish Horse». Os exagerados não se contentarão com menos do que a totalidade. Em todo o caso, para os mais prudentes e seletivos, aconselho o volume 5 (na altura editado pela Island) e o seguinte, «Bonaparte’s Retreat», este último contando com a voz dessa grande senhora que dá pelo nome de Dolores Keane (posteriormente nos De Dannan a atualmente movendo-se a solo em terrenos menos tradicionalistas). Para além, claro, dos respeitáveis Paddy Moloney, na gaita-de-foles, Sean Keane e Martin Fay, os violinistas de serviço e Derek Bell na harpa. Jigs, reels, airs, hornpipes, é dançar até não se poder mais, de preferência com o bom velho whisky a acompanhar.
PLANXTY – Na minha opinião (e decerto nas de muitos mais), o grupo mais original e inventivo ao nível dos arranjos e interpretações do cancioneiro tradicional irlandês. Por aqui passaram nomes lendários como Christy Moore, Liam O’Flynn, Andy Irvine, Donal Lunny ou Matt Molloy (que também tocou nos Chieftains e nos Bothy Band). Todos os álbuns são indispensáveis mais os mais fáceis de encontrar são «The Woman I Loved so Well» e «After the Break». Corram e não parem até os encontrarem.
WHISTLEBINKIES – Anda por aí o volume 4 que é excelente. Música bastante variada ao nível das combinações instrumentais, servida por intérpretes de primeiríssima qualidade. Ah, é verdade, são escoceses, embora gravem para uma editora rival.
Merecem ainda uma escuta atenta e aquisição por parte dos fanáticos que não deixam escapar nada, os álbuns a solo de Derek Bell («Carolan’s Receipt») e Matt Molloy («Stony Steps»), o quarto discos dos Oisin («The Jeannie C»). Só para os iniciados no grau mais elevado sugiro os discos de John Molineux com música tocada exclusivamente em saltério («Douce Amère») e finalmente temas tradicionais interpretados no cravo por Sean O’Riada («O’Riada’s Farewell»).
E passemos à Escócia.
ALISON KINNAIRD – «The Harper’s Gallery». A harpa escocesa (clarsach) em todo o seu cristalino esplendor. Alison também canta e nalguns temas é ajudada pelos seus amigos da Battlefield Band, em instrumentos variados, e pelo seu marido Robin Morton, patrão e dinamizador da Temple Records, cujo estúdio é mesmo uma antiga abadia perdida algures no meio do nevoeiro.
Exclusivamente de harpa é o álbum que gravou em dueto com Ann Heymann, uma americana de alma celta apaixonada pelas cintilações do instrumento, neste caso na variante irlandesa («The Harper’s Land»).
BATTLEFIELD BAND – Os reis da festa. A Escócia infinitamente recuperada e reinventada. Cada álbum que gravam é uma constante surpresa. Passam dos ambientes mais profundamente tradicionais para um reel baseado em «Bad Moon Rising» (esse mesmo, o dos Creedence) sem nunca perderem o pé nem o toque característico da música celta. Juntam descaradamente o som da gaita-de-foles ou de instrumentos medievais ao computador de ritmos. Sabem ser sérios e divertidos nas alturas certas. Retiram da música tradicional aquilo que ela tem de essencial e acrescentam-lhe a sua própria inspiração. São brilhantes. Adquiram sobretudo os álbuns «Home is Where the Van is», «There’s a Buzz», «Anthem for the Common Man», «On the Rise» e «Celtic Hotel». Excelente é também o disco a solo do multi-instrumentista da banda, Brian McNeill, «Unstrung Hero», com temas da sua autoria mas totalmente imbuídos do espírito antigo. Uma referência final para mais alguns discos, digamos que para especialistas: «O’er the Border» de GORDON MOONEY, o paraíso para os amantes das sonoridades das diversas gaitas-de-foles (no caso as variantes escocesas das Highlands e as «cauld Wind»), «Fonn is Furan» pela voz de FINLAY MACNEILL, inteiramente cantado em gaélico, os dois volumes de «Music in Trust», uma colaboração de Alison Kinnaird com os Battlefield Band para uma série televisiva dedicada aos monumentos e zonas históricas nacionais e mais um disco dedicado à harpa de MAIRE NI CHATHASAIGH («The new strung harp»).
Há pois muito por onde escolher e para complicar ainda mais a coisa, ainda por aí andam espalhadas algumas pedras preciosas, álbuns absolutamente indispensáveis para um «folkie» que se preze. São eles:
Ashley Hutchings/John Kirkpatrick: «The Compleat Dancing Master», Boys Of The Lough: «Farewell and remember me» e «Sweet Rural Shade», Blowzabella: «A Richer Dust», Cock & Bull: «Sacred Cows and concrete routs»; House Band: «The House Band», John Kirkpatrick/Sue Harris: «Stolen Ground», June Tabor: «Ashes and Diamonds», Late Night Band: «Kings of the Baroque’a’Billy», Martin Carthy: «Out of the Cut» e «Right of Passage», Roger Watson: «Chequered Roots», Richard Thompson: «In Strict Tempo», Shirley & Dolly Collins: «Love, Dead and the Lady» e Silly Sisters: «No More to the Dance», para além de tudo o que por cá existe de Stivell, claro.
… E depois o Universo imenso que falta: da Bretanha, da Galiza, da Provença, do resto da França, do Minho e Trás-os-Montes continuam a chegar os novos bardos e trovadores. An Triskell, Tri Yann, Malicorne, Mélusine, La Bamboche, Doa, Milladoiro, Pablo Quintana, Amancio Prada, Mont-Jòia, Le Bardon, Emilio Cao, Ronda dos Quatro Caminhos, Maio Moço e mais algumas boas dezenas de nomes mas para já estes chegam.
A Chama e Alma Celtas continuarão eternamente a brilhar.

