Michel Giacometti – “O Homem Que Gravou Portugal”

Secção Local – Televisão – Sábado, 08.06.1991


O Homem Que Gravou Portugal

É nosso costume deixar andar. Esperar que os outros façam por nós. Felizmente, no caso do folclore, houve quem fizesse, para nossa sorte e vergonha. Chamava-se Michel Giacometti, era corso e chegou a Portugal em 1959, atraído por um livro que lera, de Kurt Schindler, sobre Trás-os-Montes. Morreu português, após uma paixão pela música tradicional portuguesa que durou cerca de 30 anos, tantos quantas as viagens pelos territórios da nossa alma. Amou os portugueses melhor do que os portugueses. Gravou-lhes as alegrias e tristezas, com um gravador (então, uma coisa “satânica”) e “aquele ar manso de quem se aproxima devagar das borboletas não para as caçar, mas para lhes decifrar as cores e o voo”, como o descreve Sérgio Godinho. Contra a política oficial da FNAT, dos ranchos e dos acordeões, vigiado pela PIDE, Michel Giacometti, percorreu o país à procura da nossa e da sua verdade. Contra o “folclore” devolveu-nos o folclore genuíno. Um “Cancioneiro Popular Português” e uma “Antologia de Música Regional Portuguesa”, em colaboração com Fernando Lopes-Graça, 150 horas de gravações registadas nos 24 discos dos “Arquivos Sonoros Portugueses”, seis mil fichas de informação etnográfica e três mil fotografias são o resultado dessa paixão. Quando chegou pela primeira vez a Bragança, de capa negra, “barba enorme” e cabelos compridos, o povo estranhou: “Uns diziam que era um padre; outros, um personagem mítico qualquer; e houve quem achasse que era a alma penada de um conde que, de vez em quando, voltava à terra”.
As Outras Músicas, de José Duarte, foram buscar gravações do programa Povo que Canta, que Michel Giacometti organizou e a RTP, na época, transmitiu. Para discutir e não deixar esquecer.
Canal 2, às 19h50

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