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António Manuel Ribeiro – “António Manuel Ribeiro E Os Gigantes Do Nada”

PÚBLICO QUARTA-FEIRA, 13 JUNHO 1990 >> Videodiscos >> Na Capa


ANTÓNIO MANUEL RIBEIRO E OS GIGANTES DO NADA

António Manuel Ribeiro recusa a imagem do herói e mártir incompreendido, sobrevivente de uma história atribulada e sem garantias de final feliz – a do rock português. Não se considera corrompido pelo sistema e promete gravar canções dos UHF acompanhados de orquestra sinfónica.



PÚBLICO – A sua imagem como músico de rock é a do mártir incompreendido, uma espécie de Jim Morrison português…
António Manuel Ribeiro – Tenho muito pouca vontade de ser mártir. Sou de facto sobrevivente, mas não me identifico com qualquer tipo de movimento. A minha posição é extremamente individualista. Muitas vezes meti-me em lutas e, quando olhei para trás, via que era um general sem tropas. Já percebi as teias manhosas em que se enreda grande parte da música portuguesa. Não estou metido em nada. Não tenho nada a ver com isto.
P. – Ultimamente tem dado a imagem de homem bem instalado na vida. Casou, dá entrevistas à “Nova Gente”… É possível conciliar esta imagem com aquela de rebeldia geralmente associada aos UHF?
R. – Os UHF foram, são e serão uma banda de rock duro, enquanto acharmos que é assim que deve ser. Não é incompatível com entrevistas na “Nova Gente”. Considero isso apenas o cumprir das marcações normais que a editora faz. Aceito-as como parte do meu trabalho, mais nada e muitas vezes nem tenho controlo sobre as coisas que se passam, mas também não me preocupo. Já houve uma fase em que fui ingénuo. Tinha a vontade de me explicar, mas cada vez que isso acontecia gozavam comigo. Essa fase passou.
P. – Os UHF consideram-se uma banda da oposição. Por outro lado são das que mais vende. Luta contra o sistema mas aceita as vantagens e o lucro que este lhe proporciona… Os Xutos e Pontapés andam a publicitar a Sumol…
R. – Nunca faríamos anúncios a um refrigerante. Faríamos sempre a uma marca de “whisky”… Agora a sério, cada um de nós vive daquilo que ganha. Não estamos corrompidos. Continuamos o mesmo tipo de pessoas. Por exemplo, em relação à nossa editora, não somos oposição mas assumimos uma posição crítica.
P. – O cinismo é necessário?
R. – Sou muito cínico, sobretudo a negociar. Quando me sento à mesa para negociar qualquer tipo de contrato tenho de levar a água ao meu moinho. Tenho sempre que levar a minha avante.
P. – O intimismo das letras pode ser uma fuga possível?
R. – É verdade. Mas vou dizer outra coisa: “Noites Negras de Azul” e “Lugares Incertos”, ambos de 88, eram álbuns que falavam sobretudo do amor, eram intimistas. Agora que casei já não falo do amor. É um bocado a minha filosofia de vida. Gosto de andar ao contrário. Gosto pouco de andar em rebanhos, de pensamento, de atitudes ou de vestuário… Como já disse, sou um individualista.
P. – Que vai envelhecendo… Será como o Mick Jagger, aos 50 anos ainda a tocar rock?
R. – Não estou preocupado com isso. Não vou abandonar. Depois de uma gravação fico vazio, em ressaca, como se tivesse parido. Outras vezes fico mesmo farto… Mas gosto disto.
P. – Os UHF têm permanecido quase sempre na crista da onda. Qual o segredo?
R. – Digamos que têm andado sempre por lá perto. Penso que temos feito um trabalho coerente. Se alguém não gosta, deite fora, aceitamos isso. Mas às vezes sinto o descalabro à minha volta. Somos gigantes do nada. As pessoas contam mentiras na imprensa. Também já o fiz. Hoje não estou interessado em fazê-lo. Não é nada bom para a música portuguesa. Estamos todos a viver de balões de oxigénio, fora os UHF e mais três ou quatro bandas que recusam essa inflação de mentiras.
P. – Que tipo de mentiras?
R. – Não quero entrar em pormenores. Digressões no estrangeiro que são falsas, “cachets” inflacionados e depois negociados com 30 por cento de desconto. Digressões neste país não há. Nunca houve. O que há são contratações que vão sendo aceites.
P. – Não têm projetos para o estrangeiro?
R. – Temos, claro. Não quero falar de concertos dos meus colegas no estrangeiro, mas tenho que dizer que foram quase sempre desastrosos. Os UHF são sinceros ao ponto de admitir já ter perdido dinheiro em atuações no estrangeiro. Tocamos em salas cheias… de emigrantes. Em Paris estavam 5 franceses entre 1500 pessoas. Fomos a Paris tocar para o Minho e Alentejo.
P. – Porque é que isso acontece?
R. – Porque em Paris existem outras 50 salas idênticas com concertos, à mesma hora. São outros meios. Para quê fazer como colegas meus, que dizem que fizeram espetáculos incríveis aqui e ali, em salas de 200 lugares?…
P. – Como situa os UHF perante a concorrência?
R. – Somos mal vistos. A maior parte das vezes, as pessoas, não digo que virem a cara, mas levam um certo tempo para nos enfrentar. Nos bares, na noite, nos concertos. Temos sido sempre colocados num gueto. Não é que queiramos passar por vítimas. Temos uma relação mais íntima e próxima do nosso público que a maior parte dos outros artistas portugueses da mesma área, que inflacionam uma certa pose e depois é tudo mentira.
P. – E a vossa relação com o público?
R. – As pessoas criaram uma imagem deturpada de nós. A imagem de rebeldia foi, confesso, vendida por mim. Hoje diz-se que estamos mais calmos. Não estamos. Há dias viemos de um concerto, andámos 400 quilómetros e fomos para a pândega em Lisboa. Chegámos a casa às cinco da manhã, virados do avesso. Os UHF têm um ouvido popular. Conseguem perceber o gosto do público. É isso que queremos: compor canções que todos possam trautear. Há por aí projetos musicais engraçados mas totalmente afastados do público. Não vendem. Não ponho de parte a hipótese do rock português pura e simplesmente acabar. Acaba-se esta porcaria toda. As editoras andam de cabelos no ar sem saber o que fazer. Se calhar não há solução.
P. – Alguma vez pensou em trabalhar fora da área específica do rock?
R. – Gostaria de gravar um disco com canções dos UHF pouco conhecidas, trabalhadas com orquestra de modo a dar-lhes um cunho totalmente diferente.
P. – Que é para si o rock?
R. – É uma questão física… O apelo à dança. Permite a agressividade, a agressão. Pertenço a uma geração de agressão. Tinha 20 anos em 74. Antes dessa data e mesmo depois, só havia baladeiros. Ganhei aversão a esse tipo de música. Paz, amor e uma viola. “Hippismos” retardados. O Maio de 68 consumido fora de horas. Quando começámos, todos esses sujeitos estavam contra nós. Lembro-me de, uma vez, um digno cantor da nossa praça afirmar publicamente que os UHF não tinham direito cultural de ir à festa do “Avante. O rock, nessa altura, tinha toda a razão de ser.