Vários – “O Balanço Final” (lista | melhores dos anos 80 – 2ª metade da década | dossier | artigo opinião)

BLITZ 23 JANEIRO 1990 >> Valores Selados


O BALANÇO FINAL

Depois dos primeiros cinco anos conclui-se nestes «valores» o balanço final dos melhores da década. A partir de 85 houve ainda mais discos a merecerem toda a nossa atenção e aplauso. Poucos os terão notado. Não faz mal, eles (os discos) continuam à espera de quem os souber merecer. Muitos dos nomes citados permanecem num injusto quase anonimato. Mas são eles que fizeram e fazem o melhor da história da música dita popular.

Novamente por ordem alfabética, eis a relação dos vinte melhores para cada ano:

1985

Alésia Cosmos: Aeroproducts (Pop minimalista francês).
Andrew Poppy: The Beating of Wings (Minimalismo outra vez, desta vez do sério. Mais eletrónico do que a concorrência).
Art Barbeque: Feet Hacked Rails (Música industrial para Sado-masoquistas).
Benjamin Lew & Steven Brown: À Propôs d’un Paysage (Paisagens ambientais em aguarela, cheias de pormenores).
Biota: Vagabones & Rockabones (Compêndio definitivo da arte do ruído).
Einstuerzende Neubauten: Halber Mensch (Os martelos-pilões finalmente domesticados).
Foetus: Nail (Viagem guiada ao Inferno).
Kalahari Surfers: Living in the Heart of the Beast (Su-africanos vanguardistas e intervencionistas).
Laibach: Nova Akropola (Neo-nazis ou brincalhões? Wagner, se fosse vivo, aprovaria).
Legendary Pink Dots: Asylum (Hippies disfarçados, clássicos, bizarros, transtornados).
Mathilde Santing: Water Under the Bridge (Pura magia. Nunca mais fez nada igual).
Michael Nyman: A Zed and Two Naughts (Novos labirintos para a fita de Greenaway).
Nico & The Faction: Camera Obscura (Requiem final pela senhora de negro).
Nurse With Wound: The Sylvie and Babs High-Thigh Companion (Stephen Stapleton é louco e gosta de misturar todos os sons, todas as músicas, todas as manias. Stephen é um génio, só que doutro mundo).
Peter Principle: Sedimental Journey (O lado mais experimental dos Tuxedomoon).
Regular Music: Regular Music (Repetitivos e barrocos. Discípulos de Nyman com Charles Hayward ao comando).
Severed Heads: Clifford Darling, Please don’t Live in the Past (Obras mestra dos terroristas australianos. O terror pode ser engraçado).
Urban Sax: Fraction sur le Temps (Os saxofones do Apocalipse).
Wondeur Brass: Ravir (Três senhoras canadianas que aprenderam muito com Carla Bley).
Zoviet France: Gris (O cimento é musical? Resposta: Neste caso é).

