Valentin Clastrier – Hérésie” + Compagnie Chez Bousca – “Ethnograffiti”

pop rock >> quarta-feira, 29.09.1993
WORLD


HERESIAS

VALENTIN CLASTRIER
Hérésie (7)
COMPAGNIE CHEZ BOUSCA
Ethnograffiti (7)



“Contrariamente à opinião comum, a heresia não é um erro ou um desvio ao dogma dominante, mas simplesmente, no sentido etimológico do termo, a livre escolha de um itinerário espiritual.” Estas palavras, escritas a prpósito no álbum “Hérésie”, de Valentin Clastrier, definem uma essência e um método de trabalho. Mago e grande emancipador da sanfona, acústica e electrificada, instrumento que levou aos auditórios de música contemporânea, Clastrier tomou como base a heresia cátara, surgida na Occitânia, dos cavaleiros do amor que se opounham a Roma (leiam por “Roma” de trás para a frente), de forma a estabelecer novas práticas e linguagens para a “vielle à roue”, até então confinada às músicas tradicionais. “Hérésie”, atenção, não é um disco de música tradicional. Clastrier, um prodígio de técnica, arranca da sanfona sonoridades alucinantes, coadjuvado pelos “jazzmen” Louis Sclavis (saxofones e clarinete) e Gérard Siracusa (bateria). Da improvisação semiestruturada à narração, passando pela interpretação, mais ortodoxa, de “Quant vei la lauzeta mover”, do trovador Bernard de Vantadorn, séc. XII, “Hérésie” discorre sobre a funcionalidade do som e a assume-se como manifesto em favor do diálogo “da História com o presente”. À laia de anedota, registe-se a maneira como a “Folkroots” se referiu a Clastrier, a propósito de “Hérésie”, chamando-lhe um músico interessante e “com potencial”…
Heréticos, embora menos, também os Compagnie Chez Bousca se apoiam no jazz e na improvisação, um pouco à semelhança dos Gwendal, para dizerem a música tradicional. Com a região de Auvergne e a referência a António Bouscatel (tocador de “musette”, outra variedade de gaita-de-foles francesa, responsável, em conjunto com o acordeonista italiano Charles Peguri, pela criação do “baile ‘musette’”) a servirem de pretexto.
Os processos são em tudo idênticos aos do jazz – introdução do tema, exposição, com solos, regresso ao mote inicial -, sendo os instrumentos solistas a sanfona, o violino, o acordeão e o clarinete, ficando a gaita-de-foles remetida para as funções de contraponto. Pouco convincentes, as vocalizações. Procurando nos sítios certos, consegue-se encontrar outro álbum da banda, “Chants de Quête de la Période de Pâques”, onde, aqui sim, a Companhia se manté fiel aos cânones.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.