Vários – “Cuecas” (televisão)

PÚBLICO SEXTA-FEIRA, 18 MAIO 1990 >> local


Cuecas

MANUEL JORGE ROQUE prossegue corajosamente a sua cruzada em prol da música portuguesa, não sabemos se de algum modo instigado pela severa e sapiente mão legislativa de defesa da mesma. Seja como for, a divulgação da música portuguesa não é, por si só, negativa. A música portuguesa, em geral, é que é negativa. Em termos qualitativos quase sempre não passa de cópia, mais ou menos fiel, de correntes e estilos estrangeiros. Quantitativamente também não estamos melhor. Para além dos intérpretes que realmente vendem e cujo número se conta pelos dedos, existe realmente um lote um pouco maior de aspirantes a figurar nas páginas de mexericos da “Nova Gente”, receber cartas de adolescentes apaixonados ou a ser inflamadamente defendidos ou atacados nos “pregões” do Blitz, sinais inconfundíveis de glória. Felizmente que alguma vergonha ainda impede a mediocridade ou simples nulidade da maioria de tais “projetos” de se estender à vergonha maior do espetáculo televisivo. Assim não causa estranheza o facto de esta semana os nomes em destaque serem Lena d’Água, Xutos e Pontapés e UHF (estes na rubrica “Perfil”), os mesmos de sempre. Não se estranhe pois também que, para variar um pouco, o programa se socorra de estratagemas como os desta semana em que será apresentada uma coleção de cuecas americanas para esta estação. Entre Xutos e cuecas importadas, vive apertada a “nova” música, a muito custo, portuguesa.

Canal 2 às 24h00

Vários – “Haja Festa” (TV | RTP)

PÚBLICO SEXTA-FEIRA, 4 MAIO 1990 >> Local


Haja Festa

O “HAJA MÚSICA” faz hoje um ano de emissões. Haja alegria e vontade de fazer melhor. Em dia de festividades, o destaque vai para os nacionais Xutos e Pontapés e para o seu mais recente disco “Gritos Mudos”. Os Xutos interpretarão o tema “Pêndulo”, não sabemos se ao vivo se em “clip” – o Manuel esqueceu-se, esta semana, de nos contar… Em pessoa, no estúdio, vão estar Luís Represas, dos Trovante, João Peste, provocador-mor da nossa praça, e Jorge Palma, eterno vagabundo das cantigas. Foi o que conseguimos apurar da consulta às páginas de um colega. O resto da lista dos nomes presentes, bem adjetivados para compensar com palha a falta de informação, é o seguinte: Afonsinhos do Condado, tontos, broncos e engraçados; Rádio Macau, “rockers” de Xana e de sucesso; Adelaide Ferreira, hoje também “rocker”, amanhã talvez fadista, mas não faz mal, enquanto o resto se mantiver a alturas aceitáveis; Ritual Tejo, novos, desconhecidos, digam qualquer coisa; Lobo Meigo, vencedores do último concurso RRV; UHF, “alter ego” de António Manuel Ribeiro, o papa. Todos em “playback” – que desilusão! Parece que vai haver um cenário especial de aniversário. Parabéns a você, etc.

Canal 2, às 24h00