1986

Cassiber: Perfect Worlds (Free jazz + Beethoven + ruído, por Heiner Goebbels e Chris Cutler).
Conrad Schnitzler & Michael Otto: Micon in Italia (Fusão entre a eletrónica e instrumentos de orquestra).
Daniel Schell & Karo: If Windows They Have (Expoente máximo da nova música de câmara europeia).
David Garland: Control Songs (Canções, sampling exaustivo, acordeão, voz de «Crooner», Zorn, C. Marclay e G. Klucevsek como convidados. Chega?).
David Linton: Orchesography (As tácticas de Elliott Sharp aplicadas à eletrónica).
Elliott Sharp: Virtual Stance (As tácticas de Elliott Sharp aplicadas à eletrónica).
Godard Fans: Godard, Ça vous Chante? (Homenagem ao cineasta com interpretações brilhantes de Zorn, Lindsay, Clint Ruin (Foetus) e Amati Ensemble, ente outras).
Graeme Revell: The Insect Musicians (Inteiramente realizado com samples de sons dos ditos, pelo mentor dos SPK. Brilhante).
Holger Hiller: Oben im Eck (Opus 2 da bíblia do «sampling»).
John Zorn: The Big Gundown (Obra-prima absoluta pelo mestre da rapidez. Tudo encaixa no lugar certo, como nos desenhos animados. Só para ouvidos ultra-ágeis).
Kraftwerk: Electric Cafe (disco típico do séc. XXII).
Laurie Anderson: Home of the Brave (Laurie antes do grande pecado).
Nurse With Wound: Spiral Insana (mais contemplativo e perturbante que «Sylvie»).
O Yuki Conjugate: Into Dark Water (Eletrónicos e sombrios. Jon Hassell teve um pesadelo).
Poules (les): Contes de l’Amère-Loi (As mesmas senhoras dos Wondeur Brass brincando aos computadores).
SPK: Zamia Lehmani (Songs of Byzantine Flowers) (A Música religiosa dos discípulos das trevas).
Steve Beresford, David Toop, John Zorn, Tonie Marshall: Deadly Weapons (Quatro excêntricos unidos na produção de um filme imaginário superinspirado. Ponto de fuga das mais recentes tendências do Jazz (?) atual).
Steve Reich: Sextet/Six Marimbas (Cristal minimal).
Sussan Deyhim & Richard Horowitz: Desert Equations: Azax Attra (as vozes do deserto encontram os sintetizadores).
Test Dept: Unacceptable Face of Freedom (O Ocidente infernal)
e ainda: Bruce Gilbert: The Shivering Man; Camberwell Now: The Ghost Trade; Collectif Nox: Sessions 84/86; Derome/Lussier: Soyez Vigilants, Restez Vivants; Harold Budd: Lovely-Dusks; Jon Hassell: Power Spot; Masahide Sakuma: Lisa; Neo Museum: Nouvelles Ethnologies de L’Obscure Museum; Orthotonics: Luminous Bipeds; Peter Hammill: Skin; PFS: Illustrative Problems; Semantics: Rothenberg, Sharp, Bennett; Skeleton Crew: The Country of Blinds; Recoil: 1+2; The The: Infected; Tom Van Der Geld: Small Mountain.
1987

Arthur Russell: World of Echo (com pouco se faz muito, uito, uito…).
Art Zoyd: Berlin (O disco da década. A síntese perfeita. Encontro da Tradição com o Futuro num disco perfeito).
Derome/Lussier: Le Retour des Granules (Nova colaboração entre os sopros de Derome e a guitarra Frithiana de Lussier).
Double-X-Project: Fallobst (grupo alemão feminino de Jazz eletrónico minimalista ou lá o que isso é).
Elliott Sharp: In the Land of the Yahoos (Sharp goes Electropop? Quase!… O seu disco mais acessível, com a voz de Sussan Deyhim).
Jocelyn Robert: Stat-Live-Moniteur (Colagens. Ruído. Ambiental. Étnico. Eletrónico. Lembram-se dos Faust?).
John Zorn: Spillane (Banda sonora de filme negro a 78 rotações).
Lounge Lizards: No Pain for Cakes (John Lurie volta a atacar o Jazz com unhas e dentes. Os puristas não gostam).
Negativland: Escape from Noise (Os rapazes da Contracosta americana voltam a baralhar tudo de novo. Paranoico, diferente, divertido).
Popular Mechanics: Insect Culture (A vanguarda soviética nos desvarios de Sergei Kuriokhin, ainda não se falava da Perestroika).
Renaldo And The Loaf: The Elbow is Taboo (Discípulos dos Residents, como estes divertidos e esquisitos).
Robert LePage: La Traversée de La Mémoire Morte (Sintetizadores analógicos, manipulação de fitas à antiga, sopros ora swingantes ora fragmentados. Excelente e genuinamente original).
Robert Musci & Giovanni Venosta: Water Music on Desert Sand (A Música de todos os mundos. A síntese de todas as tradições. A mistura de todos os sons. Genial).
Scott Johnson: John Somebody (Guitarra e colagens sem tesoura. Filho do casamento entre Steve Reich e Laurie Anderson antes do pecado).
Slagerij Van Kampen: Out of the Doldrums (Inteiramente realizado com samples de percussão).
Startled Insects: Curse of the Pheromones (Funky para mentes muito, muito distorcidas).
Teargarden: Tired eyes Slowly Burning (Projeto de E. Ka-Spel dos L.P. Dots e Cevin Key, dos Skinny Puppy).
Wondeur Brass: Simoneda, Reine des Esclaves (das Canadianas apreciadoras de jazz e «Chanson Française»).
Wayne Horvitz: This New Generation (Costuma tocar com Zorn mas este disco nao tem nada a ver. Pop-Jazz, talvez?…)
e ainda: Andrew Poppy: Alphabed (a Mystery Dance); Bourbonese Qualk: Bourbonese Qualk; French, Frith, Kaiser & Thompson: Live, Love, Larf & Loaf; Jazz Passengers: Broken Night/Red Light; Kahondo Style: Green Tea and Crocodiles; Legendary Pink Dots: Any Day Now; Mark Stewart: Mark Stewart; Meredith Monk: Do You Be; Nimal: Nimal; Philip Perkins: Hall of Flowers/The Flame of Ambition; Steven Brown: Searching for Contact; Yasuaki Shimizu: Music For Commercials.

1988

Ben Neill: Mainspring (Trompete traficado em fundo minimalista).
Bobby Previte: Claude’s Late Morning (Mais um músico ligado a Elliott Sharp, desta vez o percussionista).
Coil: Gold is the Metal (As magias invertidas em tons classizantes).
David Borden/Mother Mallard: Migration (Um dos nomes fundamentais da nova escola minimalista americana).
David Fulton: Marcos & Harry, pt. 3 – Semi Trilogy (Serrotes e computadores no novo tribalismo elétrico).
Delerium: Faces, Forms & Illusions (Arabizantes, ambientais e ameaçadores).
Elliott Sharp: Larynx (Nova Iorque histérica).
Fred Frith: The Technology of Tears (A tecnologia da complexidade).
Jon Hassell/Farafina: Flash of the Spirit (A música do Burkina Faso acionada por botões e enfeitada com trompete).
Lights In A Fat City: Somewhere (Didgeridoo digital em música para aborígenes sofisticados).
Mikel Rouse Broken Consort: A Lincoln Portrait (Outro dos nomes importantes do minimalismo americano).
Motor Totemist Guild: Shapuno Zoo (Rebuscados, Perfeccionistas, tocam tudo e mais alguma coisa. Inclassificáveis).
Non Credo: Reluctant Hosts (os medos infantis. O papão. Estes alemães parecem inocentes mas tocam-nos o cérebro como se fôssemos bonecos).
Pere Ubu: The Tenement Year (Regresso em forma do gordo mais simpático do mundo em novos exercícios de contorcionismo vocal).
Recoil: Hidrology (Kraftwerk, versão esotérica).
Robert Musci & Giovanni Venosta: Urban and Tribal Portraits (O título diz tudo).
Steve Moore: A Quiet Gathering (O mistério das catedrais. Um dos lados é apelidado de «Música de câmara para sons ambientais»).
Test Dept.: Terra Firma (Depois do metal a Terra, os cânticos guerreiros e a gaita-de-foles).
Univers Zero: Uzed (Os belgas discípulos dos Magma continuam a tarefa de dar um rosto solene à velha Europa).
When: Death in the Blue Lake (O líder dos Holy Toy inspira-se na obra do seu compatriota, o escritor Henrik Ibsen, agarra em samples do «Tristão e Isolda» de Wagner e constrói um disco estranhíssimo e grandioso).
e ainda: Heiner Goebbels & Heiner Muller: Der Mann im Fahrstuhl; Jazz Passengers: Deranged and Decomposed; Jocke Soderqvist: Perma Blue; Last Exit: Iron Path; Luciano Margorani: Home Recording is Killing Studios; John Surman: Private City; Peter Blegvad: Downtime; President: Bring Yr Camera; Uludag: Mau Mau; 5UU’s: Elements.

1989

Agnes Buen Garnas/Jan Garbarek: Rosensfole (A voz celestial de Agnes leva-nos direitinho ao Céu).
Barry Adamson: Moss Side Story (O ex-Magazine numa obra heterogénea em tons de negro e sangue).
Charles W. Vrtacek: When Heaven Comes to Town (O que Eno poderia ter feito mas não fez. O que Satie faria se fosse vivo e utilizasse um sampler em vez do piano).
David Byrne: Rei Momo (Onde se prova que as boas saladas devem levar salsa).
Edward Ka-Spel: Perhaps We’ll Only See a Thin Blue Line (Edward mais experimentalista do que nos Legendary).
Einstuerzende Neubauten: Haus der Luege (Os niilistas berlinenses mais virulentos do que nunca).
Fred Frith: The Top of his Head (Aproveito para dizer que, para mim, é Frith e não Zorn, o músico da década. Zorn é o segundo… Está feita a correção).
Glenn Branca: Symphony N.º 6-Devil Choirs at the Gates of Heaven (Não sei quantas guitarras fazem a festa e o rugido do costume).
Hector Zazou: Géologies (música clássica erudita que Zazou é gente séria).
Invaders Of The Heart: Without Judgement (Oriente vs, Ocidente em guerra religiosa instigada por Jah Wobble).
Laurie Anderson: Strange Angels (Laurie Pop, a grande pecadora…).
Lounge Lizards: Voice of Chunk (O sax emblemático da Nova Iorque underground).
Michael Nyman: The Cook, The Thief, His Wife & Her Lover (De novo juntos, Nyman e Greenaway. Como sempre obcecados pela morte e desta vez também pela comida).
Philip Glass: 1000 Aeroplanes on the Roof (Ou mudava ele ou nós). Felizmente, mudou ele. Ou será que fomos nós?…).
Robert Merdzo: Darwin Waltzes (Da mesma escola que Branca).
Seigen Ono: Comme des Garçons, vols. 1 & 2 (Da New Age dos primeiros tempos passou para companhia de Frith, Zorn, Frisell, Lindsay, Lurie e por aí fora. Sim, os referidos tocam todos neste disco).
Stan Ridgway: Mosquitos (O melhor contador de histórias da América, a par de Tom Waits. Como este também das vozes mais originais).
Steve Tibbetts: Big Map Idea (o misticismo ECM por um dos melhores guitarristas da casa).
Worlds Of Love: The Worlds of Love (Depois de canções sobre o poder, David Garland regressa cantando o amor em todas as suas variantes. Apaixonado ou não, mantém-se tão excêntrico como nunca).